Wanda Camargo*

 

Como costuma acontecer com todas as gerações, olha-se o jovem de hoje com alguma desconfiança. Parece não ter valores, demonstra não se interessar pelas grandes questões sociais, dedica seu tempo às suas traquitanas tecnológicas e redes sociais.

De fato, não tem os nossos valores, não se interessa pelas nossas questões, não fala exatamente a nossa língua - do mesmo modo como fizemos com relação aos nossos pais. Galileu Galilei precisou renegar sua conclusão de que a Terra se move em torno do sol para não ser morto, mas deixou a ressalva: “no entanto, ela se move”.

A juventude é uma invenção recente. Até há pouco mais de cem anos, a vida dividia-se entre infância e maturidade - e velhice para uns poucos. Criança era quase adulto em miniatura, usando roupas que copiava dos pais, submetida a rígidos códigos de comportamento. Como não tinha nenhum direito, seu maior desejo era ficar mais velha, constituir família, ter algum controle sobre suas vidas.

O século XX, com seus horrores, mudou radicalmente este panorama. Nos anos 1920, grande parte da população europeia e norte-americana aderiu a um hedonismo desesperado - os chamados anos loucos, em que tudo parecia permitido para se divertir, esquecer a guerra recém-terminada. Não por coincidência, foi quando o cinema, o automóvel, a indústria da moda, tiveram seu período de consolidação e desenvolvimento.

Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo entrou em um período de polarização entre dois países armados com bombas atômicas, e que ameaçavam se destruir, levando junto todos os outros, gerando clima de medo, que alimentou um niilismo existencial. Como consequência quase natural, houve, em seguida, uma espécie de reedição do frenesi dos anos loucos - e o surgimento do rock, ritmo e dança identificados especificamente com a juventude, símbolo de todo um universo comportamental que incluía modos de vestir, de agir e de falar, que eram necessariamente diferentes daqueles das gerações mais velhas.

Os jovens não queriam mais ser adultos para serem livres. Queriam apenas ser livres. A expansão e diversificação do mercado de trabalho, os anticoncepcionais, a nova moral desvinculada de preceitos religiosos, e mesmo o enfraquecimento da família nuclear, possibilitaram, bem ou mal, esta liberdade.

No final dos anos 1960, jovens estudantes franceses levantaram-se contra os “valores burgueses”. Exigiam mudanças em currículos escolares, em relações de trabalho, em tudo que viam como errado em sua sociedade. Alguns radicalizaram, pedindo até que a iluminação das ruas fosse reduzida por ser “uma medida de proteção da burguesia”. A fúria reivindicatória era sintetizada em “seja realista, peça o impossível”.

Não obtiveram o impossível, apesar da generosidade de seus propósitos. A dureza da realidade política se impôs - e os interesses dos sindicatos e partidos, que eram seus aliados a princípio, se sobrepuseram a seus ideais. Mas, daquelas ideias libertárias, anárquicas, algumas absurdas, ficaram sonhos e inspiração para várias gerações. Ficou aquele slogan, como expressão de algo que às vezes esquecemos: para realizar alguma coisa grande, devemos começar pensando grande.

Hoje, em meio à maior revolução que a humanidade já viveu, milhões de pessoas conectadas compartilham ideias, opiniões, conhecimento, e mudam o conceito do que é educação. É tempo de refletir sobre isso.

* Wanda Camargo é educadora e assessora da presidência das Faculdades integradas do Brasil – UniBrasil.