Data: 20.10.98, horário: 09:50 horas, “Loro, Lorices, Redondices e Braguices”:

Neste exato momento cheguei na sede da Associação dos Delegados de Policia do Estado de Santa Catarina para um encontro agendado com o Presidente Delegado Mário Martins. Logo me dirigi até o seu gabinete e ele  estava sozinho conversando ao telefone. Ouvi parte da conversa:

“(...)

  • “...A comissão, mas que comissão? Mas nem foi escolhido ainda o Secretário de Segurança, de mais a mais o interlocutor é o Celestino...” (Mário)

(...)

  • “Mas onde é que já se viu, o Braga, o que o Braga está querendo? Tem que correr com esse cara daí, onde já se viu, mas que barbaridade. Ele o Wanderley não tem nada de querer informações...” (Mário)

(...)

  • “Ô, ô Braga? O  que é isso? Não. Não! Tem que correr com ele daí, não tem que dar nada para eles”.

(...)

Olhei para Mário e por mímica apontei o dedo indicador da mão direita para meu peito querendo fazendo sinal que também estava incluído naquela comissão a que ele estava se referindo na conversa com o interlocutor do outro lado da linha (até estão desconhecido).

(...)”.

Depois que Mário desligou o aparelho perguntei-lhe:

  • Aposto que era o Thomé.
  • Não. Não! Era o Lourival, mas tu já imaginou, o Braga e o Wanderley querem uma audiência para pedir informações, não vai dizer que tu estais nessa também?
  • Sim. Claro que estou, não sei por quê o Lorival não citou o meu nome?
  • Vai ver já estão te boicotando.
  • Tudo é possível. Esquisito, mas deixa para lá.
  • Não te avisaram nada?
  • Sim. Até acho bom tu participares das reuniões com o Backes, não só pela tua condição de membro do PSDB, mas também na condição de presidente da nossa entidade de classe. Ontem nós nos reunimos lá na sede.
  • Tu falas lá no comitê de campanha?
  • Sim. Lá mesmo. Estava além do Backes todo aquele pessoal que tu já conheces e o Jorge. Em determinado momento se entendeu que deveria ser formada uma comissão integrada por três membros.
  • Entendo.
  • Mas eu logo vi que isso não iria dar certo, bem que o Backes previu isso. Evidente que a  Lúcia não vai dar informações assim. Chega lá três Delegados que querem obter informações e ela simplesmente manda abrir as portas sem qualquer documento oficial, isso numa transição de governo...
  • Ah sim Felipe, o encaminhamento deve ser político,  por meio do Celestino Secco. Para isso foi indicado o Cesar Barros Pinto.
  • É verdade, acho também que esse é o encaminhamento correto.

(Lembrei aquela conversa que eu e Jorge Xavier tivemos com o Backes, em cujo momento havia previsto o que estava ocorrendo, ou seja, sem credenciais não poderia haver diálogo, nem seria recomendável em se tratando daquelas circunstâncias, dos choques entre dois governos...)

“O Pé Frio”:

E continuando a conversa:

  • Mas Mário como tu és pé frio em prognósticos políticos, heim?
  • Por quê? (Mário)
  • Olha, tu não te lembras o que me dissestes aqui, neste mesmo lugar, sentado nesta mesma cadeira?  (Felipe)
  • O quê que eu disse?
  • Primeiro disseste que o Heitor não iria se eleger, que ele era um homem de doze a quinze mil votos, não tinha a menor chance e olha no que deu? O Heitor fez quase trinta mil votos, depois disseste que o Tiscoski também não iria chegar...
  • É realmente eu sou pé frio em política. O Heitor foi uma ingrata surpresa e a decepção foi o Júlio que acabou sendo o grande derrotado. Você vê,  Felipe, o Heitor conseguiu fazer vinte oito mil votos além dos doze previstos, não , deixa eu ver...
  • Tu estais falando dezoito mil?
  • Sim. Isso. Dezoito mil votos e como é que ele conseguiu isso? Os Delegados não  trabalharam para o Heitor não, isso aí foram os próprios policiais civis que em vez de ajudar o Júlio traíram a Fecapoc e votaram no Heitor.
  • Tu queres dizer que a Fecapoc tinha publicamente declarado apoio ao Júlio?
  • Exatamente. Então tu vê, se o Heitor iria gastar uns cem mil reais para não se eleger, olha  o que ele fez?  Vou gastar quatrocentos mil e seja lá o que for, e assim ele conseguiu toda essa votação, foi um trabalho frente à frente.
  • É, e tem mais o Heitor começou a campanha dele em agosto do ano passado e o Júlio andava onde nessa época? Andava envolvido até o pescoço com o episódio das letras lá na Assembleia...

