PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 12.11.2001, horário: 13:10 horas:

O Perito Celito Cordioli, Diretor de Polícia Técnico-Científica, estava sendo entrevistado pela jornalista Márcia Dutra no programa da rede do “SBT e falava sobre o “seu órgão”, demonstrando desenvoltura, como se estivesse credenciado am falar à vontade e sobre o que quisesse. Era  bem provável que o Delegado-Geral Lipinski nem tivesse conhecimento do fato, lembrando até da época dos “Inspetores de  Quarteirão, “Juízes de Paz que ficavam abandonados a própria sorte pelo interior do Estado, resolviam questões sociais, crimes... sem prestar contas para ninguém. Cheguei a pensar que se fosse um policial civil que estivesse dando uma entrevista sem conhecimento superior para tratar sobre assuntos internos, certamente que correria sérios riscos de ter a “Corregedoria-Geral” no seu encalço. Obviamente que o caso do Perito Celito Cordioli a coisa era bem diferente, pois contava com as costas quentes do Secretário Chinato e do Governador Amin.  

Nesse mesmo dia, no outro canal (RBS), apareceu o Delegado Maurício Eskudlark que chegou a ser tratado como Delegado-Geral. Nessa entrevista o Diretor de Polícia do Interior falou sobre uma chacina que ocorreu na Capital na última madrugada. E me perguntei: “onde andariam Lipinski e Rachadel nessas horas? Certamente que nem sabiam também dessa entrevista... Pensei: “com a palavra os ex-Delegados-Gerais Evaldo Moreto e Ademar Rezende...”.

Horário: 17:30 horas:

Deixei o segundo andar da Delegacia-Geral, por meio das escadas, para me dirigir rumo ao café da tarde,  quando me deparei com Lipinski saindo do elevador no andar térreo. Ele praticamente veio ao meu encontro dizendo naquele seu jeito (eu ainda estava sob o efeito da visão meio que embaralhada... e nem tinha bem certeza que era ele):

 - “Aquele teu projeto já está na Assembleia, conseguimos colocar a regulamentação do artigo cento e seis da Constituição lá, o relator é aquele deputado, como é mesmo o nome dele?” 

Lipinski se esforçava para lembrar o nome do parlamentar.  Tentei ajudá-lo, mas não vinha o nome... e ele completou:

“Ele é do PPB!”.

Na parte da manhã Braga já tinha me procurado para mostrar esse projeto. Lipinski tinha dado o material para ele ver e queria que eu desse mais uma olhada.  Pela leitura que fiz pude perceber que Lipinski estava querendo dar as “boas novas” (e conseguiu!), pois  tinha aquilo como uma vitória. A aproveitei para argumentar:

-“Isso já está há anos aguardando regulamentação, mas que bom que vai sair agora”.

Lipinski completou:

-“Não digo que já esteja aprovado, mas já é alguma coisa termos conseguido colocar o projeto na Assembleia!”

 O que disse era verdade, considerando as sérias limitações daquela cúpula e continuei:

- “Sim, é verdade, é mais uma batalha ganha!”.

- “A gente sabe que eles podem colocar um monte de penduricalhos lá!” 

- “Sim, mas é o risco que se tem que correr, sob pena de não se conseguir nada!”

- “Também conseguimos limitar o número de presos nas Delegacias”.

- “Bom, para mim isso nem é da competência da Polícia Civil, é um ato de desumanidade para com nossos policiais exigir que além das atribuições funcionais cuidem ainda de presos”.

Lipinski concordou, mas deu a impressão que passou ao largo da carga emocional da minha observação, dando a nítida impressão que não era bem assim, e argumentou que essa “limitação” já seria  um avanço e uma conquista sua.   Acabamos nos despedindo naquele clima cordial, sendo que procurei ser contido nas minhas palavras e gestos,  apesar de prestar atenção principalmente no seu olhar a fim de tentar entender e antever o que se passava realmente  no interior daquela pessoa humana e no Delegado-Geral.  Talvez Lipinski tivesse milhares de razões para ser aquele “lobo solitário”, também, ele não poderia confiar nas pessoas, tinha que ser inconstante nas relações, inconfiável, teimoso, manter distâncias... Muito provavelmente, bem antes, já havia se transformado naquilo que o mundo o ensinou desde a sua época de militar, Comissário..., num ser absurdamente solitário..., não por nossa causa, pela causa deles ou, simplesmente por “causas”, mas em razão “dos outros” que resistiam em ser absolutos nas suas verdades, nos seus “egos”..., e na busca obstinada do poder pelo poder!  De qualquer forma, naquele dia Lipinski pareceu que estava desejoso de me dar boas notícias e esse foi um fato marcante e que me conduziu a várias leituras, imprimiu imagens, reforçou entendimentos..., entretanto, não poderia descurar fatos recentes, a minha visão de que a busca do poder pelo poder tinha o seu preço, e que só o tempo talvez pudesse revelar...

