PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 10.02.2004, horário: 10:30 horas:

Estava retornando do café e encontrei o policial “Nhônhô” sentado atrás do balcão da  portaria da Chefia da Polícia Civil, em cujo local anteriormente permanecia Walter (o ‘Guarda-Chuva Velho). Estava mais calmo que noutros dias e trazia nas mãos a resenha do dia com uma nota na coluna do Moacir Pereira com o seguinte título: “Governo antecipa reforma do secretariado”. 

Perguntei para “Nhônhô” quem era o Delegado que estava com o doutor Dirceu na festa e ele respondeu:

- “Era o doutor Feijó, doutor”. 

Argumentei:

- “Bah, alguém comentou que era o ‘Peixoto’, então era o Feijó!”.

O policial ficou rindo com aquele seu jeito simples, sabia de tudo e eu estranhei o fato do Delegado Feijó ter ido a Joinville fazer o quê? 

Data: 10.02.2004, horário: 16:20 horas:

Estava conversando sobre o episódio na “Assistência Jurídica” quando Garcez a certa altura me perguntou:

- “Será que a nossa Corregedoria está apurando a presença dos nossos Delegados naquela boate?”

Argumentei:

- “Se é um policial simples e insignificante eles caem de pau em cima...”.

Horário: 16:00 horas:

Tinha acabado de chegar junto a porta de entrada da sala do Delegado Tim Omar que estava de costas ao telefone. Depois que desligou foi direto ao comentário:

- “Ô, Felipe, entra! Estava pensando em ti neste momento, juro!” 

Pensei comigo: “Será verdade, ou seria uma mentira hipócrita?”  Depois Tim me deixou em dúvida:

- “É, estou com este monte de papel na minha mesa e aí pensei em ti”.

Em silêncio, depois de ouvir o que havia dito, pensei: “agora poderia ser verdade”.  Mais a seguir chegaram os Delegados Braga, Wilmar e Valquir.  Aproveitei para fazer uma indagação:

- “Pois é, eu quero perguntar para vocês o seguinte: ‘Qual a fórmula que nós vamos usar para fazer o Dirceu ter tesão pelo nosso projeto?’ A gente já sabe que ele planejou aquela festa lá no bordel da ‘Marlene Rica’ em Joinville. Então, se ele teve aquela tesão  para preparar a festa para a cúpula na casa da ‘Marlene Rica’, como é que nós poderíamos fazer para despertar a mesma tesão dele pelo planejamento de uma estratégia para fazer o nosso ‘projeto’ tramitar, heim?” 

O pessoal ficou em silêncio e Valquir argumentou:

- “Ué, eu não estou sabendo de nada. Me explica melhor isso Tim. É assim mesmo?”

Eu continuei:

- “Olha pessoal o nosso ‘projeto’ está aí há um ano parado. Já uma festa em um bordel parece que mexe com a adrenalina. Então nós temos que descobrir a fórmula para que ele desperte uma ‘tesão’ pela nossa proposta que esta sim deveria despertar muita adrenalina porque é institucional. A festa da cúpula no bordel é outra coisa bem diferente, vocês não acham?”

Tim concordou e eu completei:

- “Olha, pessoal, mal com o Dirceu pior sem ele, mas o fato é que nós temos que fazer alguma coisa”. 

Valquir, acabou fazendo uma revelação:

- “Vocês não sabem da festa da Ilha?  Bom, já contei aqui, lembram?”

Fiquei meio que em dúvida, pois não lembrava mais dos detalhes, já Valquir com o apoio de Tim  continuou:

- “Eu fui numa solenidade lá na base aérea. O meu filho está servindo lá. Eu fui junto com o baixinho.... Lá eu fiquei sabendo que todas às sextas-feiras o baixinho e mais o ‘P.’ pegam o barco e saem de lá e vão para a Ilha dos Guarás. Vocês sabiam que a Polícia Militar tem uma sede naquela Ilha? Pois é, todas às sextas à tarde eles se reúnem lá e ficam a tarde toda tomando ferrinho... Então esse negócio que às sexas-feiras eles viajam não é bem verdade...”. 

(...)”.

Acabamos falando sobre salário, teto e Wilmar comentou que agora o Delegado Maurício Noronha estava batalhando com o Presidente da Associação dos Fiscais da Fazenda e com os Oficiais da Polícia Militar o aumento do teto. Acabei perguntando:

- “Sim, mas quanto esses Oficiais estão ganhando por mês?”

E acabei lembrando do Delegado Noronha e qual seria a sua carta na manga? O tempo passou e ele não fez revelação alguma, será que iria ser como Lipinski que disse para os policiais em movimento grevista que poderiam esperar que o governo iria dar aumento de salários... Depois chegou o Diretor  de Polícia do Interior, Delegado Henrique, com aquele ar açoriano e eu fiquei pensando: “Meu Deus, como estamos...”. Henrique era uma boa pessoa, mas por dentro senti um vazio, era só brincadeira, conversa jogada fora, agrados, simpatias, tapinha nas costas, aperto de mãos...

