PRINCÍPIOS E MECANISMOS DA GESTÃO DEMOCRÁTICA

                                                                                   Por Paulo Marcos Ferreira Andrade

Democracia é oportunizar a todos o mesmo ponto de partida. Quanto ao ponto de chegada, depende de cada um.

Fernando Sabino

Entendo que este seja um tema pertinente ao momento em que vivemos em nosso país e porque não dizer a especificidade de Mato Grosso na luta pela valorização profissional. Estamos em clima de Conferencia da educação- II CONAE- e nas etapas escolares, municipais e intermunicipais, o que mais se fala é a respeito da democracia na educação.

Este é pois o momento oportuno para o debate, para o diálogo sobre a democracia, todavia é preciso entendermos está uma questão processual e fruto de lutas que duram mais de 500 anos em nosso país, marcado pela oligarquia burguesa que insiste em decidir os destinos da nação.

A democracia na educação está além dos muros da escola, perpassa os processos políticos e culturais que se ativam na história do povo brasileiro. Por isto é um processo de democratização atrelados as práticas pedagógicas democráticas. Não sei se isto ficou muito claro, mas é o que flui para mim. Uma coisa é democratizar a educação outra bem diferente e ter práticas democráticas na educação. E se lançarmos o nosso olhar ao sistema, às práticas, ás politicas veremos que o resultado será um tanto paradoxal. 

Quando penso em princípios e mecanismos da gestão democrática não consigo nortear meu raciocínio sem pensar nos seguinte elementos que julgo serem setas no caminho para o entendimento desta questão: Acesso universal; Qualidade de ensino, Gestão democrática.

Partindo daí em síntese podemos perceber que a historicidade da educação no brasil, nos mostra um a um quadro estarrecedor. Tivemos 210 anos de educação Jesuítica, cujos objetivos era ensinar ler e escrever com base meramente na fé e não no princípio de direito. A educação era centrada em dogmas e a igreja decidia o que os índios podia e deviam aprender.

De 1760 a 1808 o Marques Pombal expulsa os jesuítas e passa a organizar escolas para servir ao Estado, e a educação passou a ser, rigorosas, com professor único, sargentos das milícias militares como professores nos colégios para substituir os jesuítas.

Em 1821 D. João VI volta a Portugal. Em 1822 seu filho D. Pedro I proclama a Independência do Brasil e, em 1824, outorga a primeira Constituição brasileira. O Art. 179 desta Lei Magna dizia que a "instrução primária é gratuita para todos os cidadãos". Parece um tanto irônico a o vislumbre da nossa Constituição Imperial de 1824, art. 179, XXXII, como direito dos mesmos a instrução primária gratuita para os cidadãos.O art. 6º da mesma Constituição define como cidadãos brasileiros os que no Brasil tiverem nascido, quer sejam ingênuos (nasceram livres de pai livres) ou Libertos (alforriados). Não reconhece os escravos como cidadãos. Educação restrita à população urbana e europeia.

Aí vem a primeira república e estabelece um sistema dual de ensino – pensando em universalização, embora não era este o termo- a educação das elites dirigentes (bacharéis, letrados) e a educação do povo livre e pobre (origem da escola pública). Mas só com o manifesto dos pioneiros em 1932 é que temos laicidade do ensino, implantação e expansão da escola pública, igualdade dos sexos no direito à educação e oferta estatal obrigatória, universal e gratuita.

...desprendendo-se dos interesses de classes, a que ela tem servido, deixa de constituir um privilégio determinado pela condição econômica e social do indivíduo, para assumir um “caráter biológico”, com que ela se organiza para a coletividade em geral, reconhecendo a todo o indivíduo o direito a ser educado até onde o permitam as suas aptidões naturais, independente de razões de ordem econômica e social. (Manifesto dos Pioneiros, p.33)

Faço este breve relato para que se possa entender que a escola pública foi e tem sido uma conquista diária dos cidadãos brasileiros. Pois todo este processo culmina em 1988 quando a educação torna-se o primeiro dos direitos sociais (art. 6º.), o ensino fundamental, gratuito e obrigatório, ganha a condição de direito público subjetivo para todos, os sistemas de ensino passam a coexistir em regime de colaboração recíproca, a gestão democrática torna-se princípio dos sistemas públicos de ensino e a gratuidade, em nível nacional e para todos os níveis e etapas da escolarização pública, se torna princípio de toda a educação nacional. O texto constitucional reconhece o direito à diferença de etnia, de idade, de sexo e situações peculiares de deficiência.

