PNEUMONIA ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA: CONSIDERAÇÕES ACERCA DO TRABALHO DE ENFERMAGEM UNI E MULTIDISCIPLINAR NA UTI
Por Vera Lúcia Barros Félix | 04/02/2022 | SaúdeI- INTRODUÇÃO
A importância clínica da pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) deriva, além de sua ocorrência (segunda mais frequente em UTIS), da mortalidade associada e dos altos custos relacionados à permanência na unidade e ao uso de antimicrobianos, dentre outras adversidades (SBI, 2019).
Deste modo, destacamos o trabalho da enfermagem intensivista neste contexto, a fim de ressaltar a sua relevância no que concerne à manutenção de alguns aspectos profiláticos, os quais podem minimizar a ocorrência deste agravo.
O tratamento da PAV se dá sob o aspecto multiprofissional, onde a equipe médica, de enfermagem, odontologia, fisioterapia, farmácia, fonoaudiologia, dentre outras, têm papeis indispensáveis e que, positivamente correlacionados, acarretam a visão global da prevenção de sua instalação.
As PAV são, de acordo com a SBI (2019), classificadas de acordo com o tempo após internação hospitalar em que acontecem, onde aquelas ditas precoces, advêm sob período inferior a 4 dias de internação, caracterizando sua etiologia, àquela da pneumonia adquirida na comunidade (S. pneumoniae e H. influenzae).
As pneumonias tardias constituem grupo heterogêneo de infecções, variando de acordo com fatores múltiplos e decorrentes da temporalidade e das situações adversas decorrentes do prolongamento da ventilação mecânica.
Capacitar continuamente a equipe de saúde e envolvê-la na prevenção de infecção hospitalar, de acordo com o nível de responsabilidade de cada profissional, é necessário e fundamental.
A prevenção de fatores de risco associados à PAV se concentra na adoção de medidas de assistência multicausal, reunindo os seguintes cuidados:
Intubação e ventilação mecânica, traqueostomia, trocadores de umidade e calor (heat and moisture exchanger - HME), aspiração de secreções respiratórias, profilaxia de úlcera de estresse, controle da glicemia, modulação da colonização, nutrição enteral, cabeceira elevada (BABCOCK et al, 2004).
Cabe ao enfermeiro intensivista, no seu cotidiano, dominar esta temática, trazendo à tona para o contexto da capacitação de sua equipe, o desenvolvimento e o reconhecimento da importância da profilaxia da PAV e aqui, portanto, consiste a justificativa do estudo.
Como objetivos, destaco:
- Apresentar o conceito de PAV no contexto da UTI;
- Discorrer, sob a modalidade de revisão de literatura, a PAV e a sua ocorrência na UTI;
- Analisar o papel do enfermeiro intensivista no que concerne à profilaxia da PAV em UTI.
O estudo apresenta-se relevante na seara dos agravos ocorridos no ambiente que assiste pacientes graves, uma vez que o conhecimento acerca do assunto, certamente acarreta na diminuição dos custos, do tempo de hospitalização, da taxa de morbi-mortalidade na unidade.
II-DESENVOLVIMENTO
Dentro do ambiente nosocomial, a Unidade de Terapia Intensiva é aquela que atende às populações com necessidades terapêuticas emergenciais, sob o alto risco de complicações.
Neste serviço há demanda de alta tecnologia e de recursos humanos em larga escala, configurando-se no local no qual onde ocorrem os maiores gastos para o atendimento intra-hospitalar. Desse modo, é fundamental que, associada à redução de custos e ao aumento da produtividade, a busca pela qualidade vise à promoção/manutenção da segurança do cliente (GALLESIO et al, 2006).
Dada à gravidade dos casos clínicos e/ou cirúrgicos que compõem a clientela deste serviço, não raramente, verificam-se elevadas taxas de permanência, o que consequentemente acarreta oportunidades inúmeras para a ocorrência das complicações decorrentes da estadia no local.
Destacamos as Infecções Hospitalares, o Delirium, a Insuficiência Respiratória, a Insuficiência Renal, a Insuficiência Circulatória e as Lesões Cutâneas, como principais desenvolvidas neste ambiente (SBI, 2019).
Destarte, evidenciamos que a PAV está, conforme anteriormente destacamos, na segunda posição, quando comparadas às infecções cutâneas e do trato urinário, resultando mortalidade variável entre 20% e 70% (CARRILHO et al, 2006).
