Estaríamos Próximos do Fim de um Mistério?

A partir desse último contato com Júlio Teixeira tinha como certo que a participação de Wanderlei Redondo em todo esse processo era considerada estrategicamente fundamental (no entendimento dele), em que pese as diferenças existentes entre os dois subgrupos que apoiavam o mesmo candidato. E naquele momento realmente estava fazendo sentido o que o Delegado Quilante havia dito acerca da existência de um “trunfo”, coisa que até então deveria ser guardado a sete chaves. E, também, fazia sentido os policiais fieis à Wanderlei Redondo estarem fazendo plantão permanente no Gabinete do nosso parlamentar. Mas Júlio Teixeira fez questão de enfatizar a importância de seu trabalho, inclusive, no sentido de impedir que Heitor Sché viesse a ser o Secretário de Segurança, coisa que pessoalmente para mim sempre foi considerada indigesta, especialmente, depois dos resultados do pleito eleitoral. No entanto, nossos destinos estavam traçados e não seria o meu caso fugir a essa realidade, especialmente, segundo meus interesses em estar dentro de todo o processo. Se até então tinha apoiado Júlio Teixeira assim permaneceria até o fim, mesmo que não concordasse com o encaminhamento acerca de Heitor Sché que na minha avaliação poderia fazer um bom trabalho na Segurança Pública, desde que se cercasse das pessoas certas e comprometidas, em que pese possíveis choques de ordem ideológica, no nosso caso voltadas integralmente ao plano institucional e dele tendo que priorizar também seus interesses políticos. Mas a impressão era que o fim de um enigma estaria próximo de seu deslinde final, pelo menos era o que esperávamos.

Data: 19.10.98, horário: 09:55 horas, “Encontro com Backes”: 

Havia chegado à Praça Getúlio Vargas faltando cinco minutos para às dez horas e, em frente ao edifício Dona Angelina fiquei aguardando a chegada do pessoal para reunião. Em determinado momento visualizei Braga entrando no prédio e não tive dúvidas, coloquei o cartão de estacionamento no painel e fui para a reunião no andar térreo. Lá chegando, cumprimentei todos que já estavam sentados à mesa, primeiramente Braga, depois Rachadel, Redondo, Sell e, por último, Backes. Logo a seguir a reunião foi iniciada no horário estipulado. Ainda, quase no seu início chegaram pela ordem Jorge Xavier, o Cel Ib Silva, mais Krieger e Garcez.

O Coronel Backes, como já era esperado, coordenou os trabalhos sentado  numa das pontas da mesa. Inicialmente esclareceu a solicitação de Celestino Secco, na condição de coordenador da transição de governo, como representante do Senador Esperidião Amin e, em seguida:

  • ...Dentro da Polícia Militar a gente consegue tudo em termos de orçamento e lá na SSP eu não sei se há essa facilidade? (Backes)
  • Lá na SSP a gente tem que ver quem vai... (Rachadel)
  • Como é que vai ser feito isso? Quem ficaria qualificado para solicitar essas informações? (Sell)
  • Temos que ver se eles vão colocar a nossa disposição essas informações. (Backes)
  • Eu acho que ela vai se colocar a nossa disposição. (Redondo referindo a Secretária de Segurança Lúcia Stefanovich)
  • De qualquer maneira eu tenho condições de saber pelo fundo da Polícia Militar o orçamento é o mesmo. Já pedi um lançamento da arrecadação relativa aos anos de 97 e 98. Para ter uma ideia da evolução e tudo o que foi gasto... (Backes)
  • O mais importante é o fundo... (Braga)
  • E precisamos saber o que tem de dívida...(Ib)
  • Eu acho que Lúcia não dá as informações...(Backes)
  • Sim, ela dá sim... (Redondo)
  • Precisamos saber sobre a estrutura atual, viaturas... (Backes)
  • Já está sendo feito, eles já estão providenciando...(Redondo)
  • Isso é rápido...(Braga)

(...)

Em seguida Jorge Xavier sugeriu aos demais participantes da reunião que para se cumprisse aquela meta que fosse feita distribuição de tarefas por subgrupos  dentre os presentes:

  • ...Precisamos de informações necessárias sobre o funcionamento em termos de estrutura, organização para os próximos cem dias... (Backes)
  • ...Para isso precisamos da indicação de alguém para fazer esse trabalho. Eu gostaria de propor nomes de Delegados em atividade, e nisso, vejam bem senhores, eu já me excluo porque sou inativo, eu sugiro o doutor Braga, o doutor Felipe, dois Delegados Especiais e o doutor Redondo Delegado de Quarta entrância para formar uma comissão para ir solicitar a Secretária essas informações...(Jorge)
  • Aprovado por unanimidade! (Redondo)

(...)

