DATA: 09.10.98, horário: 16:15 horas, “Em política tudo é possível”:

Wildemir Vieira me telefonou da Penitenciária de Florianópolis querendo saber quais eram as novidades. Em seguida me questionou como é que ficaria a situação dele, considerando que o Júlio Teixeira não havia sido eleito e que o pessoal da Penitenciária agora estava cobrando dele como é que o nosso candidato não havia sido eleito considerando que ele tinha garantido que isso não aconteceria, ou seja, a reeleição estava certa. Respondi para Wilder para ficasse tranquilo, pois agora o jeito era aguardar o andamento das coisas para ver como é que ficaria, mas que por enquanto não se tinha nada a fazer a não ser aguardar os acontecimentos, além do fato que havíamos perdido muito com a não reeleição do nosso candidato. Wilder reiterou preocupado que seus colegas não paravam com as cobranças, pareciam que estavam só querendo saber de seus interesses pessoais.  Wilder ainda relatou  que os Delegados Pedro Fernandes e Ewaldo Villela estiveram na Penitenciária levantando informações sobre o estabelecimento, deixando a impressão de eram eles que iriam  mandar no Sistema Penitenciário (Pedro Fernandes, ex-Diretor da Penitenciária de Curitibanos,  tinha sido visto várias vezes fazendo contato na sede do Comitê de Plano do Governo Amin na Praça Getúlio Vargas e Villela era velho conhecido no Sistema Penitenciário, inclusive, possuía tradição nessa área já que seu pai chegou a responder interinamente pela direção da Penitenciária, foi lá que Vilela teve seu primeiro emprego e chegou a trabalhar, depois foi Diretor Estadual de Administração Prisional (Deap), durante a gestão do Deputado-Coronel Sidnei Pacheco – 1991-1994 (Secretário de Segurança Pública). Argumentei que o seu apoio ao Mantelli foi muito correto nas circunstâncias em que se encontrava, porque a gratidão deveria ser levada em conta e foi justamente esse parlamentar quem segurou ele na Penitenciária. Manifestei minha opinião no sentido de que ele não devesse deixar o setor financeiro (eu havia colocado ele nesse setor na minha gestão à frente da Penitenciária, não só porque era uma pessoa de confiança, mas porque com o tempo acumularia conhecimentos técnicos, estratégico...) e fosse com a Rosa Maria Bittencourt para o Procon, já que havia essa possibilidade (Rosa, Gerente de Serviço Social era casada com o Bittencourt, presidente da Associação de Sargentos e Subtenentes do Estado e leal à Mantelli). Wilder registrou que poderia ser que Mantelli acertasse com Amin, inclusive, a mudança de partido político e com isso ficasse bem no próximo governo (em silêncio duvidei que isso fosse possível, até pelo seu posicionamento no episódio das letras, mas em política tudo é possível, até o impossível...). Mesmo assim orientei que ele não trocasse uma função eminentemente técnica por outra política e que não tinha experiência alguma no “Procon”. Finalizei afirmando que por enquanto estava tudo bem, ele foi fiel à Mantelli e também ajudou bastante o Júlio Teixeira (Wilder achou esse posicionamento ambivalente, estranho e incômodo, mas eu mesmo procurei demovê-lo dessa perturbação, considerando o fator gratidão, lealdade e a sua situação funcional que se antagonizava à lógica política, onde as amizades verdadeiras superam questões de ordem superficial, como no caso essa a que me referi anteriormente) e isso eu tinha plena convicção. Convidei Wilder para participar do encontro com Gilmar Knaesel e Júlio Teixeira previsto para a próxima semana.

Horário; 16:40 horas, “Heitor o Conciliador?” 

