POSICIONAMENTO DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO FRENTE AO SÓCIO NOCIVO

 

 

 

 

Geraldo Lucas do Amaral Júnior[1]

 

 

 

 

Resumo: O condomínio edilício tratar-se de uma inovação bem aceita e agregada pela sociedade, que já incorporou em seu cotidiano a presença de prédios e aranhas-céus. Mas a convivência, muitas vezes não ocorre de forma pacifica até mesmo pela proximidade de unidades autônomas e diferentes culturas. O Código Civil de 2002 inovou ao disciplinar sobre multa a ser aplicada ao condômino que reiteradamente deixa de cumprir seus deveres, bem como aquele que mantém comportamento antissocial, no entanto, se omitiu ao não regular penalidades mais severas, quando não surtir efeitos a multa. Através de um estudo sobre a função social será demonstrada a possibilidade de limitação do direito de propriedade daquele que se tornou um problema para o condomínio edilício.

Palavras-chave: Condomínio edilício. Condômino nocivo. Ineficácia da multa. Possibilidade de exclusão condômino nocivo.

Sumário: 1 Introdução – 2 Condomínio edilício - conceito geral – 2.1 Direitos e deveres dos condôminos– 3 Administração do condomínio edilício – 3.1 Da convenção e do regimento interno – 4 Condômino nocivo – 4.1 Da penalidade consistente em multa – 4.2 Exclusão - 5 Conclusão

 

 

 

 

 

 

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

A propriedade outrora considerada um direito subjetivo quase que absoluto, hoje evoluiu ao ponto de se transformar em direito subjetivo relativo e limitado, que visa atender os interesses particulares, bem como uma função social coletiva, o que gera uma relação complexa, de reciprocidade e fluidez[2].

No entanto, mesmo com a evolução do conceito de propriedade ainda existe um conflito entre este instituto e o instituto do condomínio, o qual visa possibilitar que o direito dominial seja exercido por mais de uma pessoa. Nesse sentido:

Dá-se condomínio, quando a mesma coisa pertence a mais de uma pessoa, cabendo a cada uma delas igual direito, idealmente, sobre o todo e cada uma de suas partes. O poder jurídico é atribuído a cada condômino, não sobre uma parte determinada da coisa, porém sobre ela em sua integralidade, assegurando-se a exclusividade jurídica ao conjunto de comproprietários, em relação a qualquer pessoa estranha, e disciplinando-se os respectivos comportamentos, bem como a participação de cada um em função da utilização do objeto. (PEREIRA, 2011, p. 151)

Assim, a figura do condomínio pode ser vista como um estado anormal da propriedade, em virtude do aparente conflito existente entre uma das principais características da propriedade, tido como exclusiva e o condomínio, onde várias pessoas possuem o domínio.

No entanto, o direito é mutável e evolui com o dinamismo do homem, que tende a adaptar-se às facilidades e aprimorar as novidades impostas pela realidade social[3], o que faz com que mesmo se contrapondo aos princípios do direito de propriedade regulamenta o ordenamento jurídico o instituto do condomínio.

Sobre o condomínio devemos ter em mente:

O condomínio, por sua vez, funda-se numa relação de igualdades que se limitam reciprocamente na medida em que coexistem direitos iguais sobre a mesma coisa. Ou seja, quando mais de uma pessoa tem o exerc´cio da propriedade (total e única) sobre determinado bem, o que justifica as denominadas comunhão ou compropriedade (domínio conjuto). Isto é, vários sujeitos ativos (cotitulares) exercem os poderes em relação ao direito de propriedade que é único (propriedade indivisa). (SOARES, 2010, p. 488)

O Código Civil brasileiro de 2002 regula expressamente este instituto, dividindo em condomínio geral, que por sua vez se subdivide em voluntário e necessário e, condomínio edilício. Apresentando este como uma novidade aceita pelo homem, qual seja, morar em prédios de apartamentos.

