DATA: 07.10.98, “E o Grande Oscar Vai...”: 

O relógio assinalava que eram sete horas da matina e eu, como fazia naquele horário, estava me dirigindo para a Delegacia-Geral, passava pelos mesmos lugares, as mesmas avenidas e ruas. O tráfego nesse horário era plenamente suportável, o tempo estava nublado, com o vento sul o mar da baia norte estava um espelho, era o meu mês de outubro, a temperatura muito agradável, bem do jeito que eu gostava, entre treze e quinze graus, havia colocado o “CD” de George Michael e a primeira faixa invocava a presença de Cristo para uma criança. A seguir “o amor rápido”, já próximo à “Casa do Barão”, primeiro as folhas verdes da repartição do Exército e, mais adiante, senti o vento bandear as folhas daqueles coqueiros centenários, e nesse clima veio  um pensamento bastante presente, justiça seja feita, o grande vencedor disso tudo realmente foi o “Grande Heitor Sché”. Qual seria o seu segredo? Obstinação, experiência, visão ou, muitos ismos, como centralismo, “alianciacismo”, oportunismo, “ambicionismo”, “articulismo”, “estrategismo” ...?

“Um Grande Final...”:

Havia entrevistado Heitor Sché no ano de 1996 e ele deixou registrado um desejo bastante natural em querer voltar ao cenário político, seria uma a volta por cima em grande estilo. E, para isso estava disposto a tudo ou nada, ele que deve ter passado por poucas e boas nos últimos tempos, por muitas adversidades no plano existencial... Mas as nossas vidas têm que seguir seu curso natural, e agora estava ele ali integral, reinventado, renascido das cinzas, e de volta para o futuro. Pessoalmente, achei que mais uma vez deixou para trás uma oportunidade de ter se lançado à Câmara Federal (como no ano de 1986, por ocasião da Constituinte...), mas essa era uma opinião pessoal, de qualquer maneira, que falassem o quiser, estava ali um grande vencedor. E dizer que tudo começou com seu pai, Fiscal de Armas nas décadas de cinquenta e sessenta na cidade de Rio do Sul (chegou a ser designado para função de Delegado de Polícia), elegeu-se vereador e foi aí que Sché deve ter despertado seu interesse para os binômios “Polícia e Política”... Seu gestou calou a boca de muita gente, eu particularmente fiquei contente com sua reeleição, apesar de não ser essa uma opinião de todos os meus companheiros. É certo que o tempo ainda irá revelar novos lances nesse jogo pelo poder, outros lances, mas, certamente, ninguém poderia ofuscar o brilho de Sché que tal como Fênix, deixou as cinzas para alçar um voo, digno de respeito e merecedor de registro. Certamente que gostaria muito que o seu “Oscar” viesse a ser entregue por Esperidião Amim, depois de todo aquele jogo de traições por causa da fundação do “PRN” (o projeto engendrado foi Sché fundar o o PRN no Estado de Santa Catarina, juntamente com os Deputados Mário Cavalazzi e Jair Silveira e, depois, quando o Presidente Collor de Mello se consolidasse no Poder, Amin deixaria o “PDS” e assumiria o comando do partido no Estado, só que isso não deu certo, e o mico ficou com os três parlamentares que ficaram abandonados a própria sorte..., conforme relatou um dos parlamentares mencionado em entrevista a este autor).

“E, o ‘Ig-Nobel’ vai para Quem...?”

E quem teria pago o grande mico nesse processo eleitoral? Por enquanto, sem dúvida, afigura-se que foi o nosso Júlio Teixeira. Lembrei de seu excesso de otimismo e depois percebi que apesar de conversar comigo invocando palavras de efeito, não se via no plano concreto uma campanha eleitoral, eleitores, votos... Também, não passava a confiança de que tudo estava indo bem, além do que suas alianças quase não funcionaram... O fator subestimação dos fatos, a desconsideração ou o desconhecimento acerca do que algumas pessoas poderiam lhe dizer nos momentos cruciais, repassar... e lembrei daquele dia, isso há um ano atrás, quando nos encontramos na Assembleia Legislativa e conversávamos eu e o “Carlos Tucano”’ do PDT, ex- Secretário Municipal do Prefeito Sérgio Grando na Prefeitura da Capital e nosso ex-colega da Faculdade de Direito, quando  ele veio ao nosso encontro e completou nossa conversa anterior no seu gabinete sobre as tratativas que fizemos sobre o nosso “Plano”, dizendo:

  • Certo Felipe, é isso aí, vamos trabalhar num “Plano Maquiavélico”’ ...!