“Em Joinville continuam as diligências da PM: Coronel Anilson diz que o relatório do Comissário de Menores é ‘leviano’ e ‘mentiroso’”:

“Coronel faz diligências em Joinville - O comandante temporário da Polícia Militar de Santa Catarina, coronel Anilson Nelson da Silva, iniciou ontem a sindicância interna para apurar se o coronel Paulo Conceição Caminha, comandante afastado da PM, obstruiu ou não a operação da força-tarefa que investigava a presença de menores na boate ‘Marlene rica’. Ele passou o dia em Joinville ouvindo depoimentos. Responsável pela investigação, o oficial só vai se pronunciar sobre a diligência após concluí-la. Ele tem 30 dias para terminar a apuração. Caminha admitiu em entrevista gravada à reportagem de A Notícia que estava na boate naquela madrugada como ‘pessoa comum’, mas negou que tenha impedido a operação dos policiais. ‘O relatório desse comissário (Milton Francisco da Silva) é leviano e mentiroso. Eu estava lá na condição de pessoa comum. Não me apresentei como comandante e nem disse quem eu era’, sustenta Caminha. O oficial nega ainda que tenha dito que o secretário de Segurança Pública e Defesa do Cidadão, João Henrique Blasi, também estava com ele na casa. O militar contou ainda que, quando os homens da força-tarefa chegaram na boate ­ que ele não reconhece como prostíbulo, mas como uma boate reservada ­, Marlene o teria chamado e dito: ‘Caminha tem gente aí! É um monte de policiais’. ‘Disse para ela não abrir, porque poderia ser um assalto. Fomos até uma janelinha. Pode perguntar para o tenente (Reisdorf, comandante da força-tarefa)’, complementa o coronel. O caso chega hoje a Brasília. O deputado federal Leodegar Tiscoski (PP) terminou de reunir ontem informações sobre o episódio que foram divulgadas em jornais e revistas. Ele vai entregar o material à Comissão Parlamentar de Inquérito da Prostituição Infantil no Congresso Nacional. O parlamentar quer que a CPI peça esclarecimento ao governo do Estado sobre o caso” (A Notícia, 10.02.2004). 

Deputado “Vieirão” diz que tinha mais gente no bordel:

“Vierão quer CPI - Ontem, o deputado estadual José Carlos Vieira, do PP, revelou a possibilidade de ser instalada uma CPI na Assembléia Legislativa, a partir de denúncias de exploração sexual infanto-juvenil, que culminou com o impedimento da força-tarefa, por determinação judicial, de cumprir a fiscalização em luxuosa boate da zona Norte da cidade, conhecida como Marlene Rica. Episódio despertou também as atenções dos parlamentares que integram CPI no Congresso Nacional, que investiga esse tipo de crime. O impacto na mídia nacional também foi grande com reflexos negativos para a imagem do Estado. Vieirão tem certeza de que tinha mais gente na boate, além do comandante da PM: ‘Ninguém fecha uma casa desse porte para festinha reservada apenas para uma pessoa’, argumenta. Tudo vai depender agora da investigação do ministério público e se haverá oferecimento de denúncia ao juiz” (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 10.02.2004). 

Adélcio (Secretário Adjunto do PMDB) diz que muitos deputados frequentam esse tipo de bordel e o Deputado Federal Ronaldo Benedet (do sul do Estado e ligado ao Governador Pinho Moreira) entra no páreo para assumir a Secretaria de Segurança Pública no lugar de Blasi:

“PMDB nega ter debatido caso - O caso não foi discutido ontem durante o encontro da executiva estadual do PMDB. O grupo se reuniu no diretório do partido, em Florianópolis. O secretário-adjunto da sigla, Adélcio Machado dos Santos, jura que a pauta se limitou a apenas dois assuntos: registro de novos diretórios e a revitalização das coordenadorias regionais. ‘Temos absoluta confiança no secretário Blasi. Se tivéssemos alguma dúvida, teríamos discutido esse assunto’, disse, taxativo, Adélcio. O deputado estadual Ronaldo José Benedet (PMDB) avalia o episódio como um ato político para prejudicar a candidatura de João Henrique Blasi à Prefeitura de Florianópolis. "Há tantos deputados que frequentam esses lugares (casas de prostituição). A questão (presença do coronel Caminha da boate) não é legal, mas moral", diz o parlamentar, cotado para assumir o cargo de Blasi quando este se desincompatibilizar em março para participar da sucessão municipal” (A Notícia, 10.02.2004).

“Secretariado: reforma antecipada - Uma conversa telefônica entre o governador Luiz Henrique, que se encontra em Nova York, e o governador interino Eduardo Pinho Moreira poderá definir a alternativa política que o governo e o PMDB procuram para tirar do noticiário o escândalo de Joinville envolvendo a cúpula da segurança, em processo de obstrução de investigação em boate suspeita de presença de menores. Há múltiplas variáveis. O secretário João Henrique Blasi ser aconselhado a se exonerar para sair do epicentro do explosivo episódio. A volta à Assembleia Legislativa poderia sinalizar, contudo, algum tipo de cumplicidade, de efeitos negativos para seus projetos políticos. Outro caminho poderia ser a substituição integral das principais autoridades da segurança pública. Seria uma forma de impedir que todo o governo fosse envolvido no rumoroso caso. Essa é uma das preocupações de Luiz Henrique e de Eduardo Moreira, convencidos de que a permanência da atual estrutura oferecerá prato cheio para as oposições. A viagem do governador a Nova York acabou se transformando num problema para a busca de uma solução rápida. Distante dos acontecimentos e não estando no efetivo exercício do cargo, encontra dificuldades para se posicionar e decidir. Esperar para seu retorno dia 21 de fevereiro constitui tempo muito longo para uma solução. Ademais, se até a volta do governador o tema continuar na ordem do dia, seu desembarque será marcado por perguntas delicadas sobre a ocorrência em sua base eleitoral. A hipótese que vem ganhando corpo dentro do PMDB e do governo: ampla reforma do secretariado estadual. Prevista para acontecer em abril, quando secretários deixariam os cargos para disputar as eleições municipais, a ampla mudança pode ocorrer já. Nesse caso, a cirurgia política será mais radical” (A Notícia, Moacir Pereira, 10.02.2004).