Princípios de Comportamento Animal Parte I
Por Romão Miranda Vidal | 01/03/2010 | SociedadeRastreabilidade: princípios de comportamento animal (Parte I)
Este artigo é uma adaptação e tradução de uma trabalho científico produzido pelo Dr. Temple Grandin, do Departamento de Ciência Animal, da Universidade Estadual do Colorado, Fort Collins, Estados Unidos
O que nos propusemos após termos pesquisado vários assuntos relacionados com o BEM ESTAR ANIMAL, foi buscar algumas informações básicas e necessárias sobre o COMPORTAMENTO ANIMAL, para podermos então obter uma idéia mais generalizada do assunto. Ou seja, não se pode chegar a uma conclusão real sem saber o princípio básico. Isto equivale a afirmar que se não soubermos como e qual é o correto COMPORTAMENTO ANIMAL, dificilmente estaremos em condições de ofertar e praticar o devido BEM ESTAR ANIMAL.
Vamos deixar bem claro que este artigo não é de nossa autoria, mas sim do Dr. Temple Gradin.
Nas últimas décadas do século XIX os cowboys norte-americanos manejavam e levavam tranqüilamente o gado bovino em grandes lotes que partiam do Texas até Montana. Na sua lida diária o vaqueiro Andy Adams escreveu o seguinte: "Rapazes, o segredo de conduzir o gado é que eles nunca se dêem conta de que estão sendo obrigados a serem conduzidos. Que todo o gado o faça de forma voluntária".
Desafortunadamente, os métodos tranqüilos e sossegados do princípio do século XX foram caindo no esquecimento e os vaqueiros mais modernos se tornaram mais rudes, trazendo com isto resultados ruins, com repercussão direta nos animais. Na atualidade, os pecuaristas mais avançados sabem muito bem que a redução do estresse dos animais melhora, por sua vez, a produção e a segurança dos animais, assim como dos vaqueiros.
Motivados pelo medo
Os bovinos, a exemplo das outras espécies animais herbívoras que vivem em manadas, como os cavalos, são animais classificados como sendo animais de presa. O medo faz com que se mantenham em permanente vigilância para poder escapar e se defender dos predadores. O medo é um grande fator de estresse. O medo pode elevar os níveis de hormônios associados com o estresse em comparação com os fatores físicos adversos. O medo é que leva o gado bovino a se movimentar quando em operações de manejo, seja para operações de vacinações, vermifugação, banhos, castração, marcação, pesagem, transferências de pastagens. Em relação a esta última operação, os animais tendem a se acostumar com o manejo referenciado. Existe uma razão para tal. Os circuitos cerebrais que controlam os comportamentos originados pelo medo já são hoje conhecidos, devido aos estudos realizados por Ledoux e Rogan em 1996.
Os boiadeiros que trabalham com gado de corte em regime a campo se convenceram que o manejo calmo, durante as operações de vacinações ou outras que impliquem a concentração de um grande número de animais na central de manejo, faz com que os animais retornem mais rapidamente ao sistema de alimentação. Estas operações feitas com calma, sem alaridos, gritos, presença de cachorros e uso de instrumentos contundentes, diminuem o estresse animal e a liberação de hormônios como a adrenalina. Os animais quando estão ou são submetidos a operações agitadas e violentas, em especial na central de manejo, em geral apresentam uma perda de peso, em especial quando permanecem por longo período confinados neste ambiente, que não lhe é agradável. Já quando o manejo é planejado e os animais permanecem o mínimo necessário, os resultados são melhores e a perda de peso é insignificante.
A percepção do animal herbívoro
A visão
Para evitar os predadores, o gado bovino tem um campo de visão amplo e panorâmico, que abrange os 360º. A visão nos bovinos é mais acentuada que a audição. O bovinos podem distinguir as cores (Thines e Soffie, 1977: Darbrowska e outros 1981: Gilbert e Arave, 1986: Arave 1996). As últimas investigações demonstram que os bovinos, ovinos e caprinos têm uma visão dicromática, com bastões de máxima sensibilidade a luz amarela esverdeada e azul-purpúrea. Estudos feitos com cavalos demonstram que estes animais podem distinguir a cor roxa e azul da cinza, mas não diferenciam o verde do cinza. A visão dicromática pode servir para que os cavalos tenham uma melhor visão noturna e possam detectar alguns movimentos, inclusive de predadores.
Em bovinos reprodutores machos quando em idade adulta, a visão, quando comparada com ovelhas, é inferior.
Os animais herbívoros podem enxergar em profundidade. Os cavalos são sensíveis a indicadores de profundidade visual (Keil, 1996). Sem dúvida, por razões naturais, os cavalos param e baixam a cabeça para poder perceber a profundidade do seu campo visual. Isto explica porque muitas vezes param bruscamente, quando enxergam sombras no chão. Observações realizadas indicam que os bovinos não podem perceber objetos localizados acima da linha da sua cabeça, a não ser quando estão em movimento. O pesquisador Smith, no ano de 1998, sustenta através de pesquisas e estudos realizados com bovinos, que em função destes animais possuírem pupilas horizontais, podem perceber melhor as linhas horizontais e que a maioria dos seus predadores possuem pupilas redondas, o que lhe favorece a tomada de posições defensivas e de fuga. Investigações realizadas com cavalos indicam que existe uma banda de sensibilidade na retina, em lugar de uma FOVEA central como existe nos humanos (Saslow, 1999). Isto permite manter um baixo controle visual ao seu redor, mesmo quando estão pastoreando com outros animais.
Os animais bovinos possuem um sistema ótico muito sensível a qualquer movimento e aos contrastes de luz e sombras. São capazes de visualizar permanentemente o horizonte quando estão pastando, mas podem apresentar dificuldades para visualizar rapidamente, ou melhor, para enfocar rapidamente a sua visão em objetos muito próximos, devido ao fato de que seus músculos oculares são débeis (Coulter e Schmidt, 1993). Tal fato explica porque estes animais se assustam quando algo se move repentinamente ao seu redor. Os ungulados selvagens, o gado bovino e os eqüinos, em geral, se adaptam e respeitam uma forma de contenção compacta, e dificilmente investem ou tentam atravessar esta barreira (curral) em desabalada carreira.
Quando se trata de "encurralar" animais muito bravos e nervosos, criados em regime extensivo, uma maneira sugerida é o uso de pedaços ou cortes de plásticos opacos (Fowler, 1996). Quando se faz uso de currais construídos com cordoalhas, cabos de aço ou arames trançados, os animais em geral apresentam alguma dificuldade em enxergar este tipo de obstáculo, e muitas vezes ao tentar se movimentar em linha reta, batem contra estes obstáculos. Uma solução para quem se utiliza deste tipo de material de contenção em sua central de manejo, é o uso de alguns quadrados de lona plástica de cor opaca, medindo 30 centímetros quadrados, pendurados nas cordoalhas, a altura dos olhos dos animais. Este expediente evita que os animai sofram algum tipo de contusão e escoriações ao se aproximar de um vão, o qual não enxergam a presença das cordoalhas ou similares (Ward, 1958).
Uma prática que pode beneficiar e diminuir o estresse dos bovinos, quando manejados em período noturno, em uma central de manejo, é lhes proporcionar um grau de luminosidade confortável. Os bovinos tendem a se movimentar de lugares com menor grau de luminosidade para locais mais iluminados. Mas isto não significa afirmar que eles se aproximarão de uma luz muito intensa, pois isto viria a lhes oferecer um desconforto visual.