Giliardi Dorn[1]

 

PARTES DA HOMILÉTICA

INTRODUÇÃO

Sendo a homilética uma das principais partes de todo processo de interpretação, pois consiste na entrega do sermão à comunidade, por isso é importante que a produção do sermão seja de qualidade acentuada com o objetivo de apresentar a verdade bíblica aos ouvintes. Por isso, o objetivo deste trabalho é apresentar de forma sucinta a homilética material, bem como exegese do Antigo e do Novo Testamento e as figuras de retóricas usadas nas Escrituras Sagradas.

1 – HOMILÉTICA MATERIAL

A tarefa da homilética é fazer com que o estudante familiarize-se com as versões de Bíblia em português, aprender a usar os tópicos e rodapés, desenvolver técnicas para utilização da chave bíblica e da concordância e também perceber o valor auxiliar de dicionários, léxicos, comentários, harmonias e panoramas bíblicos na preparação de uma mensagem. A prédica alimenta-se, baseia-se, origina-se, inspira-se e motiva-se na Palavra de Deus, porque ela é o grande e inexorável reservatório da verdade cristã. Deus fala através da Bíblia, ela é o instrumento único e infalível pelo qual Deus revela Sua vontade. Por isso, para o pregador do Evangelho, não há nenhum motivo pelo qual deva desviar-se da Palavra de Deus. O pregador é o profeta divino que anuncia a mensagem de Deus para a sua geração. Quando o povo vai à igreja, deseja ouvir a Palavra de Deus interpretada com fidelidade e relevância quanto às necessidades atuais. É importante que se saiba que nem todas as passagens bíblicas são igualmente recomendáveis para a escolha de uma mensagem específica pois a Bíblia é uma verdadeira biblioteca contendo sessenta e seis livros que tratam de diversos assuntos, isso não significa que existam partes mais importantes do que outras na Bíblia, mas são diferentes entre si, por isso nem todas as passagens bíblicas são igualmente recomendáveis para a escolha de uma mensagem específica.

Nem sempre a pregação evangélica pode apresentar toda a história da salvação. Ela se fundamenta praticamente em um texto básico, numa parte pequena, em comparação com o tudo o que Deus revelou no restante da Bíblia. Mas esse texto breve é estudado, interpretado e comunicado no contexto bíblico e em harmonia com a Palavra de Deus, em sua totalidade. Assim a pregação deve ser textual, escriturística, cristológica e prática. Quando se fala do texto do sermão, referimo-nos a uma parte específica da Escrituras Sagradas, que desejamos estudar para depois expô-la a nossos ouvintes. Versículo, um ou mais capítulos inteiros das Escrituras Sagradas, ou ainda uma personagem. Para escolher o texto de um sermão é importante observar algumas regras práticas na escolha do texto como, por exemplo, escolhê-lo com, pelo menos, uma semana de antecedência, evitar optar por textos polêmicos ou de linhagem pomposa e extravagante, não se limitar ao Novo Testamento, como faz a maioria dos pregadores, variar de livros bíblicos, afim de não negligenciar nenhum dos sessenta e seis livros e, uma vez escolhido o texto, não se deve mudar mais, a não ser que o Espírito Santo assim indique claramente.

Além da oração pessoal e da direção do Espírito Santo, se tem algumas ferramentas que auxiliam na escolha do texto propício como textos apropriados para a época eclesiástica, a exposição de livros inteiros da Bíblia, a meditação sobre biografias bíblicas, mensagens acerca de temas doutrinários ou éticos da Bíblia, as devoções particulares, o serviço e o aconselhamento pastoral, uma situação crítica na igreja, algum livro teológico que se estudou, temas específicos relacionados às necessidades da igreja e o calendário anual da pregação, sendo que o mínimo de antecedência o texto para o sermão seja escolhido se escolha, da mesma forma que deve-se tomar cuidado com textos difíceis, polêmicos ou de linguagem pomposa, para que o culto não se torne uma discussão nem que os ouvintes fiquem sem entender o tema central da mensagem.

