PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data 08.04.2002 – “O verdadeiro ‘TZ’?”

A Exposição de Motivos assinada pelo Secretário Chinato demonstrava muito bem o espírito da sua administração quando a política de tratamento dos Delegados de Polícia, a começar pelos mais graduados que ao invés de serem valorizados e prestigiados acabavam sujeitos a serem jogados na vala comum para dar lugar às ingerências políticas nas escolhas de cargos de direção, além de mpor um perfil de polícia operacional (todo Delegado novo quer fazer carreira e servir ao poder político), com “tolerância zero” para quaisquer resistências de cunho institucional:

“ESTADO DE SANTA CATARINA – SECRETARIA DE ESTADO DA SEGURANÇA PÚBLICA – GABINETE DO SECRETÁRIO – Florianópolis, 05 de março de 2002 – EM. GAB. SSP n. 8062/2002 – Senhor Governador, Submetemos à elevada deliberação de Vossa Excelência proposta de Decreto que regulamenta o par. 3o, do art. 40, da Lei Complementar n. 98/93, com o objetivo de suprir lacuna que produziu grave distorção no último grau de carreira de Delegado de Polícia Civil do Estado. A ausência de norma regulamentadora levou a que muitos desses profissionais ficassem, simplesmente, sem atribuições. Com a nova norma, todos terão não apenas a lotação definida como também a designação das atividades que desempenharão, que poderão dar-se nas Delegacias de Polícia da Capital, a exemplo do que ocorre nas carreiras da Magistratura e do Ministério Público, na sua entrância especial. Acolhida a proposta por Vossa Excelência, a Polícia Civil poderá disponibilizar maior número de Delegados para as suas unidades da Capital, que sofreram sensível redução com a regularização das lotações, além de poder dispor mais facilmente de tais profissionais para a designação em missões especiais. Respeitosamente, Antenor Chinato Ribeiro – Secretário de Estado da Segurança Pública”. No auto do documento consta o despacho do Governador: “De acordo. Publique-se no DOE esta EM. 5.3.02” (DOE n. 16.861, de 08.03.2002).

“Seriam os Delegados na ‘Idade das Trevas?’”

Ao ler esse documento parece que ouvia vozes que ecoavam do  Gabinete do Secretário Chinato, as conversas de bastidores com outros Delegados das suas relações (todos Delegados novos ou reacionários). Tratam-se de Delegados que gozam do privilégio do convívio direto com Chinato, mas que também integravam o comando da Polícia Civil, especialmente, os integrantes do “triunvirato” que frequentavam seu gabinete com certa assiduidade, aproveitavam intervalos de conversas, entre  cafezinhos para risos e desabafos “às fanforras”, tipo a) se faltava efetivo:  a culpa era dos Delegados Especiais;  b) se havia críticas: a culpa era dos Delegados Especiais;  c) se havia desobediência: a culpa era dos Delegados Especiais; d) se existiam obstáculos: a culpa era dos Delegados Especiais; e) se havia muitas ocorrências policiais: a culpa era... Não dava para esquecer que aquele discurso também era o discurso do Delegado Mário Martins, presidente da Adpesc e que certa vez me “jogou isso na cara” numa conversa nossa lá na sede da entidade no ano de 1998 e me perguntei: “será que Mário que é do ‘PPB’ também frequentaria o gabinete de Chinato às escondidas para conversar e tomar um cafezinho, usando os ‘Delegados Especiais’ como ‘bodes expiatórios’ favoritos, justamente ele que não chegou ainda no topo da carreira, então era um prato cheio...