Neste estudo, através da abordagem metodológica qualitativa, apresentamos esforços, no sentido de destacar aspectos inerentes à PAV em UTI e o manejo profilático de sua instalação, sobretudo no que concerne ao trabalho de enfermagem.
Uma tipologia metodológica qualitativa oferece três possibilidades de se realizar uma pesquisa: a documental, o estudo de caso e a etnografia (GODOY, 1995).
Para Alarcão (2014, p. 109), o pesquisador deve considerar as etapas a serem concluídas, por investigação, a partir do delineamento de seu problema, a fim de trazer discussões e resultantes válidas para o campo da ciência.
Optamos ainda, a utilização da revisão de literatura narrativa como estratégia de desenvolvimento, uma vez que, por avaliação do pesquisador, suficientemente presta contas aos intuitos da investigação proposta.
É a etapa do trabalho em que se reúne as referências que serão suficientes a fornecer embasamento teórico para o alcance dos objetivos. Para tanto, houve a necessidade de definir o recorte, elencar o diferencial (através do delineamento dos objetivos), destacar os achados principais e discutir acerca destes, no sentido da crítica e da produção científica (UNESP, 2015).
Sendo assim, a respeito da PAV, podemos então classificá-la como uma infecção de trato respiratório que prolonga a internação, o desenvolvimento de outras complicações, além da extensão da ventilação mecânica, trazendo risco de morbi-mortalidade e alto custo do tratamento (PARK, 2005).
Suspeita-se de PAV onde se evidencia o surgimento de infiltrado pulmonar novo ou progressivo à radiografia do tórax, associado à presença de sinais clínicos e laboratoriais definidos como: (SBI, 2019)
• temperatura (>38 ou < 35C);
• leucocitose (> 10.000/ mm3) ou leucopenia (<4.000/mm3);
• presença de secreção traqueal purulenta;
• presença de patógenos na cultura de secreção traqueal.
Como causa para a instalação da PAV cabe-nos destacar que são proporcionais ao tipo de UTI e de hospital, de população implantada no setor naquele momento, da capacitação e do trabalho preventivo (CARRILHO et al, 2006).
Posto isto, apresentamos a afirmativa de que a acurácia diagnóstica médica bem como o tratamento da PAV deve ser precoce, a fim de minimizar a severidade da patologia, mas não é a intervenção suficiente para a melhoria prognóstica (BABOCK et al, 2004).
No trabalho multidisciplinar na UTI, sobretudo no que tange ao tratamento e profilaxia da PAV, medidas farmacológicas e não-farmacológicas trilham caminho simultâneo, onde o cotidiano da enfermagem desempenha fundamental papel (SBI, 2019).
As microbroncoaspirações de secreções contendo bactérias da orofaringe e do conteúdo de estase gástrica, seguidas da contaminação por condensação formado no circuito do respirador requerem medidas não farmacológicas para prevenção da PAV.
Estas decisões estão ao alcance da enfermagem, a partir de disposições simples, de amplo espectro: posicionamento adequado, sem tração do ventilador, desinfecção e esterilização dos circuitos dos aparelhos, mensuração da comissura labial (em 22 mm) do TOT (tubo endotraqueal, aspiração regular do TOT/TQT e das vias aéreas), mensuração do cuff (balonete) do TOT, posicionamento adequado no leito, com cabeceira a 30-45º, mudança regular de decúbito, controle glicêmico, administração de protetores gástricos (por prescrição médica), lavagem rigorosa das mãos, assepsia oral dos pacientes com clorexidina (MARTINS et al, 2010).
Outras medidas adotadas para evitar e diminuir a exposição dos pacientes críticos ao TOT, como: a ventilação não invasiva com pressão positiva (non invasive positive pressure ventilation - NPPV) e os protocolos de suspensão diária de sedação e desmame, também são citados como estratégias eficazes para diminuir a incidência de PAV (BABCOCK et al, 2004).
Ainda que apresentemos estes destaques inerentes ao cuidado, sobretudo o de enfermagem intensivista, na profilaxia da PAV, cabe-nos salientar que, no Brasil, o número de trabalhadores de enfermagem, bem como o investimento na sua qualificação deve ser mandatório, para que, efetivamente, estes apontamentos possam ser garantidos dentro da UTI, como rotineiros (VERSA et al, 2011).
