Porque a Igreja insiste na “opção preferencial pelos pobres”? Afinal, não são nas favelas, cortiços e morros que se escondem os bandidos, os inimigos da sociedade?

Em primeiro lugar, não são apenas as periferias, favelas e morros que escondem a delinqüência. Ela está presente em todos os ambientes, em todas as classes sociais, não só nas grandes cidades, mas também nas cidades interioranas de todo o país. Mas, a Palavra de Deus é muito clara quando diz: “Todas as vezes que o fizestes a um desses meus irmãos menores, a mim o fizestes” (Mt 25,40). Se fizermos o bem a um desses irmãos menores, isto é, a um irmão mais pobre, o Senhor diz que é a Ele que fazemos esse bem; no entanto, se fazemos mal a esse mesmo irmão, se o desprezamos, se o tratamos como cidadão de terceira classe, assim também estaremos fazendo a Jesus.

O Catecismo da Igreja Católica no n° 1933 vai mais longe quando diz: “Este mesmo dever (de servir ao pobre) se estende àqueles que pensam ou agem diferentemente de nós. A doutrina de Cristo vai até ao ponto de exigir o perdão das ofensas. Estende o mandamento do amor, que é o da nova lei, a todos os inimigos, conforme Mt 5,43-44. A libertação, no espírito do Evangelho é incompatível com o ódio ao inimigo, enquanto pessoa, mas não com o ódio ao mal que ele pratica, enquanto inimigo.”

Portanto, indo diretamente ao encontro da pergunta do leitor, podemos afirmar que apesar de não compactuarmos com o erro, com o pecado, devemos amar aqueles que chamamos de inimigos da sociedade, portanto nossos inimigos. Devemos fazer a nossa parte, para traze-los diante de Deus, apresenta-los a Jesus para que tenham a oportunidade de uma vida nova. Tantas são as pastorais de nossa Igreja que cuidam dos pequeninos de Jesus e que podemos participar: pastoral da criança, que atende as crianças mais carentes; pastoral do menor, associações fundações e ONG´s que cuidam de menores de rua (os que vivem nas ruas) e de menores na rua (os que embora tendo famílias, vivem na mendicância, nas drogas e prostituição); pastoral, associações, fundações, paróquias que trabalham com sofredores de rua, drogados, alcoólatras; pastoral carcerária, procurando a reabilitação do preso através da fé, enfim, a nossa igreja, os movimentos como a Renovação Carismática estão agindo dentro desse contexto social e necessitando de voluntários e voluntárias que querem seguir o mandato de Jesus.

O Catecismo em seu n° 1932 diz: “O dever de tornar-se o próximo do outro e servi-lo ativamente, se faz ainda mais urgente quando este se acha mais carente, em qualquer setor que seja”.

Nosso dever de Cristãos nos impele a trabalhar em favor dos que têm menos oportunidades na vida e, daqueles que perderam todas as oportunidades recebidas. Não basta desviar o olhar do mendigo, do indigente; não é dando uma esmola em um farol de trânsito para aplacar a nossa consciência,  que estaremos fazendo a vontade de Deus, ao contrário, ações desordenadas e desorganizadas como a de dar esmolas sem critério, estimula o vício da mendicância e da permanência nas ruas. Dê o seu dízimo para um trabalho sério e organizado na sua paróquia, ajude associações, fundações e ONG´s de respeito e que fazem um trabalho social e de reabilitação humana, mas principalmente, participe pessoalmente como voluntário dando um dízimo de seu tempo e de seus talentos.

Diz a encíclica Gaudium et spes 29, § 2: “Qualquer forma de discriminação nos direitos fundamentais da pessoa, seja ela social ou cultural, ou que se fundamente no sexo, raça, cor, condição social, língua ou religião deve ser superada e eliminada, porque contraria ao plano de Deus”.

Deus não nos fez em série, todos iguais como robôs, como máquinas; somos diferentes uns dos outros, exatamente para que nos completemos, respeitando e até agradecendo nossas diferenças; os “talentos” conforme Mt 25,14-30, não são distribuídos de maneira igual. Santa Catarina de Sena escreve seus diálogos com Jesus: “Eu não dou todas as virtudes na mesma medida a cada um... A este a caridade, a outro a justiça; a este a humildade, àquele uma fé viva... Distribuí muitas graças e virtudes, espirituais e temporais, com tal diversidade, que a ninguém por si só concedi todo o necessário, para serdes obrigados a usar de caridade uns para com os outros... Quis que todos tivessem necessidade uns dos outros e fossem meus ministros na distribuição das graças e liberalidades que de mim receberam” (Dial. 1,7)

Ainda a respeito da pergunta sobre a opção preferencial pelos pobres, diz o Catecismo em seu n° 2443 “...O amor da Igreja pelos pobres... faz parte de sua tradição constante. Inspira-se no Evangelho das bem-aventuranças, na pobreza de Jesus e na sua atenção aos pobres”.

Em Deuteronômio, há uma exortação que é seguida pela Igreja, porque é confirmada por Jesus; “Nunca deixará de haver pobres na terra; é por isso que eu te ordeno: abre mão em favor de teu irmão, de teu humilde e de teu pobre em tua terra” (Dt 15,11). “Sempre tereis pobres convosco; mas a mim nem sempre tereis” (Jo 12,8). Ele nos convida a reconhecer a sua presença nos pobres, que são seus irmãos.

As chamadas “obras de misericórdia” são, segundo o Catecismo,  “as ações caritativas pelas quais socorremos o próximo, nas suas necessidades corporais e espirituais. Instruir, aconselhar, consolar, confortar são obras de misericórdia espiritual, como também perdoar e suportar com paciência. As obras de misericórdia corporal consistem sobretudo em dar de comer a quem tem fome, dar moradia aos desabrigados, vestir os maltrapilhos, visitar os doentes e prisioneiros, sepultar os mortos. Dentre esses gestos de misericórdia, a esmola dada aos pobres é um dos principais testemunhos da caridade fraterna: é também uma prática de justiça que agrada a Deus” (n° 2447)

“Em razão da miséria humana é que todos aqueles que ela atinge são objeto de um amor preferencial por parte da Igreja que, desde as suas origens, apesar das falhas de muitos de seus membros, não deixou nunca de se esforçar por alivia-los, defende-los e liberta-los. Ela o faz através de inúmeras obras de beneficência, que continuam a ser, sempre e por toda à parte, indispensáveis.” (n° 2448)

Podemos encerrar esse nosso raciocínio com uma passagem singular da vida de Santa Rosa de Lima: No dia em que sua mãe a repreendeu por manter em casa pobres e doentes, Santa Rosa de Lima lhe replicou: “Quando servimos os pobres e os doentes, servimos a Jesus. Não nos devemos cansar de ajudar o próximo, porque neles é a Jesus que servimos”.