Em uma paráfrase externamos o pensamento de Argucio, (2012, p. 17) dizendo que a partir deste momento histórico surge a cooperação e a colaboração entre os níveis de governo em um dos mais recorrentes problemas da educação nacional, razão pela qual a nossa Constituição Federal de 88 alerta sobre o Regime de Colaboração.   

O fundamento constitucional pressupõe que por meio do Regime de Colaboração as relações interfederativas não decorram mais de processos hierarquizados e sim através do “respeito aos campos próprios das competências assinaladas, mediadas e articuladas pelo princípio da colaboração recíproca e dialogal” (Cury, 2012, p. 38).

“[...] Regime de Colaboração significa compartilhar competência políticas, técnicas e financeiras para execução de programas de manutenção e desenvolvimento da educação, de forma a concertar a atuação dos entes federados sem ferir-lhes a autonomia [...]” (PDE, 2008, p.10).

Então surge o sistema nacional de ensino como articulador dos sistemas pautando-se nos seguintes princípios:

  • O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
  • Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
  • Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
  • Pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
  • Gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
  • Valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial;
  • Ingresso do profissional exclusivamente por concurso público de provas e títulos;
  • Gestão democrática do ensino público, na forma da lei Garantia de padrão mínimo de qualidade.

Depois desta breve reflexão tendo em vista o que diz o artigo 26 da CF “Gestão democrática do ensino público, na forma da lei Garantia de padrão mínimo de qualidade” resta nos agora apontar os limites e possibilidades da gestão democrática frente às ações previstas em lei e aquelas que efetivamente acontecem na escola.

Os textos em estudo apontam a gestão democrática na escola como um processo de efetiva participação, não apenas nas realizações de tarefas, mas nos processos decisórios, por este a primícia da gestão ao meu ver. Sabe-se gerir democraticamente é romper com cultura que esta arraigada em nossa formação, então esta terá que ser uma tomada de decisão pessoal antes de tudo. Sou democrático por decidi e compreendi ser este o melhor jeito de administrar. O limite da gestão democrática está exatamente no ‘eu’, na minha prática de gestor. Daí a necessidade de romper com as velhas tradições, isso é conflituoso.

Uma outra questão muito séria é a colaboração, gerir democraticamente é ter claro o papel e a responsabilidade de cada numa escola pública que historicamente foi pensada para a pobreza. Estar em uma democracia não significa não ter uma hierarquia. Todo poder é hierárquico do contrário é ditador. Mas isso nos leva a pensar em questões proeminentes que são apontadas no texto “Gestão escolar democrática: definições, princípios e mecanismos de implementação” que assim se apresentam:

  • Autonomia da escola;
  • Financiamento das escolas;
  • Escolha dos dirigentes escolares;
  • Criação de órgãos colegiados;
  • Construção do PPP;
  • Participação da comunidade.

Os autores fazem de forma salutar a alusão aos itens acima citados como princípios da efetivação da gestão democrática na escola enfocando “participação da comunidade escolar e a garantia de financiamento das escolas pelo poder público”.

Lembro-me do vídeo “aprendendo a aprender” acho que é bem isso aí, temos que aprender a aprender a gerir democraticamente. Pois a “idéia básica é a da gestão como um processo de idas e vindas, construído por meio da articulação entre os diferentes atores, que vão tecendo a feição que esse processo vai assumindo.

Isso só possível na convivência, na experiência, é algo que nunca está pronto mas pode ser construído sempre em espaços de discussão e deliberação coletivos. A escola pública brasileira vive este momento ímpar de participação popular organizada sem a qual não faz democracia.

Acho que temos avançado, porém precisamos ainda mais em termos de garantias de financiamento e de participação coletiva compromissada.

Referencias

BUSS, A. M. B. Entidades de gestão democrática. SED, 2008.

BARROSO, J. O reforço da autonomia das escolas e a flexibilização da gestão escolar em Portugal. In: FERREIRA, N. (org.). Gestão democrática da educação: atuais tendências, novos desafios. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2000.

 CANARIO, Rui. A escola tem futuro? Das promessas às incertezas. Porto Alegre: Artmed, 2006.

DOURADO, L. F. A escolha de dirigentes escolares: políticas e gestão da educação no Brasil. In: FERREIRA, N.(org). Gestão democrática da educação: atuais tendências, novos desafios. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2000.

Documento Referência II CONAE

FERREIRA, E. B. A organização da instituição de ensino após a LDB/1996 e as condições do trabalho pedagógico. Disponível

www.coordenacaoescolagestores.mec.gov.br/ufsc Acesso em 05/09/2013.

http://pacto.mec.gov.br/