Data: 02.12.98, horário: 14:50 horas:

Estava na “sala de reuniões” da Delegacia-Geral da Polícia Civil e me dirigi até a “Assistência Jurídica”, a fim de redigir uma comunicação interna solicitando férias a partir de sete de dezembro a dezoito quando deveria estar viajando com o meu pai para os Estados dos Paraná, São Paulo e Minas Gerais e, também, desfrutar um pouco do dinheiro que apareceu num excelente momento. Logo que entrei no recinto encontrei Myriam que me cumprimentou e  “Jô Guedes” que foi apanhar no computador um modelo de “CI” pronta do Delegado Braga acerca de suas férias para usar como modelo, aproveitando para me lançar uma pergunta:

(...)

  • Doutor Felipe então é verdade que o senhor vai ser o Delegado-Geral?
  • Não sei Jô.
  • É o que estão dizendo por aí. (Myrian)
  • Só sei que o Doutor Braga quer ser o Delegado-Geral e ele já está com tempo para se aposentar, enquanto eu e você, sabe né Myriam como o poder é desgastante...
  • É verdade.
  • Tem que se pensar muito, se for para realizar um projeto tudo bem, mas quando ele está comprometido...

(...)

E “Jô Guedes” terminou de redigir a comunicação que eu iria levar ao Delegado-Geral Trilha. Nem me lembrei mais a última vez que estive na sala do Delegado-Geral e nem parecia que ele havia reassumido naquele dia o cargo, depois da viagem para a França.  A sua secretária havia informado que ele estava com o Delegado Elói e perguntou se eu desejo entrar. Respondi que aguardava mas ela foi avisar sobre a minha presença no local e Trilha imediatamente pediu que eu entrasse. Nesse momento constatei que Trilha e Eloi estavam de pé:

  • Eu já estou indo, gostei, o homem emagreceu, estava com cento e cincoenta quilos. (Elói)
  • Elói temos que fazer aquela entrevista. (Felipe)
  • Pode sentar, senta  Doutor Genovez, senta! (Trilha)

Como Trilha havia sentado no sofá e apontou para eu sentar mais uma vez,  pedi licença e acomodei meu esqueleto enquanto Elói se foi. Trilha iniciou a conversa esperando por novidades:

