A “Demissão é o desligamento do cargo com caráter sancionador. Corresponde a uma expulsão, aplicável nas hipóteses legalmente previstas. Não se confunde com exoneração” (Celso Antonio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo Brasileiro, p. 271).

Perfilando os mesmos passos do jurista Ivan Barbosa Rigolin, esposado na manifestação anterior  [“(...) é um ato jurídico perfeito, que quita de parte a parte – Administração e servidor – todo e qualquer direito pendente, ou expectativa, ou desacerto passível de regularização futura. A aposentadoria corrige pendências até então existentes, apara arestas, arredonda cantos vivos, elimina descompassos como créditos ou débitos recíprocos.  (...)” (Comentários ao Regime Único dos Servidores Públicos Civis, Saraiva, 3a Ed., 1994, SP, p. 231). 

O ato de demissão “é a penalidade máxima a que poderá sujeitar-se o servidor, na esfera administrativa, atingindo-o integralmente em sua condição funcional, que é unilateralmente encerrada através do ato demissório (...)”  (Edmir Netto de Araújo, in ‘O Ilícito Administrativo e seu Processo’, RT, 1994, SP, pág. 200). 

Estabelecendo-se um paralelo com o evento morte que extingue a punibilidade no processo criminal (art. 107, I, CP c/c 62), o ato de demissão importa no desligamento definitivo do servidor, o que faz operar esse mesmo efeito jurídico no campo disciplinar, isto é: servidor demitido  não existe para o serviço público, portanto, uma vez publicado o ato demissionário, por falta de prescrição legal  a extinção da punibilidade é condição elementar para determinar o encerramento dos procedimentos disciplinares contra si instaurados. 

A demissão simples incompatibiliza o servidor para o exercício de cargo ou emprego público, pelo período de 5 (cinco) a 7 (sete) anos, tendo em vista as circunstâncias atenuantes e agravantes  Via de regra os diplomas estatutários dispõem que a "demissão qualificada incompatibiliza o ex-funcionário para o exercício de cargo ou emprego público pelo período de 5 (cinco) a 10 (dez) anos, tendo em vista as circunstâncias atenuantes ou agravantes". 

Registre-se  que os recursos administrativos atacando atos de demissão não produzem efeito suspensivo. Em tese, a hipótese de sobrestamento dos autos - em se tratando servidor policial demitido - só poderá ser admitida nos casos de demissão não definitiva, isto é,  desde que haja manifestação expressa da autoridade competente atribuindo essa condição excepcional (deferimento de liminar em recurso administrativo; anulação do respectivo ato demissionário,  desde que publicada decisão revogatória).

Conforme registrou o Professor Carlos Eduardo Elias de Oliveira:

