Data: 12.10.98, horário: 22:15 horas, “Por dentro dos últimos acontecimentos”:

Telefonei para a residência de Garcez a fim de informá-lo a respeito do almoço de amanhã:

  • Alô.
  • Alô, é da residência do doutor Rubens Garcez?
  • Sim. Um momentinho.

Depois de alguns instantes Garcez deu o ar da sua graça, antes, porém, bem lá no fundo, consegui escutar ele perguntando algo como “É o Felipe?”

  • Oi,  Felipe?
  • Oi, e daí Garcez, tudo bem?
  • Sabe o que é a Laila achou que era um rapaz que anda dando trote, por isso que ela deve ter atendido meio desconfiada.
  • Nem notei isso.
  • Mas Felipe tens acompanhado o noticiário? A gente sabe que é muito cedo ainda e depois eu não sei se tu viste a entrevista do Amin ontem à noite na RBS com aquele cabeça branca, como é mesmo o nome dele?
  • Sei, sei o Paulo Alceu.
  • Isso. Mas ele não abriu o jogo sobre o secretariado, tu viste?
  • Sim. Eu vi Garcez, inclusive gravei a entrevista, tu sabes que eu tenho um grande arquivo com documentários, quem é historiador tem que se preocupar com essas coisas, e esse momento é singular, entendesse?

“Nos jornais”:

  • Sim. Eu estava escutando. Mas eu não sei se tu viste, saiu em dois jornais, um na coluna do Urbano no Jornal “O Estado” e outra no “Diário Catarinense” de ontem, tu viste?
  • Não, espera aí, tu falastes na coluna do Urbano no jornal “O Estado”?
  • Isso, ele cita que o Júlio deve ser o futuro Secretário de Segurança e  enfatiza que é remotíssima a possibilidade do Heitor Sché vir a ser convidado. Também, ontem, sábado no Diário Catarinense consta o nome do Júlio como o provável Secretário de Segurança Pública.
  • É Garcez, as coisas agora vão se definindo, passado aquele momento da campanha...
  • Mas tu vê, o Amin ali quando estava sendo entrevistado pelo Paulo Alceu não abre o jogo, de qualquer maneira eu estou mais animado agora, a gente vê que há realmente uma possibilidade muito grande dele ocupar espaços.
  • Ah, sim, com certeza Garcez, como todo mundo sabe o Júlio tem história.
  • E ele foi muito bem votado, fez vinte quantos mil votos?
  • Vinte mil trezentos e poucos votos.

“O Olhar de Garcez”:

  • É muito voto. Mas outro dia eu fui comprar tinta ali no Estreito e adivinha quem que eu encontrei? O Wilder, filho do Wilmar Domingues, ele me cumprimentou ligeiramente e meio estranho, estava esquisito, eu estava com o meu genro e no início não estava entendendo, depois ele saiu e foi para perto do carro e sabe o que era Felipe? Eu fui olhar era porque ele estava com a camiseta do Heitor Sché., tu vê!
  • Mas isso não tem problema algum Garcez, todos nós sabíamos, talvez você não porque tu não foste a todos os nossos jantares, mas num deles o Wilmar fez questão de dizer que seu filho estava apoiando o Sché e isso não tem problema algum, você sabe Garcez que o meu pai também votou no Sché.
  • Eu sei, tu disseste.
  • Então...

“Os Baques de Heitor Sché”:

  • Mas o Heitor levou um baque muito grande com a própria votação expressiva que fez, tu vê foram vinte e nove mil e tantos votos.
  • É Garcez, foram quase trinta mil votos...
  • Ele passa a ter muito cacife político, mas escuta uma coisa, o Heitor foi o que de Amin em 1994?
  • Ele foi um dos coordenadores dele na campanha presidencial, inclusive, teve aquele episódio que saiu na revista “Isto é” de que ele estava descontente com o Amin porque só servia para deixar o paletó na cadeira, nem sei bem como foi isso.
  • Todo mundo fala isso, parece que eles se atritaram, mas por quais partidos que o Heitor passou?
  • Ele era do PDS, depois  PPB, passou para o PRN e depois veio para o PFL.
  • Pois é, mas qual o problema que ele teve com a Ângela Amin?
  • Garcez, isso foi na campanha para o governo de 1994, o Heitor estava apoiando a Ângela, mas eu não sei qual o problema que houve entre eles, e se houve esse problema comentam por aí que a Ângela não quer saber de ouvir o nome do Heitor, eu sei que foram muitos baques.