  • E daí Doutor Genovez, quais são as novidades?
  • Não há muita.
  • Quem vai ser o Secretário? Já sabe?
  • Não sei.
  • A última que se sabe por aí é que vai ser o Napoleão Amarante e o adjunto o Júlio Teixeira, é verdade?
  • É mesmo? Não estou sabendo, mas se for assim é bom.
  • E o Delegado-Geral vai ser o senhor?
  • Não Doutor Trilha, eu já lhe disse uma vez que não aspiro o poder  e depois tem outros na minha frente. Eu tenho ainda uns dez anos de polícia pela frente, acho que o Doutor Braga está na minha frente e tem outros.
  • Sim, sim, pode ser o senhor, o Doutor Braga, o Doutor Wilmar.
  • Tem, inclusive, o Doutor Renato Ribas lá de Itajaí.
  • Duvido, ele não vai abrir mão de Itajaí, vir para cá pagar aluguel, perder dinheiro? Duvido...
  • Isso é verdade, mas tem outros nomes.
  • É muito fácil levar isso aqui. Não tem segredo, é só pegar uma boa assessoria, o Senhor se dá bem com o Doutor Oscar?
  • Sim.
  • Pois é, na época que ele era o Corregedor-Geral me convidou para trabalhar na Corregedoria e eu assumi o cargo de Corregedor, aqui eu tive sorte, peguei bons auxiliares, tanto o DPI – Doutor Carlos Dirceu com o DPL – Doutor Braga, o Doutor Lima na Corregedoria e depois o Doutor Sala, hoje tem muita gente boa, não é como na nossa época, hoje todo esse pessoal é computadorizado, é outra coisa.
  • É, eu estou trabalhando no resgate histórico da Polícia Civil e gosto disso que eu faço.
  • Sim, é um trabalho muito importante, o senhor mandou aquele calhamaço,  eu até estava falando com o Doutor Ilson a respeito desse belo trabalho que o senhor está desenvolvendo...
  • É algo que eu acho importante para minha instituição, na semana passada o “DC” publicou um encarte sobre a Revolução de 1932, onde apresentou Lara Ribas e o que vemos ali? A História da Polícia Militar, então é muito importante esse trabalho.
  • Sim, é verdade Doutor Felipe.
  • Ah, até gostaria de lembrar que eu quero lhe entrevistar.
  • Quando?
  • Não precisa ser já.
  • Mas o senhor volta quando de férias?
  • Deixa eu ver,  acho que dia dezoito.
  • Ah, sim... porque o meu ato de aposentadoria deve estar saindo antes do final do mês.
  • Mas não tem problema, eu posso lhe procurar em sua casa. Há algum problema?
  • Não. Vai ser um prazer recebê-lo em minha residência, o meu ato de aposentadoria está para sair, já falei com o Clito Vieira, ele é quem assinou a minha ficha de filiação ao PMDB, e já disse que o ato vai ser publicado ainda neste mês. O senhor sabe como é, o outro governo pode assumir e criar alguma dificuldade depois...
  • É, infelizmente em política tem isso, direito é direito e não deveria ocorrer esse tipo de coisas.
  • Sim, mas ocorre e o senhor sabe disso, eu, o Doutor Lima, o Doutor Bahia estamos requerendo aposentadoria. A doutora Lúcia deve voltar para do Distrito, ela quer ficar.
  • Bom, se depender de mim ela não volta, isso é claro se eu viesse a ser o Delegado-Geral.
  • Mas ela tem essa prerrogativa garantida.
  • Eu sei, ela não perderia a lotação, isso seria respeitado, a lotação dela continuaria sendo lá, só que eu a convocaria para prestar serviços na Delegacia-Geral, o certo seria ela ocupar um cargo, possui  currículo para isso, na Magistratura é assim, no Ministério Público e na Polícia Militar também, só na Polícia Civil que não, acho que o Delegado Especial tem que ser valorizado, não admitiria que um Delegado Especial ficasse numa Delegacia, se ela não quisesse ocupar um cargo, tudo bem. Mas, mesmo assim ela seria convidada a atuar em qualquer área da Delegacia-Geral, prestando auxílio, até como assessora do Delegado-Geral.
  • É verdade!
  • É por isso que eu acho difícil assumir alguma coisa e depois tem outra eu já conheço o filme, por exemplo, o caso da isonomia, na época do Jorge ele sofreu muito porque não pediu exoneração, nós todos erramos, eu que era Assistente Jurídico, o Moreto, o Ademar e o Braga, deveríamos ter colocado nossos cargos a disposição e não fizemos, deu no que deu. Hoje me arrependo, deveria ter tomado essa iniciativa e não o fiz, depois tem a questão do “Fundo”, não se pode admitir que o governo revogue  essas conquistas.
  • Mas Doutor Felipe eu acho difícil isso acontecer, nós termos três deputados na Assembléia, poderíamos ter até quatro se o doutor Carlos Dirceu tivesse se elegido, e depois com o Napoleão Amarante não vai ser fácil...
  • É ele já atuou na Policia Civil.
  • Ele não vai deixar mexer assim, na época que o Kleinubing acabou com nossa isonomia ele também quis fazer o mesmo com o Ministério  Público, só que o Kurtz deu um soco na mesa e não admitiu, faltou isso.
  • É verdade, infelizmente na época o Doutor Jorge optou em permanecer no cargo e ver se conseguia reverter a situação, só que não conseguiu e o Pacheco deixou esse legado para nós.
  • Ah sim, mas uma pessoa ligada ao Pacheco me falou que ele está muito mal, dizem que numa reunião com o Amin ele teria pedido para ser o Secretário de Segurança Pública e sabe Doutor Genovez o que ele disse?
  • Não!
  • ...‘Mas Coronel como é que eu posso nomeá-lo Secretário de Segurança se o senhor está respondendo processos por corrupção junto ao Tribunal de Contas?  ...
  • Isso tem sido comentado...
  • E o Doutor Jorge tem sido muito execrado perante a classe, o senhor pode falar dele por aí  que ninguém pode ouvir fala no seu nome...

