Data: 12.12.98, horário: 23:00 horas: “Carvalhinho”:

Era sábado e saí de Borda da Mata por volta de quinze horas com destino a Poços de Caldas (Minas Gerais). Depois de dar umas voltas nas cidade, resolvi telefonar para Florianópolis a fim de saber das novidades. Inicialmente fiz contato com o Sargento Julio Francisco, reformado da Polícia Militar e dissimulando a voz:

  • Alô! (Felipe)
  • Alô!
  • Fala Comandante!
  • Quem é que está falando?
  • Aqui é o comandante-geral.
  • Quem é?
  • Fala rapaz.
  • Eu não sei quem é?
  • Ô rapaz, aqui é o comandante-geral.
  • Mas eu estou reconhecendo essa voz, ô meu amigo, olha nós temos que conversar muito, está em casa?
  • Não, estou aqui em Minas Gerais.
  • O quê? Não brinca, está mesmo em Minas Gerais?
  • Sim, é verdade.
  • Está sozinho?
  • Não. Estou com o meu pai.
  • O velhão tá aí.
  • Sim.
  • Mas nós temos muito que conversar, quando é que nós podemos nos encontrar?
  • Tudo bem Júlio, mas dá para pelo menos darmos uma geral.
  • Ah, sim, olha aqui, quando é que nós podemos nos encontrar?
  • Deixa eu voltar.
  • Mas está mesmos em Minas Gerais, olha óóó!
  • Escuta, como é que está a casa lá?
  • Olha, temos que conversar muito, tá feio!
  • E quando é que sai o dinheiro?
  • Dia dezesseis.
  • O quê?
  • É, dia dezesseis, e é só o décimo terceiro.
  • Olha!
  • É!
  • Mas como é que pode, se um ladrão rouba um toca-fitas é preso, ele é tratado como bandido, mas se um governo confisca os salários de quase todos servidores, não acontece nada, isso é uma barbaridade!
  • É verdade, mas quando é que volta?
  • Antes do natal.
  • Ah, sim. Estais sabendo aí como que estão as mudanças de governo na área da Segurança? Já sabem quem vai ser o Comandante-Geral?
  • Não, ninguém sabre nada ainda, só o nome do Secretário que saiu, é aquele que já foi...

(...)”.

Horário: 23:45 horas:

E, pela Segunda vez tentei contato com Jorge Xavier sem sucesso. Consegui conversar com Francine (filha) que parece que estava de plantão junto ao telefone:

  • Alô!
  • Francine?
  • Oi.
  • O teu pai já chegou?
  • Sim, vou chamar.

E ouvi aquele: “pai, paiê,  paiêê, paiêêê, paiêêêê, telefone...!   Fancine retornou para avisar que seu pai estava guardando o carro na garagem:

  • Só um momentinho que ele já vem.
  • Tudo bem Francine.

E depois de aguardar mais uns dois minutos:

  • Oi!
  • Oi Jorge!
  • Tentei contato contido umas trinta vezes, não consegui, só escutava uma voz macia que dizia..., dava para perceber que não era deste Estado,  estais aonde agora?
  • Estou em Minas Gerais.
  • Olha, masas seria bom se na terça-feira tu estivesses por aqui, quando é que tu voltas?
  • Olha Jorge amanhã devo estar chegando em São Paulo, depois Curitiba, Foz do Iguaçu...
  • Sim, mas agora tu vais estar voltando, já é o retorno?
  • É.
  • Mas tu sabes das novidades já?
  • É, eu sei que o Carvalho é que vai ser o Secretário de Segurança.
  • É, eu no início não sabia quem era o Carvalho, depois é que soube que se tratava daquele que foi Secretário de Administração no governo passado, ele sempre nos tratava bem, acho até que uma vez tudo fostes lá comigo?
  • Sim.
  • Foi eu, o Valéri e acho que tu também estavas, foi naquele episódio da isonomia, e ele sempre nos atendeu muito bem.
  • Sim, o Pacheco também foi com os Coronéis.
  •  Isso!
  • Pois é o Krieger me ligou e eu recomendei que ele ligasse para o Julio.
  • Eu falei com o Krieger.
  • Sim, mas tu falasses com ele antes ou depois do telefonema dele para o Julio?
  • Foi antes, porque ele não me disse nada.
  • Tudo bem, mas depois o Krieger ligou para mim e eu recomendei que ele fizesse contato com o Julio e ele fez e me deu um retorno. O Julio teria dito para ele que como o Heitor estava para ser indicado e ele teria colocado para o Amin várias possibilidades para bloquear o Heitor, dentre os nomes foi colocado o do Napoleão Amarante que não aceitou, então surgiu o nome do Carvalho, só que o Heitor estava vindo com força total, e quando o Carvalho estava para perder o espaço o Júlio entrou na parada para fortalecer o nome do Carvalhinho. Depois até ele soube e teria agradecido a intervenção do Julio. E, eu resolvi telefonar hoje para ele também e ele disse que seu nome estava oitenta por cento contado para ser o Secretário Adjunto. Quando eu telefonei até parece que o Julio estava de plantão ao lado do telefone.
  • De plantão? Acho que não, será que ele está sempre em casa?
  • Não. Parece que estava de plantão e depois ele me confirmou que estava esperando para qualquer momento um telefonema e eu falei para ele que logo que ele fosse convidado oficialmente para o cargo de Secretário Adjunto que já deveria levar já o nome do Delegado-Geral... Eu disse para ele que o Felipe além de ser filiado ao PFL era amigo dele e trabalhou no projeto. Ele disse que é uma boa opção.
  • Ele falou isso?
  • É, por isso que eu acho que tu deveria estar nessa reunião de terça-feira,  não dá para tu dares um pulo de Curitiba a Florianópolis?
  • Não dá Jorge, nem pensa, está tudo esquematizado aqui com meu pai, eu só vou chegar aí no sábado ou domingo à noite. Olha Jorge, e tem mais,  sinceramente, eu não sei se vou aceitar algum cargo, vou só deixar a coisa rolar. O Moreto andou me telefonando.
  • Quem?
  • O Moreto, na verdade queria me sondar, eu acho...

