PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 06.01.2004, horário: 17:00 horas:

Estava em São Francisco do Sul e resolvi telefonar para Garcez. O telefone tocou, tocou e nada. Em seguida liguei para Tim Omar que atendeu a ligação. Sua voz não conseguia esconder certa decepção e um julgamento moral, como se minha ausência não pudesse ser justificada. A bem da verdade Tim se sentia abandonado sem a minha presença intensa, com isso revelava certa   ansiedade no sentido de querer ver fluência nas atividades do seu “grupo”. Nesse contexto a impressão era que minha ausência passava a ser um caso sério.

Procurei driblar aquele seu ar melancólico afirmando:

- “Eu não fui trabalhar ontem e hoje porque me convocaram para trabalhar no feriado, o Valquir também”. 

A seguir, depois que justifiquei minha ausência Tim já se mostrava mais conformado e disse:

- “Pois é, estivemos lá embaixo e não tinha ninguém, nem você nem nada do Garcez, agora lá fica fechado...”.

Insisti sobre a convocação no feriadão de final de ano e argumentei que problemas com a minha obra... e que Garcez provavelmente faltou porque estava com sérios problemas na família pois sua esposa estava com um tumor seio. Tim parece que entendeu e perguntou:

- “Mas amanhã tu estais por aqui, né?”. 

Respondi:

- “Sim, de manhã cedo em já estarei aí...”.

Tim retrucou:

- “O quê?”

Continuei:

- “Sim, de manhã cedo já estarei aqui!”

Tim completou:

- “Fica tranqüilo, não te estressa!” 

Data: 07.01.2004, horário: 14:30 horas:

Garcez estava na “Assistência Jurídica” daquele seu jeito, tipo coração saltando pela boca, parecia bem “adrenado” e que precisava conversar comigo:

“...O Goulart da Deic telefonou!”

Tive que obstar sua frase porque estava entretido com outra ação não concluída e, ainda, mais meu celular que estava tocando. Passados alguns instantes tratei de dar atenção a Garcez que disse:

- “Encontrei o Braga e ele disse que tu estavas puto da cara. Ele disse: ‘o Felipe ta puto da cara porque convocaram ele para trabalhar no feriadão.  O Felipe ta ‘puto da cara’! Tu vê, tu tivesses que trabalhar dois dias no feriadão? Eles te convocaram mesmo?” 

Respondi:

- “O quê? O Braga disse isso?  Meus Deus, eu fui convocado para trabalhar, mas só que vim com prazer. O que é isso, eu nem conversei com o Braga, como é que ele pode dizer uma coisa dessas? Eu telefonei ontem à tarde para o Tim e ele disse que nem eu e nem você estávamos na “Assistência Jurídica”, que estava tudo fechado aqui embaixo, pode?”

Garcez não acreditou que Tim tivesse dito aquilo, mas eu insisti:

- “Sim, agora tu vê Garcez o Wilmar não vai as nossas reuniões, o Mauro não aparece e outros membros faltam um monte e ninguém fala nada. Agora quando eu preciso faltar justificadamente, em vez de reconhecerem, defenderem, compreenderem..., brincadeira. O Dirceu fez a mesma coisa na semana passada. Sim, retrasada, acho que foi na sexta-feixa antes do feriadão. Segundo eu soube, ele chamou o ‘grupo’ na sala dele para reclamar que estava descontente com o nosso trabalho. Ah, mas eu cheguei lá e fui dizendo para ele que ele, isto sim, deveria nos agradecer por ter empenhado o nosso nome trabalhando para este governo. Olha só Garcez, o Tim é comissionado, o Braga também... este ‘grupo’  é político e nós estamos lá colocando nosso nome, defendendo a administração dele. E o Dirceu vem dizer que está descontente como o nosso trabalho, dá licença!” 

Depois argumentei que a criação do ‘grupo’ foi uma forma de esvaziamento do Conselho Superior da Polícia Civil e que se nós tivéssemos aquele “jornalzinho” certamente que eu escreveria uma matéria com o seguinte título: “O Triste Fim do Conselho Superior da Polícia Civil”, começando pela administração passada. Garcez fez uma ponderação tipo quixotesca:

- “Quem tem que tomar alguma iniciativa seria um dos membros eleitos para o Conselho Superior. Eles é que deveriam adotar alguma medida judicial. O que não dá é para a gente ficar se expondo, se submetendo a retaliações. Não, Felipe. Isso não! Por isso que eu só quero me aposentar. Estou até com vergonha de trabalhar aqui, não sei quase nada de informática, é muito difícil aprender, não sei se é a idade. A Laila está me dando umas aulas, mas é muito difícil. Eu estava conversando ontem lá com o Arilton e ele contou que duas pessoas foram convidadas para ocupar o cargo de “Assistente Jurídico” aqui, ninguém teve coragem de aceitar. Felipe, não tem ninguém em condições de se ombrear contigo. Eu tirei cópia de todos os teus pareceres. Estou lendo lá em casa. Eu sinceramente acho uma sacanagem o que fizeram contido, não te nomeando para o cargo aqui, não tem ninguém a tua altura.

