O Grupo de Trabalho: Os encontros seguintes no comitê:

Os encontros seguintes transcorreram durante os meses de julho e agosto de 1998, sem aparente abalo da normalidade.  O Delegado Rachadel não apareceu mais nas reuniões. João Lipinski algumas vezes.  Já o Delegado Redondo trouxe o Delegado Quilante (de Itajaí) para integrar o seu subgrupo. Do nosso lado, conversei com Jorge Xavier e acertamos que deveríamos convidar mais dois delegados para integrar nosso grupo. Sugeri o nome do Delegado Rubem Garcez (Jorge Xavier inicialmente torceu o nariz, mas em seguida concordou sem muito custo). E, coube a Jorge Xavier ainda apresentar o outro nome que soube tratar-se de César Krieger (não criei qualquer objeção, muito pelo contrário).

Ficou definido preliminarmente que não se trataria de propostas que importassem em mudanças na estrutura e organização institucional. Essa decisão contrariava as propostas apresentadas no nosso “Plano” inicial, dando a impressão que estávamos migrando para a sobrevivência. Lembrei da correspondência que eu, Jorge Xavier e Júlio Teixeira recebemos de Amin: “...determinei que incluísse as propostas no meu plano de governo...”, o que passava a descortinar o “novo”, o senso real, a dimensão política na qual o Senador Amim virou não só astro, mais verdadeiro “Az”, se bem  que ainda não mitificado e mortal. Também, comecei a me preocupar mais com as impressões de Júlio Teixeira, e se elas viessem a se concretizar, se Amin realmente daria pleno apoio ao nosso plano, mas a esperança naquele momento tão decisivo era a última que poderia sucumbir, e tempo estava a nosso favor, já que fomos os primeiros a apresentar algo concreto. O Cel Backes havia comentado que deveríamos trabalhar em propostas genéricas de “o que fazer” e “como fazer” em nível de segurança pública, conforme foi acertado na reunião do Hotel Floph, bem ao estilo do plano apresentado por Wanderley Redondo. A dúvida era por que o Cel Backes, representante-mor da Polícia Militar e forte parceiro do Senador Amim, não havia se posicionado sobre nossas propostas (ou apresentado qualquer coisa em nome da sua corporação)? Muitas dúvidas, presságios, inferências... ao sabor do tempo.

Um fato marcante foi o Cel Backes  (assessorado pelos Coronéis Ib Siva e Souza), ter utilizado a estratégia de trabalhar em separado para propor uma proposta específica da Polícia Militar.  Enquanto que o nosso grupo apresentaria um estudo relativo à Polícia Civil ou, como dizia o então, ainda, Tenente Coronel Vanderlei Souza, à Polícia Judiciária (pensei em rebater essa terminologia que diz respeito à função, porém resolvi deixar para lá, até porque pensei ser falta de esclarecimento ou ignorância, depois percebi que estava equivocado porque o Delegado Lauro Radka Braga havia confidenciado que num encontro em Mato Grosso – do início ao fim – bateu boca com o Coronel Souza acerca de questões institucionais e que tais embates ideológicos na áreas da Segurança Pública parecia não terem mais fim e que tônica era sempre: Polícia Civil  x Polícia Militar. Também, lembrei daquele livro do Coronel Ib Silva atacando a Polícia Civil... e agora estavam eles ali na linha de frente (será que teriam sensibilidade para se desprender da pequenez de sua crenças para realmente defender o que seria melhor para a sociedade e para a sobrevivência das próprias instituições? Sim, teríamos que enfrentar efeitos colaterais, pois quanto mais se cresce mais se agigantam as forças em contrário...

A estratégia vaticinada pelo grupo militar se resumia a fazer propostas fragmentadas, isto é,  a Polícia Militar faria uma apresentação individualizada também para o Corpo de Bombeiros, Polícia Rodoviária Estadual, Defesa Civil, além da Polícia dita de Segurança.  Com isso, a Polícia Civil teria também que fazer estudos para cada uma das áreas: Polícia Civil (ou judiciária), Detran, Sistema Prisional, Polícia Científica, Jogos e Diversões, Produtos Controlados... Acabei lembrando da conversa que tive com o Cel Backes ainda no Hotel Floph, quando este havia dito  que o ideal seria o Detran se transformar em uma autarquia (sim, era pretender o enfraquecimento de uma área estratégica e tradicional da Polícia Civil que sempre despertou o famoso “olho grande”...).

Avisei os companheiros mais chegados da Polícia Civil que não podia concordar com aquela metodologia, mesmo porque ela afrontava o espírito de nosso Plano de criar a Procuradoria Geral de Polícia. Disse a Garcez que era preferível romper com o grupo militar e apresentar uma proposta nossa, tendo Jorge como Coordenador.  Já que Garcez – representando nosso grupo - estava encarregado de trabalhar na proposta juntamente com o pessoal de Redondo, segundo o encaminhamento dos oficiais, disse a ele que para a Polícia Militar nada alteraria o produto final, pois os órgãos especificados, independentemente, da forma como fossem tratados, seriam sempre compactados dentro do Comando Geral da Polícia Militar. Enquanto isso, a fragmentação dos órgãos policiais civis não implicariam na mesma máxima, muito pelo contrário. Garcez procurou resistir a essa ideia, dizendo que não era bem aquilo e eu pensei cá com os meus botões: “... então tá!