Tratado como uma nova modalidade de condomínio, o condomínio edilício caracteriza-se pela apresentação de uma propriedade comum no lado de uma propriedade privada[4]. Cada condômino ao lado é titular, com exclusividade, da unidade autônoma e titular de partes ideais das áreas comuns[5].

Justamente por caracterizar-se pela conjugação de propriedade privada e propriedade exclusiva é que devemos lembrar que para tal instituto fluir como delibera o Código Civil de 2002, o comportamento dos condôminos é essencial para a administração do condomínio edilício, uma vez que todos poderão gozar de suas partes exclusivas ou particulares, desde que atendidas as funções estabelecidas para o condomínio, assim, como todos terão de conviver em partes coletivas.

O Código Civil de 2002 regulou os principais pontos sobre a administração do condomínio, no entanto, devemos lembrar que cada ser humano tem suas particularidades e muitas vezes, os síndicos vão deparar com aquele condômino que insiste em não obedecer as regras comuns a todos, gerando transtornos, fazendo que a ordem do condomínio seja abalada.

Assim, como deve agir o condomínio perante esse condômino que insiste em perturbar a ordem do condomínio, quais as penalidades permitidas, qual a forma adequada para sua aplicação, sem que os direitos desse condômino sejam infringidos. A busca pelas respostas para essas questões é justamente o que objetiva este artigo.

2 CONDOMÍNIO EDILÍCIO – CONCEITO GERAL

 

Trata-se de uma modalidade de condomínio surgida depois da Primeira Guerra Mundial, o que justifica a ausência de qualquer menção sobre esse assunto no Código Civil de 1916, mas apenas no chamado novo Código Civil de 2002.

Essa modalidade de propriedade se desenvolveu rápido diante do crescimento acelerado dos grandes centros urbanos, que gerou a necessidade de melhor aproveitamento do solo, surgindo o condomínio em edifícios de apartamentos por diversos motivos.

[...]Em primeiro lugar, devido ao melhor aproveitamento do solo, redundando, destarte, indiretamente, no seu barateamento. Em segundo lugar, porque se torna mais econômica a edificação, combatendo assim a elevação do custo de vida mercê da aquisição de grandes quantidades de materiais. Em terceiro lugar, porque facilita obtenção da casa própria, que a todos interessa fomentar, como poderoso elemento de coesão familiar. [...] Em quarto lugar, finalmente, com sua edificação, possibilitou-se a fixação dos respectivos donos nas imediações dos locais de trabalho. (MONTEIRO, 2011, p. 282)

Assim, diante da grande aceitação o Código Civil de 2002 regulamentou o condomínio edilício em Capítulo próprio, artigos 1.331 a 1358.

Quanto à natureza jurídica do condomínio edilício trata-se de matéria controvertida, no entanto, como não é objeto do nosso trabalho, aliamos às palavras de Caio Mário da Silva Pereira, quando supera as inúmeras teorias que foram ao longo do tempo surgindo em busca de explicação para sobreposição de propriedades privadas e coletivas, para concluir que o condomínio edilício explica-se por si mesmo.

Prevalece o entendimento de que o condomínio não tem personalidade jurídica, a qual deixou de ser regulada pelo Código Civil de 2002, mas está legitimado para atuar em juízo, ativa e passivamente, representado pelo síndico, em situação similar à do espólio e da massa falida[6] (CPC, art. 12, IX).

O condomínio edilício apenas se institui por atos entre vivos ou testamentos, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, obedecendo a requisitos legais[7].

Após analise dos dispositivos que regulam a instituição e constituição do condomínio edilício, Maria Helena Diniz (2011, p. 244) conclui que pode um condomínio em edifícios de apartamento ser instituído em razão de: a) destinação do proprietário do edifício, mediante escritura pública, sendo que a venda das unidades autônomas pode ser realizadas antes ou depois de concluída a obra; b) incorporação imobiliária, que é o negócio jurídico que tem o intuito de promover e realiza a construção para alienação total ou parcial; c) testamento; d) constituição do regime por vários herdeiros, após a homologação da partilha; e) arrematação em hasta pública, doação, ou compra de frações do edifício e, f) sentença judicial em ação de divisão.

