PARTE CCXXI - “O PROBLEMA DAS POLÍCIAS: DOIS IDIOMAS E A VIOLÊNCIA RECRUDESCE PELO BRASIL”.
Por Felipe Genovez | 26/04/2018 | HistóriaPROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA
Data: 18.10.99, horário: 08:15 horas:
Heródoto Barbeiro na CBN entrevista o Secretário de Segurança Pública do Estado do Paraná sobre a unificação das Polícias Civil e Militar. Segundo o Titular da Pasta – Dr. Cândido Martins de Oliveira – o Paraná estaria na frente, pois Delegados de Polícia e Oficiais trabalhavam juntos, havia uma maior integração, o policial militar lavrava o termo circunstanciado e apresentavam a mesma para o respectivo Delegado de Polícia e ao Juiz de Direito, e isso se tratava por enquanto de uma unificação operacional...
“Garotinho ma non troppo
Clovis Rossi
(...)
É cedo demais para fazer especulações sobre a viabilidade eleitoral de Garotinho e, mesmo , sobre o caráter de novidade que sua gestão no Rio trará aos para políticos brasileiros.
Além disso, ele é pragmático demais para o meu gosto, mas o meu gosto em geral não bate com o da maioria do eleitorado, o que o torna irrelevante.
Mais relevante é o sucesso ou insucesso de Garotinho no enfrentamento da criminalidade no Rio.
O governador dividiu o Estado em 36 áreas, cada uma delas sob responsabilidade de um delegado (polícia civil) e um oficial da PM. É uma boa ideia, porque permite ao público identificar um responsável pelo desempenho policial, em vez de relegá-lo ao território amorfo em que a culpa é de todos e, por extensão de ninguém.
Paralelamente, o governador está promovendo uma triagem nas policiais de tal forma que, em um futuro Instituto de Segurança, só terão lugar os que não pertencem ao que Garotinho chama de ‘banda podre’ das polícias. O saneamento do aparelho policial é outra necessidade.
No papel, portanto, o esquema parece inteligente. Aliás, guarda certas semelhanças com ideias que o governador de São Paulo, Mário Covas (PSDB), lançou há uns dois anos, como mudança constitucional. Depois, nunca mais tocou no assunto.
Se ganhar a batalha da segurança Garotinho será gente grande o suficiente para de fato disputar 2002” (Folha de São Paulo, 1-2 , Opinião, 17.10.99).
Data: 19.10.99, horário, 07:30 horas:
Benedito Mariano – Ouvidor das Polícias do Estado de São Paulo - é entrevistado por Heródoto Barbeiro sobre a violência policial:
Segundo seu relatório, 67% dos casos de mortes em serviço no último trimestre não tinham antecedentes criminais e envolvimento em qualquer crime...
Heródoto perguntou se isso era um indicativo da violência policial e Benedito respondeu que era uma hipótese procedente...
A seguir, observou que no confronto com as duas polícias a grande maioria havia se entregado e que em razão disso era desnecessário o confronte e a morte... No relatório, Benedito acusa que o trimestre de julho a setembro foi considerado um dos mais graves em termos de incremento de mortes... Essa porcentagem foge muito da violência registrada anteriormente...
Heródoto menciona as declarações recentes de um policial militar à imprensa, em razão de ter recebido instruções superiores para que quando fosse socorrido bandidos por meio de viaturas era para deixar que morressem a caminho de Hospitais... Benedito diz que esse fato é grave e está sendo apurado a fim de se saber se realmente o comandante desse Batalhão teria instruído seus comandados...
Sobre o assunto, reportou-se a Folha no dia seguinte:
OAB liga aumento de mortes à falta de controle de comandos
Advogados e conselheiros da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) atribuem o aumento de número de pessoas mortas por policiais à falta de controle dos comandos das Polícias Civil e Militar de São Paulo.
‘A situação está fora de controle. Os casos de morte durante as folgas dos policiais mostram que a falta de controle já começa na admissão deles. Tem de haver um exame apurado sobre o perfil desses cidadãos’, disse o advogado e conselheiro da Comissão de Assistência Judiciária da OAB Marcelo Martins de Oliveira.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos da ordem, Pedro Dallari, defendeu ontem ‘rigor’ na apuração dos dados divulgados ontem pela ouvidoria.
