Tema: Perspectivas sobre a Produção e Circulação de Bens Culturais em Moçambique

Moçambique é um país de grande diversidade cultural, e como a maioria dos países em África, não possui uma identidade específica, apresentando aspectos que o ligam a outros países vizinhos ou mesmo a outros continentes. Além da influência portuguesa, Moçambique está bastante ligado à India e ao Oriente Médio. De referir que o país é dotado de ricos e extensos bens culturais que necessitam de um maior controle de sua circulação dentro e fora dele.

Para DE MIRANDA (2002:205) Cultura na língua latina entre os romanos tinha o sentido de agricultura que se referia à cultura de soja, cultura de arroz, etc. Em ciências sociais, a Cultura é definida como um conjunto de ideias e comportamentos, símbolos de práticas sociais, aprendidos de geração em geração através da vida em sociedade (seria então a herança social da humanidade). A cultura é um conceito que está sempre em desenvolvimento, pois com o passar do tempo ela é influenciada por novas maneiras de pensar inerentes ao desenvolvimento do ser humano.

Cada país tem a sua própria cultura que é influenciada por vários factores, por exemplo, a cultura brasileira é marcada pela boa disposição e alegria, isto se reflecte na música (samba). Na cultura portuguesa, o FADO é o património musical mais famoso que reflecte a característica do povo português: o saudosismo. Na cultura moçambicana a MARRABENTA representa o património musical, o MAPICO e o NHAU representam a dança e a GALINHA ZAMBEZIANA representa uma das gastronomias moçambicanas.

 Se reunirmos o sentido amplo e o sentido restrito, compreenderemos que a Cultura é a maneira pela qual os humanos se humanizam por meio de práticas que criam a existência social, econômica, política, religiosa, intelectual e artística. A religião, a culinária, o vestuário, o mobiliário, as formas de habitação, os hábitos à mesa, as cerimônias, o modo de relacionar-se com os mais velhos e os mais jovens, com os animais e com a terra, os utensílios, as técnicas, as instituições sociais (como a família) e políticas (como o Estado), os costumes diante da morte, a guerra, o trabalho, as ciências, a Filosofia, as artes, os jogos, as festas, os tribunais, as relações amorosas, as diferenças sexuais e étnicas, tudo isso constitui a Cultura como invenção da relação com o Outro.

  1. Definição de bem cultural

A museologia entende como bem cultural todo testemunho da criação humana ou da evolução da natureza, devido ao seu significado e valor para a ciência, para as artes e/ou para a história.  Para o olhar museológico o bem cultural não é visto apenas pelas suas qualidades físicas e materiais, ou seja, o objecto em si, mas como elemento importante que possui a potencialidade de reflectir uma rede de relações e portador de significados. 
Neste sentido, de acordo com o site https://www.portaleducacao.com.br/ existem três categorias de bens culturais:

a) Bens culturais imateriais (as formas de fazer e o saber fazer). Nesse universo estão: 
• Os componentes do patrimônio intelectual: a música, a literatura, a dança, o teatro, as tradições, as técnicas, etc. ; os componentes do patrimônio emocional: as expressões do sentimento individual ou coletivo: as manifestações folclóricas e religiosas.

b) Bens culturais materiais: estão em sítios históricos, urbanos, arqueológicos e arquitetónicos. Seus componentes estão classificados como parte dos seguintes conjuntos culturais: No património arqueológico: achados arqueológicos; 

No patrimônio urbanístico e paisagístico: paisagens naturais e/ou com interferência humana em áreas urbanas e rurais;  no patrimônio artístico e arquitetónico: bens móveis, objectos de arte, objectos utilitários, documentos arquivísticos e iconográficos; edificações rurais e urbanas. 
c) Bens naturais (património natural): rios, cachoeiras, matas, florestas, grutas, climas, dentre outras. Na pesquisa museológica o bem cultural pode ser tratado de duas maneiras: como objecto de pesquisa científica, para produzir conhecimentos;  como instrumento cognitivo: para a transmissão de conhecimentos.

 Portanto, o bem cultural (seja material, imaterial ou natural) como objecto de pesquisa e suporte de informações é capaz de evidenciar aspectos históricos, econômicos, sociais de um espaço/tempo. Sendo assim, eles permitem recuperar ou produzir informações sobre o modo de vida das pessoas e sociedades do passado e do presente; recuperar informações sobre a memória colectiva.  Como instrumento cognitivo, os bens culturais são apresentados de forma processual e em um contexto, evidenciando a sua origem, sua função e os significados a ele atribuídos.

Mas, qualquer que seja a motivação, é importante esclarecer que a pesquisa sobre um bem cultural deve ir além da leitura estética, ela deve procurar evidenciar a rede de relações e o contexto (tempo, região, história, entre outros aspectos) que envolve um bem cultural. Nesse sentido a pesquisa museológica exige um conhecimento amplo e profundo dos aspectos de uma realidade. Por isso, necessita da interdisciplinaridade e precisam recorrer aos métodos, técnicas e instrumentos das ciências sociais, da história e de ecologia.