Uma ferramenta de indispensável para a produção de um sermão adequado é a exegese, que é um termo técnico teológico empregado para definir o trabalho de exposição de um texto bíblico. A palavra exegese deriva do substantivo grego exegeses, que significa declaração, narrativa, exposição, explicação, interpretação. Para os gregos os exegetai eram os intérpretes e expositores oficiais da lei sagrada. O ponto de partida da exegese é o texto. Seu alvo é uma exposição bíblica compreensível para os ouvintes. A finalidade da exegese é dispor os elementos a serem expostos de maneira clara, lógica, sequencial, progressiva e estética, de sorte a formar um conjunto convincente, por isso a exegese bíblica é necessária, para que os ouvintes possam entender a mensagem bíblica de forma adequada e que a possam colocar em prática. Existem seis condições que fazem da pregação uma prédica bíblica, estas são: preparo adequado do pregador, unidade corporal na prédica, vivência real do pregador na fé cristã, aplicação prática às necessidades existentes na igreja, equilíbrio na seleção dos textos bíblicos e pregar a verdade, mas toda a verdade, sendo alvo da exegese, uma exposição bíblica compreensível para os ouvintes.

Contudo é importante e necessário atentar para as diferenças entre a exegese científica e a exegese limitada: a exegese científica é um trabalho indicado para os comentários, para os cursos de mestrado e para professores de seminários evangélicos. A exegese do pregador é uma tarefa limitada ao essencial do texto, à compreensão popular da igreja e objetiva uma mensagem de aproximadamente de 30 minutos. Nessa exegese limitada, é legítimo pesquisar os termos principais com mais atenção, deixando de lado expressões secundárias. É preciso fazer a exegese sob a orientação divina, num espírito de submissão, obediência e oração. A exegese bíblica é uma atividade espiritual que exercemos na presença de nosso Senhor Jesus Cristo.

Pode-se usar dez passos para que se possa fazer uma exegese bíblica adequada: ler o texto em voz alta e em espírito de oração várias vezes, comparando-o com versões bíblicas diferentes para obter uma maior compreensão de seu conteúdo; reproduzir o texto com as próprias palavras, sem olhar na Bíblia, para verificar se realmente entendeu o conteúdo; observar o contexto imediato e remoto; verificar a forma literária do texto e tentar estruturá-lo; determinar o significado exato de cada palavra básica, com sua origem e seu uso pelo autor e no restante do testemunho bíblico; anotar as peculiaridades do texto e fazer uma comparação sinótica, caso o texto pertença aos evangelhos; pesquisar as circunstâncias históricas; elaborar de cada versículo ou termo principal por meio de versículos paralelos, de seu núcleo, de sua relação com a história da salvação, de perguntas didáticas e de comentários bíblicos, léxicos, dicionários e manuais bíblicos; estruturar o texto conforme seu conteúdo principal e organizador e suas seções secundárias; e resumir o trabalho exegético feito até este ponto da frase: O assunto mais importante deste texto é...

A leitura em voz alta é importante, pois faz com que o leitor esteja concentrado e mais atento ao se ouvir na leitura. Repetindo com as próprias palavras o texto a respeito do que se pregará, proporciona ciência sobre o tema e é possível perceber se o texto foi realmente compreendido. É importante a atenção voltada também ao contexto imediato e remoto, para que se possa saber o enredo do texto, que pode estar nos versículos ou capítulos anteriores ou posteriores. É importante prestar atenção nas peculiaridades do texto a ser examinado para que se possa fazer uma relação das palavras que se repetem, contrastes, sequencias, conclusões e perguntas usando-a para identificar o teor do texto e a importâncias dessas peculiaridades. A palavra contexto deriva dos termos com e texto. No contexto, consideramos tudo o que vem com o texto, ou seja, frases anteriores e posteriores, versículos anteriores e posteriores, capítulos anteriores e posteriores. O contexto é definido como o arcabouço mais amplo no qual uma passagem ocorre. Pode ser tão estreito como um parágrafo ou capítulo, mas em última análise inclui o argumento maior do livro. Em textos sinópticos, deve-se fazer uma comparação resumida, observando o material peculiar e os trechos omissos de cada evangelista, elaborando uma cronologia dos acontecimentos. A finalidade de uma sinopse ou harmonia dos evangelhos é a organização da matéria dos quatro evangelhos canônicos em colunas paralelas, de modo a facilitar a comparação nos trechos em que tratam do mesmo assunto e o realce da matéria peculiar a cada um deles, bem como as diferenças de estilo dos autores. Procura-se também dispor em ordem cronológica a narrativa para que seja conexa e contínua no maior grau possível à história de Jesus. Assim, é necessário que se analise o livro inteiro que inclui o texto, pois é importante que se tenha uma visão geral do tema do livro assim, poder ser facilitado trabalho de interpretação de determinado texto. O contexto é definido como o arcabouço mais amplo no qual uma passagem ocorre. Pode ser tão estreito como um parágrafo ou capítulo, mas em última análise inclui o argumento maior do livro.

