Por que e para que ensinar leitura

Por Rainer Alves da Fonseca | 12/02/2014 | Resumos

Em primeira observação deve-se pontuar que há diferença entre ser alfabetizado e ser letrado. O sujeito alfabetizado, é aquele que consegue codificar e decodificar informações da língua falada de forma que a informação contida seja entendida. Já o indivíduo letrado, não somente detém o conhecimento de codificação e decodificação como também interage com esta críticamente, questionando a informação ali contida por um prisma social. “A condição de sujeito letrado se constrói nas experiências culturais com práticas de leitura e escrita que os indivíduos têm oportunidade de viver, mesmo antes de começar sua educação formal” (Morais e Albuquerque, 2004). 

            No âmbito escolar, deve-se abordar a escrita, leitura e a releitura feita de forma crítica, buscando compreender e até mesmo transformar o meio em que vivemos, seja a própria escola e ou mesmo os problemas sociais que permeiam o mundo do educando. Tornar a leitura além de prazerosa, uma forma de compreensão do que ocorre a nossa volta, e vital para compreender a sociedade que estamos inseridos. “O necessário é fazer da escola um âmbito onde a leitura e escrita sejam práticas vivas e vitais, onde ler e escrever sejam instrumentos poderosos que permitem repensar o mundo e reorganizar o próprio pensamento, onde interpretar e produzir textos sejam direitos que é legítimo exercer e responsabilidades que é necessário assumir.” (LERNER, 2002, p.18)

            Em muitos momentos, vem o questionamento de: o que é realmente a leitura. A leitura, ultrapassa a ideia de informar, ela abrange desde a formação do intelecto do indivíduo, desenvolvimento criativo, composição de sua personalidade e interação social.

Segundo Silva (1991), a leitura é um ato de conhecimento, pois ler significa perceber e compreender as relações existentes no mundo. Nesse sentido podemos definir leitura como“[...] um ato individual, voluntário e interior [...]”, (SANDRONI; MACHADO, 1998, p. 22), que se inicia com a decodificação dos signos lingüísticos que compõem a linguagem escrita convencional, mas que não se restringe à mera decodificação desses signos, pois, a leitura exige do sujeito leitor a capacidade de interação com o mundo que o cerca.

           

A leitura torna-se portanto ao mesmo tempo uma atitude individual e social. Individual por que a leitura quando é feita vem cheia de resignificados que são imbuídos pela própria experiência do leitor. Social já que o leitor está subordinado a regras linguísticas pré-estabelecidas e condições sociais ao qual o texto lido foi direcionado. Para Kleiman (2002), a leitura é um processo que se evidencia através da interação entre os diversos níveis de conhecimento do leitor: o conhecimento lingüístico; o conhecimento textual e o conhecimento de mundo. Sendo assim, o ato de ler caracteriza-se como um processo interativo.

 Segundo Kleiman (1998), ao lermos um texto, qualquer texto, colocamos em ação todo o nosso sistema de valores, crenças e atitudes que refletem o grupo social em que se deu nossa sociabilização primária, isto é, o grupo social em que nascemos e fomos educados. Por isso, podemos afirmar que a leitura enquanto prática social é algo bastante complexo, pois está intimamente ligado às nossas raízes sócio-culturais e conseqüentemente à formação da nossa cidadania.

Em nossos dias, a escola assume um papel ainda maior na inserção social, já que, além de ensinar a leitura/escrita e a compreensão destas, também deve ajudar seus discentes a compreender a leitura de mundo que vem inserida nas mais diversas informações. Aquela a qual depende de conhecimentos anteriores para sua compreensão, “a compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto”. (FREIRE, 1997, p.11).

            Sendo assim, a inserção social ocorre para aqueles que não somente sabem ler e escrever (alfabetizados), mas principalmente para aqueles que compreendem a leitura e releitura nas mais diversas nuances e conjunturas e conseguem aplica-la de forma efetiva.

Segundo Soares (1999), passamos a enfrentar uma nova realidade social em que não basta apenas saber ler e escrever é preciso também fazer uso do ler e do escrever, para saber responder às exigências de leitura e de escrita que a sociedade faz continuamente, daí surge o termo letramento, ressignificando a idéia principal que se tinha do saber ler e escrever, buscando definir um novo padrão de usuário da língua que se mostre apto a atender às demandas da sociedade contemporânea. Quando afirmamos que um individuo além de alfabetizado precisa ser letrado estamos incorporando a ele valores que definem a maneira que esse individuo interage com a complexidade lingüística e cultural do mundo a sua volta, pois dessa forma ele passará de um mero decodificador da língua escrita a um usuário ativo da mesma.

            Portanto a leitura na escola, a real formação de leitores não permeia o valor numérico de livro lidos, ou tão pouco a quantidade de páginas da cada um, mas principalmente perpassa a idéia de inserção pelo gosto de ler, a busca pela leitura como algo prazeroso e necessário para a compreensão do por que é e como mudar a sociedade que vivemos.

Segundo Takahashi (2000, p. 45) “a educação é o elemento-chave na construção de uma sociedade baseada na informação, no conhecimento e no aprendizado”, considerando que a leitura é um dos pilares da educação urge a necessidade de se reconhecer o papel da escola na formação do leitor, pois é através da leitura que o individuo terá acesso a uma enorme gama de informações e conhecimentos que possibilitará a ele interagir na sociedade de forma crítica, autônoma e consciente, exercendo plenamente seu papel de cidadão.

Referencias

 

MORAIS, A. G. & ALBUQUERQUE, E. B. C. Alfabetização e letramento: o que são?

Como se relacionam? Como alfabetizar letrando? In LEAL, T. F. e ALBUQUERQUE, E. B. C. Alfabetizando jovens e adultos letrados: outro olhar sobre a educação de jovens e adultos. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

 

LERNER, Délia. Ler e Escrever na escola: o real, o possível e o necessário. Porto Alegre: Artmed. 2002, 120 p.

 

SANDRONI, L. C.; MACHADO, L. R.(orgs). A criança e o livro: Guia prático de estímulo à

leitura. 4ª ed. São Paulo: Ática, 1998.

 

KLEIMAN, Angela. Oficinas de leitura: teoria e prática. São Paulo: Pontes, 1998.

 

_____. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 8ª ed. Campinas, SP: Pontes, 2002.

 

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 46ª ed. São

Paulo: Cortez, 1997.

 

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 1999

 

TAKAHASHI, Tadao. (org). Sociedade da informação no Brasil: livro verde. Brasília:

Ministério da Ciência e Tecnologia, 2000.