2.1 Deveres e Direitos dos Condôminos

A Lei Civil, as convenções e o regimento interno regulam obrigações positivas e negativas dos condôminos á luz da garantia constitucional da propriedade e dos princípios da razoabilidade, dos direitos de vizinha, da supremacia do direito coletivo sobre o individual e da função social da propriedade[8].

O Código Civil regulamentou os direitos dos condôminos no artigo 1.335 e seus incisos[9], no artigo 1.338[10] e no § 2º do artigo 1.339[11], dentre eles, destaca-se: uso, gozo e disposição da unidade autônoma; uso da parte comum, direito esse limitado pela convenção ou pelo regimento interno, vez que deve ser observada a destinação das partes dos condôminos e, exercer o direito de voto se estiver em dia com as contribuições condominiais.

Dentre os direitos dos condôminos e à luz do tema do nosso estudo, deve-se ater à utilização das áreas autônomas e coletivas, visando resguardar os direitos dos demais condôminos.

Com efeito, acerca das partes comuns sobrevém o necessário equilíbrio a fim de evitar que um condômino (proprietários e possuidores) gere incômodo a outros ou impeça o acesso e uso do que é comum, por parte de todos, em benefício das normas de convivência e da legítima destinação econômica da coisa. (SOARES, 2010, p. 496).

No que tange aos deveres, o Código Civil de 2002 os disciplinou no artigo 1.336, seus incisos e parágrafos[12].

Assim, cabe tanto na utilização das partes autônomas quanto nas coletivas a ordem da boa vizinhança.

3 ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO

A administração do condomínio será exercida pelo síndico, pelo conselho fiscal e pelas assembleias gerais, que terão como norma primeira a convenção e o regimento interno.[13]

Nos artigos 1.347 a 1.356 o Código Civil em vigor regula a administração dos condomínios edilícios, onde especifica a atuação do síndico e da assembleia geral.

O síndico poderá ser nomeado entre os condôminos ou não e é eleito para defender os direitos e interesses comuns dos condôminos, podendo ser remunerado ou não pela prestação do serviço. O mandato perdurará pelo prazo de 02 anos, podendo ser renovado, nos termos do artigo 1.347 do CC e, fica o sindico ainda responsável em convocar a assembleia geral e representar, ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, o condomínio.

O conselho fiscal será formado por três membros eleitos pela assembleia, com mandato não superior a dois anos, ao qual compete dar parecer sobre as contas do síndico (art. 1.356 do CC).

A assembleia geral é constituída por todos os condôminos e é através dela que serão deliberadas questões referentes à administração do condomínio, no que tange àquelas não abarcadas pelo síndico. O Código Civil de 2002 traz várias questões que apenas podem ser decidas pela assembleia geral, com quorum especificado em cada caso, sendo que nos demais não previsto em lei, será o quorum definido pela convenção. Nesse ínterim, a Assembleia Geral é o órgão deliberativo e soberano do condomínio.[14]

3.1 Da convenção e do regimento interno

O Código Civil exige a convenção constitutiva do condomínio para sua existência[15]. A convenção de condomínio e o regimento interno são vinculativos para os condôminos, individualmente considerados, para as assembleias, para o síndico e para o conselho fiscal[16].

A Convenção de Condomínio, como direito estatutário da comunidade (Gurvitch) ou direito corporativo (Planiol, Ripert et Boulanger), contém precipuamente as disposições que condizem com o particular interesse dos condôminos, que têm a liberdade de estipular o que melhor lhes convenha, desde que não transponha as disposições imperativas ou proibitivas da lei. (PEREIRA, 2011, p. 163)

Ressalta-se que as cláusulas estipuladas pela convenção que ultrapassarem os limites da lei, não geram efeitos[17], facultando ao condômino prejudicado a ajuizar ação anulatória. Assim, tratando-se de um regramento de natureza privada, em regra é lícita a estipulação de todas aquelas normas que não se confrontarem com as normas de ordem pública em sentido lato.