(...)

“O Céu e o Inferno”:

  • Por isso Felipe que eu digo que o Heitor foi uma ingrata surpresa e ninguém sabe como é que vai ficar a situação com esse homem. Com ele vem novamente todo aquele pessoal antigo. (Mário)
  • Eu sei. Andaram até dizendo, eu particularmente não acredito, acho que foi o próprio Braga que disse, não tenho certeza, que o Heitor teria convidado o Sell para ser Diretor da Academia de Polícia.
  • Sim senhor é verdade.
  • É mesmo? Foi por isso então que na reunião de ontem, quando o Jorge indicou o meu nome, do Braga e do Redondo para integrar a comissão, ele fez questão de dizer que os inativos deveriam ficar de fora, inclusive, ele próprio. Em seguida o Sell discordou e disse que para ele não tinha nada disso,  para ele tanto fazia ser  ativo, inativo, especial ou não.
  • Pois é Felipe, por aí você vê que perigo que nós corremos, o projeto do Heitor ainda é colocar um Delegado inativo em cada Regional, e não é segredo porque o próprio Maurício disse isso para mim na presença de outras pessoas que se o Heitor vier a ser o Secretário de Segurança ele será o Delegado-Geral, então você vê, não tem nada de hierarquia.

(...)

“O Bonde da História

  • Realmente, assim, fica difícil, mas um dos grandes problemas desta administração atual foi que ficaram no início criticando as leis complementares cinquenta e cinco e a noventa e três, depois perderam o discurso e se esqueceram do nosso projeto de lei orgânica. (Felipe)
  • Tu falas do projeto de lei orgânica nacional?
  • Não. Eu falo é da nossa lei orgânica estadual. Foi uma luta colocar na Constituição do Estado disposição prevendo que a Polícia Civil terá uma Lei Orgânica, conseguimos isso na época do Bado, por meio do relator da Constituinte, dos Deputados Sidney Pacheco e  Neuzildo Fernandes. E,  logo que o pessoal assumiu em 1995 eu entreguei para o Thomé alguns estudos preliminares de um anteprojeto e não deu em nada. Agora  está ai a instituição totalmente vulnerável, sem uma lei de impacto, colocam Delegados inativos em cargos onde deveriam estar somente os ativos,  o Secretário de Segurança pode ser qualquer cidadão, perderam o “bonde da história”, preocuparam-se em fazer política e construir prédios e esqueceram o essencial...
  • É verdade.
  • Mário,  você que viaja pelo Brasil e eu que já passei pela Presidência da Fecapoc e viajei por vários Estados, se compulsares a legislação que nós conquistamos aqui em Santa Catarina com a de outras unidades vais constatar que estamos muito na frente, temos estatuto próprio, leis extravagantes importantes como a cinquenta e cinco e a especial de promoções, enquanto outros Estados os policiais continuam regidos por estatuto geral dos servidores públicos, os Delegados não tem prerrogativas, não existe sistema de entrâncias...
  • É, realmente, a maioria é regida por estatuto geral.
  • Então, por aí você tira que nós estamos dentre os melhores, como São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.

(...)

“Heitor Senador – 2002”?

