PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 27.04.2004 – “Blasi se recupera do caso do “bordel”, segue seu caminho seguro e mata no peito seus desafios”:

“Saia Justa – O deputado João Henrique Blasi é do partido do governador e advogado por profissão. Portanto, em tese, deveria votar favoravelmente  ao projeto que permite o uso de 70% do dinheiro da conta única, já que a matéria é de interesse direto da classe e do Poder Executivo. Deveria se o Tribunal de Justiça não se sentisse prejudicado pela proposta. Votaria o deputado contra os desembargadores e juízes?” (DC, 10.08.04).

Gilmar Knaesel, frequentador do “Scuna Bar” (embaixo da Ponte Hercílio Luz – Florianópolis), segue o seu caminho, só não se sabe se seguro ou se queimando tempo?

Fora – Ao embarcar para Portugal,com retorno marcado para quinta-feira dia 3, o secretário Gilmar Knaesel sinalizou que não é candidato à prefeitura de Blumenau. Ocorre que teria que se desincompatibilizar até o dia 2,quarta-feira” (site: pauloalceu.com.Br, 1.6.2004). 

Secretário – Gilmar Knaesel, apesar de admitir que pode ter feito desabafo a amigos em momento de cabeça quente, assegura que não pensa em deixar o primeiro escalão” (DC, 17.08.04). 

E a impressão era que tudo ficava reduzido a “batalhas de campanhas” porque quem estava no poder tinha a obrigação de segurar tudo. Então, a oposição experiente e competente passou a vigiar e atacar o governo do PMDB com a política do “denuncismo“ e sobrou para a Polícia Militar:

Batalhas de campanha – Sobraram reuniões e telefonemas na cúpula do governo desde que a notícia de que um caminhão da PM e dois policiais da corporação foram usados na organização do comício que teve a participação do candidato Dário Beger (...).  Coordenador de campanha de Chico Assis, o deputado Celestino Secco reage com uma pitada de ironia: - Já imaginastes como nós entraríamos num quartel da PM, sequestraríamos um caminhão, e, ainda por cima, obrigaríamos dois policiais a nos ajudar? Não estamos  dizendo que foi o governador ou o comandante da PM, mas alguém usou a máquina, rebate Secco. Luiz Henrique determinou e o secretário Ronaldo Benedet atendeu. Está em curso uma investigação interna para investigar o caso. Alguém, certamente, deve ser responsabilizado” (DC, 26.10.04).

Data: 12.11.04, horário: 10:30 horas – “Bons tempos aqueles”:

Depois de deixar o gabinete da Delegada Marilisa Boehn em Joinville, me dirigi a 7ª DP, a fim de fazer uma visita rápida ao Delegado Dirceu Silveira. Fui informado que ele estava em seu gabinete e para lá me dirigi, abrindo a porta e flagrando o mesmo sentado junto a sua mesa de trabalho, ostentando um semblante menos formal que das outras vezes. Pude perceber que Dirceu Silveira estava com a barba por fazer, trajes esportivos, sem aquela sua aura de quem já foi rei não perde a majestade, parecia um Delegado comum da linha de frente.

Certamente que o uso de trajes formais talvez tivesse tudo haver com sua estatura baixa, e que para compensar principalmente o seu tamanho e finura, um dos truques para lhe dar visibilidade que no seu caso seria caprichar no traje social, porém, não dessa vez que retornou ao lugar mais comum. Dirceu me recebeu sorridente por me rever e isso gerava uma boa energia de quem avistava, digamos, uma espécie de sol, era um sentimento que sempre parecia igual.  Confesso que tive saudades do seu tempo na Chefia de Polícia, quando se respirava liberdade, não havia regime de terror, opressão, patrulhamento ideológico, imposição de doutrinas internas de dominação..., apesar da tristeza nos projetos, da falta de resistência, do jogo de habilidades... 

Com prazer me sentei à frente de Dirceu e começamos a conversar sobre tudo. Ele foi argumentando que não era nem para estar ali, pois havia tirado plantão na “CPP” durante a madrugada. Pensei em perguntar onde estava o Delegado Zulmar Valverde, mas acabei desistindo porque logo imaginei que ele não estava trabalhando. Dirceu fez uma importante revelação:

- “O pessoal aqui tem certa resistência ao Hilton Vieira. Tu podes notar, ninguém aqui tem qualquer preocupação com o Felipe Genovez, mas com o Hilton Vieira... Todo mundo sabe que ele é ligado ao Marco Aurélio (Marcucci). Nós acabamos de ter uma reunião aqui com todos os Delegados, o pessoal aqui está bastante unido, tu precisas ver. Eu só estou aqui por causa da reunião. Nós discutimos sobre tudo”.