  1. Propostas para criação, produção, preservação, intercâmbio e circulação de bens culturais

LAURANO (2015) no seu artigo advoga que é necessário que se reafirme a circulação lícita de bens culturais, aprofundando em debates, simpósios, reunindo o maior número de informações para que os bens culturais sejam protegidos e devidamente utilizados. Precisamos de nos autocriticar, visto que o país não tem feito o suficiente para proteger a diversidade cultural existente. Por exemplo na União Europeia o princípio da liberdade de circulação de bens culturais constitui um dos pilares fundamentais, pois há protecção das diversidades culturais dos Estados-Membros. Na realidade moçambicana não há protecção de certos bens culturais como é o caso dos poucos museus que existem no país, facto concreto o que se vive na cidade da Beira, Quelimane e outras cidades. Os cinemas no país de uma forma geral não existem. Ex. Cinema Victória, Casa dos Bicos na Beira e outros que estão abandonados e alguns transformados em igrejas; Cine-teatro Águia e Cine - Estúdio em Quelimane; locais que deveriam ser de promoção cultural não têm cumprido sua real função. O estado deve saber que a cultura tem valor económico e precisa valorizar mais os bens culturais. Há de certa forma alguma produção, mas a dinâmica de circulação do bens culturais produzidos é bastante fraca. Infelizmente o Estado pouco valoriza a cultura. Não há promoção dos cantores locais, são convidados e valorizados cantores de outros países em detrimento dos nossos, promovendo e fazendo circular a cultura de outros países. Em contrapartida os artistas locais produzem bens culturais (pinturas/artes) e vendem noutros cantos do mundo a valores bastante elevados devido ao fraco poder económico dos moçambicanos, tal facto justifica a falta de monitoria e controle dos bens culturais nacionais.

Sugerimos que se criem programas de incentivo e se garanta o lançamento de editais por parte dos governos municipais, provinciais para a promoção de todas as manifestações tradicionais, respeitando suas origens e etnias, conforme a realidade de cada região. Ainda há que se pensar em garantir o âmplo acesso formando continuamente os agentes culturais locais, capacitando-os para o acesso a esses instrumentos; estimular, apoiar e promover os grupos artísticos e culturais implantando a política de circulação cultural e artística, promovendo intercâmbios regionais e internacionais, em eventos e concursos periódicos, em espaços urbanos e rurais, possibilitando o acesso a todas as expressões étnicas e culturais.

É necessário de igual modo que se fomente a produção em moda africana no geral e moçambicana em particular e de outros productos dos povos tradicionais de matriz africana, garantindo investimento em capacitações para o empreendedorismo e na comercialização desses produtos por meio de realização de feiras específicas, em todas as províncias.

Incentivar cada vez mais e com mais garra a produção de literatura em especial a infanto-juvenil, e fomentar publicações de literatura com a temática da cultura tradicional africana no geral; promover intercâmbio cultural por meio de festivais de diversidade cultural; destinar 20% do fundo de cultura especificamente para a circulação de bens culturais.

É sabido que os bens culturais se encontram dispersos por todo vasto Moçambique (bens arqueológico, monumentais, as esculturas, pinturas, dentre outros) produz se muita coisa boa e interessante, portanto há que tornar acessível a todo o cidadão nacional ou não potencializando bastante os meios virtuais e garantindo sua circulação também por esta via (internet). Nota-se que os bens culturais públicos globais de certa forma não conhecem fronteiras e isso também dificulta o controlo dos mesmos, os tais paraísos fiscais também existem nesta área e é necessário um sistema de controlo reforçado de modo que não percamos os nossos bens mais valiosos.

É importante a valorização da diversidade, das identidades e das manifestações culturais de épocas, de civilizações e de riquezas diversas.

A busca da preservação da nossa identidade cultural é o objectivo primeiro de toda política de preservação dos bens culturais. O acervo a ser preservado, recebido de gerações anteriores, ou produto do nosso tempo, será referido como históricos, culturais e estéticos que dão a cada comunidade sua individualidade.

3. Considerações Finais

No respeitante à produção e circulação de bens culturais há que frisar o controlo rigoroso levado a cabo pela União Europeia com todos os seus Estados-Membros, isso perdura basicamente há cerca de seis décadas. Os Estados-Membros da União Africana têm muitas dificuldades em controlar a produção e circulação dos bens, devido á questões políticas, económicas e geográficas.

Nota-se profundamente a falta de união entre os povos africanos, sem esmagar as respetivas peças constitutivas (os Estados-Membros), pelo que sugere-se que a “União” tem de assegurar, um maior grau de coesão, autoridade e identidade, que se não compaginam com esquemas traçados num contexto de muito menor interdependência entre os seus elementos constitutivos, como por exemplo, a transformação de cine-teatros em Igrejas e o abandono de museus culturais.

4. Bibliografia

DE MIRANDA, José A. Bragança, Teoria da Cultura, s/l, 2002.

LAURANO, in: a circulação intracomunitária de bens culturais no direito da união europeia:

um quadro coerente de orientações jurídicas?, 2015.

https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/turismo-e-hotelaria/definicao-de-bem-cultural/23830