PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 04.10.2000, horário: 16:10 horas:

O Delegado Braga (responsável pela Gerência de Fiscalização de Jogos e Diversões da Polícia Civil) veio até a “Assistência Jurídica” para pedir que preparasse um anteprojeto de lei com vistas a instituir “novos valores de taxas estaduais” na área de jogos e diversões, cumprindo determinação do Delegado-Geral  Lipinski.  Na verdade Braga, além  de propor as novas taxas pretendia encaminhar ao Delegado-Geral também o anteprojeto de lei. Depois ouvir o que ele tinha a me dizer argumentei que se restringisse a atender tão somente o pedido que lhe foi feito (propor somente os valores, nada mais). Braga inicialmente resistiu, mas depois dos meus argumentos e de ponderar sobre o que fizeram com meu irmão (Guilherme Genovez, responsável pelo ambulatório médico da Delegacia-Geral, cujo serviço era vinculado ao Setor de Recursos Humanos) em razão da Informação Jurídica 071/2000, cujo documento ele próprio tinha difundido aos quatro ventos. Aproveitei para afirmar:

- “... Se eles não prestigiam a gente como é que vamos ficar nos oferecendo, olha Braga eu faço o que tu queres, tu sabes que isso para mim não é difícil, mas para encher a bola dessa gente que fica pisando em nós, onde é que está a nossa dignidade?”.

(...)

Depois desse desabafo acabei por ajudar Braga a redigir apenas uma Comunicação Interna. Mais tarde, fiquei preocupado porque Braga poderia ter interpretado mal a minha atitude.

Data: 05.10.2000, horário: 09:00 horas:

Foi a vez da Psicóloga Policial Clarice Silva, do Setor de Recursos Humanos da Delegacia-Geral, vir até a “Assistência Jurídica” para dizer que conversou com o Delegado-Geral Lipinski acerca do caso envolvendo o pedido de exoneração do meu irmão.  Segundo ela, Lipinski havia se mostrado bastante sensível e argumentou que aquilo não iria ficar assim, que iria tentar reverter a situação. Clarice relatou que se esforçou para dizer a Lipinski que era uma injustiça o que estavam fazendo com meu irmão e que se tratava de um “troco”, inclusive, que o pessoal da sua área não havia sido ouvido e que não era verdade o que o Diretor de Polícia Técnico-Científica  havia escrito no documento que encaminhou ao Secretário de Segurança Antenor Chinato.  Clarice afirmou que saiu daquela conversa com Lipinski  bastante confiante que havia se sensibilizado e iria tentar reverter a aquela situação. De outra parte, eu custava acreditar que seria possível e ponderei que o despacho final havia sido de Lipinski, então como é que ele poderia ter agido daquele forma?

Resumo dos fatos (objeto da Informação Jurídica 071/2000), subscrita por mim (responsável pela “Assistência Jurídica”):