Em seguida Tim Omar telefonou para a “Assistência Jurídica” pedindo a minha presença porque o pessoal estava reunido e precisava muito  de mim... No telefonema desabafei:

- “Tim eu estava na segunda-feira lá em São Francisco do Sul e de manhã fui à solenidade dos ‘Quinhentos Anos’  da cidade. O Governador Luiz Henrique começou com um ‘Bom-Diá!’ a todos. No palco da solenidade estava o pessoal do governo, autoridades... Olha eu contei dois Oficiais da PM e mais um Primeiro Tenente circulando de um lado para outro. E procurei pelo Delegado de São Francisco, pelo Delegado Regional de Joinville...”.

Tim interveio:

- “Pelo Blasi!”

Continuei:

- “Sim, pelo Secretário, pelo Dirceu Silveira, pelo Colatto. Não, nenhum representante da Polícia Civil estava lá...”.

Tim interveio novamente:

- “Tinha você lá de Delegado”.

Continuei:

- “Eu estava junto ao público, mas no anonimato, era um expectador dos fatos. Mas o Governador fez questão de citar com o seu bom dia um a um dos presentes no palco. Olha, Tim, a Polícia Civil possui tanta história, tu sabes que eu trabalho no resgate desse nicho. Por que não criaram um grupo para apresentar um trabalho de resgate da história policial da cidade desde a época das Ordenações. Imagina, nessa solenidade poderíamos lançar uma obra em homenagem à cidade, mencionar os fatos históricos na área de segurança pública, que momento, heim?” 

Tim concordou que se perdeu um bom momento para se divulgar a instituição, o trabalho policial e a segurança pública. Superado esse assunto, fiz um outro desabafo:

- “O Garcez estava me contanto que o Braga andou dizendo para ele que fiquei ‘puto da cara’ porque me convocaram para trabalhar no feriadão, o que é isso? Olha Tim, muito pelo contrário, eu fiquei muito contente de ter sido convidado a vir aqui dar minha contribuição. Isso significa que o meu trabalho é reconhecido, valorizado. O Braga não pode sair por aí soltando essas, daqui a pouco chega no ouvido do Dirceu e ele é capaz de pensar que é verdade. O Braga tem esse costume, é uma brincadeira de mal gosto da parte dele”.

Passados uns vinte minutos retornei até a sala de Tim Omar e lá encontrei Braga e Valdir. Logo que me viu chegar Braga foi afirmando:

- “Eu não disse nada disso para o Garcez. Ele inventou. Eu não disse nada disso que tu estavas ‘puto da cara’. Eu não disse isso, Felipe!”

Enquanto isso, Tim Omar prestava antenção no que Braga dizia e Valdir fazia a mesma coisa. Procurei não dar importância para o assunto até porque já conhecia as tiradas de Braga. Intervi, lamentando a ausência de Valquir e fui externando meu pensamento:

- “Nesse feriadão eu pensei muito. Pensei naquele nosso encontro com o Dirceu. Eu já percebi que o Dirceu é uma pessoa que opera no campo negativo. Ele não é capaz de reconhecer os bons serviços dos policiais, ele não é capaz de elogiar, ele é uma pessoa que tende ao negativismo, à crítica, só não sei se é porque a melhor defesa é o ataque, e como ele esta no cargo de Chefe de Polícia, a melhor tática é ir atacando quem cerca ele.  Eu não gosto disso, não é o meu estilo. Eu tenho certeza que vai terminar dois mil e quatro e ele vai chamar novamente o ‘grupo’ para reclamar. Não tenham dúvidas disso, é do estilo dele, esse é o seu perfil, não sabe elogiar, sabe apenas criticar, é da essência dele...”. 

Alguém comentou:

- “O Lipinski também era assim...”.

Eu intervi rapidamente e argumentei:

- “Tem uma diferença, o Lipinski poderia até ser t. como diziam por aí, mas  o Dirceu não, pelo menos ele é sincero, é o jeito dele, é a sua personalidade, desconheço que ele seja traiçoeiro. Mas voltando ao assunto, o nosso ‘grupo’ aqui é um ‘grupo’ político, não é? Ele serve para dar sustentação aos projetos políticos do Chefe de Polícia que foi colocado no cargo politicamente, certo?”