  • O Maurício já saiu com a última aí que é:  Heitor Senador em 2002. (Mário)
  • Eu não sabia disso.
  • Sim senhor, mas como eu te disse, o Júlio é culpado disso tudo, não poderia ter deixado acontecer isso. E, você vê uma coisa Felipe, se o Júlio tivesse sido eleito é certo que ele não seria o Secretário, ele colocaria uma pessoa dele e ficaria na Assembleia, isso para nós seria muito importante,  e tu sabes que o Júlio sem mandato não significa nada, não apita nada.
  • O trabalho do Júlio parece que tem sido o de obstaculizar a pretensão do Heitor de ser Secretário.
  • É, e tem ainda o João Rosa, essa é a nossa sorte, temos dois deputados na Assembleia.
  • E o João Rosa como é que está, será que ele tem alguma pretensão?
  • Olha Felipe eu acho que não.
  • Tem que ver a posição do João Rosa e do Pacheco nesse contexto, mas agora eu me lembrei também, disseste que a Hebe Nogara estava eleita, e daí?
  • Mas ela estava,  eu te falei,  o problema da Hebe foi que o Prefeito de São Bento, dois meses antes das eleições, majorou o IPTU da cidade em...
  • Tu disseste duzentos e vinte por cento?
  • Não. Cento e vinte por cento, o dobro, e isso representou menos cerca de quatro mil e quinhentos votos só na cidade.
  • Ela fez treze mil votos?
  • Não. Foram mais de quinze mil.
  • Foi bastante, e a região dela era Rio Negrinho, São Bento, Campo Alegre... Então Felipe o caso da Hebe foi diferente.
  • E como está a Adpesc?
  • Estamos com uma assembleia aí, estou envolvido agora com a construção da sede, mas a situação está difícil, esse mês nem temos arrecadação, o Tesouro não vai repassar nada. Estamos envolvidos também com essa questão do teto salarial, estão fixando o valor e nós temos que saber como é que fica, se vai ser subsídios e aí nós temos aquela nossa ação que está em grau de recurso no Supremo. Como tu sabes não existe mais a isonomia, então nós vamos propor um acordo com o Governo, tu sabes que este é um bom momento para nós e a proposta é nós abrirmos mão dos nossos atrasados que são bastante significativos e o governo abre mão de todos os recursos que interpôs na nossa ação, como o Paraná fez e se não há recurso a isonomia está assegurada, pois não tem como o Supremo dar contra.
  • Olha Mário eu sou contra abrir mão dos nossos  atrasados, acho que uma coisa não tem nada a ver com outra, não sei se tu lembra da Lei sete setecentos e vinte de oitenta e nove? Quando o Kleinubing assumiu o governo simplesmente revogou essa nossa lei em noventa e um,, então quem é que garante que amanhã o governo também não vai revogar essa legislação?
  • Não Felipe! Não podemos ir por esse caminho, você há de considerar que teremos dois deputados na Assembleia na próxima legislatura e ficará muito difícil se revogar esses direitos.
  • Tudo bem! Tudo bem concordo, realmente acho que se o governo assegurar a isonomia plena não tem por que não abrir mão dos atrasados, eu ainda não li a Emenda Constitucional Dezenove de Noventa e Oito, tu já vistes?
  • Sim.
  • Ela é de maio, não?
  • Não. É de junho!
  • Certo. “Parece” que ela revogou o artigo duzentos e quarenta e um da Constituição Federal, é verdade?
  • Sim. A redação do desse artigo é outra, aquela não existe mais, com isso a nossa isonomia na Carta Federal foi para o espaço, agora existe ainda o artigo cento e noventa e seis da nossa Constituição Estadual que está em vigor, e a nossa isonomia também advém daí.
  • Pois é, mais isso não significa que amanhã não possa ser revogado também, além do mais pode ser invocado a máxima que isonomia não gera direito adquirido e aí como é que fica?
  • Não Felipe uma coisa que me preocupa é se a isonomia é paga enquanto durar a vigência da Lei e o outra é sobre direito real..., não é? O que tu achas disso?
  • Eu entendo que a fonte do direito é a lei... uma vez criado o direito ele está em vigor...
  • Não posso concordar com isso... pois se assim o fosse... o direito só teria vigência enquanto a lei estivesse em vigor...cessada a sua vigência... só se teria direito as parcelas atrasadas...

(...)

E nisso telefonou o Delegado Celso (Roque dos Santos? Achei que só poderia ser ele para saber de dinheiro...) querendo saber informações sobre o salário. Mário informou sobre a Assembleia que haveria em novembro próximo, também, esclareceu sobre a pretensão em se fazer um acordo com o governo e, depois, comentou,  ainda, sobre a situação dos salários, afirmando que naquele mês de outubro o governo não pagaria mais nada, além do que já havia pago (décimo terceiro). No mês de novembro ele deveria pagar setembro e assim por diante.

Mais a seguir telefonou o Décio (logo imaginei que só poderia ser o Garrozzi de Blumenau, só pode ser ele...). Mário reiterou as mesmas informações repassadas ao Delegado Celso Roque...