  1. Meses antes dos fatos o Delegado Regional de Criciúma (Delegado De Bona) havia encaminhado uma comunicação interna denunciando que o Perito Criminalístico que atuava naquela região se negava a atender requisições de perícias ;argumento que só aceitaria receber ordens do Diretor de Polícia Técnico-Científica – Perito Celito Cordioli (nomeado indevida e ilegalmente para o cargo que deveria ser ocupado por Delegado de Polícia);
  2. Como se tratava de uma denúncia de insubordinação contra um Perito Criminalístico, cuja carreira integrava o Grupo: Polícia Civil, a comunicação interna foi dirigida para o Corregedor-Geral da Polícia Civil (Delegado Rachadel) que ao invés de instaurar procedimento disciplinar para apurar os fatos resolveu encaminhar o documento subscrito pelo DRP de Criciúma ao Diretor de Polícia Técnico-Científica para que o mesmo se manifestasse sobre os fatos;
  3. Tão logo recebeu o Diretor de Polícia Técnico-Científica deu razão ao Perito Criminalístico de Criciúma e que o mesmo só deveria receber ordens suas;
  4. O Corregedor-Geral após receber a resposta do Diretor de Polícia Técnico-Científica, ao invés de instaurar procedimento disciplinar resolveu encaminhar o documento para que o Delegado-Geral tivesse conhecimento e adotasse as providências necessárias;
  5. Na sequência, o Delegado-Geral ao invés de determinar que a Corregedoria-Geral adotasse as medidas disciplinares cabíveis, resolveu encaminhar para que sua “Assistência Jurídica” se manifestasse;
  6. Logo que recebi o documento produzi a Informação Jurídica 071/2000 denunciando primeiramente que o cargo de Diretor de Polícia Técnico-Científica estava ocupando ilegalmente o cargo que deveria ser destinado a um Delegado de Polícia. Nesse sentido, argumentei que o ato de nomeação era nulo assim como todos os documentos subscritos pelo Perito Celito Cordioli. Mais, ainda, que o governador do Estado e o Secretário de Segurança (Promotor de Justiça Antenor Chinato) poderiam incorrer em prática de ilícito criminal porque eram os responsáveis pela produção de um ato ilegal (a nomeação do Diretor de Polícia Técnico-Científica). Questionei a omissão do Corregedor-Geral da Polícia Civil em não instaurar procedimento disciplinar tão logo tomou conhecimento da prática de flagrante ato de insubordinação do Perito de Criciúma;
  7. Passado alguns dias do encaminhamento desse documento recebi uma notificação do Corregedor-Geral, com uma manifestação do Governador Amin, concedendo o prazo de 10 (dez) dias úteis para que eu justificasse minha informação jurídica, sob as penas da lei;
  8. Nas minhas justificativas repisei todos os argumentos expendidos na Informação Jurídica 071/2000 e adicionei mais, ainda: que o Secretário Chinato estava envolvido num esquema dos Peritos para que a Polícia Técnico-Científica deixasse à Polícia Civil, inclusive, que o Titular da Pasta tinha participado de um Congresso Nacional de Criminalística, em cujo evento foi homenageado. Registrei que o Perito Celito Cordioli, ocupante de cargo de direção superior da Polícia Civil não despachava com o Delegado-Geral (Lipinski), tão somente com o Secretário Chinato, o que demonstrava quebra da hierarquia e desprestígio à cúpula da Polícia Civil. Juntei vários documentos procurando demonstrar como o Secretário Chinato procurou sempre prestigiar o Perito Celito Cordioli com quem trabalhou no processo criminal envolvendo o Engenheiro “Miguel Orofino” (Ponte Pedro Ivo Campos), cuja repercussão dos fatos foi internacional.
  9. Depois de encaminhar minhas justificativas fiquei aguardando o resultado que veio “a cavalo”. Não puderam (ou não quiseram me atingir) em razão talvez da repercussão dos fatos. Entretanto, passado alguns dias, a esposa de Celito Cordioli, secretária de meu irmão no “Ambulatório Médico” (Cristina Cordioli) encaminhou uma correspondência, por meio de seu esposo, ao Secretário Chinato denunciando que meu irmão não cumpria horário de trabalho e que havia várias reclamações de seus pacientes quanto à qualidade de seus serviços médicos...
  10. O documento veio aportar na Delegacia-Geral e Lipinski notificou meu irmão a se apresentar imediatamente (em vinte quatro horas) na Diretoria de Polícia Técnico-Científica, justamente, para Celito Cordioli e, ainda, ter que responder disciplinarmente por tais denúncias;
  11. Tão logo meu irmão foi notificado se dirigiu até a “Assistência Jurídica” com o despacho de Lipinski e arrematou: “Olha aqui o que estão querendo fazer comigo, provavelmente, porque não puderam te atingir e vieram contra mim, a parte mais fraca. Não fico mais um minuto na Polícia Civil, pode preparar meu pedido de exoneração em caráter irrevogável”. Foi a primeira vez que vi meu irmão derramar lágrimas na vida... Nosso pai era Delegado e se orgulhava de ter dois filhos na Polícia Civil...
  12. Foi o ato de exoneração mais rápido que vi ser publicado na imprensa oficial, não demorou mais do que alguns dias para ser publicado.

A Psicóloga Clarice ainda disse que a responsabilidade pela decisão de Lipinski havia sido do Chefe de Gabinete Moacir Bernardino que deve ter influenciado na decisão.  Argumentei que não, que preferia acreditar que o Delegado Moacir Bernardino apenas cumpriu ordens de seu superior (acabei lembrando das advertências do Delegado Natal no nosso último encontro em Chapecó...). 

Horário: 16:00  horas:

O Delegado Braga retornou à “Assistência Jurídica”  e me senti mais aliviado de revê-lo porque já tinha pensado em procurá-lo por causa de nossa conversa no dia anterior (sobre o anteprojeto de lei). Mas ele aparentava estar bem e argumentou que estava chateado isso sim com o que fizeram com meu irmão, uma baita “covardia” e que já estava conversando com muitas pessoas, procurando colocar a par a respeito dos fatos, inclusive, que as pessoas com quem já havia conversado ficaram muito revoltadas. Aproveitei para comentar que meu irmão era um excelente médico na área de “sangue”, uma referência no Estado, com especialização no Japão... que só procurou ajudar os policiais e seus familiares com um atendimento médico especializado e de alta qualidade,  muito honesto, trabalhador, dedicado e que nunca fez mal a ninguém. Braga afirmou que no início da tarde ficou esperando por Lipinski para desabafar, mas ele não veio.  E, finalmente, completei dizendo que em razão de uma causa tão relevante em defesa da unidade da instituição, dos interesses da Polícia Civil, apontei para o  Diário Oficial que estava sob a minha mesa, aberto na Lei Complementar 201/2000 (DOE n. 16.510, de 02.10.2000) que criou mais de cem cargos na área criminalística e nenhum cargo de Delegado de Polícia... e passei a desabafar um pouco sobre minhas frustrações e questionei porque foram se vingar justamente na parte mais fraca, meu irmão que era ocupante de cargo efetivo de Técnico em Necropsia (foi boicotado no concurso para médico legista por minha causa, na época do Delegado-Geral Jorge Xavier, porque na greve dos Peritos e Médicos Legistas, havia assinado um laudo de necropsia, cujo pedido era urgente, passando por cima dos médicos legistas (no caso especialmente da Médica Legista Joyce, Gerente Médico Legal, cuja mãe foi paciente de meu irmão na UTI  do Hospital de Caridade...e fez de tudo para ajudá-la no seu tratamento...).  E, Braga, depois de dar uma rápida passada na LC 201/2000 e, também,  no excelente Parecer do Consultor Jurídico/SSP Edelson Naschenweng (Parecer n. 078/SSP/2000), aprovada por Antenor Chinato Ribeiro, foi se despedindo... 