A Convenção pode revestir a forma pública, ou ser redigida por instrumento particular. Se for aprovada em Assembleia Geral, a Ata respectiva, firmada pelo quorum mínimo de dois terços, é válida como instrumento particular.[18]

O regimento interno posiciona abaixo da convenção de condomínio e deve zelar em não provocar conflito de regras, sendo utilizado como instrumento complementar à convenção, regulamenta matérias de interesse geral dos coproprietários, nas questões de menor importância. O descumprimento de suas regras acarreta aplicação das penalidades previstas na convenção, bem como na legislação pertinente.

As regras dispostas na convenção, bem como no regimento interno podem ser alteradas, sendo que para a primeira necessário se faz a aprovação de 2/3 dos condôminos.[19]

Assim, tem-se que é através da convenção e do regimento interno, onde todos os condôminos possuem direito de voto proporcional às frações ideais, no solo (em regra), que surgem limitações que devem estar de acordo com os direitos inerentes à propriedade, visando alcançar sua função social frente ao condomínio edilício sem limitar qualquer direito, até porque os regramentos privados não prevalecem sobre as normas de ordem pública.

4 CONDÔMINO NOCIVO

 

As regras estipuladas pelos condôminos em convenção visam resguardar a função social do condomínio edilício, seja na utilização das unidades autônomas, seja nas unidades coletivas.

Essa função social não deve ser vista como uma limitação do direito de propriedade, mas pelo contrário, deve ser tido como uma busca desse direito, uma vez que atendida a função social da propriedade, o proprietário passa a ser titular do direito de ter sua propriedade protegido pelo ordenamento jurídico.

Nesse liame, tem-se que as regras estipuladas na convenção buscam estipular um conteúdo mínimo para o alcance da função social da propriedade exigida de sua unidade autônoma.[20] No entanto, deve se ater a questão de que algumas limitações podem ser interpretadas como limitação do direito de propriedade. Mas, vale ressaltar que a função social busca a harmonia entre aqueles que integram o condomínio edilício.

No entanto, os conflitos não deixam de existir por diversos fatores.

No condomínio, seja ele de qualquer natureza, a coexistência, o convívio, o desfurte de áreas comuns e mesmo a utilização da própria parte individualizada de cada condômino sempre trarão conflito, ainda que pequeno, porque as diferenças de educação, condição financeira, dentre outras, produzem reações diversas nas pessoas, motivo pelo qual deve haver uma normatização interna para disciplinar as condutas e comportamentos daquela comunidade, sem que tais normas conflitem com as gerais impostas a toda a sociedade. (AMORIM, 2005, p. 186)

Assim, as regras estabelecidas pela convenção são obrigadas a todos os condôminos, familiares, empregados, etc., sob pena de punição nos termos legais.

O uso anormal da propriedade condominial pode se traduzir em abusivo ou nocivo. O uso abusivo traduz naquele comportamento que tem por finalidade apenas de causa dano a outrem, enquanto o nocivo é aquele capaz de prejudicar o vizinho no seu sossego, salubridade, saúde e segurança.[21]

Constatado o uso anormal da propriedade por um condômino, cabe a administração de o condomínio fazer cessar as intervenções, através de limitação ou impedimento da utilização nociva ou abusiva do bem.

4.1 Penalidade consistente em multa

 

A penalidade expressa no Código Civil tanto em caso de reiterado descumprimento pelo condômino de seus deveres, quanto comportamento antissocial, é a multa.