Bom, nunca tinha pensado naquilo e nem era esse o nosso intento, muito pelo contrário, mas naquele momento desconsiderei aquela afirmação, nem levei muito a sério a sua exaltação, entendendo ter sido ela mais fruto de um instante de delírio de Júlio ao encontrar dois ex-amigos da faculdade, daqueles tempos que ainda tínhamos resquícios das nossas adolescências.

E lembrei, finalmente as minhas aulas de História, sobre Napoleão Bonaparte e sua participação na Revolução Francesa ao lado do proletariado, combatendo a nobreza (“ancien régime”), para mais tarde restaurá-lo, sob os aplausos das mesmas massas populares... Aquele momento no Estado trazia muito em comum com o reinado de “Luiz Capeto”, aquela alternância de poder conduzia, indubitavelmente, à construção e desconstrução, leituras e releituras... De um lado o PMDB de Paulo Afonso que havia assumido o governo do Estado no início de 1995 sob o rufar dos tambores e para “mudar tudo”..... E, naquele ano, o mesmo governador e seus seguidores, de maneira melancólica saem enxovalhados... Surge o novo, Esperidião Amin que já tinha deixado o governo do Estado em 1987, sem respaldo popular e tendo que aceitar que os catarinenses queriam mudanças, sendo assim, teve que se quedar ao PMDB histórico de  Pedro Ivo Campos. Então, guardadas as devidas proporções, a história se repete, tudo parecia cíclico e por quê seria que o povo catarinense agia daquela maneira? Elementar, como diria o contista, o poeta... E me veio a lembrança aquelas tiradas populares de “Voltaire”, como por exemplo, esta sua máxima: “Quando estou com a barriga cheia penso de um jeito e quando estou com ela vazia penso de outro bem diferente!”.

E voltei à realidade, vendo o termômetro do Posto da Rio Branco assinalando a temperatura de quinze graus.

Horário: 08:00 horas, deu no Jornal “Diário Catarinense”:

"Já começou

Reeleito, o deputado estadual Narcizo Parisotto (PMDB), em entrevista a uma rádio de Chapecó, ontem, apressou-se a dizer que ‘não vai fazer oposição ferrenha ao governador Amin’. O também reeleito deputado Pedro Uczai (PT) aproveitou a deixa, e disparou: ‘É claro, a prática política dele  não se sustenta sem o uso da máquina". 

(DC de 7.10.98, pág. 3).

"Mais pérolas do Paulo Alceu": 

"O recado das urnas

(...)

Os quatro deputados que apoiaram o governador Paulo Afonso durante o processo de impeachment foram reeleitos. Onofre Agostini e Ciro Roza, ambos do PFL. Jaime Mantelli PDT e Jorginho Mello (PSDB). Os dois principais algozes foram derrotados, os pefelistas Norberto Stroisch e Júlio Teixeira. Coisa das urnas.

PFL x Expulsão

O deputado Onofre Agostini, reeleito, vai permanecer no PFL. ‘O diretório nacional substituiu a pena de expulsão por uma suspensão, já cumprida. Sendo assim continuo no partido’. O deputado Ciro Roza, também reeleito, não tem motivos para sair agora, embora reconheça que em política nunca se sabe... ’Sendo tratado com respeito como qualquer filiado, continuo. Não vai ser conveniente, em cada votação, reviverem o episódio do impeachment. É uma página virada. Passou.’

Eu fico

O deputado Jaime Mantelli, reeleito, afirmou que não vai deixar o PDT. Na verdade pretende provocar uma redemocratização dentro do partido buscando a formação de um diretório legalmente eleito. Não aprova uma comissão imposta e nomeada. Defende uma mudança através do voto. ‘Sou pedetista pela doutrina e pelos princípios do partido’.

A Frase

Estamos em profunda reflexão. Penso em reunir as lideranças do partido, depois de baixar a poeira, para uma análise sociológica. Reconheço esta necessidade, mas continuo acreditando na ressurreição.’ Do senador Cacildo Maldaner, presidente estadual do PMDB.

Pensando em voz alta

Só falta agora o candidato Paulo Maluf perder no 2° turno para que todos os principais envolvidos no Caso das Letras sejam punidos pelas urnas.