E em seguida entrou no gabinete do Presidente o Delegado Wilmar Domingues:

  • Como é que estão os doutores? (Wilmar)

Na sequência, Wilmar lançou uma pergunta para Mário Martins se ele já havia conversado com o Delegado Lourival Mattos acerca da situação de seu filho que era Delegado Substituto e havia sido removido para Blumenau:

  • Falou com o homem lá em cima?
  • Não Wilmar, ainda não, mas acabei de falar com ele,  o Felipe estava aqui e acabei falando sobre outras coisas e não falei sobre o teu caso, acabei esquecendo.
  • Não tem problema, fala outra hora.
  • Não vou ligar agora.

Enquanto Mário fazia a ligação para Lourival, Wilmar veio até próximo do meu ouvido e comentou:

  • Como é que pode, o meu filho já é Delegado há dois anos e mandaram daqui para Blumenau, e só neste último concurso colocaram cinco delegados substitutos aqui na Capital, é dois pesos e duas medidas.
  • É realmente assim é difícil.
  • Eu já lhe mostrei aquele depoimento do Sala a respeito do caso que ele teve como o meu filho?
  • Não!
  • No depoimento o Sala reconhece que perdeu as estribeiras com o meu filho, mas...

(...)

Como esse assunto era de interesse pessoal não me despertava interesse, não por conta do Wilmar, muito pelo contrário, procurei desviar a atenção, quando  ouvi Mário Martins conversando com Lourival intercedendo para que desse uma força para o filho de Wilmar. Percebia-se claramente que do outro lado da linha Lourival estava intransigente, deveria ter falado mais coisas sem se dar conta da presença de Wilmar. Mário só ouvia de dizia “ahan, ahan, ahan!!!”.. Depois de desligar o telefone:

  • Olha Wilmar está difícil. (Mário)
  • Tá difícil é, eu já sabia, só fiz isso para testar.

(...)

Antes de retornar a conversa com Mário Martins, dei a cinco reais de um total de dez que estava devendo para Wilmar por ocasião da nossa festa, tendo ele retrucado em tom de brincadeira que iria cobrar juros, e, disse-lhe, ainda:

  • Olha Wilmar ontem nós tivemos uma reunião lá no comitê, era sobre a transição de governo, eu iria te convidar, o nosso pessoal foi lá, estava  também o pessoal do Heitor, mas já que tu nunca tinhas participado de nenhuma reunião achei que fosse melhor te poupar. E, considerando que teu filho trabalhou para o Heitor você ficaria melhor na condição de um coringa, assim você não se desgasta, não sei se tem algum problema isso para ti?
  • Não. Em absoluto. Eu prefiro não participar.

(...)

“Alcino: Dois Pesos e Várias Medidas”:

  • Foi o que eu também achei...Mas Wilmar viste o que fizeram com o Alcino?
  • Não sei?
  • Foi demitido agora, dia sete último.
  • O quê?
  • Ele tinha vinte oito anos de polícia e mandaram embora com uma mão na frente e outra atrás, é aquilo que tu disseste em relação ao teu filho, dois pesos e duas medidas. No caso do G. deram um tratamento privilegiado, apesar de ser um caso bem mais grave. Não tenho nada contra o G., o  que estou dizendo é que poderiam ter dado uma oportunidade para o coitado do Alcino também, mas não era compadre da Secretária, né!
  • Eu nem questiono o caso do G., mas claro que poderia ter sido dado uma oportunidade.
  • Imagina agora a situação dele, com uma mão na frente e outra trás?
  • É, mais se tu falares com o Vieira lá na Corregedoria tu vais ver que ele tem um dossiê com uma série de casos tão graves ou mais até que não fizeram nada, fala com o Vieira para ti ver quantos policiais foram protegidos...

(...)

“Wilmar à Moda Antiga?”

E logo que Wilmar deixou a sala. Mário se dirigiu para mim e demonstrando um certo alívio porque aquela “ponte” que estava fazendo acerca da remoção de seu filho era muito desgastante. E fez o seguinte comentário:

  • Agora você vê Felipe, o Wilmar andou perseguindo o Sala por causa daquele episódio envolvendo o filho dele, chegou a descobrir onde o Sala jogava a “canastrinha” dele, ficava fazendo campana de carro e armado,  se isso é coisa que se faça, é um policial à moda antiga.

(...)