Ao ler o Decreto via-se claramente os absurdos nele contido: A) “as Delegacias de Polícia da Comarca da Capital integram a estrutura da Delegacia Geral da Polícia Civil” (art. 1o): A pergunta que se deveria fazer era a seguinte: e as demais Delegacias integravam que estrutura, heim? B) “(...) ficando sob a coordenação da Gerência de Operações Policiais” (art. 1o, parte final): Ora, o atual Gerente nada mais nada menos era que Mauro Dutra, Delegado Especial ansioso para fazer parte da cúpula. Sucede que o Diretor que comandava esse Delegado Especial chamava-se Paulo Koerich, Delegado de 1a Entrância, atuando diretamente com Chinato... C) “Os Delegados de Polícia de entrância especial (...)” (art. 2o): Espera ai, existia cargo de Delegado de Polícia de entrância especial? Afigura-se que o cargo era de Delegado Especial (ver LC 55/92). A estrutura jurídica da carreira de Delegado iniciava como substituto e terminava na quarta entrância, como era no Ministério Público e na Magistratura, portanto, o Delegado Especial não possuía  entrância, justamente porque deveria atuar em postos de comando que chegou à esse patamar na carreira,  Também, a Lei Complementar  que fixou estrutura jurídica à carreira de Delegado de Polícia no mesmo sistema do Judiciário e Ministério Público (entrância inicial, intermediária e final) estava ainda sub judice, haja vista que o governo do Estado havia arguido a sua inconstitucionalidade (vicio de origem). Ademais, pela referida legislação, a entrância final era resultado da transformação da quarta graduação e não dos cargos de Delegados Especiais. F) “(...) e na sua estrutura (...)” (art. 2o): que estrutura seria essa? Todos os órgãos e unidades policiais civis não integram a estrutura da Delegacia-Geral da Polícia Civil? G) “(...) mediante ato de designação do Secretário de Estado da Segurança Pública, por indicação do Delegado-Geral da Polícia Civil” (art. 2o, parte final): afinal, quem comandava a Polícia Civil? Será que a Constituição do Estado (art. 106, caput) de nada valia? O restante do Decreto demonstrava cristalinamente que não só a ideia, mas, principalmente, a redação foi engendrada por Lipinski, especialmente, no que dizia respeito a possível designação de Delegados Especiais para presidir inquéritos que demandassem dedicação exclusiva e para a realização de missões especiais específicas de competência da Polícia Civil. 

Como sempre dizia Lipinski: “Chinato veste a camisa da Polícia Civil!” Depois de ler o documento entendi a “jogada”:  Ao designar os Delegados em último nível de “entrância especial”  e com a criação das graduações de Promotor de Justiça e de magistrado de entrâncias especiais para atuar na Capital, queria se tratar os Delegados Especiais como Delegados das Delegacias da Capital, como se Florianópolis não fosse comarca de quarta entrância na Divisão de Polícia Judiciária (Decreto 4.196 de 1994).

Braga comentou ainda que o arguto Delegado Moacir Bernardino insistia que os Delegados finais de carreira eram de entrância especial, parecia outro que estava com o discurso na ponta da língua, já que estava longe de chegar no último patamar da carreira. Além disso, Moacir Bernardino ocupava cargo e lugar que deveria ser destinado ao um Delegado Especial, portanto, ele deveria ter que ir para uma Delegacia de Polícia do interior do Estado e esperar a sua vez chegar. Portando, era bem mais cômodo ele ficar num cargo comissionado com seus privilégios, sem a necessidade de ir participar de concursos de remoção horizontal... 

Ponderei que a legislação especial (LC 98/93) estabelecia que a lotação dos Delegados Especiais era na Delegacia-Geral, em cujo local deveriam exercer suas funções, que o objetivo do legislador foi que os Delegados Especiais ocupassem todos os principais postos de comandos da instituição, que tivessem prerrogativas, garantias... e que a experiência adquirida ao longo dos anos na instituição fosse reconhecida...  Braga argumentou que estava com pressa para o almoço e antes que ele se fosse argumentei:

- “Desse jeito vão fazer ‘joquetes’ dos Delegados Especiais, ao invés de se fortalecer esse pessoal eles vão sujeitá-los a serem colocados nas Delegacias como substitutos,  isso é um retrocesso histórico, é uma artimanha, é uma a vergonha! Não vê o caso do Wilmar Domingues, ele tem combatido essa exploração de jogos, tem falado aos quatro cantos.... e olha só o que querem fazer com ele? A verdade era que quem se metesse a falar, a criticar, a incomodar... correria sérios riscos de ser removido, ser colocado numa Delegacia, ficar vulnerável perante ao Delegado Rachadel (Corregedor-Geral) e o Mário o que diria de tudo isso?” 