Trata-se de uma inovação que não tem correspondência no Código Civil de 1916 nem na lei 4591/64 que trata especificamente do condomínio e incorporação imobiliária.

O caput do art. 1.337 abrange todos os deveres do condômino, portanto, apresenta-se de forma mais ampla que o anterior 1.336, vem alcançar não somente o condômino, mas todas as pessoas a ele vinculadas, como também o possuidor direto. Há discussões no sentido da solidariedade do condômino e demais ocupantes frente ao condomínio, devendo o caso ser analisado de forma concreta, ver que ocorrera situações em que a multa ficara vinculada apenas ao ocupante infrator[22].

Para aplicação da multa, faz-se necessário a existência de fatos reinterados, ou seja, o condômino resiste a cumpri com seus deveres perante o condomínio, no entanto, será compelido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, apenas através de assembleias deliberadas de ¾ dos condôminos restantes, este caso todos devem ser convocados, mas serão excluídos da votação os condôminos cuja conduta esta sendo apurada, bem como aqueles que se encontra em atraso com suas obrigações condominiais.

Quanto à reincidência, vale resaltar que a pratica deve persistir por novo lapso temporal que configura a reiteração do ato.

No que tange ao lado da multa, o artigo é taxativo até ao quíntuplo, portanto, ilegalmente estará agindo aquele que arbitrar valor superior ao previsto em lei. Assim, como não pode a convenção ou assembleia deliberar em sentido contraria, ate por que tal penalidade já esta prevista em lei e não regulada pelas normas internas do condomínio, basta que a conduta seja reiterada e sua aplicação deliberada pela convenção, já esta prevista em lei.

A aplicação desse tipo de multa já foi objeto de estudo das Jornadas de Direito Civil, mas precisamente a necessidade de se dar condômino infrator a oportunidade de ampla defesa, tendo aprovada na I Jornada o Enunciado nº 92 que dispõe – Art. 1.337: As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo.

Mas trata-se de matéria controvertida, existindo posicionamentos nos dois sentidos, e até mesmo no sentido de que a multa só poderá ser aplicada se o condômino for anteriormente advertido e convidado a prestar esclarecimentos por escrito.

O parágrafo único do dispositivo em comento visa coibir o comportamento reiterado do condômino antissocial;  o comportamento antissocial pode ser definido como aquele que atinge de modo severo e seguido, colocando em risco a viabilidade da vida condominial[23].

A forma de deliberação sobre a multa não foi expressa pelo dispositivo, mas deve ser aplicada por analogia ao caput, ou seja, apenas através de assembleia, até mesmo por que esta se caracteriza como mais grave que aquela. O valor Maximo de dez vezes o valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais também é taxativo, não podendo ser suplantado pelas deliberações internas do condômino.

Quanto ao sujeito ativo e passivo temos que todos os condôminos/possuidores e pessoas ligadas a ele podem figurar nos dois polos, no entanto, esclarece-se que o sujeito ativo, não precisa necessariamente ser aquele cujo imóvel seja contiguo ou confinante.

Assim, a aplicabilidade da multa prevista pelo Código Civil 2002 deve ser analisada em cada caso, devendo ter como parâmetro o princípio da razoabilidade e tolerância, bem como sempre a proporcionalidade entre a multa aplicada e a conduta praticada.

4.2 Exclusão

Infelizmente, em alguns casos a multa não resolve o problema do condomínio, insistindo o condômino a praticar atos nocivos, ameaçando gravemente a estabilidade entre condôminos, inviabilizando a convivência social.

Também poderá ser considerado aquele que descumpre reiteradamente com os deveres previstos em lei e na convenção, inclusive no que diz respeito ao pagamento das despesas, vez que passa a onerar os demais condôminos.

Inovou ao estipular multas, a fim de coibir tais atos, mas deixou muito a desejar quando se omitiu sobre a possibilidade de exclusão do sócio nocivo, cujas multas aplicadas não alcançaram seus objetivos.