E em razão disso fiquei imaginando o que Lourival teria dito para Mário Martins, mas como se tratava de um outro personagem bastante controvertido, optei pelo silêncio, até porque sempre defendi a unidade da Polícia e a união de todos os Delegados, apesar das “encrencas” internas.

“Alcino: 'Patinho Feio'”:

 E depois que Wilmar deixou a sala, reiniciei a conversa com Mário:

  • Mas Mário eu estou com o Alcino aí fora me esperando, vistes o que fizeram com ele?
  • Pois é, mas Felipe você é uma pessoa que trabalha honestamente,  cumpre as tuas obrigações, eu faço a mesma coisa aqui,  estou produzindo..., nós não podemos admitir que existam pessoas que simplesmente não queiram trabalhar.
  • Concordo, é um belo discurso, mas isso é outra coisa, eu estou falando de se dar tratamento igual aos desiguais, entende?

(...)

“Delegado ‘Pedrão’ 'Vivo e em Cores'”:

E nisso chegou “Pedrão” com aquele seu jeito meio esbaforido, pesado, rosto inchado, sempre com aquele seu jeito parecendo “mal humorado”... Não dava nem para acreditar, inrrompeu à dentro, com aquela sua voz tartamuda e rouca, quase pronunciadas na garganta, como a última depois de uma  manhã carregada:

  • Vocês sabem da última, o Genovez vai ser o Delegado-Geral, então doutor  Genovez o Senhor vai ser o Delegado-Geral, parabéns!
  • O que é isso “Pedrão”?
  • É sim, é o que andam dizendo por aí, que você vai ser o Delegado-Geral!
  • Não é verdade, “Pedrão” eu não tenho essa ambição.
  • Vai ser sim!
  • Só se for você!
  • Não senhor, dizem que você já é o Delegado-Geral, o Júlio vai ser o Secretário.
  • Não é verdade que o Júlio vai ser o Secretário.

(...)

“Jorge Cesar Bornhausen e Jorge Konder Xavier, segundo o nosso ‘Platão’ mais Tupiniquim”:

E nisso “Pedrão” com acidez e um “discurso” antifilosófico se volta para Mário Martins:

  • Mário já desse parabéns para o Genovez, ele vai ser o próximo Delegado-Geral.
  • Que é isso “Pedrão”, não faz isso, não queima ele assim! (Mário)
  • Olha só o “Pedrão” tu com essa agora,  o que tu queres, heim? (Felipe)
  • Vocês não estavam lá ontem, o Jorge bateu na mesa,  ele disse... (Pedrão)
  • Quê?.O Jorge...? Tu estais falando do Jorge Bornhausen por acaso? (Felipe)
  • Não. O Jorge Xavier!
  • Coitado do Jorge Xavier, ainda se fosse o Bornhausen até vá lá. (Felipe)
  • Vai ver que ele trocou de nome. (Mário)
  • Não! É o Xavier! Não é o Bornhausem, o Júlio vai ser o Secretário e o Genovez já é o novo Delegado-Geral. (Pedrão)
  • “Pedrão” deixa de falar besteira! Ainda se fosse o outro, até tudo bem,  se ele batesse na mesa por mim, mas trocasses os sobrenomes.(Felipe)
  • “Pedrão” não fica falando isso aí que tu sabes que é mentira. (Mário)

“Um Caso de Amor”:

E depois desse duelo “Pedrão” tomou a direção da porta dizendo que iria ler os jornais, porém, antes soltou mais uma de suas provocações:

  • Eu só quero pedir uma coisa, olha só uma coisa heim,  me deixa próximo,  próximo!
  • Já sei Pedrão, já sei, nem precisa falar, tu queres é ficar próximo do meu coração, é isso! (Felipe)
  • O quê? Não! Eu quero o Thomé próximo de mim.

“Lógica Política na Hora Certa e no Lugar Certo?”:

E logo que ficamos a sós na sala comentamos a postura do “Pedrão” que ficava soltando aqueles “balões” com “ironia” e que na verdade tinha como único objetivo queimar o nome de pessoas. Mário fez o seguinte comentário:

  • Olha Felipe tens que tomar cuidado.
  • Mário, sinceramente, se eu viesse a ser convidado para ser Delegado-Geral não iria aceitar por aceitar, não estou pleiteando isso, já deixei de ser em duas outras oportunidades. Mas isso não significa que eu iria radicalizar, mas faria algumas condições, uma delas seria quanto ao aproveitamento dos Delegados Especiais, acho que a coisa não pode ser assim como está,  tem que haver respeito à hierarquia.
  • Felipe eu acho que tu não deves colocar as coisas nesses termos, tens que tomar cuidado, se falares assim vais te queimar. Se perguntarem se você será deves dizer que aceitas e que isso é muito bom, depois aí sim tu implementas as coisas conforme for possível, não deves te expor, tu és uma pessoa muito boa.
  • É, realmente é nesses termos, só que não vou fugir aos meus princípios éticos.
  • Cuidado!