(...)

E relatei para Jorge o conteúdo do telefonema que Moreto me deu quando estava ainda em Campinas na casa dos Caponi.

  • Depois falei com o Krieger e ele me confirmou que o projeto acabava com as entrâncias, voltava ao sistema de classes e o Delegado Especial passava a ter a sua lotação determinada por decreto do governador, então Jorge você vê eu que sempre lutei por aquelas ideias, como é na magistratura, Ministério Público e o que acontece até com os Coronéis,  não vou poder compartilhar com uma coisa dessas assumindo um cargo de Delegado-Geral. E depois quando eu falei para o Krieger que o projeto é do Julio ele disse que o Redondo estava por trás, para mim foi o fim.
  • Mas Felipe eu acho que não é isso não, se existe o projeto não é do Julio.
  • Sim, eu acho que o Moreto e o Krieger não iriam mentir, quando eu duvidei que fosse do Julio o Moreto leu para mim o nome dele e que a assinatura constava de uma emenda.
  • Mas Felipe isso depois a gente pode consertar, se tu assumires como Delegado-Geral...
  • O quê?  Jorge eu já conheço esse filme, no teu tempo ocorreu o mesmo com a isonomia, o governo derrubou logo de início e ficamos correndo atrás do prejuízo e deu no que deu, depois sobrou para ti, agora só falta querer repetir o filme e eu servir como bobo da corte, não!
  • Não! A isonomia foi diferente, nós assumimos em março de 1991 e ....
  • Olha Jorge é tudo igual e é como eu te disse se for convidado ainda tem a questão do nosso grupo, como ficará o nosso pessoal? Por que assumir com todos os cargos já ocupados é outra coisa, eu já conheço esse filme,  nesse caso não é só a minha situação que conta, não posso esquecer dos amigos, de você, do Garcez, do Krieger, Wilmar, Cláudio, até do Braga, todos aqueles que confiaram na nossa palavra, todos aqueles que emprestaram seus nomes a nossa causa. Se vierem me convidar para alguma coisa vou pedir quarenta e oito horas para pensar, vamos nos reunir para fazermos uma avaliação, todo o nosso pessoal.
  • Nisso tu estais certo, realmente não dá para aceitar as coisas de qualquer jeito.
  • Veja bem, lutamos por ideias que colocamos no nosso “Plano”, pela transformação do cargo de Delegado Especial em Procurador, pela criação das procuradorias... para fortalecer a nossa instituição, pelo fortalecimento da carreira de delegado e agora acontece tudo ao contrário?
  • É.
  • E ainda tem a questão da isonomia, Detran e do Fundo...
  • Felipe, aí não tem a mínima condição!
  • É bem isso Jorge, prefiro comer o pão que o diabo amassou, não tem problema, volta até para uma Delegacia, prefiro deixar o Julio e o Redondo assumirem tudo sozinho, se bem que nós temos um monte de Delegados vendidos, covardes, que aceitam qualquer coisa por troca de “carguinhos”, mas isso não é o meu caso..., a história os julgará!
  • Eu falei com o Backes na última reunião e disse a ele que a Polícia Militar vai ficar subordinada à Segurança Pública, mas ele estava com aqueles ares de quem seria o Secretário e que foi sondado, ele viajou para os Estados Unidos na mesma época do Amin, na verdade foram juntos.
  • Pois é até para ele vai ficar difícil, como é que vai administrar essa situação?
  • É, ele vai ficar subordinado ao Secretário de Segurança Pública, não entendi?.
  • É fácil Jorge, o Amin não vai querer uma Polícia Militar fora de controle. Para isso, coloca tudo dentro do mesmo saco e bota uma onça para cuidar dos gatinhos. O Backes aceitou isso porque coloca a amizade dele com o Amin acima da instituição. Não é o nosso caso. Bom como eu te disse a história os julgará. Eu estou aqui em Poços de Caldas.

