Data: 17.12.98, horário: 21:00 horas, “Chapecó”:

Horário: 08:30 horas, “Passarinho”:

“Zé Ghizzo”, como costumava chamá-lo, especialmente para distingui-lo do outro que era meu pai (e Delegado aposentado...), em razão de sua teimosia de querer em cada cidade entrar numa casa lotérica, um vício que me incomodava muito..., desceu a pé para fazer os seus jogos diários. Havia acertado com Delegado Natal para nos encontrarmos na "revendedora da Chevrolet", na saída de Chapecó. Depois de deixar meu carro para conserto, retornamos em seu “WV Santana azul para o centro. Antes, porém, não pude resistir e o convidei para passarmos na revendedora Mitsubishi do seu conhecido “Passarinho” que veio nos recepcionar e passou a passou a apresentar suas vedetes:

“(...)

  • Ontem fui levar um desses para o Delegado de Pinhalzinho, ele tinha um Mégane e fizemos a troca... (disse Passarinho apontando para uma caminhonete)

(...)

E dali Natal me convidou ainda para vermos ainda a revenda da caminhonete  “Galloper”, vedete da  Asia naquele momento na cidade...  e no retorno, no trânsito para o centro:

  • Doutor, quando é que nós temos condição de comprar um carro desses,  com um salário de Delegado? (Natal)
  • Ah, sim, eu estou consciente disso Natal, tenho até dinheiro para comprar um carro desses, mas não sou louco, num momento de crises dessas, todo mundo num sufoco, onde já se viu, chega a ser triste você aparecer com um carro desses por aí...

(...)

E depois de tomarmos um café na “Boca Maldita”, fomos sentar num banco quase em frente, para conversarmos sobre o “essencial” naquele nosso encontro, além de matarmos a saudade em razão da nossa amizade de anos:

(...)

  • Sim Natal, quais são os nomes que estão fortes para as Delegacias Regionais aqui no oeste, a começar por Chapecó?
  • Olha, aqui é eu e o Alex.

(...)

E nisso chegou um cidadão da rádio local e que era conhecido de Natal, inclusive, membro do diretório do PFL:

  • Este aqui é o doutor Felipe, nosso amigo do peito...

E depois de  cumprimentá-lo, o radialista me lançou uma pergunta:

  • Como é que é, já saiu o nome do Secretário?
  • Sim, é o Promotor Carvalho, temos dois Delegados que se elegeram deputados, o Sché e o João Rosa, mas...
  • Bom, quando eu soube que o Sché não foi escolhido para Secretário eu soltei foguetes, entende...?

Não entendi bem de início o que o radialista quis dizer e continuamos a conversa:

  • Mas quem você acha que deveria ser o Secretário? (radialista)
  • Olha, entre o Sché, o Rosa e, também, tem o Julio que deve ser levado em conta não só pelos vinte mil votos, mas pela história dele, eu acho que o Julio é quem deveria ser o escolhido, mas dizem que ele ficou como adjunto, ainda não foi confirmado.

Logo que acabei de concluir essa frase o cidadão se afastou dizendo:

  • É isso aí, conquistou!

E Natal completou:

  • Ele é ligado ao Julio...
  • É mesmo, mas voltando... (radialista)
  • Sim, tu vê, o Heitor esteve aqui, fez aquela onda toda... O Alex pegou a Pajero e saiu com ele por aí, foram a São Miguel do Oeste, fez a cabeça do pessoal lá, e eu doutor, o que quê eu tenho...? (Natal)
  • É aquilo que eu já te falei, você é o antigo, que já tem tempo para ir para casa, já esse Alex representa o novo, que tem muito tempo de serviço pela frente, sem contar a estrutura que ele tem... (Felipe)
  • Sim, mas eu fiz um dossiê... (Natal)
  • Dossiê? Mas esse Alex é substituto? (Felipe)
  • Sim. Ele é substituto, tu não vê as cagadas que esse Delegado Regional fez aqui, mas está sendo feito uma auditoria, a ordem é descer o pau, a coisa não vai ficar assim, tu precisas ver o que esse cara aprontou aqui em Chapecó... (Natal)
  • É Natal, eu de qualquer forma fico sempre do lado da hierarquia, você é um Delegado Especial, esse pessoal novo não pode fazer isso, disputar cargos,  eles estão sacrificando a instituição, tu não vê, nenhuma outra instituição é assim, a Magistratura, o Ministério Público, a Polícia Militar. (Felipe)
  • É, existe a hierarquia, mas na Polícia Civil é diferente, é essa vergonha, tá aí o Alex atrás de político para ser o Delegado Regional e ele tem cacife. (Natal)
  • Exatamente Natal, tu não vê, o professor Edmundo veio aqui lançar um livro de história da Polícia Militar, mas o importante não é o seu conteúdo e sim o legado que querem deixar para as futuras gerações de policiais, o espírito de respeito entre os Coronéis e Oficiais, a doutrina que eles tem, os princípios, o espírito de corpo... Para o Comandante-Geral sair lá da Capital e vir pessoalmente aqui prestigiar o lançamento de um livro sobre a História da Polícia Militar, quando que na Polícia Civil existe isso? Mandei meus projetos para a Secretária e nem obtive resposta, não houve nenhum interesse em promovê-los, por quê isso? Percebe as diferenças Natal...? (Felipe)
  • É assim mesmo, é uma sem “vergonhice”! (Natal)
  • Mas, como está São Miguel do Oeste, Xanxerê, Concórdia...? (Felipe)
  • Concórdia deve ser o Badalloti, ninguém tira dele... (Natal)
  • Mas ele não está na direção do Presídio?(Felipe)
  • Sim, mas ele é bem relacionado lá... (Natal)
  • E Joaçaba? (Felipe)
  • Joaçaba acho que o Werlang, aquele que já foi no governo Kleinubing... (Natal)
  • Ah, sei quem é, mas tudo indicação política? (Felipe)
  • Sim, mesmo caso do Alex aqui, tu não vê, não te surpreendas, mas sabes quem é que vai ser o Diretor do Detran? (Natal)
  • Não, tem gente pleiteando, até o Jorge ficaria bem lá... (Felipe)
  • Que Jorge? (Natal)
  • O Jorge Xavier, somos muito chegados e trabalhamos naquele projeto de que já te falei... (Felipe)
  • Certo, mas quem deve ser o Diretor do Detran é o Pedro Fernandes Pereira, ele correu na surdina todo o Estado pegando assinatura de prefeitos, presidentes de diretórios, pedindo que avalizassem o nome dele para a Diretoria do Detran... E até eu tive que entrar nessa, assinei o documento,  não tive como me esquivar, agora tu vê um homem desses que quando foi Delegado Regional aqui fez misérias e eu estava na comarca e não podia fazer nada, eram carteiras de habilitações... (Natal)
  • Mas eu pensei que o Pedro Fernandes estava pretendendo alguma coisa no Sistema Penitenciário, ele está sempre lá pelo diretório do PPB... (Felipe)
  • Não senhor, tu não conheces esse homem, espera para ver... (Natal)

(...)”.

Horário: 09:00 horas:

E por falar em Jorge Xavier tive que interromper a conversa com Natal para atender uma ligação no celular e era justamente ele na linha:

  • Alô!
  • E daí Jorge?
  • Onde é que tu está?
  • Estou aqui em Chapecó, conversando com o meu amigo Natal que está aqui do meu lado.
  • Ah,  então já estais descendo?
  • Sim.
  • Escuta, seria bom tu fazeres um contato com o Julio, é importante, ele deve estar em Rio do Sul...

Pensei em avisar Jorge Xavier que iria passar por lá para tentar falar com ele pessoalmente, mas me contive, afinal de contas há dias que não converso com o deputado e estava aguardando seu contato,como ele tinha me dito no último telefonema (qualquer coisa me ligaria imediatamente...), ou seja, quando tivesse algo de concreto eu seria uma das pessoas que por primeiro ficariam sabendo, seria contatada... Bom, estava eu ali aguardando o contato, preferia naquele momento não tomar iniciativa alguma até por que o cenário político era totalmente contrário ao nosso “Plano” com o Ministério Público  no comando da Pasta da Segurança Pública. Como conhecia bem Jorge Xavier, tive que dizer a ele que apenas tentaria, o que na verdade não iria ocorrer naquele momento da minha viagem. Depois de desligar o telefone, retomei a conversa meio ao pé do ouvido:

(...)

  • Sim Natal, e se comenta alguma coisa para Delegado-Geral?
  • Não. Não se comenta nada. Eu se ficar sem a Delegacia Regional aqui até que aceitaria a Delegacia-Geral, o meu problema é a mulher, ela não se adapta na Capital, não tem jeito, eu adoro aquilo lá, tenho que me conformar... (Natal)
  • Bom, você é Delegado Especial,  pode se credenciar... (Felipe)
  • Se eu não for o Regional aqui eles vão ter que me arranjar um cargo lá por baixo, disso eu não abro mão doutor!

(...)

Logo em seguida se juntou a nós o meu pai que visitou todas as lotéricas de Chapecó (depois que minha mãe faleceu em 1989 ele se refugiou nesse vício e não conseguia se libertar...), a quem nós já aguardávamos para ir apanhar meu carro na oficina que já deveria estar pronto. E lá fomos nós três, como se “passarinhos” fossem, sem saber o que teríamos pela frente, cada qual com suas aspirações, sonhos...