 

Horário: 09:00 horas, “O Real e o Imaginárium”:

Na sala do café, no andar térreo do prédio da Delegacia-Geral, Walter, depois de encerrar uma ligação telefônica, sempre que me via chegar se postava de tal forma a conduzir meus pensamentos a sua imagem e a estabelecer uma relação muito próxima e ambivalente entre o real e o imaginário, tendo como cenário o cotidiano que o cercava. Aguardei sua aproximação e ele se lançou a fazer uma consideração:

  • Mas que pena aquele “menino”, não se elegeu.
  • É Walter, realmente foi muito triste.
  • Pois é,  tu tinhas dito que ele iria sair lá de Rio do Sul com uns trinta mil votos?
  • Não, Walter. Eu disse que segundo as pesquisas ele sairia de lá com uns dezessete mil votos, mas infelizmente funcionou um esquema terrível que inviabilizou a candidatura dele, o Júlio foi uma pessoa muito visada, a começar pelo próprio PMDB em razão de sua postura no episódio das Letras, do impeachment, aqui pela cúpula da Secretaria de Segurança, o número de candidatos na Polícia Civil, além de outros fatores, sem contar o fato de ter rolado muito dinheiro.
  • É, realmente ficou difícil.
  • Mas de qualquer maneira ele ficou na quarta suplência com vinte mil votos, é muito voto.
  • Claro que é, minha nossa, o Heitor também, se não fosse os treze mil votos aqui na Capital, não teria se elegido, se fosse depender lá de Rio do Sul não teria chegado.
  • Sim. Só para ter uma ideia o Maurício Ortiga, nosso médico legista, saiu numa campanha lá em Rio do Sul dentro da Polícia Civil e acabou tirando votos preciosos.
  • Mas que surpresa aquele lá de Joinville.
  • O João Rosa?
  • É, esse!
  • Pois é, ele foi uma surpresa, e vai incomodar porque tem direito a espaços. O Amin vai precisar da bancada do PSDB e você Walter conhece o João Rosa,  trabalhaste na época dele lá na Superintendência, lembra? Ele é um estrategista, e tem méritos políticos, de qualquer maneira para a Polícia Civil ficou bem, dois Delegados e mais o Júlio como suplente com vinte mil votos. E, é por isso que a situação da Secretaria de Segurança é difícil para o Amin, porque além do Heitor e do João Rosa, há uma razão de ordem moral por parte de Amin, do Jorge Bornhausen e do Kleinubing que não vão deixar o Júlio mal, acho que é uma questão de honra prepará-lo para ser um vencedor no próximo pleito, concedendo espaços importantes,  no mínimo como Secretário Adjunto da Secretaria de Segurança.
  • É verdade, e o Mantelli também se elegeu.
  • É verdade, certamente que houve o episódio das Letras, e isso pesou.

(...)”.

“Mais vítimas”:  

E nisso chegou Osnelito que relatou em síntese o que eu tinha acabado de dizer para Walter a respeito do Júlio Teixeira, no que ele concordou integralmente, entendendo que o futuro governo deveria certamente aproveitar o Júlio numa situação de bastante “prestigiamento”. Osnelito fez a seguinte observação:

  • Pois é, que pena o Blasi.
  • É Osnelito, ele foi mais uma vítima do esquema do Paulo Afonso.
  • É verdade, mas gostei que a Ideli Salvati se elegeu, é uma pessoa boa. (Osnelito)
  • E aquele Gilson dos Santos, ainda bem que não entrou, já estava há vinte anos na Assembleia, que quê é isso? (Walter)
  • Vinte anos não, mais. (Felipe)
  • Não. É vinte anos, eu ouvi ele dizer isso hoje de manhã numa entrevista. (Walter)
  • Ah, é? (Felipe)

 

“Iimortais”:

E depois Walter foi atender o telefone da central e fiquei a sós com Osnelito:

  • E o Lorival não vai assumir mais a Delegacia Geral? (Osnelito)
  • Não vai?
  • Não sei, é o que andaram dizendo por aí.
  • Não sei de nada, eu acho que ele não iria querer descer na hierarquia, vai preferir ficar lá em cima.
  • Mas para ele parece que era importante, para ser ‘imortal’ só sendo Secretário de Segurança ou Delegado Geral.

E após o sorriso de garoto travesso, menino levado num corpo já velho, deixei o local e lembrei que assim sendo Lorival estaria isento daqueles que de vez em quando vão até a galeria e na solidão do recinto blasfemam, extravasam, gritam palavras injuriosas ou difamatórias, pensam em trazer um martelo à noite..., o que poderia trazer muito azar para  certas “figurinhas imortais”.

E lembrei que nesses últimos anos passei a respeitar Lorival pela sua coerência política, fidelidade a seus princípios e lealdade ao PMDB, apesar de que essa sua postura poderia ter contribuído para muitas maquinações de bastidores, perseguições, favorecimentos, esquemas “acadepolianos”... e eu me sentia um exemplo vivo disso, mas isso seria outra história.