PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data 19.09.2001:

Recebi uma solicitação de informação e a matéria já havia sido regulamentada pelo Secretário de Segurança Chinato por meio de Portaria, porém, sem que o “Conselho Superior da Polícia Civil” tivesse sido consultado, cujo teor contrariava principalmente disposições expressas constantes do Estatuto da Polícia Civil. Infelizmente, Chinato não encontrou resistência e a ideia parecia se ir bem mais além, ou seja, o “Conselho Superior de Segurança Pública” baixaria uma resolução. A matéria, a pedido do Secretário  Chinato veio parar nas minhas mãos para fins de manifestação jurídica:

“ESTADO DE SANTA CATARINA - SECRETARIA DE ESTADO DA SEGURANÇA PÚBLICA - DELEGACIA-GERAL DA POLÍCIA CIVIL - Informação n. 085/GAB/DGPC/SSP/2001 - Interessado: Delegado-Geral da Polícia Civil - Assunto: análise de proposta de resolução do Conselho Superior de Segurança Pública (revoga a Portaria n. 0693/GAB/SSP/99 - Atendendo solicitação contida na CI n. 4494/2001, deste Gabinete, passo a me manifestar: - 1. Preliminarmente, acerca da utilização do termo “autoridade policial”: a) segundo estabelece o art. 9°, desta Lei,  o art. 6°, do Código de Processo Penal, a  Lei n. 7.720, de 31 de agosto de 1989 e, também, a LC 55/92,  autoridade policial é o Delegado de Polícia; b) significa poder, comando, direito e jurisdição, sendo largamente aplicada na terminologia jurídica a expressão como o "poder de comando de uma pessoa", o "poder de jurisdição", ou " o direito que se assegura a outrem para praticar determinados atos relativos a pessoas, coisas ou atos". É o servidor que exerce em nome próprio o poder do Estado, tomando decisões, impondo regras, dando ordens, restringindo bens jurídicos e direitos individuais, tudo nos limites da lei. Não têm esse poder, portanto, os agentes públicos que são investigadores, escrivães, policiais militares, subordinados que são às autoridades respectivas; c) no sentido legal e constitucional, as polícias civis são dirigidas por " delegados de polícia de carreira" (art. 144,§4º, da CF). O Delegado de Polícia é a autoridade competente para a instauração e presidência do inquérito policial (embora por lei possa ser atribuída a outras, expressamente, essa função - art. 4º e seu parágrafo único, do CPP) e para a lavratura do auto de prisão em flagrante ( art. 304 do CPP). A expressão ‘autoridade policial’, aliás, é citada em outros dispositivos da lei processual comum ( arts. 5º,§§3º e 5º, 6º,7º 9º,10,§§1º a 3º, 13 a 17, 20 e parágrafo único; 21, parágrafo único, 22 e 23, 39,§§ 1º,3º e 4º, 46, 241, 301, 307, 308, 311, 325, 326, 332, etc), sempre com única referência ao delegado de polícia. A distinção da figura da autoridade policial e dos demais  agentes policiais é registrada no Código de Processo Penal, que se refere ‘às autoridades ou funcionários’ ( art. 47 do CPP), ou a autoridades e "seus agentes" ( art. 301); d) na legislação processual comum, aliás, só são conhecidas duas espécies de ‘autoridades’: a autoridade policial, que é o Delegado de Polícia, e a autoridade judiciária, que é o juiz de Direito. Somente o Delegado de Polícia e não qualquer agente público investido de função preventiva ou repressiva tem, em tese, formação técnica profissional para classificar infrações penais, condição indispensável para que seja o ilícito praticado incluído ou não como infração penal de menor potencial ofensivo. Somente o Delegado de Polícia pode dispensar  a autuação em flagrante delito, nos casos em que se pode evitar tal providência, ou determinar a autuação quando o autor do fato não se comprometer  ao comparecimento em Juízo, arbitrando fiança quando for o caso. Somente ele poderá determinar as diligências imprescindíveis à instauração da ação penal quando as provas da infração penal não foram colhidas por ocasião da prisão em flagrante delito. 2. O Conselho Superior se sobrepõe ao Delegado-Geral ao baixar determinações aos policiais civis em nível de exercício de suas funções, competência essa reservada ao Chefe de Polícia nos termos dos arts. 144, par. 4o, CF/88 c/c  art. 106, caput, CE/89. 3. Logo no art. 1o constata-se determinação aos Delegados de Polícia, no sentido de exigir que compareçam aos locais de infração penal. Sucede, por razões óbvias, que isso nem sempre é possível. Para tanto, as autoridades policiais contam com agentes e auxiliares, sujeitas ao poder hierárquico, que uma vez presentes no local deverão tomar todas as medidas necessárias com vistas a assegurar o cumprimento das disposições previstas no art. 6o, respectivos incisos, CPP. Ademais, estabelece os arts. 7o e 8o, da Lei n. 6.843/86 (Estatuto da Polícia Civil), disposições quanto ao trabalho em equipe quando realizado por policiais civis:  ‘Art. 7°. A hierarquia policial civil alicerça-se na ordenação da autoridade, nos diferentes níveis que compõem o organismo da Polícia Civil, entendendo-se que a classe superior tem precedência hierárquica sobre a classe inferior e entre funcionários da mesma classe, o mais antigo precede o mais moderno.   Parágrafo único. A hierarquia da função prevalece sobre a hierarquia do cargo’. “Art. 8°. Nos serviços policiais em que intervier o trabalho de equipe, os funcionários especializados, técnico-científico e  administrativo  ficam  subordinados, eventualmente, à autoridade policial competente’. (sublinhei)  4. Havendo a presença de policiais ou servidores de outros órgãos públicos nos locais de infração penal, considerando o que estabelece o art. 6o, respectivos incisos do CPP,  devem todas elas se submeterem ao comando da autoridade policial e, na falta dela, seus agentes ou auxiliares. 5. As especificações técnicas previstas no art. 3o, respectivos incisos, da proposta de resolução, além de já constarem da legislação adjetivo penal, também estão detalhadas no  Decreto n. DECRETO Nº 27.950, de 17 de dezembro de 1985, podendo ser objeto de instrução normativa do Delegado-Geral da Polícia Civil. 6. Procede a preocupação em se estabelecer normas quanto a atuação/auxílio/suporte técnico/científico aos trabalhos da Polícia Civil por parte de outros órgãos públicos em nível federal, estadual e municipal, especialmente, em se tratando de instituições vinculadas à segurança pública, quando necessários nos locais de prática de infração penal. 7. A proposta apresenta inúmeros problemas de ordem técnica e gramatical, facilmente identificáveis. Florianópolis, 18 de setembro de 2001 - Felipe Genovez - Delegado de Polícia EE”.

