Tenho acompanhado, como deveriam fazer todos os brasileiros, a situação do Executivo Federal, e as constantes manifestações contra a Presidente da República. Por vezes me manifestei em grupos de redes sociais e fui duramente criticado por não me associar a ideia de que é necessário o afastamento imediato de nossa governante.

Indignei-me com as manifestações de ódio em passeatas (QUERO MATAR A DILMA! – POR QUE OS MILITARES NÃO MATARAM A DILMA!), organizadas por detrás dos panos por partidos interessados num poder para o qual não conseguiram ser eleitos; depois me indignei com as manifestações contra os benefícios sociais que alimentam milhares de pessoas sem condições de se auto prover, o problema não são as bolsas, mas quem as carrega, quem as administra, se há desvio a culpa não é do pobre que dela precisa.

Com a recente abertura de um processo de impeachment resolvi me manifestar novamente, não que eu goste de ser saco de pancadas, é que me causa espécie como as pessoas defendem a saída de quem foi legitimamente eleita para o cargo sem considerar as consequências desse ato, ou por várias vezes, sequer saber por que defendem essa atitude.

Vou tentar ser cronologicamente lógico com os fatos políticos que levaram a esse momento de crise:

Em 2002 Lula foi eleito com a promessa de manter o equilíbrio econômico, se sujeitando, inclusive, a publicar uma carta ao povo brasileiro de que assim procederia. Por que Lula fez isso? Se estava bom com FHC, porque Lula foi eleito e não José Serra, apoiado explicitamente pelo ex-Presidente?

A resposta é simples, o governo tucano cansou o Brasil, cansou de culpar os servidores públicos pelo déficit público, cansou de escândalos sem investigação, além de outros fatores. O povo queria mudança, pois a elite estava cada vez mais rica e os pobres se tornando, a todo dia, miseráveis. Faltavam políticas sociais.

Lula passou oito anos defendendo projetos sociais que tirou milhões de pessoas da faixa de pobreza, tanto que é o Presidente pós-ditadura com maior reconhecimento internacional, algo que FHC tentou muito com seu viés intelectual, mas definhou ante o populismo de Luis Inácio. Por outro lado, esses oito anos foram marcados por um vendaval de denúncias, prisões, com a maior delas envolvendo justamente o partido que elegeu o então Presidente.

O PT mostrava que tinha mudado. Para pior. Suas lideranças ideológicas dispersaram para outras agremiações com pouca ou quase nenhuma representação, pois quem liderava o partido agora se enchafurdara no Palácio do Planalto e de lá derramaram um mar de lama chamado “mensalão”. Lula não sabia, pois, apesar de seu gabinete ser conjugado ao de José Dirceu ele não era de se meter em fofoca. A desculpa foi tão esfarrapada que mesmo quem é acostumado a mentir, como o PMDB, não acreditou. Menos mal pra Lula que seus oito anos acabaram e ele ainda tinha cacife pra reeleger a companheira que não foi presa, pelo menos no mensalão, Dilma Roussef.

A Presidente Dilma foi eleita sob a égide dos benefícios sociais, bolsa-escola, bolsa-família e outros mais que não conheço porque não uso, não preciso, pois se precisasse deles me socorreria, apesar de muitos não precisarem e utilizar na maior cara-de-pau. E assim foi seu primeiro mandato, sem nenhuma novidade. O problema é que a falta de novidade escondeu uma administradora inapta, que brigou com seu primeiro escalão por não gostar de ser contrariada; que desfez o que FHC e Lula produziram, estabilidade econômica, por não ter preparo político para tanto.

O segundo mandato de Dilma começou mal, a diferença percentual foi menor que 2 para o segundo colocado, o tucano Aécio Neves.

Pausa para o tucano. Aécio Neves é fruto de um momento histórico em que não havia novas lideranças. Agarrado ao sobrenome do avô se tornou Governador de Minas Gerais por dois mandatos, e de lá foi escorraçado sem direito a reeleger seu substituto, graças a um declínio desastroso de popularidade em razão de seu nome ser envolvido diversas vezes em escândalos administrativos e pessoais. Sua reputação estava tão baixa à época das eleições presidenciais que perdeu em seu Estado de origem para Dilma Roussef.

O partido da Presidente, nesse momento, já havia se tornado um PMDB de poucas letras, negociações vergonhosas para conseguir algumas aprovações no Congresso foram abertamente declaradas pelos seus correligionários. Promessas da então candidata, prontamente foram esquecidas, até porque só foram feitas para ganhar uma eleição que já começava a se desenhar perdida, foi o começo do declínio.

Relembrando o início do período FCH, Dilma voltou-se contra o trabalhador, cortando benefícios, aumentando tempo de aposentadoria, e impondo cortes orçamentários sem explicar a crescente evolução do capital elitista, principalmente dos banqueiros, que insistem em se tornar mais rico em meio a uma inflação que já não se via há duas décadas.