Na saída para a Biblioteca Pública do Estado encontrei Walter na Portaria da Delegacia Geral e como sempre fui quase barrado:

  • E daí Genovez, alguma novidade?
  • Olha, é aquilo que eu já te disse ontem, espero que o Heitor tome a iniciativa e chame Júlio para uma conversa, ambos são do mesmo partido, Delegados, da mesma região, impossível não se acertarem, a gente sabe que teve um pessoal fazendo guerrinhas nos bastidores entre os dois grupos, mas tudo isso em política e superável pelos dois caciques.
  • É verdade e ele pode assumir uma outra Secretaria, mas parece que tem alguma coisa sobre o Júlio no Jornal “O Estado” de hoje, já viste?
  • Não, mas depois vou olhar. Mas o Heitor pode ajudar muito o Júlio já que ele foi o grande vencedor, não se pode desprezar a história do Júlio e os vinte mil votos que ele fez.
  • Tem tantas Secretarias, ele pode pegar uma dessas.
  • Sim, a educação, Fazenda, Administração, inclusive, poderia ajudar muito a Segurança.
  • É, a Justiça é uma boa também?
  • E porque não? Mas o que está precisando agora é que o Heitor tome essa iniciativa, foi o grande vencedor ou até o pessoal dele pode conversar, no primeiro momento que conversar com o Heitor vou sugerir isso a ele, você sabe Walter que o Heitor melhorou muito como pessoa, não sei se a idade avançada, ele está com seus cerca de sessenta e quatro anos ou mais, experiência, tantas decepções, tudo isso acredito que o ajudou a ser uma pessoa melhor e acho que é por aí.
  • É verdade.
  • Então, bom estou de saída, um abraço!
  • É isso aí Genovez!

Horário: 18:00 horas, deu na “Coluna do Moacir Pereira”:

E fui atrás do jornal “O Estado” a fim de conferir alguma coisa e não é que tinha  realmente:

"Justiça

Novos mandados de segurança contra o concurso realizado pela Secretaria de Segurança Pública deram entrada na Vara da Fazenda Pública, denunciando irregularidades e critérios subjetivos. Estão sendo patrocinados pelos advogados Marcelo Peregrino Ferreira e Sebastião Porto. A exclusão de postulantes se deu por forma rejeitada pelo STJ: psicotécnico sem conteúdo objetivo.

Recordista

O ex-deputado Heitor Luiz Sché está retornando à Assembléia Legislativa com uma conquista inédita. Foi o único candidato que obteve votos em todos os 293 municípios de Santa Catarina. A representação política também está estadualizada. Recebeu 6 mil votos em sua base original (Rio do Sul), 8 mil votos na Grande Florianópolis e 3 mil em São Miguel d’Oeste".

(O Estado de 9.10.98, pág. 2)

E na página política do mesmo jornal:

"Candidatos tradicionais estão fora:

“(...) O deputado Júlio Teixeira (PFL) tentou a reeleição, mas ficou de fora do parlamento. Sua atuação como parlamentar foi bastante consistente. Ele foi relator do processo de impeachment do governador Paulo Afonso. Isso lhe trouxe muitos inimigos, conforme explica. ‘O ódio e a calúnia pela minha participação no processo de impeachment me prejudicaram. O Palácio fez de tudo para impedir minha eleição’. Júlio diz também que a legenda ficou muito alta e que disputou, em Rio do Sul, com outro companheiro de partido Heitor Sché. Além disso, havia outros três do PPB e um do PSDB. Ele também aponta sua estrutura modesta de campanha como um dos fatores (...)”

(O Estado de 9.10.98, pág. 3)

Horário: 18:15 horas, “Porta de Entrada e Porta de Saída”:

Retornei à Delegacia-Geral e depois de passar pela porta de entrada, encontrei novamente Walter sentado quase que escondido atrás do balcão, assistindo televisão . Mostrei a ele os artigos no jornal “O Estado” que ele havia mencionado e argumentei que tinha constatado que se admitia que nosso Julio Teixeira poderia vir a ser o Secretário, muito embora tivesse mais simpatia pelo Heitor Sché, mas essa mudança mostrava que do dia anterior para o atual talvez alguma coisa pudesse ter  ocorrido, além disso havia naquele momento um silêncio no ar, parecia que havia passado a fase de euforia e caíram na real, ninguém poderia sair por aí dizendo que iria ser o Secretário de Segurança, como se Amin tivesse que engolir isso. Na verdade tudo havia sido uma estratégia política engendrada com bastante habilidade e que criou um “oba-oba” que rendeu milhares de votos.