A exegese lingüística busca a etimologia e o significado de uma palavra, enquanto a exegese gramatical procura ver o termo em relação ao restante da frase ou do versículo. A pergunta fundamental na exegese lingüístico-gramatical é sempre esta: O que realmente está escrito? Os passos da metodologia lingüístico-gramatical são os seguintes: a) Traduzir o texto do seu original hebraico ou grego; b) definir os termos principais de um texto com a ajuda de um dicionário hebraico ou grego juntamente com o NDITNT, para compreendermos sua origem, seu desenvolvimento, seu uso e seu significado bíblico e cultural. c) comparar algumas versões e traduções diferentes; d) subdividir as orações em seus componentes: sujeito, objeto, expressão principal, adjuntos adverbiais, frases secundárias: então verifica-se como cada um se relaciona com o restante do versículo; e) observar as particularidades do texto: repetições de palavras, contrastes, interrogações, conseqüências, afirmações etc; f) diferencia-se os substantivos dos verbos, advérbios e pronomes, a voz passiva da ativa, o subjuntivo do indicativo e assim por diante, para que se possa obter uma compreensão maior. A tarefa da exegese histórico-cultural é explicar dados e circunstâncias históricas, costumes e tradições que se originaram em outra cultura. A pergunta fundamental na exegese histórico-cultural deve sempre ser esta: Quais circunstâncias históricas e culturais precisam ser analisadas e compreendidas? A metodologia da exegese histórico-cultural segue os passos que seguem: a) esclarece-se o pano de fundo histórico; b) se traça as conexões históricas analisando se o texto relaciona-se com acontecimentos anteriores; c) definir o lugar a época do fato; d) explicar as tradições e os costumes; e) observar a situação geográfica. A tarefe da exegese teológico-pneumatológica é analisar os termos do texto da maneira teológica, bíblica, espiritual e doutrinária. Já a metodologia que se emprega na exegese teológico-pneumática é a seguinte: a) Esclarece-se os termos principais em relação ao testemunho inteiro das Escrituras; b) determina-se o cerne do versículo; c) observa-se o indicativo da atuação divina; d) correlaciona-se o texto com a mensagem cristológica (o Cristo prometido, encarnado, crucificado, morto, ressurreto, glorioso, exaltado, presente, que vem outra vez, consumidor, rei, sacerdote, profeta); e) define-se a finalidade prática do versículo.

A função da exegese auxiliar é utilizar ferramentas secundárias, além da Bíblia, para aprofundar a compreensão de um versículo bíblico. Tais ferramentas são: versículos paralelos, chaves bíblicas, concordâncias, dicionário, comentários entre outras. Algumas ferramentas que podem ser usadas na exegese são: versículos paralelos, chaves bíblicas, concordâncias, dicionário, comentários entre outras. Os versículos paralelos abordam os mesmos assuntos, referem-se às mesmas palavras-chave usam passagens correlatas, explicam ou apresentam em sinônimos a mesma idéia. Os versículos paralelos abordam os mesmos assuntos, referem-se às mesmas palavras-chave, usam passagens correlatas, explicam ou apresentam em sinônimos a mesma idéia. A finalidade dos versículos paralelos é fornecer ao leitor bíblico uma pequena chave bíblica móvel.

Chave bíblica são livros que representam versões bíblicas divulgadas e a função é fornecer entendimento do uso das palavras para facilitara a compreensão e a confecção de homilias. Para que a chave bíblica possa ser usada primeiramente, procura-se na chave bíblica, em ordem alfabética, o substantivo, encontra-se então muitos versículos que empregam o termo. Em segundo lugar, busca-se a forma verbal dessa palavra, e novamente encontram-se muitas referências. Depois ainda, podem-se procurar outros derivados da mesma raiz. Todas as referências oferecerão um amplo entendimento do uso da palavra e das palavras derivadas ou que se assemelham a ela. Contudo a chave bíblica difere da concordância bíblica, pois a concordância bíblica é a mais completa chave bíblica que existe, consistindo em nada mais nada menos do que uma grande chave bíblica com trezentos mil verbetes, em mais de mil páginas. Já a chave bíblica é menor com, em média de sete mil verbetes. Deve-se usar a concordância bíblica da seguinte forma: localiza-se as passagens que se busca nas escrituras, assim quando se busca por exemplo, algum lugar que fala do ‘encontrar-se com Deus’. Mas onde? Basta que seja procurado o verbete ‘encontrar’ e, passando os olhos sobre a lista de passagens sobre o verbete encontrará as referências.

