Camila Dias de Sousa²

Carlos Eduardo Cavalcanti³

1 DESCRIÇÃO DO CASO

Zaqueu Togarma ajuizou em fevereiro de 2015, ação contra a pessoa jurídica Naftali Investimentos LTDA. uma ação de execução de título extrajudicial objetivando o recebimento da importância de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), representa por título de crédito (cheque) emitido pela devedora. Tal circunstância, segundo o Exequente, caracterizaria a dissolução irregular da sociedade, motivo pelo qual, com amparo no art. 50 do Código Civil, pleiteou a desconsideração da personalidade jurídica e a inclusão de todos os sócios atuais no pólo passivo do feito, bem como de todos aqueles que figuravam como sócios da sociedade devedora à época da emissão do cheque. Juiz determinou, de imediato, a penhora de todos os ativos financeiros dos sócios e ex-sócios de Naftali Investimentos LTDA., via sistema BACEN-JUD.

No entanto, o comando de penhora foi exitoso apenas em relação a Levi Metusael, que teve R$ 30 mil penhorados de uma conta-poupança, R$ 20 mil penhorados de um investimento em plano de previdência privada (modalidade VGBL) e R$ 2 mil de uma conta-corrente. Levi Metusael procura seu advogado e explica que: a) Conforme dispõe a Cláusula Quinta do Contrato Social, desde a constituição da sociedade a administração ficou a cargo do sócio JETRO ZÍPORA, que fazia uso isoladamente da firma NAFTALI INVESTIMENTOS LTDA; b) Ingressou na sociedade em janeiro de 2013, com apenas 2% (dois por cento) das quotas do capital social; e retirou-se da sociedade em novembro de 2014, cedendo a totalidade de suas quotas ao sócio-administrador JETRO ZÍPORA. c) Desconhecia completamente a dívida contraída junto a ZAQUEU TOGARMA e, ao investigar, descobriu que a autoridade policial, via inquérito, havia concluído que o credor teria praticado crime contra a economia popular, tipificado no art. 4o da Lei 1.521/1.951. Isso porque ZAQUEU havia emprestado dinheiro à NAFTALI INVESTIMENTOS LTDA. mediante a cobrança de juros de 20% a.m., constituindo essa operação a origem do cheque em questão (emitido em janeiro de 2014).

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

2.1 Descrição das Decisões Possíveis

- O princípio do devido processo legal foi observado no processo de execução? - O título executivo extrajudicial apontado na exordial é líquido, certo e exigível? - Restaram atendidos os requisitos da desconsideração da personalidade jurídica da NAFTALI INVESTIMENTOS LTDA. para a responsabilização patrimonial dos sócios? - É cabível a penhora do patrimônio de LEVI METUSAEL para a satisfação integral da dívida? - São penhoráveis os recursos de LEVI METUSAEL bloqueados via BACEN-JUD? - Quais medidas judiciais poderiam ser apresentadas para a defesa dos interesses de LEVI METUSAEL nesse momento? - Quais fundamentos de direito processual e material podem ser suscitados na defesa dos interesses de LEVI METUSAEL?

 2.2 Argumentos Capazes de Fundamentar cada Decisão

Primeiramente, se alega que diante do processo apresentado, não se encontrou preenchido os requisitos necessários para a efetividade a respeito do princípio do devido processo legal. Entende-se que o direito dado ao devedor diante da penhora seria primeiramente sua intimação a respeito do feito, dando a devida prestação de sua defesa ou o mínimo conhecimento, já que haverá bloqueio de seus bens. Diante do artigo 652, parágrafo 4º do Código de Processo Civil, que trata da citação do devedor e indicação de seus bens, a intimação do executado deve ser feita na pessoa de seu advogado e, não o tendo, deverá ser feita pessoalmente. Dito isso, Levi Metusael, sendo o único devedor encontrado, deveria antes da “apreensão” de seus bens, ser notificado. Quando apresentada a petição inicial, por se tratar de execução por quantia fundada em título extrajudicial e consequentemente processo autônomo, positivo o juízo de admissibilidade, o executado será citado para que em três dias pague a dívida cobrada.

Cabe observar que o título executivo é requisito obrigatório de admissibilidade no processo de execução, necessário como documento exigido na lei para a instauração do mesmo. De imediato é analisado três pontos a respeito desse título conforme exposto no artigo 580 do CPC: certeza, liquidez e exigibilidade. Primeiramente, analisar-se-á a certeza da obrigação, sendo pré-requisito para o conhecimento das demais. Conforme os conceitos apresentados por Fredie Didier Jr. (JR. DIDIER, p.153-154, 2014), certeza é tratada como ausência de dúvidas a respeito da existência da dívida. Se nota tal conceito no caso descrito, uma vez que é pleiteado o pagamento da obrigação contraída de 500 mil reais. Perante a liquidez, refere-se a determinação de seu objeto, sendo desta forma o valor constante no título (cheque) emitido pela devedora que constitui prova da obrigação. Por fim, entende-se como exigível, o título que necessita do direito à prestação bem como a atualidade de tal dever. Acredita-se que há certeza, há liquidez, porém não há exigibilidade, visto que a natureza da dívida contraída não é lítica pela prática de agiotagem, prescrição e falta de contestação por parte do devedor.