A gestão hospitalar deve considerar que o uso eficiente dos recursos humanos e materiais, está diretamente relacionado ao êxito das intervenções na UTI e na prevenção das complicações.
Numa UTI, a otimização tecnológica não caminha desarticulada da capacitação e do estímulo profissional, pois quem opera a tecnologia é o humano qualificado para tal (QUEIJO et al, 2004).
III- CONCLUSÃO
A partir deste breve estudo, afiançamos que a PAV consiste em importante motivo de complicação em UTI, deflagrando o aumento das taxas de morbimortalidade.
Cabe a acurácia diagnóstica médica e a tomada rápida de decisão, a fim de minimizar o desfecho negativo da evolução da doença. Porém, o mais importante consiste na adoção de simples medidas de repercussão profilática, as quais devem ser adotadas desde a admissão na unidade, pela equipe multiprofissional, a contar, sobretudo, com a de enfermagem.
Agir em concordância, construindo comunicação efetiva, aglutinando conhecimentos específicos, no sentido do cuidado, é mandatório na UTI, sobretudo no que tange o manejo da PAV. Isto, como resultado, trará a redução dos riscos para a sua ocorrência, da permanência no setor, no decréscimo dos custos hospitalares.
O estudo configura-se como breve exposição, mas que traz em seu bojo, a crítica da necessidade do desenvolvimento do trabalho multidisciplinar, profilático e sob constante monta de capacitação.
Não esgotamos esta discussão, ampliando novas fontes de investigação e aprofundamento para os estudantes e profissionais da área intensivista, no sentido do cuidado qualificado e ampliado.
IV- REFERÊNCIAS
ALARCÃO, I. “Dilemas” do jovem investigador. Dos “dilemas” aos problemas. Investigação Qualitativa: inovação, dilemas e desafios. v. 1, p. 103-124, 2014.
BABCOCK, H.M.; ZACK, J.E.; GARRISON, T.; TROVILLION, E.; JONES, M.; FRASER, V.J.; KOLLE, M.H. An educational intervention to reduce ventilator-associated pneumonia in an integrated health system: a comparison of effects. Chest. v.125 (6), p.2224-31, 2004.
CARRILHO, C.M.D.M; GRION, C.M.C.G.; CARVALHO, L.M.; SANTOS, A.; MATSUO, T. Pneumonia associada à ventilação mecânica em Unidade de Terapia Intensiva cirúrgica. Rev. bras. ter. intensiva. v. 18 (1), Mar 2006.
GALLESIO, A.O.; CERASO, D; PALIZAS, F. Improving quality in the intensive care unit setting. Crit Care Clin. v. 22 (3), p. 547-71, jul 2006.
GODOY,A.S. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. RAE - Revista de Administração de Empresas. São Paulo, v. 35, n. 2, p. 57-63, 1995.
MARTINS, J.A.; DIAS, C.M. Programa de Atualização em Fisioterapia e Terapia Intensiva Adulto (PROFISIO) /Associação Brasileira de Fisioterapia Cardiorrespiratória e Fisioterapia em Terapia Intensiva – Porto Alegre: Artmed/ Panamericana Editora, 2010.
PARK, D.R. The microbiology of ventilator-associated pneumonia. Respir Care. v. 50, p. 742-763, 2005.
QUEIJO, A, F.; PADILHA, K.G. Instrumento de medida da carga de trabalho de enfermagem em Unidade de Terapia Intensiva: Nursing Activities Score (N.A.S.). Rev Paul Enferm. v. 23(2), p. 114-22, 2004.
SOCIEDADE PAULISTA DE INFECTOLOGIA. SBI. Diretrizes sobre pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV). Office Editora e Publicidade. 2019.
UNESP. Faculdade de Ciências Agronômicas. Biblioteca Prof. Paulo de Carvalho Mattos. Tipos de revisão de literatura. Botucatu, 2015. Disponível em: https://www.fca.unesp.br/Home/Biblioteca/tipos-de-evisao-de-literatura. Acesso em: 26 jan.
VERSA, G.L.G. da S.; INOUE, K.C.; NICOLA, A.L.N.; MATSUDA, L.M. Influência do dimensionamento da equipe de enfermagem na qualidade do cuidado ao paciente crítico. Texto Contexto Enferm, Florianópolis. v. 20