Na exegese bíblica o uso de bons dicionários é indispensável para que sejam obtidos resultados claros, seguros e atualizados.  Os dicionários foram elaborados por teólogos de renome internacional, que dominam bem as línguas originais das Escrituras Sagradas e possuem um vasto conhecimento teológico, histórico, cultural e arqueológico. Um atlas bíblico também é uma ferramenta importante no processo da exegese sendo que o atlas bíblico ajuda ao estudioso da Bíblia a conhecê-la melhor. Considerando que a geografia exerce forte influência na história, grande parte da Bíblia, particularmente do Antigo Testamento, não será adequadamente compreendida a não ser quando vista no contexto geográfico próprio. É importante saber que todo o material que resultou do trabalho da exegese não cabe dentro de uma só prédica por isso existem algumas sugestões práticas que podem orientar: a) escolher apenas o material relevante ao tema de sua passagem; b) limitar-se ao essencial, ao cerne de sua mensagem; c) evitar questões puramente teóricas ou técnicas que não edificam com a congregação; d) estruturar o texto conforme material básico. É necessário também ter ciência da relação do Antigo Testamento com o Novo Testamento, pois esta se dá no fato que o primeiro testifica a revelação de Deus na história de Seu povo, Israel, do qual viria o Salvador. Israel recebeu, preservou e anunciou as promessas do Messias vindouro. O Antigo Testamento e o Novo Testamento completam-se porque tratam da mesma história e plano de salvação, do mesmo Messias, embora com perspectivas diferentes (profecia e cumprimento). Por outro lado o aspecto histórico-cultural merece uma atenção especial na análise de textos do Antigo Testamento, pois esta condição na época é influenciadora direta para a correta interpretação das passagens veterotestamentárias, tendo em vista que a Bíblia trata com centro em Cristo, relatando a história da salvação, sendo que esta significa que Deus em Seu imenso amor que todos os seres humanos sejam salvos, contudo por causa do pecado e a dureza do coração do homem, muitos não poderão ser salvos.

Existe a possibilidade que seja observada as lições práticas do Antigo Testamento, pois o teor principal dos textos poéticos é o ensino voltado para os indivíduos e para a congregação da antiga aliança. Os textos poéticos abordam todas as questões e fases da existência humana, a alegria e o sofrimento, a comunhão fraterna e a solidão, as vitórias e as derrotas, o louvor e a depressão. Quanto aos textos proféticos (Isaías à Malaquias), estes se relacionam diretamente com a história presente e futura de Israel e, às vezes, com a história da humanidade inteira. Os textos proféticos testificam a ação divina na história de Israel e na história do mundo, proclamam a vinda do Messias, trazendo salvação para os judeus e gentios, a futura restauração de Israel e a glória eterna do Messias entre as nações. As disposições estróficas são marcadas, em nossa versão da língua portuguesa, por meio de versículos, letra em itálico, estribilhos ou repetições. Às vezes a Bíblia Hebraica usa o arranjo acróstico, onde cada versículo ou linha segue a ordem do alfabeto hebraico. As características das profecias do Antigo Testamento são a testificação da ação divina na história de Israel e na história do mundo, proclamação da vinda do Messias, trazendo salvação para judeus e gentios e a futura restauração de Israel e a glória eterna do Messias entre as nações. Segundo o Apóstolo Pedro, os textos proféticos do Antigo Testamento são importantes porque alumiam nosso caminho na escuridão desta vida e porque são necessários como tais, em todo o tempo, até que venha o dia preciso do surgir da estrela da alva. Estes textos também são importantes porque constituem um guia seguro da vontade de Deus e transmitido por homens movidos pelo Espírito Santo. Desta forma, existem dificuldades cronológicas porque as características estão inerentes às profecias, pois é progressiva, cumprindo-se muitas vezes aos poucos.

Aplica-se doze recomendações praticas para exposição de textos proféticos do Antigo Testamento: 1) Fazer uma pesquisa histórica exata e ampla do texto profético, para melhor compreender os motivos que levaram o profeta a anunciar a profecia; 2) Uma análise textual e precisa é de suma importância para que se compreendam a intenção e o conteúdo da profecia; 3) Lembrar-se que não se conseguirá entender os pormenores e implicações de um texto profético, porque alguns aspectos ainda não se cumpriram; 4) Relacionar sempre os textos proféticos com a história da salvação, com o Messias prometido na primeira e na segunda vinda de Cristo e com Seu povo escolhido; 5) Buscar as passagens correlatas no Novo Testamento; 6) Observar bem as ilustrações, metáforas, visões, expressões e atitudes simbólicas dos profetas; 7) Ter o máximo de cuidado com os números. Lembrar-se de Marcos 13.32. Nada de especulações; 8) Favorecer a interpretação literal dos textos proféticos, a não ser que o contexto ou outra parte das Escrituras permitam a interpretação simbólica; 9) Considerar que os testos proféticos possuem cumprimento, ou cumprimentos parciais e finais; 10) Orar bastante e conscientizar-se de que, na exegese profética, se depende de maneira acentuada da direção do Espírito Santo; 11) Consultar vários comentários, para não exagerar na exposição; 12) Lembrar-se de que o centro da mensagem profética gira em torno da pessoa e da obra salvadora e consumadora de Jesus Cristo.