Fiquei ouvindo Dirceu Silveira falar e de vez enquanto intercedi para fazer minhas colocações, como sobre a falta crônica de efetivo, a questão da falta da hierarquia, o clima de insegurança dentro da Polícia Civil. Argumentei que Marcucci se saiu bem nas eleições e Dirceu disse:

- “Mas aqui as coisas não parecem o que são. Ele fez uma boa votação porque tem um deputado, o Nilson Gonçalvez que investiu nele. Depois teve o caso do pessoal dos ‘caixeiros viajantes’...”.

Interrompi para perguntar:

- “Dizem que o Marcucci gastou muito dinheiro para se eleger, sabes quanto ele gastou?”

Dirceu deixou transparecer aquele seu sorriso indefectível e disse:

- “Muito dinheiro, mais de cem mil reais”. 

Alguém tinha me falado em quinhentos mil, mas eu não tinha ideia de quanto, acho que nem Dirceu Silveira nesse ponto estivesse blefando. Resolvi perguntar:

- “Mas parece que existe o projeto do Marcucci de se eleger Deputado Federal e ser Secretário de Segurança, tais sabendo?”

Dirceu respondeu:

- “Sim, mas as coisas não parecem ser o que parecem”.

Fiquei intrigado com aquela sua resposta porque já tinha dito isso antes e a impressão era que eu não estava entendendo bem as coisas.  Resolvi perguntar:

- “Mas o Marcucci tem boas chances, imagina, o PSDB está se fortalecendo para o governo do Estado, tem a faca e o queijo nas mãos para as próximas eleições e se receber o apoio do Tebaldi... Dizem que o Thomé já tem um acerto com o Marcucci para que ele seja o candidato único da Polícia Civil à deputado federal...”.

Dirceu me interrompeu:

- “Mas as coisas não parecem ser o que parecem, Felipe. O Tebaldi não pode nem ouvir falar no nome do Marcucci...”.

Interrompi:

“Como é que é? Eles não tiraram fotos juntos antes da campanha? Eles não são do mesmo partido? Eu não estou entendendo...”.

Dirceu continuou:

- “Como eu te disse, as coisas não parecem ser o que parecem. O Tebaldi não pode ouvir nem falar no nome do Marcucci, pergunta lá para ele...”.

Nisso tocou o telefone de Dirceu Silveira e pude perceber que ele citou o nome de “Angelo”, logo imaginei que se tratasse do Comissário Angelo Cantelli repassando orientações internas. Logo que ele desligou eu exclamei:

- “Já sei, era o Angelo Cantelli!”.

Dirceu contendo sua surpresa confirmou que se tratava desse policial.  Lembrei que precisava conversar com ele urgente. Aproveitei para lamentar mais uma vez o episódio da casa da “Marlene Rica”, argumentando que se não tivesse havido aquilo até hoje nós estaríamos com Dirceu Silveira no comando da Polícia Civil. Lamentei, também, que Dirceu não tivesse conseguido emplacar nosso anteprojeto de criação da “Procuradoria-Geral da Polícia Civil”, tendo ele confidenciado que o nosso “anteprojeto” não vingou porque houve uma mobilização muito grande dos “Peritos” na Assembleia Legislativa contra os Delegados na tramitação da LC 254/03 e qualquer coisa que tratasse sobre benefícios aos Delegados que fosse remetida à Assembleia Legislativa teria fortes resistências.

Dirceu relatou que havia um movimento muito grande dos Peritos para se emanciparem da Polícia Civil e que teve que ser feito um trabalho muito árduo para se conter esse processo de cisão na instituição. Ouvi atentamente  e acabei concordando em parte com Dirceu porque o encaminhamento de um “projeto” para a Assembleia Legislativa era algo muito complexo. E não dava para esquecer “Lipinski” (e o triunvirato), o Secretário Antenor Chinato e o Governador Esperidião Amin que começaram a fomentar esse processo emancipacionista dos Peritos... Sabidamente, os Peritos haviam apoiado em massa o governador Amin nas eleições para o governo. Paradoxalmente, o governador Luiz Henrique da Silveira e os parlamentares estavam parecendo simpáticos com as reivindicações dos Peritos, por quê?

Quase que perguntei para Dirceu por que ele não reuniu o pessoal do “grupo” de trabalho liderado por Tim Omar para prestar esses esclarecimentos. Certamente que sua postura pareceu totalitária, prepotente..., o que seria bem possível quando se tratava de alguém que reinava absoluto e estava “contaminado” pelo poder.  Com relação ao Delegado Marcucci, Dirceu Silveira externou sua preocupação com o futuro, pois o mesmo era uma pessoa fora de controle, instável emocionalmente e imprevisível. Acabei concordando, lembrando a história de do ex-Delegado “Sérgio Lélio Monteiro”, em Chapecó.  