(...)

“Ainda, o Caso Alcino”: 

  • Mas, com relação ao Alcino, coitado. (Felipe)
  • Eu te aconselho a mandar ele procurar um advogado, não te envolve.
  • Entendi, tu queres dizer para não queimar o meu filme.
  • É isso!

E, em seguida deixei Mário Martins e fui ao encontro do ex-Delegado Alcino que estava sentado ao fundo numa mesa rascunhando um papel:

  • Olha Alcino eu já falei com o doutor Edson para fazer o teu pedido de reconsideração, infelizmente eu não vou poder fazer, mas já falei com ele,  tu dá uma chegadinha lá no escritório que ele vai providenciar.
  • Eu já rascunhei alguma coisa aqui, não queres dar uma olhada.
  • Tudo bem.

Depois de ler suas anotações, dei a seguinte orientação:

  • Olha Alcino eu estou indo, não te esquece de dar uma chegada lá no doutor  Edson, e que Deus te acompanhe.
  • Está bom, obrigado.

E ao passar por “Pedrão” que estava ao lado lendo jornais:

  • Pois é Genovez então você vai ser o futuro Delegado-Geral! (um sorriso irônico)
  • “Pedrão”, eu já te disse que não tenho essa ambição e estou bem com o Júlio que é meu amigo há mais de vinte anos, nunca escondi isso de ninguém e que votei nele, assim como meu pai votou no Heitor Sché que teve, inclusive, votos na minha família.

Já era quase onze horas e Alcino veio comigo e reiterei para que ele mais fosse o advogado indicado  e que aquele assunto não deveria ser mais tratado ali na Associação dos Delegados. Ele e fiquei de revisar o texto final, aguardando o seu telefonema no final da tarde.