O Código Civil não prevê essa solução e esse é o principal argumento da doutrina que considera inadmissível expulsar o morador ou proprietário do prédio. Os fundamentos, embora respeitáveis, não convencem, data vênia, tanto que a doutrina que sustenta o cabimento da exclusão do condômino nocivo cresceu e se fortaleceu com ponderáveis razões, conforme lista que segue sem qualquer ordem: Marco Aurélio S. Viana, Silvio de Salvo Venosa, Francisco Eduardo Loureiro, Alvaro Villaça de Azevedo e Claudio Luiz Bueno de Godoy.

Os doutrinadores consideram tímidas as posições adotadas pelo legislador brasileiro, diante daquilo que já esta regulada em diversos outros ordenamentos jurídicos, como na Alemanha e México, onde se admite que as maiorias dos condôminos pleiteiem judicialmente a venda da unidade de condômino que deixou reiteradamente de cumprir com seus deveres.

Argentina e Espanha prevê a possibilidade de sua exclusão temporária.

Na Suíça é imposto ao condômino o dever de alienar sua unidade, assegurando aos demais condôminos direito de preferência.

No ordenamento jurídico pátrio, todavia a exclusão das pessoas, cujo comportamento censurável torne insustentável seu convívio com os demais condôminos, não é permitida por falta de previsão legal. Impossível, assim, compelir o condômino nocivo a alienar sua unidade, ou, tratando-se de mero ocupante, pleitear seu despejo em função do comportamento anti-social. Pedido nesse sentido é de ser havido por juridicamente impossível.

Assim, prevalece a duvida sobre a possibilidade de compelir o sócio nocivo alienar a sua unidade autônoma, excluindo definitivamente da relação condominial. Mas, não a duvidas de que esta é a única solução, apesar de ser defendido por Nelson Rosenvald a interdição temporária das faculdades de uso e gozo da propriedade. No entanto o entendimento doutrinário majoritário realmente é pela sua exclusão.

A função social é elemento constitutivo do direito real de propriedade, principalmente após a promulgação da Constituição da Republica de 1988 que exigiu de seu titular uma conduta voltada para o comprimento daquele principio, devendo ser concretizado no âmbito privado do condomínio edilício através da obediência irrestrita às regras estabelecidas na convenção de condomínio. (SILVEIRA, 2010, p. 529)

A função social deve ser cumprida pelo proprietário, é através de seu comportamento junto à propriedade que o preceito constitucional será concretizado, vez que é este que possui os direitos reais sobre o imóvel. Assim, deixando de atender a função social do imóvel, perde-se um dos elementos legitimadores do seu direito real, devendo, portanto, ser excluído daquele condomínio edilício.[24]

Mas, o procedimento deve ser adotado com cautela, devendo ser adotado apenas depois de verificado o insucesso das demais formas de punição, e após garantido de forma expressa o direito do contraditório e ampla defesa.

5 CONCLUSÃO

Apesar de ser uma forma anormal da propriedade, o condomínio edilício, não deixa de ser uma forma de propriedade, devendo este obedecer todos os preceitos legais inerentes à propriedade que lhe são compatíveis.

No condomínio edilício, devido as proximidades dentre os condôminos decorrentes da pouca distância entre as unidades autônomas e uso de áreas coletivas, deve mais ainda ser o direito de boa vizinhança observado, bem como seus comportamentos não perderem de vista os princípios da razoabilidade, da tolerância.

No entanto, nem sempre é possível evitar os conflitos os quais devem ser resolvidos pela administração do condomínio, que através do síndico e convenções devem fazer valer os preceitos legais dispostos no Código Civil e Lei especiais, bem como aqueles direitos e deveres emanados da vontade do condôminos manifestados na assembleia geral e regimento interno, lembrando que, em regra, a norma privada não sobrepõe norma pública.