Como se já não bastasse isso para atrapalhar o laquê da Presidente, sai das cavernas do PMDB uma figura que se apresenta como o Salvador do Congresso, Eduardo Cunha. Um cidadão nobre, que nunca desviou dinheiro para o exterior, ele disse isso quando se apresentou voluntariamente na CPI da Petrobras, que não comungava com políticas de favorecimento, ele também falou isso, e com outras práticas deploráveis praticadas pela Presidente.

Alçado a Presidente da Câmara mostrou suas garras quando prorrogou por longo tempo assuntos essenciais para o futuro do país em nome do equilíbrio político. Pior pra ele, vieram as denúncias da Lava Jato (outro escândalo atribuído ao PT, mas que, na verdade, é do Congresso como um todo, é da classe política, pois os partidos que tem filiados mais presentes nas listas do Juiz Sérgio Moro são PMDB, PR e PP, logo após vem o PT e o PSDB). Com as denúncias Cunha e sua alcunha (desculpem, não resisti ao trocadilho) se enterraram na lama que Dilma Roussef estava se banhando.

Dilma já havia determinado sua decadência política no início do seu segundo mandato, porém, ainda tinha esperanças de mudar o roteiro desse filme de terror (para os brasileiros), essa esperança declinou com a ascensão de Cunha e da Operação Lava Jato. Dilma afirmou nada saber sobre os desmandos na Petrobras, calma aí companheira essa desculpa é minha (em algum momento Lula deve ter-lhe dito isso). Não colou. Sua imagem logo se agregou ao de Cerveró e outras figuras que surgiam do nada e tinham em suas contas milhões de reais da estatal brasileira.

Havia uma forma de se salvar, Cunha e Dilma deviam se unir, se uniram pra derrubar vetos que mais uma vez não foram devidamente explicados, mas que a grande mídia cuidou de estampar de forma a ser necessárias para o reequilíbrio financeiro da nação (olha o trabalhador pagando a conta aí gente!).

Puf! Como um passe de mágica a união foi desfeita, isso porque começou a aparecer provas contra Cunha, que se encampou na possibilidade de seus aliados não permitirem seu afastamento, mas que degringolou quando a Justiça Suíça apresentou comprovantes de suas contas no exterior.

Dilma partiu para o ataque, vou de CPMF, cê sabe, ninguém tava morrendo de saudade, mas a Presidente descobriu a lâmpada, ali estava o resultado para o reequilíbrio das contas. Menos uns quinze pontos negativos de popularidade. Que se dane a opinião popular teria pensado, com Cunha do meu lado eu não caio. Mas Cunha tinha outras coisas a pensar. E a se defender.

Cunha voltou suas armas novamente contra o Governo Federal. Se olharem pra lá, não olham pra mim, povo Cerveró. Começaram os jogos. PT contra PMDB (Temer está temeroso de tomar partido). Dilma contra Cunha. Primeiro tiro, PT acerta Cunha com seus três votos na Comissão de Antiética. Cunha tem a flecha do impeachment, acata o pedido e abre o processo.

Só falta uma explicação, impeachment por quê? Qual o motivo para tirar a Presidente, se ela não foi envolvida nem no Mensalão, nem na Lava Jato? O tiro veio do TCU, as denominadas pedaladas fiscais, nome que se utilizou para a operação financeira onde os bancos assumiram o pagamento de benefícios fiscais (as bolsas da vida), quando o Executivo atrasou o repasse às instituições financeiras, ou seja, o Governo atrasou, os bancos pagaram, os beneficiados receberam, depois o dinheiro foi transferido como se nada tivesse acontecido. O TCU reconheceu no caso uma operação de crédito, o que não é permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Isso ocorreu em 2014. Outro mandato. Em 2015 não há provas de que o Governo utilizou novamente desse expediente.

Não há de se esquecer que o processo de impedimento de um Presidente é um julgamento político, que deve obedecer um rito constitucional e ser fundamentado em lei. A lei que carrega os motivos de impeachment é de 1950. Quem procede as investigações é a Câmara, mas quem julga é o Senado, presidido, nesse momento, pelo Presidente do STF.

Se a Presidente for condenada quem assume é o Vice, Michel Temer, então, após um longo período de hibernação mamando nas tetas da mamis brazilis, o PMDB volta ao posto mais alto do país. Voltam figuras ilustres, Sarney, Barbalho, Calheiros se mantém por mais uns 500 anos, e afins. Temer tem se mantido omisso, seguramente espera a defesa da Presidente, caso se mostre frágil deve romper com a titular em nome de sua legenda, se o impedimento não criar força, o Vice-Presidente deve se mostrar inerte, como de costume, pelo menos assim continua com suas mordomias garantidas.

A preocupação maior nesse imbróglio é a segurança jurídica. Marca registrada da democracia, a Constituição e as leis devem ser respeitadas, sob pena de um descaminho social, do caos administrativo, da tomada do poder pela força, da volta de militares despreparados administrativamente, mas bem preparados de armas, cassetetes, etc.

E então, você ainda quer o impeachment?