Depois que fui caminhando até a Delegacia-Geral fiquei revendo mentalmente aquelas provocações e ironias de “Pedrão”. Já estava acostumado a assistir seu “veneno” dirigido a minha pessoa quando nos encontrávamos. Na verdade os problemas entre nós remontavam ao ano de 1985 quando fui Delegado na 3ª DP de Blumenau e ele era o Chefe de Polícia. Naquela época passei a investigar golpes que estavam sendo praticados por pessoas que se identificavam como policiais civis e “visitavam” empresários e comerciantes daquela região. O golpe consistia em telefonar para empresários e comerciantes daquela  região  com o objetivo de vender espaços de publicidade em “revistas policiais” (“Vanguarda Policial”), cujos recursos deveriam ser destinados a campanhas que a Polícia Civil estava realizando para combate às drogas nas escolas, compras de viaturas... Em troca disso a vítima teria assegurado facilidades na renovação de sua CNH, receberia um título de amigo da "PC" e, também, seria favorecida noutros serviços prestados (uma das vítimas dessess golpistas foi o proprietário da "Fábrica de Chocolates Saturno” porque preparamos um flagrante para os criminosos e eu fiquei diretamente envolvido nessa ocorrência...). As investigações eram sigilosas e por experiência e cautela, havia selecionado alguns policiais (eu estava sempre à frente dos trabalhos...). O fato é como ainda era novo na cidade (estava há cerca de uns seis ou sete meses) e quando as investigaões passaram a virar burburinho chegou a conhecimento de meus superiores (além  do "vazamento" de informações havia a suspeita do meu telefone na repartição estar grampeado porque já estava bastante visado por colegas e superiores em razão de "outras investigações" que acabaram sendo abortadas ou avocadas por determinação superior...). A partir daí passei a receber pressões no sentido de que o "inquérito" dessa investigação estaria sendo avocado (só que ainda não existia autos instaurados porque já previa esse desfecho...). No curso dos trabalhos (especificamente, no caso da "Chocolate Saturno), consegui junto a “Telesc” (havia uma superamiga que trabalhava na Empresa de Telecomunicações de Santa Catarina - Cilene Meirelles, mãe da "Clarinha") que me conseguiu levantar sigilosamente a identificação do número do telefone que os “policiais” usavam para praticar golpes nas vítimas (era sempre o mesmo número). Para minha surpresa descobri o endereço e cheguei ao  “telefone vermelho” - que por ironia do destino - estava localizado numa "mesinha" bem atrás da poltrona do Chefe de Polícia (todos conheciam aquele aparelho que causava curiosidade e era tido como "misterioso"). Fui chamado a Florianópolis com “urgência urgentíssima” e depois de um embate com um misto de homérico-tupiniquim (o Superintendente da Políca Civil, com as portas fechadas do seu gabinete, vociferava com os dois braços erguidos: "o que você está fazendo comigo? Você quer destruir a minha viida, é isso que você quer, é isso que você quer, é isso...?”. Com muita calma, abri minha pasta de couro (que minha mãe havia me dado de presente de aniversário), como ela tinha segredo de números dos dois lados, me demorei uns segundos para realizar essa operação e essa minha atitude causou suspense, os olhos permaneceram estáticos no meu movimento... Em seguida passei a relatar sucintamente as investigações que ainda estavam no seu início(eram muitos golpes só em Blumenau...), apresentei cópia de documentos comprovando as minhas afirmações e, com dedo em riste, vaticinei: "...Tá vendo aquele telefone ali! O senhor deixa a porta do seu gabinete aberta  e é possível que policiais corruptos entrem aqui sem sua autorização, aplicam esses golpes. Eles usam o seu gabinete, ligam daquele seu telefone vermelho bem ali, ó! Está aqui a prova disso, o documento que consegui na Telesc...". "Pedrão" bastante nervoso, agitado e aos gritos, fazendo movimentos rápidos de um lado para outro, quase que expulsou o Delegado Lênio Fortkamp quando este tentou entrar no seu gabinete para tratar de algum assunto: "Saí daqui Lênio, saí daqui, agora ninguém entra aqui, é só eu e o Genovez!". Para minha surpresa, no acalorado dos fatos, tomei conhecimento que a partir daquele momento estava removido de Blumenau, proibido de realizar investigaões ou assinar qualquer documento, e que só teria autorização para apanhar meus pertences. Saí do gabinete do Chefe de Polícia bastante preocupado e com um gosto amargo de "fel". "Pedrão" foi ainda até a porta e gritou chamando pelo Delegado Oscar Peixoto Sobrinho (Diretor da Polícia Civil) que estava na sala em frente. Oscar veio às pressas e "Pedrão" ordenou: "Faz a 'CI' de apresentação do Genovez , ele não é mais Delegado de Blumenau, ele está removido para a Décima 'DP' aqui da Capital, faz isso agora Oscar, ele  vai sair daqui com o 'CI' de apresentação dele!". Aguardei poucos minutos e já estava com o documento nas mãos (Oscar nada perguntou ou comentou...).  Sabia que estavam me trazendo para bem perto, só não sabia que iriam me colocar sob vigilância total e como adjunto de um colega nada ético... (daria para escrever um livro como foi a nossa relação profissional no decorrer daquele ano de 1986, tudo orientado pelo "Chefe de Polícia do Telefone Vermelho"). O cerco havia se fechado e tive que passar a tomar muitos cuidados. Apesar de passado décadas, ainda quando encontrava "Pedrão" percebia que ele ainda não havia superado aqueles tempos... (e talvez temesse que eu viesse a exercer o mesmo cargo de 'Chefe de Polícia"...). Era visível a sua alteração de humor quando me encontrava, inclusive, já “velhinho”, passava facilmente para um grau de impetinência e ácidez que chamava a atenção de todos. Consegui sobreviver!  De resto, sempre que me dirigia até o gabinete do Escrivão Osnelito (Gerente de Jogos e Diversões da Polícia Civil) para usar aquele "telefone vermelho" (peça única) recordava que se tratava do mesmo aparelho "misterioso" que era de uso exclusivo de "Pedrão" (já que todo acervo da antiga "Superintendência da polícia Civil" foi transferido em 1991 para o novo prédio que passou a sediar a "Delegacia-Geral" , localizada na Avenida Osmar Cunha - centro de Florianópolis).