O Código Civil de forma expressa prevê aplicação de multa ao condômino que reiteradamente desobedecem aos deveres a ele inerentes e o comportamento antissocial, mas nada prevê quando tal penalidade não surte efeito.

Assim, para resolver o conflito que muitas vezes se torna tão grave a ponto de ameaçar a existência do próprio condomínio, doutrinadores têm cogitado a possibilidade de exclusão desse condômino como forma de solucionar a questão.

Como embasamento legal para tal exclusão vem sendo invocado o preceito constitucional de que toda propriedade deve atender a uma função social.

Considerando que a propriedade só receberá total proteção na medida em que cumpre sua função social, tem-se que essa omissão do Código Civil de 2002 poderia ser resolvida passando a regular a exclusão do condômino nocivo.

No entanto, como no direito é admissível diversas formas de interpretação das leis pelo magistrado, tem-se que é perfeitamente possível a exclusão do condômino nocivo, caso as penalidades legais não surtam efeito, até mesmo porque uma das funções da administração do condomínio edilício é zelar pelo seus interesses em um todo e simultaneamente de cada condômino.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

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PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 20. ed. Revista e atualizada por Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 395.

ROSENVALD, Nelson. FARIAS, Cristiano Chaves de. Direitos Reais. 3. ed. São Paulo: lúmen Juris, 2006. p. 716.

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MONTEIRO, Washington de Barros. MALUF, Carlos Aberto Dabus. Curso de Direito Civil. Direito das Coisas. 41. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 588 p.

ZULIANI, Ênio Santarelli. Condomínio Edilício – Aspectos Controvertidos. Revista magister de Direito Civil e Processual Civil. Ano VIII. v. 43. Jul/Ago 2011. São Paulo: Magister. p. 86-108

LOUREIRO, Francisco Eduardo. Código Civil Comentado. In PELUSO, Min. Cezar (Coord.), São Paulo: Manole, 2007.

SILVEIRA, Renato Marcucio Barbosa da. Exclusão do Condômino Nocivo. Direito Civil – Teoria e Pratica no Direito Privado. Atualidades IV. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. p. 487-535



[1] Acadêmicas do curso de Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, campus Bom Despacho/MG.

[2] LEONARDI, 2005, p. 16

[3] ZULIANI, 2011, p. 86

[4] GONÇALVES, 2012, p. 179

[5] Art. 1.331 do CC de 2002. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.

[6] GONÇALVES, 2012, 175

[7] Art. 1.332 do CC de 2002. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial:

I - a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns;

II - a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns;

III - o fim a que as unidades se destinam.

[8] SOARES, 2010, p. 495

[9] Art. 1.335. São direitos do condômino:

I - usar, fruir e livremente dispor das suas unidades;

II - usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores;

III - votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite.

[10] Art. 1.338. Resolvendo o condômino alugar área no abrigo para veículos, preferir-se-á, em condições iguais, qualquer dos condôminos a estranhos, e, entre todos, os possuidores.

[11] § 2o É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se a ela não se opuser a respectiva assembleia geral.

[12] Art. 1.336. São deveres do condômino:

I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção; (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)

II - não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;

III - não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;

IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

§ 1o O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

§ 2o O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembléia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.

[13] MALUF, 2005, p. 97

[14] PEREIRA, 2011, p. 168

[15] Art. 1.333, caput. A convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais e torna-se, desde logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos sobre elas tenham posse ou detenção.

[16] MALUF, 2005, p. 97

[17] Art. 2.035. Parágrafo único do CC/02. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.

[18] PEREIRA, 2011, p. 164

[19] Art. 1.351. Depende da aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a alteração da convenção; a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária, depende da aprovação pela unanimidade dos condôminos.

[20] SILVEIRA, 2010, p. 525

[21] ANDRADE, 2005, p. 193

[22] LOUREIRO, 2007, p. 1337

[23] LOUREIRO, 2007, p. 1337

[24] SILVEIRA, 2010, p. 530