Alguns minutos depois, quando retornei do café no “Ceisa Center” (centro comercial)  relatei para “Jô Guedes” o encontro que tive com o Delegado-Geral Lipinski e ela me relatou:

- “Ah, eu estive antes lá em cima conversando com o doutor Moacir e o doutor Lipinski chegou para o doutor Moacir e disse que o projeto regulamentando o artigo cento e seis da Constituição do Estado já estava na Assembleia e que ele já havia conversado com o doutor Wanderley Redondo para acompanhar a tramitação do projeto lá”. 

Acabei comentando com “Jô Guedes”:

- “Puxa,  é incrível, eu até entendo, é uma grande coisa, mas depois de três anos ele veio trazer essa novidade? Não sei, por todos esses anos de experiência acho que é muito pouco, talvez a inexperiência do pessoal  faça com que o pouco que consigam seja tão valorizado!”

“Jô Guedes”  argumentou dando a impressão de meio intrigada:

-“Eu nem lembro desse projeto, nem sabia que ele passou por aqui?” 

Procurei esclarecer que era um projeto que já tinha encaminhado para o Delegado Braga no ano passado.

Data: 13.11.2001, horário: 10:20 horas:

O Delegado Ilson Silva me telefonou avisando que queria saber alguma coisa sobre o seu processo, estava indignado com os trinta dias de suspensão que lhe foi imposta. Já sabia que no início da manhã ele esteve conversando com o Delegado Ademar Rezende (advogado de defesa) que havia conversado comigo (por telefone) sobre o assunto.  Procurei ser direto e repisei o que já havia escrito no meu parecer que foi incluído no seu processo disciplinar. Em síntese, argumentei que dois vícios foram detectados: 1. Quebra da hierarquia... (citei os exemplos da Polícia Militar, magistratura e Ministério Público, onde a constituição das comissões de processos disciplinares obedecem rigorosamente ao  princípio da hierarquia...),  e  2. Prescrição. Ilson Silva argumentou que chegou a conversar com um Desembargador que muito seu amigo e parente e ele havia chegado as mesmas conclusões.  Acabei lembrando também do caso do Comissário Brasil de Camboriú  e recomendei que ele tomasse muito cuidado pois meus pareceres não vinculavam o Delegado-Geral, muito pelo contrário. Ilson disse que estavam querendo “arrombá-lo” e que iria ter que recorrer da decisão, caso fosse mantida a sua punição, porém, estava confiante no Secretário Chinato que era tido como um “legalista” e, também, no seu Consultor Jurídico (Procurador Edlson Naschweng), cujos pareceres sempre foram tidos como muito bons.  Eu fiquei um pouco preocupado e não me aguentei:

-“Olha Ilson eu respeito as tuas opiniões, mas fico com um pé atrás,  o Chinato não é institucional, ‘Por que esconderam a Lei Orgânica do Ministério Público quando estava tramitando? Tem que se considerar que ele é visceralmente contrário aos interesses dos Delegados de Polícia, ou não é? Então, por que esconderam o anteprojeto de lei orgânica da Polícia Civil tão draconiano para com os Delegados? Também, teve a nomeação do Celito para a ‘DPTC’, quando todos sabem que o nosso ‘Estatuto’ determina que o cargo é privativo de Delegado de Polícia? Mais, ainda, tem teve a nomeação do Sell para a direção da Acadepol, quando o nosso ‘Estatuto’ dispõe que tem que ser um Delegado em atividade, e ele é aposentado... Eles fizeram um anteprojeto de reestruturação da Polícia Civil e eu acabei tomando conhecimento do material por acaso, as propostas deles vão contra os nossos interesses... Então que ‘legalismo’ é esse?”

Conclui dizendo que se agiram assim nessas situações então  tínhamos motivos para ficar com os pés bem atrás, apesar de Lipinski dizer repetidamente que o Secretário Chinato vestia a nossa camisa.  Ilson Silva sentiu o clima e evitou falar mais sobre assunto, como se tivesse levado um banho de água gelada.

Portaria do Delegado-Geral sobre limitação de presos é descumprida? O que fará Lipinski agora, eis a questão?

“Portaria sobre lotação é descumprida – Ontem, no primeiro dia de vigência da portaria que proíbe excesso de presos nas celas da Central de Plantão Policial (CPP), nos bairros Estreito e Trindade, em Florianópolis, a situação não havia sido regularizada. O documento assinado pelo juiz da Vara de Execuções Penais, Rui Barreiros Fortes, e pela promotora de Justiça Regina Kurschus, determina a permanência de oito homens na CPP da Trindade (anexa à 5a DP) e 20 na do Estreito (junto à 3a DP). Ontem à tarde 20 presos  se espremiam nas duas celas da Trindade e 37 na CPP do Estreito. O juiz afirmou que a ordem deve ser cumprida em 25 dias. O presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Francisco Ferreira, disse que a entidade vai fiscalizar o cumprimento da decisão judicial”  (DC, 13.11.2001).