  • Genovez, tu tens falado com o Júlio?
  • Sim,  somos amigos há mais de vinte anos, desde o tempo de faculdade.
  • Dizem que se o Júlio vier a ser o Secretário o Rachadel é que vai ser o Delegado- Geral, está sabendo disso?
  • Não, não sei.
  • Ele é ligado ao Wanderley Redondo.
  • É, isso eu soube, o Wanderley em qualquer situação, pelo que eu sei, deve assumir algum cargo e acho que vai querer o Detran.
  • Mas não se o Heitor vier a ser.
  • Sim senhor, mesmo com o Heitor seja o Secretário, veja bem Walter, o Wanderley é uma pessoa ligada ao Esperidião e à Ângela, existem coisas que a gente não sabe, é entre eles, dizem que faz informação e sabe muita coisa, certamente que o seu nome está forte e o Amin vai determinar que ele seja aproveitado.
  • É mesmo?
  • Não tenhas dúvida disso, ele sabe muito, e é do partido, o objetivo dele talvez seja ser Secretário Adjunto, pode até ser que venha ser mesmo o Diretor do Detran.
  • Dizem que se o Júlio ganhar ele seria o DPL, qual é a graduação dele?
  • Quarta entrância.
  • Olha Walter, o Júlio foi uma pessoa que teve muita personalidade durante o processo das letras, sabes quanto dizem que ofereceram para ele?
  • Acho que uns dois milhões?
  • Falam em três, sem contar o acerto da isonomia dos Delegados na época com os Procuradores, lembra? Então veja bem, se isso for verdade, olha que postura ele teve na Assembleia, recusou acertos e ficou contra os próprios colegas Delegados, já o Mantelli acertou com o governo aquele cinquenta e poucos por cento na época.
  • É, ele é uma pessoa séria.
  • E tem outra, sabes quanto que o Júlio gastou na campanha dele? Trinta mil reais, foi uma campanha pobre.
  • É, dizem que o Heitor hipotecou a casa dele por cem mil, mas não fez isso não, se ele fizesse ficaria sem casa, é único bem que ele tem.
  • Eu não sei, mas Walter eu ouvi mesmo falarem que ele teria hipotecado a casa dele para levantar recursos para campanha, era uma questão de honra a eleição dele.
  • Parece que não, olha Genovez eu não me importo se o Secretário vai ser o Júlio ou o Heitor, para mim qualquer um deles serve, o que eu quero é que corram com esse pessoal daqui.

“A figura”:

Interrompi a conversa com Walter para atender outro “figuraço” e grande amigo, Jorge Xavier ao telefone:

  • Alô, Felipe., sou eu Jorge, tudo bem?
  • Tudo bem Jorge.
  • Tu estais aonde,  estais em trânsito?
  • Não. Estou aqui na Delegacia-Geral, queres que eu te telefone?
  • Não. É rápido.
  • Se quiseres eu telefono no teu número aí?
  • Não. Não precisa.
  • Então tá.

Logo que mencionei o nome “Jorge”, Walter já pareceu mais ligado ainda:

  • Felipe, aquele jantar não dá para fazer à noite, o nosso amigo está com todos os dias comprometidos nesse horário, só ao meio-dia, o que tu achas?
  • Pode ser, acho que pode ser.
  • Mas será que o Júlio pode nesse horário, eu já tentei o celular dele, está sempre fora de área.
  • Deixa que eu tento com o Júlio.
  • Pois é, eu estou tentando naquele número, mas não consigo.
  • E para o Gilmar  tem algum problema?
  • Então, ele tem uma série de compromissos agendados.
  • Eu vou tentar também falar com o Júlio.
  • Certo!
  • Depois a gente conversa.
  • Certo!

Aproveitei essa deixa para também me despedir de Walter, deixando-o para trás por meio daquela porta,  num silêncio meio que intrigante, parecia cheio de questionamentos e eu com um leve sorriso, um pensamento efêmero como um raio: “esse Water é outra figura mesmo”. No trajeto à “sala de reuniões” fiquei pensando se realmente “Heitor Sché” naquele momento de glória teria a “sacada” de pensar grande, no seu papel histórico, num projeto na área de segurança pública para o novo milênio? Sim, ele teria que ser acima de tudo um conciliador a começar por uma atitude de grandeza e humildade que seria buscar uma aproximação especialmente com Julio Teixeira, João Rosa, Mantelli.