(...)

E Leninha que estava do lado de Jorge ouvindo a conversa perguntou (deu para escutar):

  • Pergunta se a Dinha está com ele?
  • Estais aí em Poços de Caldas? Coisa boa,  estais com a Dinha aí?
  • Não! Estou com o meu pai.
  • Olha, o velho será que quer casar novamente?
  • Sim. Está procurando uma gata.
  • Uma gata?
  • É. (risos)
  • Diz para ele que estou mandando um abraço.
  • Ó pai, o Jorge está aqui mandando um abraço para o senhor.

(...)

E disse a Jorge que iria terminar a ligação que na noite de segunda-feira voltaria a telefonar para saber das novidades. Já havia sido informado de que realmente nossos vencimentos seriam creditados somente no dia dezesseis e os relativos ao décimo terceiro salário de 1998 ficariam para o próximo governo, além de parte da folha de setembro, outubro, novembro e dezembro:

  • Pois é Jorge, mas tu vê, a Lúcia na festa de aniversário dela na semana passada, ao discursar chorou, quer dizer, depois de um governo desses,  onde o nosso policial nunca passou por uma situação dessas, depois de quatro anos viajando para baixo para cima, recebendo diárias todo mês,  vem ela chorar, dá licença, gosto muito dela, mas brincadeira tem hora,  fazer demagogia numa hora dessas não dá! E ainda por cima vem o Lourival dar presente e o Trilha discursar.
  • Ela é uma....
  • Olha, eu gosto dela, mas no governo passado se os vencimentos atrasavam cinco dias, como ocorreu durante cerca de dez meses ela e companhia estavam de plantão na Adpesc para denunciar a opressão de nossos policiais descamisados e agora..., nunca se passou por uma situação dessas e ela vem discursar...
  • Ela é ima ..., e eu estive falando com o Luiz Darci a respeito daquele atrasados da isonomia e descobri que o Mário é outro..., só tem feito o jogo..., está segurando tudo..., fazendo o jogo do pessoal lá de cima...
  • É Jorge, mas a história reservar para eles um julgamento...,  ela é implacável, se bem que nossos colegas são muito fracos de espírito,  muitos são covardes, vendidos, estão sempre do lado de quem está no poder e mudam facilmente de posição conforme os ventos,  sempre ficam do lado que os convém, dá licença.
  • É...
  • Outro coisa que eu estava pensando Jorge é que a escolha do Secretário não seguiu critério político, então a secretaria não é do PFL, mas isso foi uma decisão técnica, eu não vou me admirar se isso não tem a mão do Kurtz por trás, porque ele estava cotado para ser o Secretário, só que não iria deixar a Procuradoria da Prefeitura, não abandonaria a Angela lá, mas poderia indicar o Carvalho que é do “PFL”, ligado ao Kleinubing, ligado ao Jorge Bornhausen e bem que poderia ser o plano “b” do Kurtz...
  • Bem pensado, faz sentido. Mas o Carvalho não é político não, ele é técnico.
  • Mas como? Esse Carvalho não é político?
  • Ele não foi indicado pelo partido.
  • Tudo bem Jorge, mas foi uma decisão política e técnica. Eu acho que a indicação dele também foi decidida por aquela comissão, integrada pelo Pedro Bittencourt e pelo Paulo Gouveia da Costa, só não sei se teve o dedo do Julio. Mas veja bem, a escolha do Secretário se deu também porque essa comissão era ligada ao Kleinubing. Aposto que a indicação dele partiu do Kurtz para o Amin por meio do Jorge Bornhausen e daí para a comissão. O Kurtz conhece todo mundo dentro do Ministério Público e certamente que seria consultado, ainda mais que foi sondado para ser o Secretário. Bom, é possível ainda que o Julio venha ser o secretário adjunto para acertar a situação do Heitor Sché, pode ser que ele fique com a indicação do Delegado-Geral que nesse caso pode recair no nome do Braga, já pensaste nisso?.
  • Não! Isso não.
  • Olha, tem tudo para acontecer porque o Heitor não pode ficar de fora.
  • Pode ser que eles deixem o Heitor indicar alguns regionais, nada mais.
  • Não acredito que o Heitor vá se contentar só com isso, mas Jorge eu ligo para você na segunda-feira à noite.
  • Tu ligas então.
  • É, não te preocupes, eu ligo para saber das novidades, um abraço.
  • Em tá, um bom passeio.
  • Obrigado. Um abraço.