“Antes Tarde do que Nunca”:

  • Olha Felipe, disso tudo eu aprendi uma coisa, para ti até pode ser fácil, realmente a gente tem que se posicionar politicamente, tem que participar desses planos de governo. Eu sempre me abstive e com isso sempre fui preterido, acho que tem que lutar, fora do poder não se consegue nada.
  • Olha Garcez, agora você até me entende mais, é uma luta e você tem que se posicionar, lembra muito aquela questão maniqueísta, ou seja, quando você se posiciona outros se levantam contra porque quem se antagonizar da mesma forma está também buscando o poder, veja bem, se a gente não tivesse se posicionado com um plano de governo em 1991 não teríamos ocupado espaços, não teríamos conseguido quase nada em termos institucionais.
  • Isso  lembra àquela música “quem sabe faz a hora, não espera acontecer” do Geraldo Vandré e o pessoal ainda te critica dizendo que és um oportunista.
  • Olha Garcez, o Sidney Pacheco foi um Secretário muito forte e poderíamos ter feito muito mais naquele governo, mas fizemos. Outro exemplo de governo forte na área de segurança foi a própria administração de Heitor em 1982, ele era um dos Secretários mais influentes daquele governo Amin, no entanto, quando assumiu a Segurança não tinha um “projeto” e assumiu com um grupo que estava preocupado em ocupar cargos e depois desenvolver iniciativas. Disso aí o que restou foi um governo com poucos avanços institucionais, ou seja, o Estatuto nós já tínhamos, a Academia ficou na mesma, a Secretaria já existia e assim ficou o mesmo com a Superintendência, então era óbvio que institucionalmente o Heitor poderia ter feito muito mais também do que fez e a gente sabe que na verdade o que foi fundamental naquela época foi assegurar um projeto político que garantisse a sua reeleição e assim foi feito.
  • É verdade, a gente sabe disso, mas desse episódio eu aprendi que daqui para frente vou participar de todos os planos de governos, vou me posicionar, o que não pode é a gente ficar de  fora se abstendo desse processo.

“Agentes do Processo Histórico”:

  • Isso faz com que nós sejamos agentes do processo histórico, há aqueles que preferem se omitir.
  • Felipe, como nós temos colegas que não se posicionam, ficam quietos só esperando, parecem que têm medo ou não querem se expor.
  • Exatamente Garcez, você vê que nesse processo a gente tem que assumir posições, ir à luta, expor-se perante todos correndo riscos enquanto que existem aqueles que só ficam esperando a melhor hora de tirar proveitos sem se desgastarem, são os verdadeiros espertalhões que depois de passado o governo ficam dizendo que a gente ainda é oportunista, será que tudo isso não conta? Como seria bom Garcez se tivéssemos pessoas que abrissem essas portas para nós, infelizmente somos nós que temos que ir à luta e isso é muito bom,  é preciso que tenhamos sempre grupos trabalhado no sentido de ocupar espaços junto a governos, não com aquela mentalidade voltada a perseguições.
  • Isso, isso. Eu acho que é por aí...
  • Então, esses grupos estarão atuando com o objetivo de construir, pensando grande e não em assumir o poder para dele desfrutarem.
  • Mas Felipe, tu recebeste a Constituição por meio da FECAPOC?
  • Eu recebi pela ADPESC, foi encaminhada pelo Amin.

“Carreiras jurídicas?”

