PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Dia 04.09.2001:

Quem viu os Delegados do Estado de Santa Catarina no governo passado (1995 – 1999)  e via neste momento era capaz de achar que estávamos num outro mundo, a mesma reflexão valia para o primeiro governo Amin (1982 – 1986), quando o Delegado Heitor Sché (Deputado Estadual) era o super-secretário de Segurança Pública, em cuja época os policiais civis pelo menos se faziam presentes no cenário político e social...  Enquanto isso, também continuava a velha questão que não era nossa (presos em Delegacias de Polícia):

“Cadeia – MP pede interdição – Piçarras – O Corregedor-Geral do Tribunal de Justiça, desembargador Wilson Guarany, está analisando o pedido de interdição da cadeia pública de Piçarras, solicitado pelo ministério público. O MP alega falta de higiene e segurança. Com capacidade para abrigar 10 pessoas, está com 21 presos. O local é pequeno e com sério problema de umidade o que tem favorecido a proliferação de um surto  de doença de pele, a escabiose (sarna). O pedido  de interdição foi encaminhado, primeiro ao Fórum da Comarca, pelo delegado Márcio Luiz Colatto. Na época o delegado também alegava a falta de policiais responsáveis pela cadeia. O atual delegado de Piçarras, Carlos Jorge Scholsser, solicitou está semana, ao Comando da Polícia Militar na cidade, o reforço de um agente prisional interno e um agente externo. ‘A situação é bastante complicada’,  afirmou o delegado. Para ele, a melhor solução seria realmente a interdição da Cadeia Pública e a construção de um grande presídio regional (...)” (A Notícia, 4.9.2001).

“Rigor – A Justiça determinou que a 1a DP abra inquérito policial contra a jovem Melissa de Souza Lipinski por direção perigosa. Ocorre que foi encaminhado ao Judiciário um terno circunstanciado relatando o episódio, comum em atos menores, mas não foi aceito. Melissa é filha do Delegado da Polícia Civil João Manoel Lipinski” (DC, Paulo Alceu, 4.9.2001).

Horário: 15:30 horas:

O Delegado Braga marcou presença na “Assistência Jurídica” e depois de conversamos sobre vários assuntos institucionais lancei uma pergunta:

(...)

- “Tu vistes a nota que saiu hoje na coluna do Paulo Alceu sobre a filha do Lipinski?"

Braga ficou não mais do que dois segundos em silêncio e argumentou:

- “O pessoal lá embaixo estava comentando que isso foi obra do Lipinski, ele é radical com a família em casa, dizem que ele é que fez tudo na Delegacia e também o pessoal comenta que essa filha dele é fora de série, dizem que ela é fora de série!”

Curioso com essa resposta completei:

“Mas não aceitaram o termo circunstanciado, mandaram instaurar inquérito policial direto?” 

Braga conclui:

“Eu só sei que isso ficou muito mal porque publicam essas coisas,  alguém deu a nota...,  ficou muito mal..., não sai nada dos outros...”.

(...)”.

“Como cidadão – O delegado João Manoel Lipinski manifestou-se através de fax sobre a nota publicada nesta coluna referente aos procedimentos legais exigidos pela Justiça, na quinta-feira passada, sobre o incidente de trânsito envolvendo a sua filha. ‘A execração pública de uma menina de 21 anos, odontóloga formada, boa filha, boa estudante, boa cidadã, em razão de a ela estar se atribuindo uma falha, e friso antes de qualquer julgamento, certamente enriquece o seu já conceituado currículo moral e ético (...). Em nenhum momento, embora compungido na qualidade de pai, usei de meu cargo para alterar ou tentar alterar as circunstâncias  da situação. Muito pelo contrário, usando da ética que sempre procurei impingir aos meus atos, afastei-me (...). Assim agi porque, antes de tudo, meus filhos foram ensinados a se responsabilizarem por seus atos (....). Não consigo compreender as razão da pública execração (...) prejudicar minha filha (...) atingir  minha pessoa, atribui-se a preocupação de divulgar  tal notícia buscando informar a opinião pública. Mas informar do quê ?  (...) Deus certamente saberá recompensá-lo por tão elevado gesto.’ O direito democrático de se manifestar é o mesmo do colunista. Diferente, em tempos passados, quando impera o silêncio e a força” (DC, Paulo Alceu, 5.9.2001).

“Tolerância Zero – A Secretaria de Segurança Pública vem realizando uma depuração nos quadros da Polícia Civil. Está sendo classificada internamente de limpeza ética. Em dois anos e meio, já demitiu 36 policiais do serviço público. Três estão presos. O município que teve  mais policiais demitidos  foi Joinville, com cinco, seguido de Florianópolis com quatro. Outros processos de demissão  estão na mesa do governador para despacho” (DC, Paulo Alceu, 13. 9.2001).