2 – EXEGESE DO ANTIGO E NOVO TESTAMENTO E FIGURAS DE RETÓRICA

A exegese do Novo Testamento difere daquela do Antigo Testamento pelo fato de o Messias já ter vindo. Enquanto o Antigo Testamento revela de maneira progressiva a vontade de Deus na história, por meio de Israel, o Novo proclama as boas novas de salvação, realizadas em Jesus Cristo, para todo aquele que nÊle crê, independentemente de sua raça, cor, origem, status social ou educação. No Antigo Testamento, Israel é o recipiente das revelações e promessas divinas, e os profetas, seus transmissores. No Novo Testamento, Jesus e os Apóstolos são os transmissores, e a Igreja é a receptora das revelações divinas para as nações. Identificam-se como sinópticos os três primeiros livros do Novo Testamento, pois fornece uma sinopse, uma vista geral dos mesmos acontecimentos. O problema surge da relação aparente entre esses três evangelhos, quando sujeitos a uma pesquisa comparativa. Ao processar-se a comparação, levantam-se certas perguntas que merecem uma análise cautelosa e detalhada, antes de se tirar qualquer conclusão definitiva. Todos os sinópticos narram a vinda do Reino de Deus na pessoa e obra de Jesus Cristo. Eles testificam a encarnação do Filho de Deus e a pessoa do Messias prometido, relatam seus discursos, ensinos, milagres, falam extensivamente de Seu sofrimento vicário na cruz e de Sua poderosa ressurreição e gloriosa volta no fim dos tempos.

Os milagres dos apóstolos e de outros líderes da Igreja do Novo Testamento originaram-se na solidariedade de Cristo com Seu povo. Foram obras realizadas em Seu nome, em continuação a tudo quanto Jesus começara a fazer e a ensinar, no poder do Espírito Santo que Ele enviou da parte do Pai. Há um elo íntimo entre esses milagres e a obra dos apóstolos ao testificarem acerca da pessoa e da obra de seu Senhor; fazem parte da proclamação do reino de Deus, e não são uma finalidade em si mesmos. O sinal visa o poder operante por trás de si mesmo, visa a glória e a grandeza de Jesus. Não é o sinal que é importante, mas seu causador. O sinal tem duplo propósito: objetivamente, revelar a glória de Cristo e, subjetivamente, gerar a fé nos discípulos. Não é o sinal que é importante, mas a revelação do poder do reino de Deus através dele, visando a glória de Deus e a fé do ouvinte. É importante interpretar os milagres como estão descritos na Bíblia para que não se perca nenhum ponto importante da mensagem, pois infelizmente muitos pregadores possuem a tendência de alegorizar e espiritualizar os milagres. Assim, por exemplo, a ressurreição física do filho da viúva de Naim, transforma-se e ele se torna o filho morto nos delitos e pecados que passa pela ressurreição espiritual. Três regras exegéticas são sugeridas que se observe na exposição de textos das epístolas do Novo Testamento: 1 – Exige-se transparência entre o ensino bíblico e a situação local e o momento histórico-cultural. Exemplos: a questão do cabelo, do ósculo santo, do falar da mulher na igreja, do vinho, do véu; 2 – Distingue-se claramente entre normas para situações locais e verdades transculturais permanentes. Exemplos: Rm 13.1-7; Ef4.28; 3 – Analisam-se detalhadamente os conceitos ou tópicos teológicos. Exemplos: propiciação, remissão, santificação, sumo sacerdote, pastor, bispo, presbítero.