Depois que encerramos nossa conversa, deixei o local e fiquei pensando melhor sobre o passado. Acredito que a principal marca da sua gestão à frente da Chefia de Polícia foi se propiciar um clima de liberdade, valorização profissional e criatividade, tudo isso com responsabilidade, pelo menos da minha parte e pelo que pude observar de outros colegas, bem diferente de outras “Eras” (algumas com dirigentes opressores, castradores, maquiavélicos..., bem típico do universo de “polícia” e suas relações com a marginalidade, autoritarismos...),  que faziam com que ninguém se sentisse em chão seguro, fazendo com que a grande maioria se sentisse numa zona de instabilidade, perigo, insegurança constante. Aliás, tudo isso aplicado com os mecanismos “departamentais” e seus “cargos comissionados”, bem menos direcionados para os “amigos do poder” que não sentiam tanto essa motivação e a política de opressão e obediência cega, enfim, o clima era governar pela imposição da política do medo velado ou imposto de forma ostensiva, constante ou incisiva, cuja modulação dependeria do grau de risco gerado pelo opositor e do contexto (do meio e interesses).

Lembrei a época do Delegado Trilha à frente da Chefia de Polícia, pois que juntamente com a Secretária Lúcia e do Delegado Lourival, formavam uma cortina de poder intransponível e avassaladora para opositores... Para tanto, contavam com a estrutura de poder, Delegados e policiais situados em cargos hegemônicos, além da legião de bajuladores ávidos por servirem na política do “denuncismo” interno e no no jogo das habilidades em troca de seus interesses e favores (o famoso ‘balcão de negócios’) e a condição era sobreviver.

Tivemos momentos que essa política opressiva foi minorada e até anulada, como durante as gestões do Delegado Antonio Abelardo Bado, Jorge Xavier, Oscar Peixoto, Ademar Rezende, Evaldo Moreto..., em cujas gestões também se respirou mais liberdade, especialmente, porque se propiciou um ambiente para se pensar, criar, trabalhar, crescer... em favor da instituição. Se não souberam aproveitar, isso foi outra história e isso se aplicava, inclusive, à gestão de Dirceu Silveira! De sorte que ao longo de décadas e até séculos tivemos “Chefes de Polícia” que de alguma forma – no seu devido espaço e tempo – souberam cumprir seu papel com dignidade (um exemplo seria a “Era Jucélio Costa”). Outros nem tanto, porque ou foram “chefinhos”, estes os bonzinhos, habilidosos, desconectados, despreparados... e os “chefetes”, estes egocentristas que transitavam entre serem opressores, manipuladores, politiqueiros, utilitaristas, maquiavélicos, perseguidores, incendiários... e, talvez, alguns poucos, até “bem intencionados” ou  que acreditavam que estivessem fazendo o seu melhor...

Tentei em vão entrevistar o Coronel Danilo Klaes (Exército) alguns anos antes do seu falecimento (Chefe das Polícias entre os anos de 1964 e 1966), porém, não obtive sucesso já que ele mandou dizer por meio de sua esposa (minha prima irmã) que não poderia..., e até hoje me pergunto por quê? Olhando a sua trajetória à frente da Segurança Pública, o que fez durante os primeiros anos regime militar (uma das minhas perguntas seria por que não implantou a “Escola de Polícia” o que só veio a ocorrer a partir de 1967). Também, tivemos a seguir o grande General Rosinha (implantou a Escola de Polícia, reorganizou as carreiras policiais...) e, também, o Coronel Peret (reorganizou a Polícia Civil, na sua gestão foram reorganizadas as carreiras policiais, implantada a “Superintendência da Polícia Civil” com a centralização de vários órgãos estratégicos, criada a “Corregedoria-Geral...), cada um com suas características e gestões fortes na Chefia das Polícias, estes bem intencionados, porém, talvez não atentarem como se esperava para as aspirações de uma nova Polícia que poderia ser unificada nos seus comandos já naquela época, o que seria invariavelmente bem mais fácil. Tiveram muito poder e será que souberam utilizá-lo? 

Coronel Edson Morelli:

“PM 1 – Os fatos que andaram se registrando na Polícia Militar, especialmente o último, do corte das horas extras dos oficiais, estão gerando verdadeira revolta na oficialidade. A assinatura e a publicação do decreto sem que o comandante-geral tivesse conhecimento demonstra claramente o processo de fritura a que foi submetido o coronel Edson Morelli. PM 2 – A orquestração para derrubar Morelli parte de setores bem identificados da administração estadual, com a simpatia do deputado João Henrique Blasi e do secretário regional Valter Gallina. Também integrados ao levante, alguns oficiais da própria PM, do Gabinete Militar e da Polícia Rodoviária, todos de olho no comando. PM 3 – Tudo está sendo engendrado porque Edson Morelli não tem se sujeitado aos desmandos políticos, rejeitando também as pressões partidárias que interferem negativamente no dia-a-dia da corporação, a começar pela transferência de apadrinhados. Estariam jogando o comandante contra a tropa, porque ele está empenhado em coibir abusos do tipo do bordel e do concurso fraudulento dos sargentos?” (A Notícia, Cláudio Prisco, 12.12.04).