DATA: 08.10.98, horário: 08:30 horas, “COVAS E A UNIFICAÇÃO DAS POLÍCIAS”:

Li num dos principais jornais do país:

O Governador de São Paulo Mário Covas propôs unir as polícias’

(da reportagem local)

O episódio da favela Naval detonou, à época, uma série de discussões sobre o atual modelo de polícia. No auge da crise, uma das piores da história da Polícia Militar de São Paulo, o então governador Mário Covas encaminhou a Brasília um projeto de emenda constitucional que unificava as funções das Polícias Civil e Militar. Além disso, o presidente Fernando Henrique Cardoso criou uma comissão para estudar o assunto. A comissão elaborou uma proposta que dava autonomia aos Estados para organizar suas policiais. O projeto foi enviado para a Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados. Essa comissão havia recebido, até o final do ano passado, 97 propostas de reforma das polícias do país. O projeto de Covas, que tirava o policiamento ostensivo da Polícia Militar, passando-o para a Polícia Civil, foi diluído pelas outras propostas. A medida de Covas foi muito criticada pela PM. Recentemente, a relatora da Comissão, deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), finalizou seu relatório a respeito do assunto. O texto será discutido, e talvez votado, na próxima reunião da comissão, cuja data ainda não foi marcada.’ (Folha de São Paulo, 3° Caderno –Cotidiano, página 1, 7 de outubro de 1998).

Por Cristo, Barrabás ou Pilatos?

Não tive como deixar de rememorar a época que estive à frente da Federação Catarinense dos Policiais Civis (Fecapoc), de nossas reuniões em Brasília (inclusive do encontro com o Senador Esperidião Amin, isso ainda no início dos anos noventa quando no seu gabinete fiz alguns comentários sobre nosso anteprojeto nacional de lei orgânica. Nessa ocasião relatei a importância de se criar o segundo grau nas carreiras de Delegado de Polícia e Oficial da PM (unificação dos dois comandos) e ele teria me indagado se já tinha conversado com a PM de Santa Catarina sobre essa proposta. Também, o veloz e combativo Senador Amin me questionou o que os Coronéis da PM de Santa Catarina teriam a dizer sobre o assunto. O Senador Amin, afundado na sua poltrona, com os cotovelos sobre os encostos, as duas mãos espalmadas formando um triângulo quase perfeito sobre o seu ventre, seus dedos compridos, com o sincronismo dos ponteiros de um relógio, iam de encontro, enquanto observava a sua cabeça levemente inclinada para o lado direito, seus olhos penetrantes quase não piscavam e seu rosto pálido lembrava uma daquelas figurinhas de desenho de “Juca Pato” na “Pizzaria” que leva esse nome no Bairro Kobrassol” (São José – Santa Catarina). Na parede desse estabelecimento “Juca Pato” careca, testa franzida, de terno... também era retratado “duvidando”, “pensando”, “aguardando” (noutras, “protestando”, “criticando”, “irritado”, “revoltado”, “indignado”...). Respondi negativamente às suas perguntas. Depois, isso quando entregamos nosso projeto estadual para o mesmo Senador Amin, fiz alguns comentários sobre o mesmo assunto e pude perceber que talvez o nosso ainda Senador nem lembrasse daquele nosso encontro, ou talvez do que conversamos, evidente que muito mais fácil para eu relembrar ou ele não quis dar a devida importância...).

Sobre o nosso “Plano” estadual de “Unificação dos Comandos das Polícias” que havia sido entregue para o Senador Esperidião Amin no primeiro semestre 1998, havia conversado o Tenente Coronel Beneval acerca de formarmos uma frente mista para essas reformas antes que outros se arvorassem a fazê-las. Pensando nisso, veio novamente a imagem do Governador Amin (eleito para o seu segundo mandato), e do   artigo de Heitor Cony na Folha de São Paulo de dois dias atrás (6.10.98) e,  complementado, com o do dia anterior (7.10.98), acerca de Jesus Cristo, Barrabás e Pilatos (“Non hunc, sed Barabbam – ‘Não este, mas Barrabás’ e ‘Barrabás outra vez’...”), fazendo referência sobre o resultado das últimas eleições presidenciais em que Fernando Henrique Cardoso estaria para Barrabás, enquanto Lula (que representaria o povo), estaria para Jesus Cristo Pôncio Pilatos não teve como retroceder ante a fúria do povo que votou pela cabeça do “Rei dos Reis” (tem que se dar um desconto porque Cony foi seminarista). Diante desse pensamento, considerando as facções que naqueles tempos buscavam o poder na Segurança Pública, me questionei: Amin seria arrojado o suficiente para peitar nossa proposta? Teria, ainda, “coco roxo” para encarar as possíveis resistências, especialmente, dentro das corporações policiais? Não daria as costas ao nosso “Plano” e escolheria navegar em águas tranquilas? Ou, então, lavaria as mãos..., preferindo a contemporização de interesses outros?

Horário: 09:30 horas, “Momento de Exorcização”:  

No andar térreo da Delegacia-Geral encontrei Walter (“Guarda-Chuva Velho”)  e Osnelito (“Lito”), ambos em pé conversando bem próximo da central telefônica. Já de entrada percebi que o prato daquela manhã era o momento atual e o destino de cada um, aliás, era o que mais se falava nas repartições policiais. Após um rápido “bom dia”, me dirigi diretamente para o “cafezinho”, criando propositalmente algum suspense e depois retornei para acessar a sala de “Osnelito” que ficada de frente para a Avenida Osmar Cunha, quando veio a pergunta:

  • E daí quais são as novas, alguma novidade?
  • Não Lito. Tudo velho.
  • E o Júlio, está tentando reverter a situação dele?
  • Não. Ele está exorcizando.
  • É, o Heitor Sché vai ser mesmo o Secretário de Segurança, sabia?
  • É mesmo?
  • Pelo menos é o que o Paulo Alceu disse, está na coluna dele no Diário de hoje.
  • Bom, o Heitor tem méritos para isso, além de ter sido eleito agora, já foi Secretário no outro governo do Amin.
  • Pois é, o Júlio tem que se mexer.
  • Tens o Diário aí contigo?
  • Não. Está lá em cima...
  • Lito, o momento agora é de exorcização.

E Osnelito deixou escapar aquela sua risada de garoto maroto e replicou:

  • Exorcização, é?.
  • Sim, os maus olhados, os maus espíritos, o baixo astral, os fantasmas, os inimigos, os perigosos, os “rapozões”, os “tigrões”...

E nesse momento chegou o Escrivão Carlos, da “Gerência de Jogos e Diversões” (sob a direção do Delegado Schmidt), com um olhar e sorriso querendo mais ouvir do que falar. Nesse clima pedi licença para sair pois já estava atrasado para me dirigir até o Arquivo Público do Estado, só que na frente do prédio tive que retroceder em razão da chuva fria que caia. Retornei a “minha sala de reuniões” onde todos aqueles “figurões” na parede davam a impressão que me aguardavam e vigiavam o tempo todo.