O jeito era esperar para ver se o Delegado-Geral Lipinski desta vez iria bater de frente com o Secretário Chinato em defesa da causa da Polícia Civil, especialmente, para não se admitir mais essa quebra de hierarquia, mais essa violação de disposições legais e estatutárias, inclusive, por parte do Titular da Pasta. Depois disso, fiquei pensando no novo Estatuto dos Servidores Públicos que estariam fazendo a portas fechadas, presumia que iriam querer até restringir ou revogar o Estatuto da Polícia Civil (lembrei do Delegado Braga e das resistências dentro do Palácio do Governo contra a Polícia Civil...)  e com esse ordenamento lá se ia o pouco que restava da nossa dignidade institucional/funcional, dos nossos princípios, das nossas buscas..., lamentável que os que representavam a instituição, nossos  parlamentares, que pareciam  que ainda não se deram conta do que poderia advir: 

“Denunciados problemas na segurança em Criciúma – Os policiais civis de Criciúma estão inseguros e desanimados, convivem em um modelo de gestão que não pratica a integração efetiva com a Polícia Militar, faltam equipamentos, pessoal, armamentos e até mesmo delegacias são alvo de ladrões. A constatação foi feita pela Comissão Parlamentar Externa – CPE – da Assembleia Legislativa, segundo relato do presidente da comissão, deputado Ronaldo Benedt (PMDB), que saiu da última reunião se dizendo ‘mas preocupado’ com a situação. ‘Como é que alguém que se sente inseguro pode oferecer segurança ao cidadão?’, questiona Benedt. A associação dos policiais civis distribuiu uma ‘carta reflexiva’ sobre a situação da segurança pública na região e aponta ‘ingerência política’, ‘governantes negligentes e incompetentes ‘ e ‘pseudopoliciais’, como responsáveis pela situação. ‘Há uma falta de sintonia evidente na polícia civil pelo que se avalia das informações prestadas pelos próprios policiais; o comando vive nas nuvens e os profissionais muito abaixo, há um desistímulo geral’, avalia o presidente da CPE criada para investigar  as causas da crescente violência em Criciúma e região. Segundo o parlamentar falta entrosamento também com a Promotoria da Infância e da Juventude. ‘Os adolescentes infratores, segundo os policiais, riem quando são abordados e afirmam que têm madrinha que os livra de qualquer prisão e ainda abre inquérito  contra os policiais’, relata o deputado. O relator da CPE, José Paulo Serafim (PT) disse que ‘faltam condições salariais, estrutura, efetivo e a questão colocada de ingerência política, que é uma situação que precisa ser avaliada e ter uma discussão mais aprofundanda’. Além de policiais civis foram ouvidos as integrantes do Conselho Tutelar dos Direitos da Criança e do Adolescente. Nos dois primeiros meses deste ano foram 130 casos de violência física, 219 violências psicológicas, 670 conflitos familiares e 107 fugas de menores de idade. A CPE também ouviu pais e professores do Colégio João Frasseto, no bairro Santa Luzia, que tem registrados graves e seguidos problemas com gangues” (A Notícia, 19.9.2001).

