Data: 11.11.98, horário: 08:00 horas, “Na Berlinda”:

A mídia estadual noticia em primeira mão que o Governador Paulo Afonso foi  declarado inelegível pela Justiça por entregar viaturas (Marcelo Fernandes, Rádio CBN, Florianópolis - SC). E, nos jornais:

TRE declara Paulo Afonso inelegível

Condenação por abuso de poder durante as eleições passa a valer após esgotados todos os recursos

Entenda o caso:

Julho – A coligação Mais Santa Catarina (PPB-PFL-PSDB-PTB-PSL-PL-PST-PRN-PSDC-PRTB-PAN-PT do B-PGT) entra com uma representação contra o governador Paulo Afonso Vieira junto à Corregedoria Regional Eleitoral. Na denúncia, a aliança acusa o candidato à reeleição de abuso do poder econômico, por participar de inauguração de obras públicas, assinaturas de convênios, distribuição de verbas, infringindo o artigo 77 da lei eleitoral 9.504/97. A lei proíbe a presença de candidatos a cargos do Executivo em eventos de caráter eleitoral após 4 de julho.

Agosto – O procurador regional eleitoral Carlos Antônio Fernandes de Oliveira vota pela fundamentação da representação e pede a inelegibilidade do governador pelos próximos três anos.

21 de outubro – Depois de analisar os depoimentos das testemunhas, o corregedor regional eleitoral, desembargador Alcides dos Santos Aguiar, vota a favor da representação e pelo início da aplicação da pena depois da sentença transitada e julgada. O juiz Volnei Ivo Carlin pede vistas ao processo, alegando falta de tempo para analisar a denúncia.

27 de outubro – Carlin vota pela procedência da representação e sugere o início da aplicação da pena após  a eleição em que o abuso foi verificado.

29 de outubro – O juiz Paulo Leonardo Medeiros Vieira vota a favor da representação da Mais Santa Catarina e pela aplicação da punição a partir da data das eleições.

4 de novembro – O juiz Ricardo Teixeira do Valle Pereira vota parcialmente pelo parecer do relator  Alcides dos Santos Aguiar. É pelo início da aplicação da pena a partir da data da eleição de outubro de 1998.

9 de novembro – Depois de pedir vistas ao processo, o Juiz André Mello Filho vota a favor da inelegibilidade do governador. Ele declara-se pelo início da aplicação da pena depois que não couber mais recursos à Justiça eleitoral.

10 de novembro – O último voto é da juíza Rejane Andersen, que acompanha a posição dos colegas do TRE. Ela vota pela aplicação da pena depois de cessados os recursos na Justiça Eleitoral. Com o empate de três a três, o presidente do TRE, desembargador Wilson Eder Graf, opina pela aplicação da pena depois de transitado e julgado o processo.

(A Notícia, 11.11.98, pág. A-5)

Horário: 10:15 horas:

Estava na “sala de reuniões” da Delegacia-Geral e recebi a visita do Delegado Douglas Marreiros (já tinha me telefonado anteriormente...) da Terceira Delegacia da Capital (Estreito). Logo que entrou no recinto percebi seu rosto com marcas de expressão, cabelos quase grisalhos que não escondiam a sua idade, os desgastes que os mais de vinte anos de Polícia lhe impuseram. Estava mais uma vez me procurando para pedir ajuda acerca de sua tese final de curso de pós-graduação na Udesc e o que me chamou a atenção foi que trazia na cintura sua arma que ficava exposta ostensivamente...

Como ele próprio pode observar, havia mudado o título de sua tese em vez de História da Polícia Civil desejava traçar um perfil sobre nossos futuros líderes,  nossos gestores... Durante a sua narrativa já de início procurei externar minha resistência o uso do termo “líder”, também, fiz comentários a respeito do processo de construção de mitos, a fabricação de idolatrias e como o sistema impunha a importação de ícones e o fomento de discursos... Depois de ouvir meus argumentos Douglas deu vazão aos seu estoicismo inicial e eu mesmo assim procurei enveredar no sentido da exponenciação do conhecimento, do ser humano como centro e a necessidade de construção de blocos históricos, a partir do “eu” (autoconhecimento). Douglas reiterou que ele queria tratar do líder como um “coordenador” e acabamos concordando que dependendo das circunstâncias poderia ser válido, sem que isso viesse a gerar uma supremacia sobre os demais membros porque o importante eram as ideias e uma agenda positiva. No curso do nosso diálogo:  

  • ...Hitler, Stalin, Mussoline, Napoleão também foram líderes... (Douglas)
  • ...Sim, é  justamente isso que eu quero mostrar, que é preciso um outro tipo de liderança que não seja o “salvador da pátria”, mas isto sim, a formação de um “bloco histórico” que importe na participação igualitária de todos em função do que ficou acertado, dos objetivos...
  • ...Entendo, é preciso se desconstruir esse tipo de liderança...
  • ...Por exemplo, Douglas, no nosso microespaço de Polícia, uma das coisas que temos que mudar é o modelo de “Corregedoria”. Temos que formar um time de profissionais com afinidades para discutir isso, todos vão participar das discussões sem que ninguém se coloque na condição de superior ou que se imponha algum tipo de hierarquia. Sei que o teu nicho de pesquisas envolve a Corregedoria e na minha visão esse órgão deve se constituir antes de tudo num sistema avançado de informações, em vez de termos uma “DCI” ou outro órgão paralelo que faça isso. Lembro sempre do caso Sérgio Lélio Monteiro, quando eu fazia reuniões lá em Chapecó, isso na época de criação da Fecapoc e da Apoc Regional... Em vez da Corregedoria sair por aí querendo punir ela deveria ter antes de tudo um controle de informações, não vê o que fizeram com o Alcino recentemente? Uma pessoa notoriamente com problemas de saúde metal e acabaram demitindo... Alias, noutro caso muito mais grave o desfecho foi bem diferente...
  • ...Falaste do G., eu trabalhei com ele, quando eu ia fazer um serviço ele vinha e perguntava se eu ganhava para aquilo... Então o que falta para nossos delegados é um comprometimento e por aí tu vê,  está aí o Trilha que é um n. , o Sala que nunca foi Delegado e colocaram o Márcio...(Douglas)
  • Concordo que a Corregedoria tem que ser repensada, tem que ser antes de tudo um órgão de informações e orientação... (Felipe)

(...)”.

No final da conversa entreguei a Douglas um exemplar de meu Estatuto da Polícia Civil – 1998, mostrando  como obter as informações que procurava por meio do índice e o acompanhei até a escada. Antes que ele se fosse, na contramão do que eu tinha me manifestado, recomendei que  refletisse um pouco mais sobre o tipo de perfil que a sociedade espera dos nossos Delegados e que enfrentasse a questão de como é que poderia se proceder para  se preparar futuros líderes dentro do atual modelo de Polícia.  Depois que ele se foi fiquei pensando sobre seus conflitos interiores, as suas mágoas com a instituição e com colegas, mas mesmo assim não perdia a sua empolgação, parecia acreditar piamente no que fazia, pelo que lutava, nas suas verdades e nos seus valores.