A Bíblia utiliza várias figuras de retórica que serão tratadas na seqüencia. Inicia-se com o que se chama de parábola. Jesus usava esta figura para tratar de determinados temas. Parábola deriva do termo paraballo, do grego parabole que significa: jogar ao lado de, comparar lado a lado, colocar lado a lado com, manter lado a lado, pôr coisas lado a lado, figurar, tipificar, ilustrar através de. A parábola é uma narrativa baseada na experiência diária, cuja finalidade é transmitir verdades morais e religiosas. A parábola é uma espécie de alegoria apresentada sob a forma de narração. A parábola contém basicamente uma só verdade principal, e não um complexo de verdades, como a alegoria. Existem três características literárias das parábolas bíblicas: a parte introdutória, a parte ilustrativa e a parte interpretativa. Por muitas razões Jesus falou em parábolas e o primeiro objetivo das parábolas é de dimensão profética. Já no Salmo 78.2, Asafe profetizou: Abrirei meu lábios em parábolas, e publicarei em enigmas dos tempos antigos. O evangelista Mateus afirmou que essa profecia se cumpriu em Jesus, quando escreveu: Todas essas cousas disse Jesus às multidões por parábolas, e sem parábolas nada lhes dizia; para que se cumprisse o que foi dito por intermédio do profeta: Abrirei em parábolas a minha boca; publicarei cousas ocultas desde a criação (do mundo).O segundo propósito é de dimensão psico-espiritual. O evangelista Marcos relata que, por meio do ensino de parábolas, Jesus despertou em Seus discípulos maior atenção, um desejo mais intenso de compreender as verdades do Reino de Deus. O terceiro fim também de dimensão psico-espiritual, só que desta vez no sentido contrário; não para despertar a fé, mas para ocultar a verdade aos indiferentes e incrédulos ignorantes. O quarto e último propósito é o mais significativo, por ser de dimensão messiânica, Jesus falou em parábolas para revelar o segredo messiânico. Através do ensino das parábolas, Jesus revelou o ministério do Reino de Deus. Este mistério é a identificação de sua própria pessoa como Messias, o Filho de Deus, o Salvador deste mundo.

É importante que se observe os cinco passos metodológicos na exposição de parábola bíblica: 1 – Quando possível, dividir a parábola em suas três partes: introdução, apresentação e aplicação; 2 – Verificar e comparar a parábola com os outros evangelhos sinópticos; 3 – Determinar a principal intenção (ponto central) da parábola; 4 – Certificar-se que, ao explicar as diferentes partes secundárias da parábola, elas estejam em harmonia com seu objetivo primário. Se muita ênfase ao ponto central da parábola para que o pregador não chegue a interpretações fantasiosas, fazendo uma super elaboração da parábola e perdendo seu sentido primordial. É característico das parábolas bíblicas transmitir apenas uma verdade principal. As partes secundárias devem ser interpretadas em harmonia com o assunto principal. Outro problema surge quando o pregador simplifica demais, não dando atenção aos detalhes.

Usa-se também a alegoria bíblica que vem do grego alegoria, que significa fala figurada. A alegoria é uma figura retórica que geralmente conta várias metáforas unidas, representando cada uma das realidades correspondentes. Costuma ser tão palpável a natureza figurativa da alegoria que uma interpretação ao pé da letra quase se faz impossível.  A alegoria bíblica geralmente se caracteriza como uma metáfora extensa. A alegoria neotestamentária contém a interpretação em si mesma. Nunca se deve forçar um versículo bíblico para a exposição alegórica, não fazer exposições alegóricas para provar inteligência e dividir a alegoria em todas suas partículas para ver o pensamento-mestre do raciocínio bíblico.  A palavra tipologia é derivada do termo grego typos, que pode ser traduzido por impressões, imagem, exemplo. As tipologias do Antigo Testamento encontram suas devidas interpretações nas passagens correlatas do Novo Testamento. As tipologias do Novo Testamento interpretam personagens, objetos, fatos ou acontecimentos históricos do Antigo Testamento, que se tornam verdades espirituais. As diferenças estão no modo de interpretação: a parábola é, em geral, uma estória onde existe apenas uma verdade espiritual; a alegoria é uma metáfora extensa, onde não se pode interpretá-la de forma literal; existem tipologias do Antigo e do Novo Testamento, as do Antigo encontram interpretações nas passagens correlatas do Novo Testamento. As tipologias do Novo Testamento interpretam personagens, objetos, fatos ou acontecimentos históricos do Antigo Testamento, que se tornam verdades espirituais.

