PARTE CCX - “DELEGADO MAURÍCIO ESKUDLARK E CEL DJAIR PINTO: COMISSÃO DE UNIFICAÇÃO DAS POLÍCIAS?”
Por Felipe Genovez | 24/04/2018 | HistóriaPROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA
Data: 30.06.99, horário: 16:50 horas – “Delegado Maurício Eskudlark”:
Estava na “Assistência Jurídica” da Delegacia-Geral e “Jô Guedes” estava concentrada digitando no computador. Há alguns instantes, já havia perguntado se queria que saísse do setor para me deixar mais à vontade. Fiz ver a ela que não tinha nada de especial para tratar com a visita que acabava de chegar.
Maurício Eskudlark já havia me procurado na última reunião do Conselho Superior para me dizer que precisava conversar e neste instante estava ali justamente para isso:
- Eu pensei que o amigo iria me dar o prazer da visita lá na minha sala, estou esperando! (Maurício)
- Que é isso Maurício, entra, eu bem que ia até lá encima, mas como é para tratar daquele assunto de teu interesse, imaginei que talvez tu quisestes alguma reserva e aqui embaixo é mais tranquilo.
- Eu estou esperando para tomar um cafezinho com o amigo lá encima...
(...)
Em seguida procurei ir imediatamente ao assunto de seu interesse, e como já tinha conhecimento preliminar do que se tratava, esclareci que para contagem dos dez anos a que se referia a Lei Complementar 154/97 também deveria ser contabilizado o tempo de Academia de Polícia, nos termos do art. 260, do Estatuto da Polícia Civil... No curso da nossa conversa o assunto tomou outros rumos:
“(...)
- Mas doutor não quis ainda participar da nossa comissão de promoções, você que está por dentro...? (Maurício)
- O quê? Tu estais falando da comissão de promoções presidida pelo Optemar?
- Sim. Parece que está um pouco enrolado o serviço lá...
- Não, Maurício sinceramente não há o mínimo interesse, principalmente por absoluta falta de tempo. Só olha ali aqueles livros, não tive tempo ainda de lê-los e vão ficar aguardando. Olha no canto aqueles Diários de Justiça, eles são do mês de maio. E ainda tenho os de junho para ler.. Também, tenho os Diários Oficiais de abril, maio e junho, fora os que vão entranto... Os Diários de Justiça da União e de Justiça não estou conseguindo ler, fico aqui até tarde, sem contar que não tenho tempo para realizar minhas pesquisas...
- Bom, eu pensei que o amigo pudesse dar uma ajuda já que conhece o assunto...
- Sinceramente não dá, não tenho a mínima condição.
- Mas estão propondo a criação de uma comissão para estudar a unificação das polícias, eu não sei se o amigo está sabendo?
- Sim, Maurício, estava lá embaixo conversando justamente sobre isso com o Braga e o Wilmar...
- Nós estivemos reunidos ontem com o Secretário e o Coronel Backes entregou um expediente indicando cinco Coronéis para compor uma comissão e solicitando ao Secretário que indicasse cinco dos nossos. Eu conversei com o Coronel Enéas, mas não sei se vale a pena nós participarmos dessa comissão...?
- É, no ano passado nós entregamos um trabalho para o Governador Amin e que foi assinado por um grupo ligado ao Julio Teixeira, teve a participação do Gilmar Knaesel, e a proposta era essa, só que a nossa proposta era sobre a unificação dos comandos das duas Polícias, agora a proposta do Backes eu desconheço o teor. Mas entregamos a nossa proposta para o Backes no ano passado para que eles estudassem, espero que seja isso, de repente essa comissão seria a continuidade...
(...)
Em seguida, fiz um relatório sucinto para Maurício sobre a proposta de criação da Procuradoria-Geral de Polícia:
- Sim, então quer dizer que o Backes já tinha recebido esse material ...?
- Sim, estávamos eu e o Jorge lá no Quartel General da PM e fizemos a entrega, explicamos o conteúdo das nossas propostas...
- E será que as propostas que vocês entregaram são as mesmas que eles defendem...?
- Não sei, não conheço as propostas que o Backes está apresentando para o Chinato...
- Bom, ele só apresentou um ofício indicando os Coronéis para integrarem a comissão...
(...)”.
Horário: 18:30 horas – “Coronel Djair Vicente Pinto”:
Tinha acabado de chegar do café... e Jô anuncia:
- O Dejair telefonou e pediu para o senhor ligar.
- O quê? O Dejair Pinto?
- Sim e já!
- Pára Jô!.
- Sim. Ele pediu para ligar logo que o senhor chegasse.
- Pô Jô, como é que ele me descobriu?
- Ele sabe que o senhor trabalha aqui.
- O quê? Tu dissesses isso para ele?
- Sim. E não era?
- Tudo bem!
- Quando eu procurei ele o senhor falou para usar o seu nome e eu usei!
- O quê?
- Sim senhor!
- Estou brincando, tudo bem, tudo bem, vou ligar agora para ele.