Data: 14.09.2001, horário: 15:30 horas:

Braga veio até a “Assistência Jurídica” com um jornalzinho da Adepol do Rio de Janeiro dizendo-se maravilhado com o “plano” de reestruturação da Polícia Civil daquele Estado. Perguntei quando era que a nossa Adpesc iria lançar um jornal, pois desde o início do ano que não publicava nada. Braga disse que o jornal já estava quase pronto e que o Delegado Noronha estava fazendo a revisão. Peguei o jornal nas mãos e fiz um elogio à legislação carioca, eis que naquele Estado a Polícia Técnico-Científica continuava vinculada à Polícia Civil. Braga argumentou que aqui no sul só Santa Catarina não havia perdido ainda  o Detran e a Polícia Técnico-Científica.  Argumentei que o sistema de classe era retrógrado, pois mantinha os Delegados na vala comum, onde estava o grande universo de servidores, sob controle político e administrativo do Executivo e que o sistema de entrâncias garantia relativa estabilidade. Lembrei que também era preciso se continuar trabalhando no “Plano” de unificação dos comandos das duas polícias. Braga lançou uma pergunta:

- “Será? Tu não vê o que esses pessoal da PM faz, eles querem acabar com a gente, estão tripudiando, não visses o que eles fizeram com aquele projeto de lei sobre jogos e diversões? Mandamos para frente e eles tomaram conhecimento e deturparam tudo, só que aí o Governador mandou retornar a Secretaria de Segurança e acabou no Conselho, bom, aí o pessoal tomou conhecimento do que realmente eles estavam querendo, pelo menos o projeto original que mandamos regularizava uma situação,  os alvarás passariam a ter amparo legal, hoje a gente expede alvará para essas casas de bingos e não tem validade, depois o Delegado-Geral por resolução poderia regulamentar a matéria”.

Fiquei curioso com o relato que Braga havia feito em tom de desabafo e descrédito e pedi para que ele continuasse:

“Bom na segunda-feira o Lipinski desceu e foi até a minha sala,  começou perguntando como é que estavam os bingos. Olha Felipe eu mandei aquela comunicação interna para todos os Delegados,  sobre aquele projeto que tu me ajudasses a redigir denunciando o convênio da Codesc com a Polícia Militar para fiscalizar jogos eletrônicos, é uma vergonha,  a Polícia Militar apreende as máquinas com dinheiro, depois tem aqueles termos de ajustamentos do Ministério Público, eu denunciei aos Delegados  e o Lipinski em determinado momento da conversa fechou a porta da minha sala e disse que a minha CI foi parar lá no Palácio  e que ficou muito mal. Ele falou que eles lá no Palácio estão muito brabos e em represália pegaram o nosso projeto e esconderam, deram fim, agora o que é que vai acontecer? Nós vamos continuar a emitir alvarás sem amparo legal nenhum, tudo desse jeito.  Eu disse para o Lipinski que colocava a minha gerência a sua disposição, disse para ele que nem cargo tinha, era responsável e que ele arranjasse outro para o meu lugar. Olha Felipe, sem brincadeira nenhuma,  depois que eu mandei essa ‘CI’ para os Delegados tu não imaginas o que eu recebi de telefonemas, eu estava a semana passada lá em Camboriú e foram mais de quarenta telefonemas de Delegados me parabenizando, fiquei até sem bateria, depois dessa conversa que tive com Lipinski ele não me procurou mais, eu sei que esta semana esteve aí o presidente da associação de bingos conversando com ele lá em cima, mas ele nem me chamou”.

Fiquei impressionado e perguntei:

- “O quê? Vais me dizer que tem associação de casas de jogos de bingos aqui no Estado?”

Braga respondeu:

- “Sim, não sei o nome do presidente, tem até associação de donos de máquinas eletrônicas de jogos, tem associação de donos dessas máquinas irregulares, também não sei o nome dos presidentes”.

Braga pediu o jornal da Adepol/RJ de volta e disse que iria subir para mostrá-lo para o Delegado Valkir Sgambato pois havia uma matéria com o Secretário de Administração do Estado do Rio de Janeiro que reconhecia como legítima a aposentadoria dos policiais civis cariocas aos trinta anos, conforme estabelecia a lei federal complementar cinqüenta e um de oitenta e cinco.

Depois que Braga se foi fiquei pensando que talvez o Delegado-Geral Lipinski tomasse conhecimento e começasse a lutar por mais essa grande causa. Nesse sentido, foi bom as férias de Walter Guarda-Chuva Velho, uma preocupação a menos para ele com as coisas e coisas do prédio. Também, pensei no Ministério Público, além de estarem presentes em todo o Estado, de comandarem a Pasta da Segurança Pública, de estarem dentro do Palácio do Governo, ao lado do Governador, por que não ingressaram com uma Adin contra uma lei estadual flagrantemente inconstitucional? Por que a Polícia Civil estava sendo tratada dessa forma? Por que a discriminação e falta de apoio ao Delegado Braga? Enfim, cadê o MP? Sim, a impressão é que não querem uma força policial forte e com prerrogativas, quanto mais dividida, mais fragmentada... melhor para a corrupção e para os políticos?