Valdir, Braga e Tim pareciam em dúvida, querendo insistir que o ‘grupo’  era técnico e eu reiterei meus argumentos que deveria ser técnico, mas não era. Deu a impressão que acabaram concordando comigo e eu continuei:

- “Pois é, numa das primeiras reuniões que tivemos eu questionei que este ‘grupo’ estaria afrontando o ‘Conselho Superior da Polícia Civil’ e sabe o que o Peixoto me disse? Ele disse: ‘esquece, esquece  o Conselho, não funciona, nunca funcionou...’. Vocês sabem porque o Conselho está assim desacreditado? Isso começou no governo passado, com o Lipinski que não prestigiou o Conselho. Com a nova legislação que reorganizou a Polícia Civil nós ficamos com quatro cargos de direção, antes eram sete. Vocês sabem que são sete membros eleitos e agora ficariam só quatro comissionados, isso contando com o cargo de Chefe da Polícia Civil. Não temos mais o Corregedor-Geral, o Diretor do Detran não pertence à Polícia Civil, nem o Diretor da Academia. Então, a cúpula ficaria em minoria. O jeito foi criar esse grupo como forma de dar sustentação política aos projetos desta administração. Isso é certo? Sinceramente se eu fosse um dos membros eletivos do Conselho certamente que eu iria tomar uma providência, ficaria injuriado. Eu estava cobrando antes lá embaixo do Garcez aquele jornalzinho que ele e o Sena ficaram responsáveis de gerenciar”.

Braga intercedeu:

- “Precisam ver, o Garcez e o Sena acabaram com a reunião...”.

Continuei:

- “Pois é, já se passaram mais de dois anos e até hoje nada, eu gostaria de escrever um artigo nesse jornalzinho com o seguinte título: ‘O Triste Fim do Conselho Superior da Polícia Civil’, pegaria desde o governo passado até a criação deste grupo. Mas voltando ao assunto, vocês sabem a diferença de um ‘xeque-mate’ para um ‘xeque-gardê’? Pois é, o Dirceu nos deu um ‘xeque-gardê’ naquela reunião, ou seja, ou acabava com o grupo ou o grupo passava a dar sustentação política aos projetos da administração. Vocês sabem que a gota d’água foi aquela nossa deliberação contra a criação das seis diretorias que a Polícia Militar conseguiu. Nós dissemos a verdade, que nosso caminho não era ficar imitando a Polícia Militar, seguindo os caminhos deles. Só que fomos contundentes. O  trabalho deste ‘grupo’ é saber externar suas opiniões, especialmente, para o Chefe de Polícia, ele tem que entender que tem limites...”.

Braga interrompeu:

- “O futuro Secretário?”.

Parei um pouco, pensei e argumentei:

- “É um homem maravilhoso, que Delegado, meu amigo...”.

Todos riram, Braga, Valdir... Tim Omar ficou meio que surpreso com minhas palavras e eu procurei matar curiosidades:

- “É sério? Não acredito...”.

Braga insistiu que Dirceu estava muito forte e com a saída do Secretário Blasi da Secretaria de Segurança para concorrer a Prefeitura de Florianópolis já havia sido convidado para ser o novo Titular da Pasta. Procurei não perder o foco de minhas ponderações, especialmente, quando todos entenderam  a minha brincadeira:

- “Sinceramente, eu acho que nós devemos colocar como prioridade a nossa consulta aos Delegados. O nosso projeto da Procuradoria-Geral,  de criação do segundo grau da carreira de Delegado está lá engavetada. Dessa proposta dependeria uma série de coisas. Eu acho que nós temos que primeiro insistir nessa nossa consulta para sabermos quais as reais aspirações de nossos Delegados. A situação está terrível. Temos que acabar com uma série de mazelas, como a falta de hierarquia, a politicagem... Imagina, temos que passar esperança para o nosso pessoal. Eu estava conversando com o Garcez lá embaixo e ele só fala que quer se aposentar, quer ir embora. Nós temos que mudar isso, o pessoal tem que chegar ao final da carreira pensando diferente, falando bem, demonstrar otimismo...”.

Tim me interrompeu:

- “Tem que chegar no final da carreira com um sentimento de orgulho, satisfação, de ter honrado a camisa, de satisfação, e não como vem ocorrendo por aí!”.

Continuei:

- “E tudo passa pelo nosso projeto. Vamos consultar nossos Delegados para sabermos o que eles realmente querem para o nosso futuro. Eu tenho certeza que depois dos resultados se a grande maioria concordar com nossas ideias o Dirceu não vai ter como segurar. Agora se a grande maioria entender diferente aí sinceramente eu desisto dessas ideias, mudo o foco, e passo a trabalhar noutra direção. Mas precisamos ouvir nosso pessoal...”.

Depois comentei se a maioria entender que nós devêssemos prosseguir com o nosso projeto aí nós deveríamos dar um xeque-mate no Dirceu Silveira. Todos concordaram e Valdir argumentou que nós deveríamos fazer uma “pesquisa” e não uma consulta. Fui para o computador e comecei a redigir a proposta de deliberação e a planilha da pesquisa.  Nisso já estavam na sala Wilmar Domingues e Arilto Zanelatto...