Passado alguns instantes e após alguns comentários de que o Delegado Thomé seria a pessoa certa para prestar essas informações e de que certamente haveria um encaminhamento nesse sentido, Artur Sell fez o seguinte comentário:

  • Escuta aqui eu não vejo problema algum em ser inativo, ativo ou que não seja Especial, para haver mais equilíbrio. Por que não vão somente o Braga e o Wanderlei Redondo conversar com a Lúcia?

Nisso eu me virei para o lado e comentei com Jorge Xavier que iria indicar o nome de Krieger no meu lugar, no que ele de maneira radical discordou:

  • Não senhor é você!.

E a conversa continuou no meio desse impasse:

  • Todo mundo sabe que eu tenho diferenças com a Lúcia. Não gostaria de ir lá falar com ela, queria ficar de fora. (Braga)
  • Eu não vejo problema algum do Sell ir no lugar do Braga se esse é o caso,  viu Sell. (Felipe)
  • Na verdade eu não gostaria de ir. (Braga)
  • Mas Braga você vai lá e está acabado. (Felipe)
  • Eu fiz a indicação dos três porque o doutor Braga representa o Grupo do Heitor Sché. (Jorge)
  • Vocês me desculpem, mas eu acho que a discussão não pode girar em função de grupos, nós temos como uma preocupação comum que é trabalhar em conjunto, acho que está aprovado o nome dos três e pronto! (Rachadel)

(...)

Não havendo mais dissenso acerca dos nomes dos indicados, ficou acertado que nossa próxima reunião ficaria para próxima quinta-feira, no mesmo horário e naquele mesmo local.

“Cel Ib e ‘Zé Greg’”:  

O Coronel Ib Silva mostrou para os presentes o livro de Fernando Henrique Cardoso cujo título era “Avança Brasil” que trouxe consigo. Dentre os seus comentários permeado com certo misto de preocupação e ironia estavam considerações a respeito da Polícia Militar no Brasil. Nesse compasso chamou a nossa atenção quanto ao capítulo que tratava sobre a Polícia. Segundo Ib o livro teria sido obra do “Zé Greg” (José Gregório – Secretário de Direitos Humanos do Ministério da Justiça). Uma das abordagens desse personagem ligado a Direitos Humanos dizia respeito à questão da “truculência policial e do militarismo”. Dei uma olha rápida no conteúdo do livro e constatei que as mensagens existentes se circunscreviam mais a questões de ordem filosófica do que em termos do “peso da ação” necessária com combate a criminalidade sob a ótica da sociedade que clamava por segurança e justiça. Evidentemente, achei que as questões relacionadas a Direitos Humanos e cidadania realmente tiveram o dedo daquele jurista e que todos sabem é contra a militarização da Polícia Militar (eu também, mas não da forma que pretendiam os radicais ou filósofos plantados, isto sim, respeitando a história da instituição e preservando tudo de bom que foi construído e melhorando o que tiver que ser melhorado...).  Vendo os comentários do Coronel Ib, particularmente, achei a questão complexa e meu propósito era defender nosso “Plano” que pretendia um meio termo, ou seja, não se suprime a militarização total da Polícia Militar na base, somente no segundo grau com a criação dos cargos isolados de “Procuradores de Polícia”. Para tanto, se cria mecanismos de arrefecimento da doutrina e hierarquia militarista rígida copiada do Exército, sem se comprometer a essência, as prerrogativas e as histórias das instituições policiais, a partir da submissão completa a um comando civil único, representado pelos Procuradores de Polícia originários das carreiras policiais.

Quanto a quesrtão do respeito aos Direitos Humanos defendíamos um novo modelo policial eficiente e eficaz, essencialmente civil, com segmento militar moderno (para situações de policiamento ostensivo, suporte básico nas investigações, atuação em operações policiais de combate ao crime organizado e em situações extremas de risco à incolumidade das pessoas ou de interesse do Estado), baseado na ciência, tecnologia, inteligência e cumprindo desígnios da sociedade e sob controle do Estado, não de governos.