 “No âmbito do STF, encontram-se precedentes a favor da aplicação da proporcionalidade em caso de demissão (RMS 24129, 2ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 30-04-2012), como também caso a favor dos pareceres vinculantes da AGU (STF, MS 26.023/DF, Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 17/10/2008). Neste último julgado, foi entendido que o fato de o servidor ter usado litros de combustível da repartição pública caracteriza o tipo de utilização de bens públicos em proveito particular (atrativo da demissão), ainda que tenha sido causado prejuízos financeiros baixos ao ente público. Como anotou o Ministro Relator: “O só fato da utilização dos recursos materiais da repartição em questão para fins particulares, especialmente no que se refere ao automóvel, expõe a Administração Pública a danos”. - Opção: tendo em vista a necessidade de observância ao entendimento vinculante no âmbito da Administração Pública, a Comissão poderá servir-se da seguinte técnica: a Comissão enquadra a conduta em outro tipo administrativo que não os do art. 132 da Lei n. 8.112/90, de molde a afastar a pena expulsiva. A propósito dessa opção, diga-se que os tipos disciplinares são, de certa maneira, sobrepostos, ante a sua natureza aberta, de maneira que seria possível, por exemplo, deixar de enquadrar uma ofensa física em serviço no tipo do art. 132, VII, da Lei n. 8.112/90 (que enseja demissão) para encaixá-la no tipo do art. 117, V, da Lei n. 8.112/90 (que atrai advertência ou suspensão), desde que a pena expulsiva releve-se excessiva ante o caso concreto. Acresça-se que tal procedimento é de notória aceitação na comunidade jurídico-disciplinar, do que dá nota este excerto do “Manual de PAD da Controladoria-Geral da União”: “’A solução para evitar injustiças é, ou não abrir o processo - se for possível sustentar a inexistência do ilícito - ou não enquadrar o servidor em uma das hipóteses do art. 132, mas em outro dispositivo legal cuja conseqüência seja uma pena mais branda. Isto é, para que um servidor não seja demitido a solução não é atenuar sua pena, mas sim, se for possível, enquadrar sua conduta num dispositivo da Lei 8.112/90 que não gere demissão, caso contrário não haverá discricionariedade para atenuar a pena. Assim, o princípio da proporcionalidade só pode ser utilizado para evitar a pena de demissão se ele não for invocado para atenuar a pena, mas para mudar o enquadramento para um tipo legal que não gere demissão.’ Vinícius de Carvalho Madeira, “Lições de Processo Disciplinar”, pg. 137, Fortium Editora, 1ª edição, 2008. ‘30) Não pode a autoridade julgadora, sob pretexto de incidência dos princípios da proporcionalidade, da individualização da pena ou da insignificância, enquadrar a conduta do acusado em tipo disciplinar passível do ato vinculado de demissão, mas aplicar, paradoxalmente, penalidade branda, devendo, nessas hipóteses, retipificar os fatos, de forma que haja harmonia entre a infração efetivamente cometida e a correspondente penalidade instituída ou conforme ao estatuto disciplinar de regência. 31) Ainda que favoráveis os parâmetros do art. 128 da Lei federal nº 8.112/1990, não ofende os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena a imposição de penalidade demissória ou de cassação de aposentadoria ou disponibilidade, em face da gravidade da conduta perpetrada pelo servidor, mormente quando existe prejuízo ao erário ou proveito ilícito para o transgressor ou para terceiro em razão da falta.’ Antônio Carlos Alencar Carvalho, ‘Manual de Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância’, pg. 1054, Editora Fortium, 2008, 1ª edição” (grifo nosso)[2] PrecedentesSTJ:

- MS 17.423, 1ª Seção, DJe 4/8/2011 (explicita, na ementa, que “são ilegais os Pareceres GQ-177 e GQ-183, da Advocacia-Geral da União”);

-REsp 866612, 5ª Turma, DJ 17/12/2007 (desproporcional demissão de servidora de 20 anos de carreira, com bons antecedentes, que – após instauração do PAD - devolveu R$ 1.200,000 recebidos a títulos de diárias não gozadas);

- MS 7077/DF, 3ª Seção, DJ 11/06/2001;

- RMS 28.487/GO, 5ª Turma, DJe 30/03/2009 (desproporcional demissão de policial que adquiriu carro “clonado”- de difícil percepção – diante da boa-fé, dos bons antecedente, da falta de prejuízo);

- MS 13.716/DF, 3ª Seção, DJe 13/02/2009 (servidora que usou veículo oficial no percurso residência/trabalho, com boa-fé, ausência de prejuízo, bons antecedentes);

- MS 7077/DF, 3ª Seção, DJ 11/06/2001 (servidora que foi negligente em procedimento licitatório, mas de boa-fé, com bons antecedentes, sem prejuízo ao erário);

- MS 6663/DF, 3ª Seção, DJ 02/10/2000 (servidores que assinaram cheques de origem duvidosa, sem má-fé e em fidelidade à superior hierárquica);

- MS 8693/DF, 3ª Seção, DJe 08/05/2008; RMS 29290/MG, 5ª Turma, DJe 15/03/2010; RMS 16536/PE, 6ª Turma, DJe 22/02/2010; MS 1359/DF, 3ª Seção, DJe 28/05/2010; RMS 24.584/SP, 5ª Turma, DJe 08/03/2010; MS 10.826/DF, 3ª Seção, DJ 04/06/2007; MS 10.828/DF, 3ª Seção, DJ 02/10/2006; MS 10825/DF, 3ª Seção, DJ 12/06/2006; RMS 11034/SP, 6ª Turma, DJe 22/02/2010.