Data: 09.10.2000, horário: 16:15 horas:

Estava caminhando pela Rua Esteves Júnior (centro de Florianópolis) e encontrei o Delegado Damásio Mendes de Brito (meu colega também do curso de Direito – Ufsc) que estava atuando na 1a DP de Chapecó.  Damásio caminhava para uma consulta no seu oftalmologista.  Perguntei como estava Chapecó e ele respondeu:

 - “... A minha esperança é que, bom eu sei que não dá para botar muita fé, né Felipe, mas estão dizendo que vai ter remoção horizontal em janeiro...”.

Argumentei que Lipinski era um “legalista” e que se fosse pela legislação teria que haver concursos de remoção horizontal antecedendo as promoções.  No entanto, ponderei que tinha sérias resistências àqueles que se intitulam aos quatro ventos que eram  “legalistas”, como no caso de Lipinski, quando na prática ou em determinadas circunstâncias políticas se tornavam...  Damásio pareceu concordar. Apesar da sua pressa, comentei que o problema da instituição era que o pessoal que ocupava cargos de direção o fazia porque entravam em esquemas políticos se vinculavam a pessoas ligadas ao poder em busca de posições que traziam alguma vantagem financeira, sendo que depois tinham que se submeter a interesses do governo e ficavam completamente engessados, transfigurados, travestidos...  Citei como exemplo o caso do “triunvirato”...  e lembrei que alguns estavam fora do circuito do poder e não ocupavam cargos justamente  porque não queriam se dobrar e assegurar um mínimo de independência para se contrapor aos interesses políticos. Aproveitei e fiz um relato a  Damásio sobre o caso da Informação n. 071/2000 e o destino de meu irmão. Damásio quis saber onde era que estava escrito que o cargo de Diretor da Polícia Técnico-Científica tinha que ser ocupado por Delegado de Polícia. Procurei com argumentos demonstrar a fundamentação legal (Estatuto da Polícia Civil) e Damásio fez  um desabafo:

- “Então,  Felipe, é por isso que nós vamos perder a isonomia.  Por que quê a nossa instituição não faz nada? Por que os nossos líderes classistas não tomam uma medida...?”.

Percebendo a sua confusão sobre os fatos procurei corrigir:

- “Estais falando da Associação?”.

- “Sim. A Adpesc! Por que o Mário não tomou ainda uma medida? É por isso que nós temos que perder a isonomia...”,

Procurei demonstrar que o Delegado Mário Martins estava ligado ao governo Amin, não só por sua vinculação política (PSDB), mas porque sua esposa ocupava função gratificada no Gabinete do Titular da Pasta, além disso seu filho era policial civil (havia passado no último concurso de 1998) e foi designado para atuar na Grande Florianópolis. Além disso, Mário Martins estava lotado em Tubarão, mas designado para prestar serviços na Polinter, onde certamente pretendia permanecer depois que terminasse seu mandato em abril de 2001. Damásio,  apesar de revelar  um quase total desconhecimento do que ocorria nos bastidores da instituição, procurou revelar sua revolta contra a apatia geral dos nossos pares,  e acabamos por nos despedir mais em razão da sua pressa já que tinha horário para consulta. 

No caminho lembrei que no dia seguinte teria reunião do Conselho Superior (convocada por Lipinski) e que talvez, depois de tanto tempo, o Conselho voltasse a deliberar alguma coisa importante? Lamentei que não consegui passar para Damásio o tamanho da indignação com as coisas que aconteciam dentro da Segurança Pública, e lembrei que pela manhã havia avistado o Delegado Eduardo Sena na Delegacia-Geral  e me restringi apenas a cumprimentá-lo. Lembrei que Braga talvez tivesse razão, ou seja, não deveríamos ficar nos rebaixando tanto para pedir que companheiros se juntassem ao nosso grupo, nem que fosse só para conversarmos sobre amenidades, como não queria Garcez com suas críticas jacobinas?!?! No trajeto até o Supermercado Angeloni fiquei pensando também na preocupação de Damásio com a “isonomia” salarial entre Delegados e Procuradores de Estado, sobre sua esperança em vir para o litoral com a realização no concurso de remoção horizontal que eu acreditava não iria ocorrer em janeiro/2001.