E para complicar ainda mais o quadro, após já algumas reuniões, o Cel Backes deu conhecimento de que o grupo do Heitor também iria se integrar ao grupo:

A partir de agosto de 1998 o Cel Backes deu conhecimento de que o Grupo de Heitor Sché também iria participar dos nossos trabalhos, e que já tinha comunicado Jorge Xavier e Júlio Teixeira dessa circunstância. Depois de tomar conhecimento dessa decisão, logo intui o que ela representava, mais pessoas se digladiando só de um lado, enquanto no âmbito da Polícia Militar permanecia apenas os Coroneis Backes, Ib e Souza como uma unanimidade. Sim, estariam utilizando aquela velha fórmula de dividir o outro lado?

Na primeira reunião que participaram cheguei com algum atraso e logo que aportei no quinto andar encontrei o Delegado Pedro Benedeck Bardio (Pedrão), Artur Sell e mais o Comissário Celso, todos certamente que representando o grupo de “Heitor Sché”. “Pedrão” – como era seu estilo – logo investiu de forma ácida sobre este autor:

- O Felipe está em todas, heim? Mais um plano de governo.

Olhei de forma fugaz para “Pedrão” que apresentava discretos requícios de sua ironia para com uns, mas apenas deixei escapar um sorriso. Pensei em dizer algumas verdades bem guardada, mas como sempre ocorria naquelas circunstâncias, logo percebi que era melhor esquecer antigas rusgas e, apenas, disse:

- É pelo menos eu sempre procuro  trabalhar  em propostas institucionais, não é?”.

A sala cheia e nesse cenário o Coronel Ib olha para mim e comenta com um riso indelével e solta no ar:

- Quantos Delegados, desse jeito.a sala vai estar cheia.

Se antes já estava me sentindo mal com os dois subgrupos que apoiavam o Júlio (o nosso e o do Wanderley  Redondo...), agora teríamos que conviver com um terceiro, quarto: O de Sché e mais dos Coronéis. Mas lembrei que na semana que passou tinha conversado com Júlio Teixeira relatando esse fato e ele pediu para que eu permanecesse firme e não abandonasse os trabalhos. Obviamente que sim, estaria a merecer a nossa máxima atenção e superação, além do mais pensei no nosso plano  e nos avanços que ele poderia trazer para a sociedade, para todos nós.

Dessa reunião participaram, além deste autor, também Jorge Xavier, Mário Martins (lembrei do Deputado Celestino Secco), Rubem Garcez, Wanderley Redondo, João Manoel Lipinski, Pedro Benedeck Bardio, Artur Sell, Celso (policiais civis), os Coroneis Ib, Souza, Backes (policiais militares), e um representante da Marinha. 

Já noutra cadência, invariavelmente, passei a optar mais pelo silêncio já que eram tanto os “continentes” presentes.

E se não bastasse, na semana seguinte, o Cel Backes informou que também o Delegado Ademir Serafim passaria a se integrar ao grupo a pedido do Deputado Federal João Pizolatti. “Sem comentários”, pensei (naquela altura já passava a ter sérias dúvidas sobre o futuro do nosso plano e que realmente só o tempo poderia esclarecer que lugar ele (e os personagens ali presentes teriam na nossa história...).

No dia 02.09.98, às 08:00 horas da manhã

Fui até o quarto andar da Delegacia-Geral (Av. Osmar Cunha) entregar o relatório da comissão que presidia e era responsável pelos estudos históricos acerca da Polícia Civil. Havia solicitado por meio de requerimento no ano passado que a Secretária de Segurança deixasse que eu me dedicasse exclusivamente a esse trabalho, mas a insensibilidade era tamanha e as reações de interesse político contra pareciam maiores. E fui surpreendido com um despacho dando o prazo de sessenta dias para que eu encaminhasse relatório dos trabalhos que desenvolvi. Realmente não esperava aquela reação da Secretária de Segurança Pública Lúcia Stefanovich que me colocou no ostracismo institucional, sem local determinado para trabalhar há meses, sem dar a mínima satisfação, tudo ao sabor de uma vindita de ordem pessoal... (depois superada, porque as pessoas perdem o poder, passam, envelhecem... e não há mal que perdure para sempre). Tinha plena convicção que essa reação se deveu mais a minha mobilidade e participação num projeto político institucional do Senador Amim, antagônico do Governador Paulo Afonso...

Eis o teor da CI que foi entregue ao Delegado Geral Jaceguay Marques Trilha, cumprindo determinação da Titular da Pasta, dentro do prazo estipulado:

ESTADO DE SANTA CATARINA

SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA

DELEGACIA GERAL DA POLÍCIA CIVIL

CI S/N COMISSÃO DE ASSUNTOS HISTÓRICOS/1998

Excelentíssimo Senhor Delegado Geral,

Dentro do prazo estipulado e para as providências que julgar necessárias, solicito a V. Exa. se digne fazer o encaminhamento dos seguintes trabalhos a Titular da Pasta:

  • Relatório relativo às atividades da comissão desde a sua criação;
  • Estatuto da Polícia Civil – Edição Histórica – 1998;
  • ‘DOPS – PARTE –I – As elites, a Ordem Política e Social e o Aparelho Repressivo em Santa Catarina (1808-1946)
  • ‘Autoridades Policiais, Brancos e Índios nas Correspondências Oficiais na Província  de Santa Catarina (1828-1891)
  • ‘O Punhal Nazista no Coração do Brasil (1943)’ – Reedição Histórica Comentada;
  • ‘O Processo de Modernização e os Desafios da Polícia Civil de Santa Catarina (1960-1998)

Florianópolis, 28 de agosto de 1998

Felipe Genovez

Presidente

Recebido  em

02.09.98

Apesar dessas reações, continuamos a trabalhar ainda mais por nossos objetivos, sem se apequenar e no enfrentamento de nossos desafios, muito embora sem saber onde poderíamos chegar.