(...)

  • Mas doutor Felipe o que posso ajudar...
  • É o seguinte: Eu trouxe um pedido de férias, é para deduzir...
  • Está autorizado.
  • O senhor só assina que recebeu aqui.

(...)”.

E deixei o gabinete do Delegado-Geral, tendo Trilha me acompanhado até a porta desejando boas férias. Enquanto saia com destino a escada avistei uma loira charmosa que nunca tinha visto antes sentada na sala de espera ouvi a seguinte frase de Trilha:

  • Olha a nossa loira atleta...

Horário: 15:30 horas:

Resolvi ir até a sede da Adpesc levar meu livro. Já havia telefonado antes e a secretária havia informado que o Presidente Mário tinha ido ao médico e que retornaria mais tarde. Ao chegar no térreo do prédio Joana de Gusmão (centro de Florianópolis), encontrei meu pai que informou a chegada de mais dinheiro,  era coisa antiga, um resíduo de um prédio que tínhamos alienado na cidade de Concórdia. Logo que entramos na sede distinguir os Delegados Moacir (Tesoureiro da Adpesc), Clóvis  e Alberto Freitas (Delegados aposentados):

  • Olha o nosso futuro Delegado-Geral, pessoal batam continência para ele. (Alberto)
  • Que é isso Alberto? (Felipe)

E fui direto para o café com o meu pai e Moacir veio acompanhar:

  • Moacir eu estou trazendo o meu livro, é o Estatuto Comentado, uma edição histórica especial...
  • É, o que pessoal tem usado nas Delegacias...
  • Sim. Mas aquele lá é uma edição antiga, de 1993, de lá para cá mudou muita coisa...
  • Olha Genovez esses nossos Delegados tem que passar....
  • Sim, olha quero te mostrar aqui os comentários aos artigos...

E enquanto mostrava o documento lavrado pelo Desembargador Severo Amorin do Valle, data de 1842, onde constava a  nomeação de nossos primeiros Delegados e a relação de nossos Chefes de Polícia, desde 1812, quando surgiram nossos primeiros Intendentes Gerais de Polícia...:

  • Esses nossos Delegados têm que passar por uma reciclagem, a grande maioria não tem jeito, é sofrível, bom a gente já conversou sobre isso (Moacir)
  • Moacir a gente sabe disso, mas o jeito é continuarmos a luta e tu estais onde?
  • Eu estou na Quarta Delegacia, mas não aguentava mais, tive que tirar férias.

(...)

  • Olha Moacir eu estou deixando aqui para você o Estatuto, o objetivo é ver se a diretoria da Adpesc aprova a remessa de um exemplar para cada sócio, nem que se parcela em duas vezes com desconto no contracheque,  por exemplo se sair cinquenta reais, pode ser parcelada em duas vezes de vinte e cinco porque eu não posso ficar com os custos, sem um retorno,  trata-se de um trabalho que interessa a todos e depois quem não quiser pode devolver dentro de trinta dias e se devolve o dinheiro.
  • Claro, nós podemos fazer uma consulta prévia para ver o que eles acham...

(...)

Deixei a sede da Adpesc rapidamente com o objetivo de retornar para Delegacia-Geral, passando pela Praça XV. Logo no início da Rua Felipe Schmidt (centro de Florianópolis) encontrei uma roda de Delegados, em cujo local pude destacar os Delegados Braga, Maurício Noronha, Krieger, Moritz e, mantendo certa distância, cumprimento o primeiro sob os olhares atentos dos demais. Logo pensei: “imagine qual seria o assunto que constava da ordem do dia?” Como estava embalado, resolvi seguir meu caminho sem pestanejar...