Data: 30.10.98, horário: 10:30 horas:

Depois que me recolhi no silêncio da “sala de reuniões”, após a conversa que tive com o Delegado Braga fiquei rememorando alguns fatos não tão distantes. Braga fazia parte do  “decreto” velado de confinamento ou isolamento, como ocorreu na antiga Grécia, ou seja, era mais uma vítima de uma forma moderna de “ostracismo”, sem a necessidade de “partida”, muito pelo contrário, o “condenado” tinha que permanecer no local para sofrer as consequências de uma “marcação” (vou evitar falar em “perseguição”...)  quase que invisível, mas eficaz no sentido de infundir o medo de um “inimigo invisível”.  Sim, estávamos nas mesmas condições, no entanto, sempre tive um enigma não resolvido, isto é, queria entender como no início da gestão da Secretária Lúcia (governo do PMDB) ele continuou à frente da Diretoria de Polícia do Litoral (cargo que havia ocupado no governo anterior), só que depois acabou sendo “chutado” literalmente e ficou na minha condição. Evidente isso ocorreu  por motivos bem diversos (eu era vítima de perseguições especialmente dos Delegados Lúcia e Lourival, tanto que tive que ir para outra Secretaria de Estado – Justiça e Cidadania – Sistema Prisional). O engraçado foi que quando Lúcia e Lourival assumiram o comando da Pasta da Segurança mandaram que Braga fizesse o “serviço sujo”. No início de 1995 coube a Ademar Rezende (ex-Delegado-Geral no Governo Kleinubing) assumir a “Assistência Jurídica” (imagina, eu estava falando com o ex-Delegado-Geral do governo anterior) e o novo Delegado-Geral Evaldo Moretto (que foi Diretor de Polícia do Interior) havia sido  “promovido” para o cargo de Delegado-Geral. Moreto teve a deferência e humildade de vir à  minha presença para dizer que Ademar Rezende iria me substituir em razão da mudança de Governo. Pois bem, fui me apresentar ao Delegado Braga e argumentei que tinha vários períodos de férias atrasadas... Ele rispidamente (sem muita conversa e margem para diálogo) respondeu que a ordem era que eu me apresentasse na 2ª DP – Saco dos Limões, sem direito a gozar minhas férias atrasadas. Depois de cerca de quinze dias estava nomeado Diretor da Penitenciária de Florianópolis. Um Delegado amigo que já faleceu (Carlos Andretti) nessa época me relatou que estava no gabinete com a Secretária Lúcia no momento que o Diretor de Polícia do Litoral ligou para ela (Delegado Braga) avisando da minha nomeação para cargo em comissão na Secretaria de Justiça (Diretor da Penitenciária de Florianópolis). Segundo Andretti, depois que Lúcia soube bateu o telefone com rispidez e disse para os presentes: “O Genovez escapou de nós!” Nesse encontro com o Delegado Andretti ele disse ainda que pela cara da Delegada Lúcia eles estavam dispostos a preparar alguma coisa para mim e quis saber por que daquilo?” (tive que confidenciar para ele minha luta na presidência da Fecapoc, o embate que tive com o Delegado Lourival quando o mesmo respondia pela DRP de São José (governo Pedro Ivo Campos). Ele havia se negado a cumprir uma ordem do Superintendente da Polícia Civil (Delegado Antonio Abelardo Bado) que a meu pedido determinou mudança na escala de plantão para todos os Delegados Regionais, porém, Lourival foi o único a resistiu, ponderando que não iria cumprir aquela ordem. Moral da história, tive que entrar com uma notificação judicial contra Lourival e, para minha surpresa,  prestou informações que não condiziam com a verdade (cópia de escalas de plantão que não refletiam as informações que estavam nos livros da 2ª DP de São José...) e só não entrei com uma representação criminal e civil contra ele porque o Delegado Bado fez um pedido nesse sentido, já que era do PMDB de São José, cargo comissionado.... Bom, a partir desse fato ele começou um processo interno para minar a minha imagem junto ao Chefe de Polícia e outros diretores e assim foi por todo o sempre... Já o caso de Lúcia foi bem diferente, tive uma discussão com ela a respeito da “Lei Especial de Promoções” (LC 98 de 1993). Ela numa reunião,  na minha presença, disse para todos que essa legislação não prestava” e eu defendi aguerridamente, chegando a ser meio pesado nas palavras, mas nunca com o objetivo de ofendê-la, muito pelo contrário. O fato era que tanto ela como Lourival torceram durante quatro anos pelo insucesso do governo Kleinubing na área de Segurança Pública, viviam criticando tudo e a impressão era que quando pior melhor...(especialmente, depois do fim da isonomia). Eu era o grande responsável por apresentar projetos, uma espécie de “laboratório de projetos”, ideias... Mas eles precisavam de um bode expiatório para fins de discurso e destilar suas acidez...  Mais, ainda, não se conformavam como eu havia permanecido quatro anos (governo Pedro Ivo e Cacildo Maldaner) liderando os policiais civis, sendo responsável por apresentar vários projetos...,  uma espécie de braço direito do Chefe de Polícia (acabamos ficando muito amigos, como no caso de Jorge Xavier). Também, tinha liberdade para me movimentar, realizar assembleias permanentes, pelo interior do Estado e representando a Polícia Civil na Constituinte Estadual de 1989, mesmo sendo de outro partido político (PFL – havia sido  candidato a Deputado Federal no ano de 1986). Isso passou a incomodar e passou a servir de discurso para Lourival e outros... Chegavam a dizer que eu estava fazendo tudo aquilo para preparar minha campanha a deputado novamente e que o PMDB estaria “engordando uma cobra venenosa” (moral da história: “sempre disse que jamais trairia o PMDB e realmente não fui candidato...”).  Depois, veio o governo do PFL (Vilson Kleinubing) e obviamente  voltei à cena, permanecendo na área jurídica, fazendo projetos (só havia deixado a liderança classista) e eles do PMDB tiveram que voltar para as Delegacias (obviamente que  a minha permanência e atitude pró-ativa dentro do novo governo foi motivo para que eles viessem ficassem mais incomodados ainda...). Quando o PMDB voltou a ser governo com Paulo Afonso, novamente fui para cargo comissionado, só que noutra Secretaria de Estado, e então a Delegada Lúcia quando soube soltou aquela sua frase relatada pelo amigo Andretti.