“Defasagem – Há anos, Joinville tinha 250 mil habitantes e 25 delegados de polícia. Hoje, com quase 500 mil habitantes, o número de delegados é de 11. Os dados foram fornecidos por policiais civis, na última segunda-feira, que estão revoltados com a situação” (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 20.9.2001).

Data: 21.09.2001:

Como de costume, cheguei antes das sete da manhã na Delegacia-Geral.  Nesse horário tudo está deserto. Por volta de nove horas fui dar uma volta no prédio e percebi que as salas estavam vazias,  parecia que só havia fantasmas, não se via quase ninguém trabalhando, não porque era sexta-feira, mas há tempos que se notava aquele vazio, desânimo generalizado, parecia que faltava  liderança, diálogo,  estímulo, incentivo:

“Segurança – A região de Joinville sofreu uma redução de 25 para 11 delegados de polícia nos últimos anos. No Instituto Médico Legal atuam apenas quatro funcionários. Até para revelação de filmes, a polícia depende de remessa dos negativos a Florianópolis. Os dados foram levantados ao deputado Adelor Vieira (PMDB), que defende o aumento do efetivo, após reunião com a Associação da Polícia Civil” (A Notícia, Moacir Pereira, 21.9.2001).

“Segurança Pública – Prefeito em exercício de Joinville, Marco Tebaldi (PSDB), reúne hoje na Prefeitura, a partir das 9 horas, diversos setores representativos da sociedade joinvilense para debater a situação gave em que se encontra  segurança pública com sequência impressionante de assaltos, arrombamentos, sequestros, reféns e homicídios. Delegacias de Polícia estão desmanteladas pela falta de maior número de policiais que não podem sequer fazer investigações contra a violenta escalada do crime em Joinville. Policiais civis revelaram para a imprensa e políticos a situação difícil  porque passam, sem qualquer estímulo e muitos deles há anos sem tirar férias para não perderem vantagens de quando estão na ativa. Para o encontro de hoje, na Prefeitura, estão convidados a Acij, CDL, Ajorpeme, Acomac, associação de moradores e jornalistas e radialistas, principalmente aqueles que cobrem a área policial. Depois do encontro um documento, deverá ser elaborado para cobrar providências” (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 21.9.2001).

“Joinville Exige Segurança – (...) Os deputados Adelor Vieira (PMDB) e Nilson Gonçalves (PSDB) visitaram, quinta-feira passada, os distritos policiais para levantamento dos problemas. Segundo relato dos parlamentares, há dez anos, Joinville tinha 11 delegados de polícia. Hoje, o maior município do Estado, com 450 mil habitantes, tem apenas dez delegados. ‘Esse não é um problema exclusivo de Joinville. Itapoá e Barra do Sul, com base econômica apenas dez delegados. ‘Esse não é um problema exclusivo de Joinville. Itapoá e Barra do Sul, com base econômica no turismo, enfrentam problema semelhante’, afirmou Adelor. Disse também que há policiais sem férias há mais de cinco anos por falta de outros profissionais para substituí-los. Há vários meses, o parlamentar solicitou ao governo do Estado um levantamento dos problemas na área. Como não recebeu as informações, decidiu ele mesmo fazer esse levantamento. ‘Vamos quantificar deficiências e sugestões para adequar a segurança pública às necessidades da população, principalmente na área de recursos humanos’, declarou Adelor. Em protesto contra essa situação, o parlamentar prometeu não mais dar quorum e nem votar projetos de origem governamental, enquanto s prioridades de Joinville e região não forem atendidas. Assis defende por parte da bancada do PT o mesmo procedimento por causa da falta de sensibilidade do Governo com a causa da segurança” (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 22.9.2001).

“Polícia – No Balneário Barra do Sul existem dois policiais. Um casal. O marido e a esposa. No Balneário de Itapoá, que está em acelerado crescimento, só dois policiais. São da região de Joinville, que tem três peritos e um carro para atender o departamento. Pelo menos  um dos profissionais não tira férias há cinco anos. São informações reveladas pelo deputado peemedebista Adelor Vieira” (DC, Paulo Alceu, 24.9.2001).