PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 19.08.2002, horário: 12:00 horas:

Estava de saída da Delegacia-Geral e tive que me deter para que um veículo Santana Quantum pudesse sair da garagem do prédio. O veículo passou bem ao meu lado e percebi que ao lado do motorista estava uma pessoa em traje social, sisudo, sentado ereto no banco e com uma postura austera. Logo percebi que se tratava do Delegado Moacir Bernardino, Chefe de Gabinete do Delegado-Geral, muito provavelmente saindo para seu horário de almoço. Imediatamente pensei: “Moacir deveria estar indo para casa com a viatura descaracterizada (Santana Quantum Prata), com seu motorista que provavelmente iria lhe trazer de volta, contando ainda com um estacionamento privativo, um privilégio para poucos, enquanto outros que estavam fora da cúpula ficavam de fora..., “sim, faziam um grande favor”, pensei.   De forma alguma poderia invejá-lo, muito pelo contrário... Sempre abominei essas mordomias que nunca tive e nunca quis, mesmo quando pude usufruí-las no passado, era como violar minha consciência, um desrespeito ao dinheiro público, as pessoas da sociedade que pagavam impostos, enfim, era abominável... 

Horário: 14:00 horas:

Estava retornando à Delegacia-Geral e, quando estava subindo a escada que dava acesso ao primeiro andar e visualizei que a porta do elevador estava se abrindo. Logo percebi que se travava do jornalista (e Assessor de Imprensa) Hélio Costa trajando terno bege,  com ares de austeridade fazendo frente para o porteiro da Delegacia-Geral. Hélio Costa caminhava altivo e fazia movimentos tipo em câmara lenta, gesticulando o braço esquerdo na altura do ombro parecendo uma figura nobre, talvez estivesse levando um cigarro à boca (deduzi). Acabei lembrando da visão de Moacir Bernardino anteriormente quando saiu para o almoço e agora Hélio Costa também parecia mestre em artes cênicas...,  trajes bacanas, gestos nobiliárquicos... Resolvi partir para a “Assistência Jurídica”, sem olhar para trás.

Horário: 16:00 horas:

Estava sozinho na “Assistência Jurídica” e o Delegado Luciano Bottini deu novamente o ar de sua graça. “Jô Guedes” tinha recomeçado o curso de inglês. Apesar de saber que no máximo no próximo ano iria embora ela parece que resolver fazer mais um curso, não quis criar problemas e preferi deixar ela levar vantagem em detrimento da instituição que ainda continua investindo nela, mesmo agora sabendo que de nada iria adiantar, era muito triste essa falta de consciência, mas “Jô Guedes” era uma pessoa especial e no meio do caos tudo era possível...

Na verdade eram os reflexos da gestão do Delegado-Geral  Lipinski,  e os fantasmas se somam nos guarda-roupas. Bottini já havia estado de manhã a minha procura. Ele queria saber se poderia passar presidência da Comissão de Promoções do Subgrupo: Técnico-Científico para o Delegado Especial Valdir que já preside a Comissão encarregada do Subgrupo: Técnico Profissional. Argumentei:

- “Olha Bottini, não há empecilho algum. Não é recomendável, pois a legislação já tratou de criar três comissões independentes. Depois o doutor Valdir já preside uma Comissão que tem que cuidar das promoções de mais de dois mil policiais enquanto que a tua é por volta de duzentos”.

Bottini interrompeu:

- “Por isso mesmo, se ele preside uma comissão de mais de dois mil não vai fazer diferença pegar mais duzentos, não achas? Eu vou falar com ele. Foi bom te ouvir.  Eu estou cheio de atividades, não dou conta do meu serviço. Olha tu precisas ver, o nosso pessoal não tem ideia ainda da importância da Gerência de Produtos Controlados. Tu conversa com eles e  parece que tu estais chateando eles com o assunto. Eles acham que isso não deveria ser serviço da Polícia Civil. Que nós deveríamos só fazer investigações e instaurar inquéritos policiais.  Tu precisas ver quanta coisa mudou na legislação, quantas novas atribuições foram passadas à Polícia Civil. O Decreto três mil e oito já está super defasado.  Eu não posso ficar cuidando de Comissão de Promoções. O Valdir só cuida de promoções. Ele está lá em cima só para cuidar disso. Então eu não vejo problema dele assumir as duas comissões”.

Aproveitei para argumentar:

- “Olha Bottini tu já estais há quase quatro anos ali na Gerência. Eu acho que é tempo suficiente para ter feito muita coisa”.

Bottini com tranquilidade voltou a dar ênfase a sobrecarga de serviço:

- “Eles me mandaram agora um funcionário. Disseram, ‘é Bottini agora tu estais bem, estamos te dando mais um funcionário,  uma viatura’. Agora tu vê!” 

Comentei que a ideia era essa, faltava consciência por parte daqueles que comandavam a instituição e acabei falando no Delgado Braga e seu estilo de administrar:

- “O Braga é um lutador, porém, tem um problema, ele é muito personalista. O Braga que estar sempre em evidência na mídia. É um estilo. Ele faz barulho, incomoda, só que não é o setor  dele que está em evidência e sim principalmente a figura dele. Hoje a cúpula da Polícia Civil ficou muito pequena. Você lê nos jornais matérias sobre outras instituições e percebe como são tratados. As cúpulas dessas instituições procuram se preocupar com grandes temas. Aqui não funciona assim. O pessoal se sente impotente para brigar com o governo, com as autoridades superiores e acabam se perdendo com coisas pequenas, como punir Investigador, cobrar  o uso do telefone, reformas, viaturas... Outro dia eu estava falando com o Optemar e ele passou a criticar o Comando da Polícia Civil. Eu cheguei e perguntei para ele: ‘escuta aqui Optemar, tu achas que tu também não integras a cúpula da Polícia Civil?’ Imagina, o homem ocupa uma diretoria importante e se colocava numa condição de crítico, como  se não pertencesse ao comando, dá licença, né Bottini. O que a gente vê é o pessoal que ocupa cargo comissionado às vezes se colocando numa posição de quem está fora do comando. Depois tem outra, se o Amin se reeleger, vai ficar mais quatro anos e nós vamos ter que encarar essa cúpula por mais quatro anos”. 

Bottini concordou diplomaticamente e fez o seu comentário:

- “É , mas as reeleição  não está garantida assim. Se o Amin for para o segundo turno a coisa vai pegar e ele não ganha, podes ter certeza disso!”

Fiquei impressionado com a avaliação de Bottini e acabei externando minha preocupação com o fato de Amin ganhar as eleições no primeiro turno e ainda fazer maioria na Assembleia Legislativa.  Falei da minha preocupação com a reforma da previdência no Estado, da revogação do Estatuto da Polícia Civil, da missão de Celestino Secco, caso viesse a ser reeleito Deputado Estadual.   Só esqueci dizer que – segundo o Delegado Braga – Lipinski seria cabo eleitoral de Celestino Secco (sinceramente até aquele momento não acreditava nisso).