Resenha Crítica do Artigo

‘Fundamentalismo e integrismo: os nomes e a coisa’

Ashia Roberta Andrade e Silva

PIERUCCI, Antônio Flávio. Fundamentalismo e integrismo: os nomes e a coisa. Revista USP, São Paulo, n. 13, p. 144-56, 1992.

O texto de Pierucci (1992) trata do problema para a conceituação de eventos caracterizados pelo fanatismo religioso, especialmente aos eventos ocorridos em 1979 com a revolução religiosa que culminou com a queda do governo Laico no Irã e o restabelecimento da xaria – leis baseadas nos preceitos do Alcorão e na religião do Islã – como lei universal da sociedade iraniana. Segundo o autor, na época do ocorrido os jornalistas políticos e estudiosos da religião utilizaram conceitos errôneos para denominar o fenômeno politico religioso que se iniciavam.

Os críticos e analistas dos meios de comunicação na época utilizaram termos como “tradicionalismo revolucionário”, “fundamentalismo” e “integrismos”. Termos como “xiita” e “xiismo” também foram utilizados para denominar os grupos radicais islâmicos. Quanto aos últimos termos o autor explica que o equivoco causado no emprego dos mesmos, se deve ao fato de xiita ser a denominação de uma vertente do Islã que é contrária a vertente sunita, e que em um radical religioso islão poderá ser tanto xiita quanto sunita, não sendo uma máxima que um religioso da vertente xiita será necessariamente um radical islâmico.

Pierucci (1992) prossegue em seu texto descrevendo as reais definições para os termos tradicionalismo, integrismo e fundamentalismo, e os motivos de seus empregos terem sidos equivocados para a definição dos eventos ocorridos em 1979 no Irã. Conforme o autor, o equivoco cometido ao utilizar o termo tradicionalismo, inicia com o entendimento do significado da palavra propriamente dita, pois o tradicionalismo deriva de tradição e que por definição é o ato de transmitir de geração em geração, costumes, lendas, usos e ritos, ou seja, se trata de algo criado por um grupo social. Pierucci (1992) explica que o grupo radical da Revolução Iraniana, reivindicavam justamente a extinção do islã tradicional ou “islã herdado” para o reestabelecimento das raízes islâmicas, ou seja, com as doutrinas dos primórdios da religião sem interferências de heranças sociais.

Quanto ao integrismo, o autor esclarece que o equivoco do uso se deve ao fato de a origem da palavra ser de uma crise interna no catolicismo iniciada após a Revolução Francesa, que deu origem ao movimento chamado de “integristas” os quais reivindicavam a renovação de uma sociedade inteiramente cristã baseada apenas nos preceitos do catolicismo, em outras palavras, contrários ao moderno secularismo iniciado pela Igreja. Portanto, a palavra integrismo tem sua origem enraizada em um movimento histórico do catolicismo, e não seria correto o utilizar para definir um movimento islâmico.

A respeito do fundamentalismo Pierucci (1992) explica que teve sua origem igualmente em movimentos históricos cristãos, mais especificamente do movimento protestante conservador, antiliberal dos EUA no inicio do século XX que visava a construção de uma sociedade baseada única e exclusivamente pela inspiração divina plena contida na Bíblia para a vida dos cristãos. O autor conclui que um religioso fundamentalista seria aquele inclinado a buscar diretamente na fonte de seu texto sagrado o sentido verdadeiro de sua religião, sendo dispensáveis nesse caso o clero como intermediário deste processo, por este motivo, todos os movimentos religiosos iniciados por clérigos islâmicos que reservam para si a compreensão do Alcorão estariam longe de serem fundamentalistas.

Pierucci (1992) conclui o seu texto dizendo que não é possível para jornalistas, filósofos e críticos ocidentais compreender os movimentos radicais islâmicos utilizando termos e expressões de origem histórica ocidental cristã, uma vez que os valores religiosos e sociais são completamente diferentes dos orientais islâmicos. Podemos acrescentar que a revolução islâmica, provou que a teoria da secularização de que quanto mais moderno o mundo for, menos religiosidade terá estava equivocada, pois ao contrário da separação entre Igreja e Estado requerida pelos primórdios da religião cristã, no islão tal separação não existe, e lei religiosa e a mesma lei civil. Portanto, compreendo que a diferença ideológica ocidental e oriental fica evidente que não se deve utilizar os mesmo termos para definir diferentes questões.