E foi o que fiz nos instantes seguintes:
- Alô!
- Dejair?
- Oi Felipe, acabei de sair do banheiro, queres ligar para o outro telefone, é mais barato?
- Sim. Tu que sabes!
E, em seguida liguei para o telefone do Hospital da Polícia Militar, pois Dejair era Tenente-Coronel e respondia pela Direção daquele estabelecimento. Na verdade ele queria que eu fizesse uma verificação acerca de um problema na Primeira Delegacia da Capital, fiz as anotações e, a seguir:
“(...)
- Escuta Felipe tu tá naquela comissão de unificação das polícias?
- Não. Não sei de nada ainda, soube pela imprensa.
- Eu sempre defendi isso, inclusive, queria já colocar o Hospital aqui a disposição dos policiais civis, o que eu puder fazer para ajudar o pessoal, pode contar comigo.
- Mas Dejair a proposta que entregamos para o Coronel Backes foi feita por iniciativa nossa, e evidente que tem que se ouvir o pessoal de vocês, mas acho que a tese da unificação de comandos é muito boa, mas se houver uma melhor que seja bem vinda, ninguém quer as luzes da ribalta.
- A vantagem da nossa proposta é que não vulnera, não fragiliza as histórias das duas polícias que são muito antigas, apesar de que a Polícia Militar sempre valorizou mais isso...
- É verdade, nesse ponto tenho que concordar, a Polícia Militar sempre soube valorizar a sua história.
- Ah, sim, mesmo porque a Polícia Civil é mais recente não possui a estrutura da Polícia Militar...
- Não é bem assim Djair. Olha a Polícia Civil é tão antiga quanto a Polícia Militar, só que se estruturou diferente, enquanto uma se estruturava com seus cargos e uma doutrina a outra começou com os Delegados que eram indicados politicamente. Em 1808 quando D. João VI veio para o Brasil com a família real e implantou a Intendência-Geral de Polícia, nomeou o Des. Paulo Fernandes Vianna para o cargo, com funções amplas de Chefe de Polícia, Prefeito do Rio de Janeiro, autoridade judicial. Ele passou a ser auxiliado por policiais que recebiam funções “delegadas”, eram os “Delegados” do Intendente-Geral e foi aí que começou a história do surgimento da Polícia Civil que era de âmbito nacional, o problema foi que permaneceu muito tempo nas mãos de políticos, diferente da Polícia Militar que sobreviveu de outra maneira e não tão sujeita a essas ingerências. Outro problema era que os cargos de Delegado eram desejados a qualquer preço por forças políticas, já na PM não era assim...
- Sim, até pouco tempo nomeavam qualquer pessoa para o cargo... Mas o importante agora é que a Polícia Civil está estruturada, eu estive fazendo cursos no exterior, estive no Chile, também no Uruguai e lá ainda o Delegado é cargo eletivo na comunidade...
- Eu desconheço a realidade do Uruguai...
- É outra realidade, mas o importante é mudar esse quadro Eu tenho defendido que acabe com aquele curso de preparação para Oficiais lá na Academia, deveriam exigir curso de Direito e pronto!
- Sim, esse seria um caminho... A gente sabe que hoje existem muitos que pensam assim, mas o problema é que têm sempre aqueles mais antigos e conservadores e que estão em cargos de direção, comando e resistem às mudanças, são sempre do contra.
- É verdade...
- Mas há pessoas que preferem a pobreza de espírito, existem os resistentes às inovações e a sociedade é que tem que arcar com esse atraso, as duas instituições ficam nessa relação de forças, como dois irmãos e lembra aquele dito filosófico: “como são pequenas as nossas conquistas!” Temos que pensar nas pessoas, na sociedade, precisamos reformar urgente esse modelo de Polícia e façamos isso antes que outros se arvorem a fazer.
- Sim, concordo, Felipe agora mudando de assunto, tu és da turma de 1989?
- Não! Sou de 1981.
- É que o pessoal está fazendo contato, querem comemorar os vinte anos de formatura, nunca se encontram antes...
(...)”.
Antes já tinha feito um resumo para o Coronel Djair da nossa proposta, desde a criação da Procuradoria-Geral de Polícia, do segundo grau na carreira e que o material foi entregue para o Coronel Backes... Dejair deixou bastante claro que concordava também com uma proposta de unificação, no entanto, sem formar ainda um juízo de como isso deveria ocorrer... Mas, aliás, sobre a proposta de unificação quase todo mundo era favorável, e isso poderia ser um grande aliado, o desafio seria sairmos antecipadamente com uma proposta aprovada por ambas as instituições, para daí em diante passarmos a discutir com a sociedade, pois se não fosse assim ninguém saberia onde isso iria desaguar.