Braga novamente pareceu dar de ombros e disse que na parte da tarde retornaria.  Perto de meio dia “Jô Guedes”  avisou que o policial da portaria perguntou para ele se eu tinha o projeto que acabava com todas as carreiras da Polícia Civil, que só mantinha  os Delegados e o resto, ou seja Delegados e Agentes  e que era o projeto da Fecapoc que já estava na Assembleia... Respondi que não sabia de nada. 

Horário: 14:30 horas:

Ao chegar na Delegacia-Geral encontrei Braga e como ele estava querendo falar comigo fomos direto para a “Assistência Jurídica”.  O assunto era aquele Decreto acerca dos Delegados Especiais. Argumentei que isso só poderia se tratar de uma retaliação aos trabalhos dele e de Wilmar Domingues no combate à exploração de jogos eletrônicos.  Perguntei:

- “Esse Decreto foi dirigido a quais Delegados Especiais? Estão todos trabalhando, o Secretário escreveu que havia uma deformidade grave, o que é isso? O Zachi tá na Corregedoria, o Mauro Dutra na Diretoria de Polícia do Interior, quem é o Delegado Especial que não está trabalhando por aí, que está sem atribuições, me diz? Só se for o Wilmar...”.

Braga logo socorreu Wilmar Domingues para dizer que ele estava cuidando da parte de inteligência da Polícia Civil.  Insisti:

- “Que deformidade grave é essa Braga? Sinceramente, eu acho que com isso os Delegados Especiais ficam mais e mais sem forças, amordaçados, sem poder para fazer nada”.

Braga lembrou que apenas três Delegados Especiais não querem cargos comissionados. Ele, Wilmar e... Então, pensei: “Seria então diriigido a nós esse Decreto?”

Braga argumentou:

- “Não acredito que esse Decreto foi editado para tirar a força dos Delegados Especiais, eu acho que eles fizeram isso porque tinham que fazer, a lei precisava ser regulamentada e pronto!”. 

Não poderia concordar com aquele raciocínio simplista, mesmo porque Braga havia ficado um mês todo fora de férias e devia esta  por fora de tudo  e insisti:

- “Olha Braga, para mim não há outra explicação, esse negócio de incomodar o governo, de atacar a Codesc,  aprender máquinas...  só os Delegados Especiais teriam peito para fazer isso, são eles que poderiam ter alguma segurança, apesar de pequena, mais teriam, ou melhor tinham...”. 

Depois, fui para o computador e passei a redigir uma proposta de Circular para o Delegado-Geral Lipinski que Braga havia pedido e que tratava sobre “seguros”. Enquanto isso Braga ficou falando:

- “Faço uma aposta que o Maurício Noronha vai ser o Chefe de Gabinete do Delegado-Geral, queres apostar dois pães de queijo? Queres apostar quantos pães de queijo? O Moacir Bernardino se desentendeu com a Letícia lá em cima e tu sabes que o Mário Martins quer apitar aqui também, queres apostar? Eu estava falando com o Lipinski, isso ‘em off’, o Lipinski me contou, ele mesmo me contou, isso é segredo, ele disse que o Carlos Dirceu vai ser o Delegado-Geral, conversa por aí! Ele falou sério, disse que o Carlos Dirceu vai substituir ele. O Carlos Dirceu está  no PPB,  no partido do Amin, tá fazendo campanha para o Maurício Eskudlark. Eu não acredito, outros dizem que já está tudo certo, que há um acerto, o Rachadel vai assumir no lugar do Lipinski”.  Fiquei meio sem saber o dizer, mas procurei disfarçar, perguntando:

- “Vem cá, onde é que anda o Wanderley Redondo, heim?”.

Braga respondeu:

- “Tá na 3a Delegacia, lá no Estreito, mandaram embora da Assembleia. Ele se apresentou na Corregedoria e mandaram que fosse para a 3a DP”.

Depois de ouvir essa informação, quase que sem acreditar, perguntei:

- “O que? O homem que foi um dos mais poderosos da Polícia Civil no início deste governo acaba indo para a 3a DP? O  que é isso Braga?”

Braga reiterou:

- “É verdade sim!  Dizem que agora não é mais ‘triunvirato’, é ‘unovirato’, acho que é isso, ‘dunovirato’, é isso mesmo, como é mesmo dois... ? Agora é ‘dunovirato’ e é só o Lipinski e o Rachadel que mandam em tudo”.