No que tange a desconsideração da personalidade jurídica, entende-se que deve o juiz analisar preliminarmente se esta medida seria a melhor a ser acatada. Somente poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica quando os requisitos do artigo 50 do Código Civil estejam devidamente comprovados, uma vez que decretar a desconsideração calcada em mera presunção, certamente colidirá com o preceito do princípio da autonomia assegurado às sociedades limitadas. Diante de novas decisões dadas pelo Supremo Tribunal de Justiça, exige-se de forma incisiva, prova concreta da fraude alegada pelo credor que pretende a desconsideração da pessoa jurídica para satisfação de seu crédito. “Se assim não fosse, estaria sacrificada a segurança jurídica, de matiz constitucional, com grave ofensa não só à ordem jurídica propriamente dita, mas à economia nacional [...]” (SANCHES, 2014). Entende-se, dessa forma, que a desconsideração requerida no caso descrito deveria ser analisada minuciosamente, necessária para evitar confusões e injustiças diante da relação entre credor e devedor.

 Conforme o que expressa a lei nº 11.382/2006, é permitido o instituto da penhora on line, em que através do Banco Central, autoriza-se o bloqueio de depósitos e aplicações financeiras do executado pela via eletrônica. Segundo os artigos 591 e 592 do Código de Processo Civil, a penhora tem por objeto os bens do patrimônio do devedor bem como o patrimônio de terceiros responsáveis pela obrigação. Diante disso, os bens com expressão econômica tais como corpóreos e incorpóreos podem ser avaliados como penhoráveis, e como explana a situação, determinado caso se tem 20 mil reais de um investimento em plano de previdência e 2 mil reais de uma conta corrente. No entanto, deve ser observado que não cabe penhora diante dos 30 mil reais pedidos de uma conta poupança do devedor. Afirma-se isso devido o rol de bens impenhoráveis classificados no artigo 649 do CPC e em específico ao inciso X, que define: “até o limite de 40 salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança”. Acredita-se como um bem necessário a segurança do mínimo necessário para subsistência do devedor e sua família. Devido a isso somente esta aplicação financeira é protegida, sendo qualquer outro fundo de investimento penhorado, tal como se observa com o plano de previdência privada de Levi Metusael.

A medida que pode ser tomada para a defesa de Levi Metusael, primeiramente, seria a interposição de embargos à execução. Trata-se de uma defesa plenamente aceitável através de petição inicial de acordo com os requisitos dos artigos 282 e 283 do CPC. Tem por finalidade “discutir a validade do título, a inexistência da dívida ou um defeito do procedimento executivo, por exemplo [...] cabe ao embargante o ônus da prova de suas alegações.” (JR. DIDIER, p. 343, 2014).

Posto isso, observa-se que duas são as formas de defesa por parte de Levi Metusael: a indagação acerca da nulidade do título de crédito, bem como sua prescrição. Na presença da prática de agiotagem, ato inquestionavelmente ilícito, o negócio jurídico é nulo de pleno direito desde a sua formação e torna inexigível qualquer pagamento com relação ao título de crédito. A Lei de Usura (Decreto nº 22.626/33) veda a concessão de empréstimo a juros exorbitantes, em que no caso em questão, cobra-se 20% sobre o valor do mesmo. Em um segundo momento defende-se conforme explana Didier, que o cheque somente dispõe de força executiva no prazo de seis meses, contado do esgotamento do prazo de apresentação, que é de trinta dias quando a emissão do cheque for na mesma praça do lugar do pagamento, ou de sessenta dias, quando for de outra praça. Passado esse prazo não se permite mais a execução. Diz-se nesse caso que o cheque está prescrito e caberá ação monitória, porém não a execução.

2.3 Descrição dos Critérios e Valores Contidos em cada Decisão Possível

Diante do caso analisado utilizou-se como base a legislação de Processo Civil que atua no sistema brasileiro, bem como a doutrina através de Fredie Didier Jr. que muito se pronuncia acerca do Processo de Execução e suas generalidades.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Código de Processo Civil. LEI No 5.869, DE 11 DE JANEIRO DE 1973.

JR DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Execução. Salvador: Editora JusPODIVM, 2014.

SANCHES, Sidney. Desconsideração da pessoa jurídica exige prova cabal. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-fev-07/sydney-sanches-desconsideracao-pessoa-juridica-exige-prova-cabal>. Acesso em: 13 de Março de 2015.

 

[1] Case apresentado à disciplina Processo de Execução, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

² Aluna do 7º Período – Vespertino, do Curso de Direito, da UNDB.

³ Prof. Esp., orientador.