Meu trabalho mudou de endereço. A empresa agora está confortavelmente instalada em um empresarial chique no bairro Boa Viagem.

Para evitar o estresse de dirigir nos intermináveis engarrafamentos do Recife, resolvi deixar o carro em casa. Fazia tempo que eu não viajava de ônibus.

Primeiro dia, beleza. Escolas de férias, ônibus quase vazio. O desconforto foi apenas pelas arrancadas e freadas bruscas do motorista pé duro.

Segundo dia. Passa o primeiro... Lotado. Passa o segundo... Lotado. Subi no terceiro e fui, digamos, "menos em pé".

Dois quilômetros adiante descubro que o ônibus anterior (aquele que passou lotado) havia quebrado e que os passageiros - uma multidão enfurecida – agora avançavam disputando a tapas um lugar na porta de saída. Sim, amigos, esse é o lugar preferido de todos. Até daqueles que vão descer no terminal, mas que fazem questão de se acomodar ali. Talvez por algum um ímpeto psicopata de querer atrapalhar o semelhante.

Cheguei ao meu destino depois de ter sido quase esmagado por uma senhora um pouco acima do peso, mas minimizo os transtornos. Afinal, andei de ônibus a vida toda.

Fim do expediente. Saio tranquilo, planejando uma boa leitura no meu livro durante a viagem. Já havia até esquecido a viagem de ida, pois nem tudo na vida é um mar de rosas. 

Espero o Setúbal – Príncipe, mas cometo a bobagem de perguntar a uma mulher que estava na parada quais as outras linhas que passam na avenida Agamenon Magalhães.

-O melhor é PE-15 Boa Viagem, que vem um atrás do outro  -disse-me ela gentilmente.

Agradeço e subo no tal PE 15.

A cada parada entram pelo menos dez pessoas, e sabe para onde todos se dirigem? Isso mesmo, para a porta de saída. E eu estava lá no comecinho do ônibus. Eis que... Mais adiante... Outro ônibus quebrado e a aventura se repete. Subiram umas 850 almas desesperadas (devia ter mais que isso) e todos ficam aonde? Exatamente. Na porta de saída. Comecei a achar que naquele pequeno espaço deve ter ar condicionado, distribuição de cestas básicas, qualquer coisa assim.

Me bate um desespero e eu, claustrofóbico, começo a empurrar todo mundo pra enfrentar o formigueiro da porta de saída temendo perder o meu ponto de descida. Quase derrubei uma mulher que teimava em não querer soltar a barra de ferro do ônibus impedindo a minha passagem. Pisei em vários pés e escutei palavras "carinhosas", até que finalmente consegui me desvencilhar daquele enxame e quase fui vomitado do PE-15 Boa viagem.

Cheguei em casa moído e com a sensação de ter brincado o carnaval no bloco Galo da Madrugada. 

Lembrei-me da mulher que me indicou o PE 15. Criatura abençoada...

Lembrei também que amanhã é outro dia e que virão outros ônibus com as concorridas portas de saída. A essa altura começo a achar excelente a possibilidade ficar parado num longo e enfadonho engarrafamento, dentro do meu próprio carro.

Minha reverência a todos os heróis que enfrentam essa luta diária (exceto à mulher que quase me esmagou na ida e a que me indicou o PE 15 na volta).

Viajar de ônibus é Flórida... Se é que me entendem.