- MS 15810/DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 29/02/2012, DJe 30/03/2012:*

Para ilustrar, cita uma decisão do Estado de Mato Grosso do Sul:

“(...) No caso examinado, tratava-se de MS contra demissão aplicada pelo Ministro da Justiça a servidor do Departamento da Polícia Federal. O servidor foi denunciado em 2004, acusado de participar da gerência de empresa (uma creche) até o ano de 2001. Ficou, no entanto, provado que o impetrante atuara de maneira esporádica. Ao passar no concurso da Polícia Federal em 1998, não se desligou subitamente da empresa que seu pai fundara, mas a transferiu paulatinamente à sua esposa, de quem veio a divorciar-se. A esposa estava a fazer uma gestão desastrosa da empresa, razão por que o servidor praticou alguns atos de gerência para salvar a empresa. Esses atos foram: assinar contrato de empréstimo perante o Banco do Brasil e documentos para pagamento de despesas e impostos. Anota-se que só após 1 ano da posse no cargo é que o servidor tomou ciência da gerência desastrosa de mulher e passou a praticar atos de gerência esporádicos. A autoridade julgadora, todavia, não levou em conta as circunstâncias do art. 12, notadamente a ausência de demonstração de qualquer prejuízo ao serviço público (que, nesse caso, não pode ser presumido), as circunstâncias atenuantes (ditadas pela premente necessidade de evitar um mal maior, que adviria da inadimplência dos compromissos assumidos pela sociedade) e os (bons) antecedentes funcionais do policial” (STJ, MS 18023/DF, 1ª Seção, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, DJe 18/05/2012). *

*Jurisprudências coletadas do artigo do Professor Carlos Eduardo Elias de Oliveira..

 

 

 

 

 

 

JURISPRUDÊNCIA:

 

Demissão – reintegração no cargo decorridos mais de cinco anos:

“(...) Uma vez decorridos mais de cinco anos de sua demissão, não pode mais o funcionário protestar contra o Estado, nem perquirir o procedimento administrativo gerador de sua demissão, porquanto seu  direito foi atingido pela prescrição, nos termos do Decreto n. 20.910, de 1932, e arts. 258 e 259, da Lei n. 4.425/70. Tampouco sua absolvição, por falta de provas, no procedimento criminal instaurado, tem reflexo na decisão administrativa demissionária, porque aquela não exclui a punição administrativa do funcionário quando baseada em inquérito” (Apel. Civ. 88.044332-4, Capital, Rel. Des. Solon d’Eça Neves, DJ 9.748, de 19.6.97, p. 15).

“Mandado de segurança. Servidor público. Demissão. Processo disciplinar. Falta de inquirição de testemunha de defesa. Cerceamento de defesa caracterizado. Desídia não configurada. A testemunha-chave, devidamente apresentada pelo impetrante, deixou de ser ouvida, entendendo a administração que se trataria de medida protelatória do impetrante, sem maiores argumentações, o que caracteriza, plenamente, o cerceamento de defesa (...)” (MS 6900/DF, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ de 04.06.01).

“Administrativo. Processo administrativo. Disciplinar. Demissão. A comissão processante tem o poder de indeferir a realização de diligências inúteis. Contudo, para fazê-lo, deve apresentar sólidos e concretos fundamentos, sob pena de caracterizar-se um ato arbitrário, extremamente lesivo ao direito, constitucionalmente assegurado, à ampla defesa. Recurso provido” (STJ, Rec. Ordinário em Ms n. 12.016, PA, data da dec.: 19.06.01).

“(...) 3. O fato de o ato de demissão conter menção a dispositivos legais reveladores de transgressões diversas e para as quais são previstas penas mais brancas não o vicia. Suficiente é que dele conste a alusão àquele que conduz a pena de demissão. O procedimento do servidor pode ensejar a variedade de enfoques, como ocorre relativamente ao Policial Federal quando o ato praticado provoque escândalo e comprometa a função (VIII), revele descumprimento de leis e regulamentos (XX), negligência (XXIV), atentado, com abuso de autoridade ou, valendo-se desta, a inviolabilidade de domicílio (LVIII) e, ao fim, que o agente se prevaleceu abusivamente, da condição de funcionário público, aspecto a atrair, ao contrário das demais figuras, a pena mais drástica, que é a de demissão (XLVIII) – incisos  do artigo 364 do Decreto n. 59.310/66” (STF, Tribunal Pleno, MS n. 21.297, DF, data da dec.: 28.02.92). 

