Data: 17.12.98, horário: 21:00 horas, “Chapecó”:

Eu e meu pai chegamos na cidade de Chapecó e nos hospedamos no “Hotel Eston”. Depois de nos acomodarmos liguei para o amigo Delegado Natal:

  • Alô! (Felipe)
  • Alô!
  • É da residência do doutor Natal?
  • Sim.
  • Ele está?
  • Não. Ele foi uma solenidade.
  • Ah, sim, ele retorna muito tarde?
  • Sim.
  • Poderia anotar um recado?
  • Sim.
  • Avisa ele que...

(...)”.

Data: 18.12.98, horário: 06:45 horas:

  • Alô! (Felipe)
  • E daí doutor?
  • Oi Natal.
  • Era para eu ter telefonado ontem à noite, meu filho deu o recado, mas já era de madrugada e aí não quis incomodar aquela hora, mas e daí, como é que está indo de viagem?
  • Estou fazendo uma viagem com o meu pai  e estamos aqui agora, viemos de Foz do Iguaçu.
  • Mas estamos aí, vai ficar por aqui até quando?
  • Olha Natal eu tenho que levar meu carro para trocar as pastilhas de freio e o óleo na Chevrolet, acho que fica aqui no centro, na Getúlio Vargas,  enquanto isso...
  • Ah, então vai dar para a gente conversar, vamos fazer o seguinte, eu de manhã estou cedo no café, é ali na “boca maldita”, te espero ali, estou com o coronel...
  • Certo, sei aonde é, então nos encontramos lá!

Horário: 07:30 horas, “Eternos Infantes”:

Estávamos no subsolo, onde era servido o café no Hotel, em cujo momento avistei o ex-professor da faculdade de Direito, Coronel reformado da Polícia Militar e agora escritor Edmundo Bastos, já beirando talvez os setenta anos. Depois de uma troca rápida de  olhares para fins de reconhecimento pensei comigo que era estranho sua presença ali, ou uma mera coincidência. Sempre que via o professor lembrava dos tempos em que fui seu aluno (temporário, apenas para assistir algumas de suas aulas de Direito Penal - UFSC). E numa dessas aulas, escutei o professor afirmar que naquele último final de semana teria ido visitar sua mãe em Joinville e que toda vez que fazia isso lá vinha ela querendo ainda tratá-lo como um infante, fazendo uma comidinha para o filhinho, um “mingalzinho”... Aquele incansável mestre deixava sempre passar para as pessoas que o acompanhavam (nem que meio distante como era o meu caso) uma certa dose de inspiração, vanguardismo, humildade, mas também posicionamento em defesa de seus ideais, valores e de ocupação do tempo por meio da pena a serviço de interesses de sua instituição: A Polícia Militar.

E depois de me servir e comentar com meu pai sobre a presença daquele não tão velho militar surgiu o Delegado Natal de surpresa, era ele mesmo em carne e osso, sempre com aqueles ares de “viking”, de ‘Moises’ ou de algum pregador bíblico, certamente serviria para fazer papel em algum filme épico.

“Bom Dia Senhores!”

“(...)

  • Olha o Natal! (Felipe)
  • E daí doutor, sabia que vocês estavam aqui no café.

(...)

E Natal se sentou junto à mesa e começou a relatar os acontecimentos da noite anterior:

  • Eu cheguei muito tarde e resolvi deixar para telefonar de manhã.
  • Não tem problema Natal.
  • Fui o lançamento do livro do Coronel Backes, trata daquele Capitão que morreu durante a revolução de trinta e dois, é a transcrição de um diário... ele conseguiu com a família, parece que o sobrenome é Boabaid.
  • Ah, sim, agora entendi por que o Coronel Edmundo está aqui, tu falaste Backes, ele também participou da solenidade?
  • Não. O Backes não esteve, estava o Valmir Lemos, Comandante-Geral da Polícia Militar...

Em seguida, depois de outros oficiais que se juntaram àquela mesa ao lado... apareceu Valmir Lemos que ao chegar aonde estava sendo servido o “buffet” e se dirigindo para nós a certa distância deixou escapar o seu formal:

  • Bom dia senhores!

Era um jeito formal de Valmir que encarnava a sua figura de Coronel, uma postura um tanto conservadora para alguém mais moderno e que chegou a cursar algumas cadeiras comigo no curso de Direito, isso no ano de 1977. Era incrível como uma pessoa conseguia manter um visual e uma postura quase que intacta durante décadas, como se o tempo tivesse quase que ficado congelado. Estava ali um dos principais escudeiros do Governador Paulo Afonso (também contemporâneo do curso de Direito) e depois daqueles “escândalos” das escutas em que se envolveu o seu antecessor, recordei a última vez que o vi no Restaurante ‘Doll’, na Lagoa da Conceição, acompanhado por uma infante.

Duas mesas tão próximas e que ao mesmo tempo refletiam uma verdade que teimava em acompanhar nossos passos, reflexos do que fomos, somos e poderemos vir a ser... com o nosso “Plano”. E deixamos o café numa linha quase que reta, sem ao menos olharmos para o lado...