Metáfora é uma figura de retórica que consiste no transporte, por analogia, de um nome, de um atributo ou de uma ação, de um objeto para outro, a que não é literalmente aplicável. É possível citar três exemplos de metáforas: Eu sou a porta (Jo 10.7), eu sou o pão da vida (6.35), eu sou o caminho (Jo 14.6). Para a exposição de metáforas recomenda-se separar as partículas externas da metáfora dos princípios internos, separar o físico do metafísico, as verdades aplicáveis da metáfora sempre se referem às suas características internas. Sinédoque é figura de retórica que confere a uma frase maior ou menor extensão do que geralmente se atribui. Exemplo: Naqueles dias foi publicado um decreto de Cesar Augusto, convocando toda a população do império para recensear-se.... Todos iam alistar-se, cada um à sua própria cidade (Lc 2.1-3). Uma análise precisa desta passagem, logo se convencerá que as expressões todos e toda a população não podem referir-se ao mundo inteiro, mas, sim, a todos no mundo conhecido naquela época, ou seja, todos do Império Romano. Metonímia é outra figura de retórica usada na Bíblia que idendifica-se quando se designa um símbolo em referência a uma verdade espiritual ou moral. Exemplo: ... o sangue de Jesus, Seu Filho, nos purifica de todo pecado(1 Jo 1.7). Sabe-se que o sangue não purifica mas suja as roupas. É preciso muito sabão e ter bastante paciência para limpar uma roupa suja de sangue. Todavia, é verdade que o sangue de Jesus nos purifica, por que a Bíblia ensina que sem o derramamento de sangue, não há perdão dos pecados.

Prosopopéia é uma figura que dá vida, ação, movimento e voz às as coisas inanimadas, e põe a falar pessoas ausentes ou mortas; personificação; discurso empolado ou veemente. A ironia é uma afirmação ou comparação sarcástica, quando se expressa algo contrário à verdade ou àquilo que se quer dizer. O apóstolo Paulo chama os falsos mestres de os tais apóstolos (1 Co 11,5; 12.11). Hipérboles são exageros de uma verdade menor ou diminuições da realidades mais amplas. Exemplo: Há, porém, ainda muitas outras cousas que Jesus fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos (Jo 21.25). É evidente que este que este versículo é um exagero, pois, em termos físicos, o mundo é bem maior do que todos os atos e discursos públicos sobre Jesus que se poderiam registrar. A verdade não está na verdade físico-literal da afirmação, mas no fato de que o Apóstolo João não conseguiria relatar todos os atos e discursos de Jesus. Fábula é uma narração alegórica cujos personagens principais são animais. A fábula quase não é empregada nas Escrituras Sagradas. Símile deriva de sua forma grega simile e significa semelhante, parecido. Conseqüentemente, o símile é uma comparação de coisas semelhantes, uma analogia.

Da mesma forma é importante que se atente às interrogações quando se analisa um texto bíblico, pois, em geral, esta tem por objetivo estabelecer uma verdade moral ou espiritual profunda. A figura de retórica que se chama de apóstrofe assemelha-se muito à personificação ou a prosopopéia. O vocábulo indica que o orador volta-se de seus ouvintes imediatos para dirigir-se a uma pessoa ou coisa ausente ou imaginária. Contraste é uma figura de retórica cujas partes principais estão em oposição entre si, para estabelecer, desta maneira, uma lição moral ou espiritual. A antítese bíblica é uma tese que contradiz ou nega a afirmação, é uma tese contestada. A palavra antítese origina-se do termo latino antithesis, e significa contrastar ou colocar uma coisa contra outra.

Clímax é uma figura de retórica que se origina do vocábulo Klimax, que significa escala, graduação, progresso. A diferença entre ascendente e descendente está na sequência dos fatos. Exemplo:Clímax ascendente - Jo 15.1ss.: a) nenhum fruto (15.4); b) fruto (15.2); c) mais frutos (15.2,4); d) muito fruto (15.3); e) fruto permanente (15.16). Clímax descendente – Sl 1.1: ímpios, pecadores, escarnecedores. Tg 1.13-15: tentação, pecado, morte. Provérbio é um ditado curto, sentencioso e axiomático, cuja vivacidade está na antítese ou na comparação, que repete constantemente os pensamentos dos sábios de modo a se fixarem na mente. Os provérbios podem ser metafóricos, enigmáticos, parabólicos ou didáticos. Neste caso existem sete recomendações praticas a serem observadas e aplicadas na exegese de provérbios: 1 – Deve-se ter muito cuidado a respeito à interpretação de provérbios e, em particular, no referente àqueles que não são fáceis de entender e interpretar; 2 – Dado que os provérbios podem ser símiles, metáforas, parábolas ou alegorias, é bom determinar a que classe pertence o provérbio a ser interpretado; 3 – Estudar o contexto, isto é, os versículos que precedem e seguem o texto, os quais são a miúdo, a chave interpretação; 4 – Quando houver fracassado todas as tentativas destinadas a aclarar o significado, é melhor ficar na expectativa até que se receba a luz sobre o assunto; 5 – Não empregar como prova textos, provérbios ou outras Escrituras cujo significado não possa determinar, embora favoreçam a doutrina que se mantém; 6 – Aproveitar a ajuda que proporcionam os comentaristas eruditos no estudo das Sagradas Escrituras; eles conhecem os idiomas originais e podem proporcionar as conclusões a que chegaram os eruditos sagrados mais famosos; 7 – Acima de tudo, orar pedindo iluminação divina.