“(...) O ideal de justiça não constitui anseio exclusivo da atividade jurisdicional. Deve ser perseguido também pela Administração, principalmente quando procede a julgamento de seus servidores, no exercício do poder disciplinar” (MS 12.991/DF, 3ª Seção, DJe 27/5/2009).

 “(...) A via mandamental mostra-se adequada para perseguir a anulação de ato demissional quando se alega e comprova que este mostrou-se excessivo, e não amparado nas provas dos autos. Rejeito a preliminar de inadequação” (Precedente: MS 14.993/DF, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, DJe 16.6.2011).

“(...)É possível anular judicialmente o ato demissional que ocorre em desatenção ao acervo probatório dos autos e com desatenção à proporcionalidade na sanção, sem prejudicar eventual aplicação de diversa penalidade administrativa. Precedente: MS 13.791/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJe 25.4.2011.” (STJ, MS 15810/DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 29/02/2012, DJe 30/03/2012).

“(...) Ao Poder Judiciário não cabe discutir o mérito do julgamento administrativo em processo disciplinar, mas, por outro lado, compete-lhe a análise acerca da proporcionalidade da penalidade imposta, nos termos de farto entendimento jurisprudencial’ (RMS 19.774/SC, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, Quinta Turma, DJ 12/12/05)” (MS 16.385/DF, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/06/2012, DJe 26/06/2012).

 "(...) A Administração Pública, quando se depara com situações em que a conduta do investigado se amolda nas hipóteses de demissão ou cassação de aposentadoria, não dispõe de discricionariedade para aplicar pena menos gravosa por tratar-se de ato vinculado" (MS 15.517/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 18.2.2011). No mesmo sentido: MS 16.567/DF, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 18.11.2011). No mesmo sentido: MS 15.951/DF, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe 27.9.2011” (STJ, MS 12.200/DF, 1ª Seção, DJe 03/04/2012).

“(...) Não está configurada afronta aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, visto que, por força do disposto no art. 132 da Lei 8.112/90 e dos fatos apurados, à autoridade administrativa não cabia optar discricionariamente por aplicar pena diversa da demissão. Precedentes: MS 15.437/DF, Min. Castro Meira, DJe de 26/11/2010;  MS 15.517/DF, 1ª Seção, Min. Benedito Gonçalves, DJe de 18/02/2011”(STJ, MS 17.515/DF, 1ª Seção, DJe 03/04/2012).

“(...) Sobre a razoabilidade e proporcionalidade da pena aplicada esta Corte vem se posicionando no sentido de que, no âmbito do controle jurisdicional do processo administrativo disciplinar, é vedado ao Poder Judiciário adentrar no mérito do julgamento administrativo, cabendo-lhe, apenas, apreciar a regularidade do procedimento, à luz dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Precedentes: RMS 32.573/AM, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 12/8/11; MS 15.175/DF, Rel. Min. Humberto Martins, Primeira Seção, DJe 16/9/10; RMS 20537/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ de 23/4/07. 4. No caso em análise, tendo-se aplicado a sanção após efetivo exercício da garantia ao contraditório e à ampla defesa, e estando a decisão fundamentada na constatada gravidade dos fatos e os danos que delas provieram para o serviço público,  a análise da proporcionalidade implicaria indevido controle judicial sobre o mérito administrativo.” (STJ, RMS 33.281/PE, 1ª Turma, DJe 02/03/2012).

“(...) É possível anular judicialmente o ato demissional que ocorre em desatenção ao acervo probatório dos autos e com desatenção à proporcionalidade na sanção, sem prejudicar eventual aplicação de diversa penalidade administrativa. Precedente: MS 13.791/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJe 25.4.2011. 8. Prejudicado o agravo regimental. Segurança parcialmente concedida”.