‘O que agrava a situação é o fato de haver informações de que há complacência dos comandos das polícias em casos de tortura e até extermínio. Polícia violenta não é sinônimo de polícia eficaz’, disse Dallari (...)” (Folha de São Paulo, 3o Caderno, 20.10.99, pág. 1).
Ainda, na mesma entrevista, Heródoto registra que segundo entrevista do Secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul – José Paulo Bisol – realizada anteriormente na mesma Rádio CBN aquele Titular havia se manifestado a favor do fim do inquérito policial e que o Ministro da Justiça também é favorável ao fim desse procedimento inquisitorial:
Ministro critica sistema penal
Dias admite que tortura policial existe e defende adoção de pena alternativa
Porto Alegre
As prisões brasileiras não têm condição de resocializar os criminosos. A afirmação foi feita ontem pelo ministro da Justiça, José Carlos Dias. ‘Nosso sistema carcerário está péssimo’, qualificou o ministro, que abriu ontem, em Porto Alegre, o XIX Encontro Nacional de Defesa do Consumidor, na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Dias disse que atualmente os presídios brasileiros abrigam 180 mil presos e seria necessária a criação de mais 97 mil vagas. Na sua opinião, seria preciso destinar os presídios às pessoas que realmente não podem viver em liberdade pelo risco que oferecem à sociedade (...). Dias considerou o fim do inquérito policial ‘uma ideia interessante’. A proposta foi defendida na semana passada pelo secretário estadual de Justiça e Segurança do Rio Grande do Sul, José Paulo Bisol, no Conselho Nacional de Segurança Pública, em Brasília. Na avaliação do ministro, o inquérito policial, da maneira como está, emperra, e algumas vezes, é instrumento até de uma indevida coação sobre o indivíduo. Na proposta do secretário gaúcho, o Ministério Público assumiria a condução do processo para obtenção de provas. Hoje, acusados e testemunhas têm que confirmar, no Ministério Público, os depoimentos prestados na polícia (...)” (DC, 19.10.99, pág. 36).
Horário: 08:15 horas:
Demóstenes Torres – Secretário de Segurança Pública do Estado de Goiás é entrevistado na CBN e diz que no seu Estado iniciou-se - logo no início do atual governo – pioneiramente uma unificação dos comandos das duas polícias... e que no início houve resistências, porém, agora ambas já se ajustaram e gostam do trabalho conjunto...
“Dois idiomas”:
Um país, dois idiomas
Clóvis Rossi
São Paulo – A questão da segurança pública talvez seja a mais emblemática da enorme distância que há entre promessas de campanha e realizações de governo e entre o sentimento da rua e a pulsação dos palácios.
Por partes. Ainda como presidente eleito, em viagem pelo Leste europeu, Fernando Henrique Cardoso dizia que a violência no Rio de Janeiro não começava no Rio, mas em pontos até distantes, uma vez que decorria, substancialmente, do crime organizado (tráfico de drogas e armas, por exemplo, que apenas terminam nos grandes centros, mas não necessariamente se originam neles).
O problema, portanto, é federal, na medida em que apenas o governo central, via Polícia Federal, teria condições de enfrentar o crime organizado.
Cinco anos depois dessas avaliações presidenciais, o resultado é o que se vê: o crime organizado só fez crescer e até contaminou o aparelho de Estado.
Vale idêntico raciocínio para o caso dos governos estaduais, diretamente responsáveis pela segurança pública. Com a mobilidade da criminalidade, é impraticável imaginar que se possa combater o crime sem que as diferentes polícias estaduais se entrosem, troquem informações, ajam em conjunto. Se não há uniformidade entre a Polícia Civil e a Polícia Militar de cada Estado, como imaginar ações conjuntas entre polícias de diferentes Estados?
Além disso, os governos não reagem à questão com a urgência e o dramatismo que a ela dá a sociedade. Exceto a embrionária experiência do Rio de Janeiro, não há notícias de qualquer iniciativa inovadora de qualquer governador (reeleito ou no primeiro mandato) no âmbito da segurança.
Era, pois, inevitável que se disseminasse a sensação de cada um por si que é, hoje, a marca registrada de todo brasileiro que vive nos grandes centros (e até em alguns não tão grandes). Sociedade e governo decididamente não falam a mesma língua” (Folha de São Paulo, Clóvis Rossi, 1-2, Opinião, 20.10.99).