Acabei lembrando quando apresentei para o Coronel Sidney Pacheco (Deputado Estadual e Secretário de Segurança Pública – 1991 a 1994) a proposta de reestruturação da carreira de Delegado de Polícia por entrância que resultou na lei complementar cinquenta e cinco, isso durante o final do ano de 1991. Inicialmente o Titular da Pasta se posicionou contra e argumentou que iria apoiar qualquer proposta nesse sentido desde que fosse nos seguintes termos: “Delegado-Aspirante, Delegado-Tenente, Delegado-Capitão, Delegado-Major, Delegado-Tenente-Coronel e Delegado-Coronel”. Na época imediatamente fui contra sob o argumento que os Delegados de Polícia eram considerados carreira jurídica nos termos do art. 241 da CF de 1988, do Código de Processo Penal e das legislações extravagantes...
Na sequência, lembrei novamente do Coronel Sidney Pacheco, nos seus tempos de "Assembleia Legislativa", quando nos encontrávamos, especialmente, nos embates da Constituinte e ele me reiterava: "Felipe, não podemos matar a 'galinha dos ovos de ouro'!" Sim, referia-se principalmente à Polícia Millitar e os riscos de uma Constituinte revolucionar prá valer! Também, da conversa com o Coronel Djair fiquei pensando quando ele se referiu à estrutura que a PM possuí, diferentemente da Polícia Civil, inclusive, que até pouco tempo atrás qualquer pessoa poderia ser nomeada "Delegado de Polícia", e que no Uruguai o cargo era eletivo... Bom, isso me conduziu a pensar nas dificuldades que poderíamos enfrentar com o nosso "projeto" especialmente porque a Polícia Militar no correr das décadas conseguiu se fazer presente dentro dos governos, o que posibilitou ganhar espaços políticos, assumir posições, galgar serviços dentro do Palácio, dos Tribunais, fóruns, Ministério Público... sem contar as prerrogativas típicas de servidores militares. Em sendo assim, obviamente que se pensar em mudanças significaria possíveis "pesadelos", temores, medos... de perder muito do que conquistaram ao longo dos anos, de se abrirem para a sociedade organizada e possibilitar uma discussão a respeito do passado, presente e do futuro... O fato era que pensando nisso tudo, nossa proposta pretendia uma mudança imediata em termos de apenas "unificar os comandos das polícias", respeitando as estruturas e as suas histórias. Certamente que os críticos radicais teriam um prato cheio para assacar denúncias contra o projeto, dizendo que a unificação teria que ser total, acabar com uma série de privilégios... Sim, concordamos com tudo isso, sem matar "a galinha", porque a sociedade merece respeito e não podemos fugir as responsabilidades de prepararmos o futuro por meio de uma Polícia de Estado que defenda realmente a sociedade contra o atual "sistema" governado por um "poder econômico" que tem como premissa escravizar as pessoas em troca de uma "felicidade" irreal e de uma segurança interna e externa cujo controle está sempre voltada a servir os seus interesses.
Horário: 19:30 horas:
Fui a coluna do jornalista Fernando Rodrigues na “Folha” de São Paulo, e não tinha como deixar de pensar numa Polícia Estadual:
FHC, a hora é agora
Fernando Rodrigues
Brasília – O vice-governador de Minas Gerais, Newton Cardoso (PMDB), fez uma ameaça gravíssima anteontem, depois de um apadrinhado seu perder o cargo no DNER mineiro:
“Vou chamar a imprensa e contar a história da reeleição que o Brasil não sabe. Preciso dizer que, se houver uma retaliação contra Minas, vai ter resposta. Eu não me chamo Itamar Franco (governador de Minas Gerais), que fica calado. Vou retaliar, e muito. O presidente que se cuide.”
A diante dessa última frase, “o presidente que se cuide”, o mínimo que Fernando Henrique Cardoso pode fazer é interpelar judicialmente o vice-governador mineiro. Ou Newtão confirma o que disse e revela seus segredos ao país ou deve ser processado por caluniar o presidente.
(...)
A emenda da reeleição foi aprovada com votos de pelo menos dois deputados comprados por R$ 200 mil a cabeça. Segundo Newtão, isso foi uma “histórinha boba que contaram”.
FHC deve estar feliz por Ter a chance de esclarecer esse episódio obscuro. Se esperava uma hora para se afirmar diante do PMDB, a hora é agora.
*
Mais uma da série “acredite, se quiser”: Marco Maciel e Jorge Bornhausen são seus amigos íntimos, disse ACM no “Roda Viva”. É isso aí.
(Folha de São Paulo, 30.06.99, pág. 1-2 Opinião)
E na mesma “Folha”, uma foto bastante singular, tendo ao fundo a identificação “Polizia”:
Policiais protestam contra falta de recursos
Policiais italianos fazem protesto, de cuecas, em Secondigliano, perto de Nápoles (sul do país). O grupo disse ter tirado as calças para protestar contra a falta de recursos e de pessoal para o policiamento da região, onde atua a organização mafiosa Camorra. Atrás do grupo de manifestantes, uma faixa traz a inscrição “estão nos deixando de cuecas”.
(Folha de São Paulo, 30.06.99, pág. 1-12)