Data: 20.10.98, horário: 16:40 horas, “As Coisas e o Cotidiano”:

“Horário: 18:45 horas, “Guarda-chuva velho: Gaviões”:

Na Delegacia-Geral passei por Walter no balcão na recepção:

  • E aí Walter como é que está o “guarda-chuva velho”?

Enquanto me dirigia à sala do café, ouvi uma risada aberta, dando a impressão que a minha “invocação” foi hilariante. Já de saída, como não poderia deixar de ser, Walter me deteve para uma daquelas conversas rápidas que  obrigou uma demora, tipo de quem pretendia amainar a curiosidade:

  • Ô Genovez é verdade que o Governo do PMDB deu duas vez a isonomia para os Delegados?
  • Não. A primeira vez sim. Foi no governo de Pedro Ivo Campos, por meio da Lei 7.720 de 1989. Justiça seja feita, foi graças aquele grande governador - Pedro Ivo que nós Delegados tivemos a isonomia, só que no início do Governo Kleinubing esse direito constitucional foi revogado. Só que nessa segunda vez agora a decisão foi do Poder Judiciário. Na verdade, o que ocorreu foi que o governo tentou de todas as maneiras derrubar essa decisão judicial, como você sabe eu leio o Diário de Justiça, qualquer um que lê pôde acompanhar recursos especial, extraordinário  e que no nosso caso foram indeferidos pela própria Justiça. Além disso o governo mandou Procuradores a Brasília para derrubar essa liminar no Superior Tribunal de Justiça, e graças ao Luiz Darci e a Adpesc se  conseguiu detectar a tempo essa manobra. Veja bem Walter, o problema é que decisão judicial não se discute, se cumpre! Mas neste governo as coisas foram bem diferentes, o Mário Martins teve que se ajoelhar para a Hebe Nogara, teve que prometer apoio a sua candidatura a Deputada Estadual, foi  levantar recursos entre os Delegados para formar caixa de campanha para ela, só assim de joelhos foi que a Hebe como Secretária da Administração intercedeu em nosso favor, isso depois de meses, para que o governo cumprisse a liminar da Justiça.
  • Eu não sabia disso.
  • Sim. Mas essas verdades ninguém diz, ficam todos quietos e ainda tem gente querendo faturar em cima da isonomia, dizendo que se o governo não quisesse não precisaria cumprir a decisão. No governo passado não havia qualquer decisão da Justiça e fizeram o diabo, greves, até declararam o governo Kleinubing e Pacheco “personas non gratas”. Então, Walter,  dizer que essa segunda vez foi graças ao PMDB é passar um atestado de “burrice”, e se for comigo eu digo na lata: “cai fora gavião”. Veja a Lúcia, o Lourival, eles viviam dizendo por aí que iriam restaurar a isonomia com o Ministério Público, não sei se tu ouviste isso, e o que eles conseguiram? É para isso que eu leio, mas a maioria do nosso pessoal nem tem tempo para isso, não querem saber das coisas, e não se interessam, eles estão cheios de serviços nas Delegacias e a verdade é escondida, não há assembleias, nada, só quando há boas notícias. Não vê a revogação do artigo duzentos e quarenta e um da Constituição Federal, o que fizeram? Ninguém sabe de nada e isso é varrido para baixo do tapete, ficam todos quietos. Mas  comigo não tem essa, por isso que quem sai falando bobagens por aí sem conhecimento de causa, não tem coragem de dizer uma coisas dessas para mim. porque na lata eu vou dizer: “cai fora gavião...”!
  • E tu achas que isso pode ser ainda derrubado?
  • Olha Walter o Supremo Tribunal Federal é político, se o Fernando Henrique quiser até você acaba sendo nomeado Ministro, contanto que assuma compromissos de julgar com o governo, a partir daí você vai usar toga, já pensou você como uma capa vermelha de cardeal, peito estufado, olhar distante numa poltrona, denotando grandes meditações e pensamentos, parecendo muito ocupado, saber jurídico...?

(...)”.

E saí dali pensando no termo que arranjei para designar policiais imaginários: “Os Gaviões” e na figura com capa de cardeal (não preta) promovendo aquele personagem a “Ministro”. Na verdade, eles estavam por toda parte, mas têm uma capacidade muito grande de mudar de cor e serem altamente deletérios e julgadores... Mudam de cor conforme o ambiente e o tamanho de suas “barrigas”, em cujo estado os matizes dos ambientes se alternam facilmente. É claro que tem aqueles que ficam sorumbáticos pelos cantos e passam a condição de errantes, verdadeiros profetas da moralização e da execração de seus pares pela via intestinal.

Horário: 19:30 horas, “O Perigo da Polícia”:

Li na Folha de São Paulo um artigo que novamente colocou em evidência o nosso “Plano” para mudar o modelo de Polícia  e os desafios do futuro Governo Amin:

"O Perigo da Polícia

Mais um relatório da Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo indica que o padrão de comportamento dos policiais paulistas ainda está longe do aceitável, apesar da política de direitos do governo estadual. De janeiro a setembro de 98, as denúncias de homicídios praticados pela polícia aumentaram 278% em  relação ao igual período de 97. Violência policial e aumento da criminalidade são problemas imbricados. À medida que crescem os crimes e a insegurança, cobra-se uma ação policial mais efetiva. Com isso, há mais chances de confrontos que redundam em mortes tanto de cidadãos como de policiais.

Continuar privilegiando um policiamento repressivo ou investir em ação preventiva seria a questão central. A repressão com o policiamento ancorado em blitz se esgotou. Confere uma sensação de segurança, mas de eficácia passageira. A prevenção mais ampla dos crimes, porém, esbarra em deficiências estruturais da corporação. A polícia responsável pela investigação, por exemplo, dispõe de veículos idênticos aos do policiamento ostensivo, o que dificulta seu trabalho. A PM, por sua vez, segue um código disciplinar anacrônico, que descura da conduta de policiais nas ruas. Uma política de prevenção requer, pois, uma relação estreita da polícia com a comunidade, mais informada por novos valores.

Os sucessivos relatórios da Ouvidoria dão ainda o alarme para um problema negligenciado pelas autoridades. A esmagadora maioria dos policiais que morre em confrontos estava de folga, realizando trabalhos extras para complementar seus salários. De  1991 a maio desse ano, estima-se  a morte de 332 policiais que faziam ‘bico’, contra 96 que estavam a serviço da corporação.

Uma polícia eficaz no combate ao crime requer mudanças estruturais da corporação, além de uma orientação preventiva e menos repressiva, quase sinônimo de violência’.

(Folha de São Paulo, Opinião, 1-2, de 20.10.98)