  • Ah, pois é, tu viste as alterações provocadas pela Emenda Constitucional dezenove de noventa e oito? Ttu vê, nós deixamos de ser carreiras jurídicas perante a Constituição Federal, o artigo duzentos e quarenta e um foi suprimido pela EC 19, outra coisa, foi a Defesa Civil, eu pensava que ela não pertencia a Polícia Militar, mas fui verificar agora, a Constituição também foi alterada, e agora pertence.
  • É, eu não li ainda a Emenda Constitucional dezenove, mas não sabia que o artigo duzentos e quarenta e um havia sido suprimido, isso foi coisa do Fernando Henrique Cardoso, do PSDB. Mas como tu sabes Garcez, há muita pobreza de espírito por parte de nossos policiais e entidades, não têm conhecimento dos problemas institucionais que nos aflige e é muito difícil como tu já sabes. Nesse caso da Emenda dezenove onde estava nossa Adpesc? Ninguém disse nada, não viram nada, não sabiam de nada e as coisas assim vêm goela abaixo.

“Titulares e Um Reserva”:

  • Mas eu queria te perguntar se o Júlio tem muito amizade com o Gilmar Knaesel?
  • Não. A amizade deles começou lá na Assembleia, mas o Gilmar é muito amigo do Geraldo, tu sabes que ele sempre ajudou politicamente. E foi por meio do Geraldo que o Jorge também fez amizade com o Gilmar, isso já nas eleições de 1994 e o Júlio a partir daí foi se integrando mais, principalmente, porque as nossas amizades são comuns.
  • Isso. Mas para nós é importante ter essa amizade com o Gilmar Knaesel.
  • Sim Garcez, tanto isso é verdadeiro que ele juntamente com o Júlio é autor do nosso “Plano” de Governo. Você sabe que o Gilmar foi o terceiro deputado mais votado nessas eleições, o primeiro foi o Paulinho Bornhausen, o segundo o Cesar Souza e depois o vem o Gilmar.
  • Pois é, o Gilmar tem cacife e peso perante o Governo e na Assembleia.

“O Convite”:

  • Mas Garcez, eu estou te telefonando é para comunicar que amanhã nós temos um almoço lá no Candeias, não é no velho é no novo.
  • Eu sei qual é...
  • Sim, é esse mesmo. E desse almoço, além do pessoal do nosso grupo, irão participar o Júlio e o Gilmar. Vai ser uma forma de nós estreitarmos mais as relações, fortalecermos o Júlio. O Gilmar, por meio da bancada do PPB,  poderá ajudar muito o Júlio neste momento, vai ser ao meio-dia. Tu vais estar lá conosco?
  • Pode deixar que estarei lá! À noite eu tenho plantão no CPP e aí não daria.
  • Não, é ao meio-dia.

“Especulações”:

  • Certo. Mas o Braga falou alguma coisa para ti sobre o cargo de Delegado-Geral?
  • Conversamos, mas ninguém por enquanto sabe nada, são só especulações.
  • É, eu procurei conversar com o Quilante outro dia, mas não consegui nada,  ele não sabe nada.
  • Mas Garcez, com relação ao Gilmar nós temos que levar em conta que nossos projetos lá na Assembleia deverão priorizar dois deputados nossos, isso se o Júlio for o Secretário, o Heitor e o João Rosa apoiarem, não podemos estar mandando projetos para o Gilmar, fica até mal para ele, o que ele pode fazer muito bem é o papel de âncora, isto é, a intermediação com a bancada do PPB. Veja bem, o Heitor e o João Rosa são dois Delegados que representam os policiais civis, o problema é que todos têm interesses políticos, inclusive, o Júlio para 2002, mas isso tem que ter acerto, de qualquer maneira o Júlio também vai querer ocupar espaços na Polícia Civil.
  • Mas Felipe, eu acho que o projeto político do Heitor não passa dessa gestão, ele já está com uma boa idade e o Júlio representa renovação, é o que nós precisamos, de renovação e ele teve uma boa votação, foram mais de vinte mil votos.
  • Eu sei, mas o Heitor pode até ir para o Tribunal de Contas ou até ter um outro encaminhamento, mas é muito difícil prever essas coisas. Mas Garcez então não te esquece de amanhã ao meio-dia, certo?
  • Pode deixar que eu vou estar lá!
  • Então está certo, eu vou ler um pouco agora.
  • Boa noite Felipe.
  • Boa noite.