Horário: 10:55 horas:

Desci até o gabinete de Osnelito para o tradicional cafezinho :

  • Ôba!
  • Oi. Escuta, sobre esse concurso aí que fizeram,  o pessoal já foi nomeado... tu achas que há chance de eles anularem?
  • É muito difícil Lito.
  • Porque tem várias ações que foram ajuizadas....
  • Sim, eu vi lá na Assistência Jurídica os mandados de segurança, mas Governo e Justiça não decidem nada se não for em conjunto nesses casos.
  • Mas tu achas que eles não podem anular tudo isso?
  • Olha Osnelito, o ato jurídico tem que obedecer critérios, eles estão previstos na Constituição, nas leis...
  • Pois é, o ato nulo pode ser anulado, não é?
  • Sim, o ato nulo não gera direitos, são princípios de Direito Administrativo consagrados..., impessoalidade, moralidade, publicidade, legalidade, competência... e se um ato administrativo é editado sem cumprir esses princípios é claro que não pode gerar direitos, pode ser anulado.
  • Ah, sim.
  • Veja bem Osnelito, a lei estabelece que para o nosso concurso teria que ter   um representante da OAB, só que eles não fazem isso..., e o representante nunca se faz presente..., se isso não foi observado o que pode acontecer?
  • É, e o que tu achas, havia algum representante lá da OAB? Eles se manifestaram?
  • Eu acredito que é possível que tenha havido até o encaminhamento de um ofício para cada etapa das provas, sei lá. Eu não estava lá, não acompanhei esse concurso, mas acredito que no dia da prova oral é possível que houvesse um representante da OAB junto a banca, pode ser que eles  cumpriram esse quesito rigorosamente, mas não tenho certeza...
  • Mas o curso de formação será que foi cumprido integralmente, conforme a legislação que tá aí em vigor?
  • A gente sabe que o concurso é feito em duas etapas, a primeira fase e o das provas escritas e, a segunda, com a realização do curso de formação que deve ter uma carga horária prevista na Lei, portanto ele é obrigatório. Uma vez que o candidato tenha obtido êxito nessas duas etapas passa ter direito à nomeação.
  • E tu achas que o curso cumpriu a carga horária prevista na lei?
  • Ah, eu acredito que eles cumpriram ou deram um jeito, do contrário eles não poderiam ter encaminhado os documentos para fins de nomeações.
  • Mas como isso, se eles tivessem cumprido, teriam que estar ainda fazendo o curso, não teria terminado no mês passado. E, eles não estariam já nomeados, então eu acho que tu tá acreditando demais nessas coisas...

(...)

E deixei a sala do Osnelito afirmando que era preciso acreditar nas coisas ou pelo menos parecer acreditar, fazer de conta..., especialmente nas pessoas (só que ele era teimoso e não acreditava...)  e deixava escapar aquele seu sorriso de manezinho maroto, garoto travesso. Nesse clima só tive um caminho para abreviar nossa conversa...:  mirar à saída para a rua, quando me dei conta já estava parado na faixa de pedestre da esquina mais próxima quando tive que parar de pensar naquele certame que mais parecia a escalada ao Kilimanjaro à noite. Foi o sinal que esperava para deixar de remoer aquela nossa conversação indigesta..., sobre a diferença entre se acreditar e dar crédito a fatos, a pessoas e a coisas tão distantes e nebulosas, reflexo da negritude ou um "environmental disease".

Data: 02.11.98, horário: 23:15 horas, “Sem Novidades”:

Jorge Xavier já tinha telefonado por volta das vinte e duas horas querendo saber das novidades. Como eu ainda não estava em casa, deixou recado na secretária eletrônica para que eu ligasse mais tarde.

  • Alô!
  • Francine, o teu pai está aí?
  • Sim. Só um momento.

E escuto a voz de Francine: ‘Paêêê!!! É o Felipe.

Jorge Xavier atendeu o telefone já querendo saber se eu havia conversado com Júlio Teixeira. Respondi negativamente. Na verdade nem tinha tentado. Desapontado, disse que tinha acabado de chegar de Governador Celso Ramos (onde tem casa de praia). Procurei deixá-lo mais tranquilo, dizendo que iria fazer contato até amanhã e daria um retorno, inclusive, trataria sobre o nosso jantar.

Em seguida, logo após desligar o telefone, procurei na Telesc o número de Júlio Teixeira em Rio do Sul e logo que consegui tentei fazer contato em vão. Em seguida liguei para a Delegacia de Ibirama com o objetivo de ver se conseguia  o número do telefone da residência do Delegado Carlos Sontag e saber se o mesmo tinha conhecimento por onde andava Júlio Teixeira naquela região... Do outro lado da linha o policial não soube informar.