Para que se trate de passagens obscuras deve-se verificar se a obscuridade é do conhecimento da comunidade, ou suficientemente séria para interpretação da passagem toda, para merecer menção no sermão. Em segundo ligar, se fazer uma breve explicação porque ela é obscura. Em terceiro lugar, deve-se escolher o sentido mais provável, em seu entender, e explicá-lo, em vez de deixar duas ou três opções. Em quarto lugar, não será provavelmente, aconselhável conduzir a comunidade por todo o processo de exegese. A meditação é uma ferramenta importante e que deve ser usada cada vez mais. Este termo origina-se da palavra latina meditari, que significa  medir ou medir espiritualmente, avaliar, julgar. A meditação tenta medir em profundidade um objeto ou uma afirmação, para avaliar, julgar e compreender melhor seu significado e suas implicações. A meditação para a homilética evangélica é importante porque trata-se de uma contemplação espiritual em profundidade da Palavra de Deus e de uma reflexão entre o texto e a vida, sedo que o alvo da meditação bíblica é a frutificação e o enriquecimento do trabalho exegético, com o impulso pessoal para uma boa prédica. A meditação e a aplicação estão intimamente relacionadas. O que se aprende e se conhece na meditação bíblica, na presença de Cristo, transmite-se ao ouvinte por meio da aplicação.

As possibilidades da aplicação bíblica podem ser a aplicação textual, aplicação objetiva, aplicação pessoal, aplicação pastoral. A aplicação pode ser textual pois entende-se que a boa aplicação surge do texto principal, que é a base da prédica. Se a aplicação não tem nada a ver com o texto bíblico, então não pregamos mais a Palavra de Deus, pregamos apenas nossas experiências subjetivas. Para que uma aplicação seja objetiva, nunca deve ser legalista, mas diretiva; não subjetiva, mas objetiva. Aplicação objetiva, sendo o objetivo da pregação é a transparência, a compreensão do texto bíblico. Em todas as pregações onde a aplicação deve ser pessoal o indivíduo merece atenção específica, isto se torna mais óbvio na aplicação. Nela dirige-se aos indivíduos, com suas necessidades e seus problemas. Contudo as aplicações sempre são pastorais, seja a prédica evangelística, missionária, diaconal, didática, temática, expositiva ou exortativa. Deve-se fazer sentir a preocupação pastoral do pregador, o amor do pastor pelas ovelhas.

CONCLUSÃO

Conclui-se, portanto, que para que a homilética seja efetuada de forma satisfatória sem prejuízo à Palavra de Deus é de extrema necessidade que a exegese seja realizada adequadamente, tendo devido conhecimento das figuras de retórica para que se possa interpretá-las corretamente e assim, fazer a entrega do sermão aos ouvintes para que estes o recebam com a certeza de que não há contradição entre o sermão e o texto bíblico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BÍBLIA. Português. Bíblia sagrada com reflexões de Lutero. Tradução de João Ferreira de Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2012.

BIBLIA. Português. A Bíblia da Mulher: leitura, devocional, estudo. Tradução de João Ferreira de Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2009.

FEE, Gordon D. Entendes o que lês? – um guia para entender a Bíblia com auxílio da exegese e da hermenêutica. 3º Ed. São Paulo: Vida Nova, 2011.

FÓRUM ULBRA DE TEOLOGIA. Lutero, o pastor. Organização Leopoldo Heimann. Canoas, RS: Ulbra, 2006.

SCHMIDT, Werner H. A fé do antigo testamento. Tradução de Vilmar Schneider. São Leopoldo, RS:Sinodal, 2004.

LIVRO DE CONCÓRDIA. Português. Livro de concórdia: as confissões da igreja evangélica luterana. Editado por Darci Drehmer. Traduzido por Arnaldo Shüler. 5.ed. – São Leopoldo: Sinodal; Canoas; Porto Alegre; Concórdia, 2006.



[1] Cursando o Mestrado em Administração e Mestrado em Teologia, Bacharel em Administração com Habilitação em Relações Internacionais, Bacharel em Teologia. MBA em Gestão Estratégica de Negócios, Especialista em Ciência Política e Relações Internacionais. Membro da Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB).