PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 01.06.2003, horário: 11:00 horas:

Resolvi dar uma chegada até o Gabinete do Chefe de Polícia Dirceu Silveira, pois já fazia alguns dias que precisava falar com ele, especialmente, depois de me frustrar com os encontros do “grupo especial” e suas deliberações. Imediatamente a secretária me anunciou e fui entrando.

Dirceu estava sentado e logo que me viu foi abrindo aquele seu sorriso que refletia espontaneidade, alegria, receptividade, boas vindas... Logo que sentei na sua frente disse que tinha dois assuntos para tratar. Antes porém, tomei a liberdade para dizer:

- “Pois é, no ano passado eu já sabia que tu serias o Delegado-Geral”.

Dirceu ficou curioso e perguntou:

- “Sim, como tu sabias?”

Eu estou construindo no norte do Estado e sempre estou por lá. Tenho alguns contados com pessoas que te conhecem bem. E me disseram que se o Luiz Henrique fosse o governador tu serias o Delegado-Geral. Foi incrível o efeito da minha colocação e Dirceu Silveira foi relatando:

- “Sim, eu tenho uma boa relação com o Governador Luiz Henrique. É muito antiga. Quando ele ainda era Deputado Federal um dia ele chegou na minha Delegacia lá em Joinville apavorado porque precisava viajar para o exterior e havia perdido todos os documentos, o ‘passaport’ e ele me perguntou: ‘Delegado e agora o que eu faço?’ Eu telefonei para a Polícia Federal em Itajaí peguei ele coloquei no carro e levei até a Polícia Federal em Itajaí. Na viagem conversamos um monte. Bom, depois o Luiz Henrique foi meu padrinho de casamento. Nas eleições dele para governador ele me encontrou e disse: ‘Tu vais ser o Secretário de Segurança’”.

Lembrei que havia entrevistado o comissário “Mirandão” que durante muitos anos foi Delegado do Dops, em cuja época Luiz Henrique era o seu Escrivão, na primeira metade da década de sessenta, justamente quando ele foi preso. Depois perguntei para ele:

- “Sabe quem é que andou perguntando por ti?”

Dirceu pareceu curioso para saber havia perguntado por ele e tive que me segurar para não dizer que quem andou perguntando por ele foi a “Leocádia” lá da cidade de Armazém, mas achei que a brincadeira era inconveniente para aquele momento e mudamos de assunto. Olhei para Dirceu que aparentava sempre aquela sua tranquilidade, espírito desarmado e fui dizendo:

- “Não vou citar o nome porque é meu amigo, mas outro dia um Diretor  aí estava conversando comigo e confidenciou que: ‘ô Dirceuzinho só fica trancado em quatro paredes, não sai lá de dentro’ e eu fiquei meio assim, fui dizendo que não era bem assim. Disse para ele que as responsabilidades do Chefe de Polícia eram muito complexas e, também, grandes as limitações. Mas o pessoal não entende, eles não têm noção. Eu sei que tu tens esse teu estilo aí, aparentas tranquilidade, calma, mas por dentro eu sei que corre um rio de preocupações. Esse teu jeito de aparentares estar calmo é só aparências. Não é fácil. Eu já trabalhei com Chefes de Polícia que saiam daqui de dentro desmaiando no elevador, cheio de preocupações, estresses”.

Depois ouvir a minha narrativa ele confirmou que realmente poderia aparentar calma, mas por dentro era muito preocupado. Nesse instante o celular dele tocou e do outro lado uma mulher. Depois,  pareceu ter conversado com o Secretário Blasi alguma coisa que não entendi. Depois de desligar o celular fui direto ao assunto que havia me trazido até ali: 

- “...Tivemos aquela nossa última conversa, naquele dia aqui, e eu preciso saber o que tu pretendes fazer com aquele cargo de ‘Assistente Jurídico’ lá?”

Dirceu, apesar de seu tamanho diminuto, meio que se reclinou na cadeira, balançou a cabeça e foi dizendo:

- “A minha ideia era propor a tua nomeação para o cargo. Não tem ninguém entre os Delegados que tenha o teu perfil”.

Continuei:

- “Porque eu tenho duzentos dias de férias, licenças-prêmio e estou disposto a pegar uns quatro meses de afastamento para tocar a minha obra lá em São Francisco”.

Dirceu me interrompeu para perguntar:

- “Esta tua obra é na praia? É na Enseada?”

Respondi:

- “Não. É no centro da cidade. Tu conheces São Francisco?”

Dirceu respondeu que sim e continuei:

- “Pois é, fica na continuidade da ‘Barão do Rio Branco’, bem no centro comercial...”.

Dirceu foi dizendo:

- “Que bom, puxa!”

Na verdade a construção não ficava na Barão do Rio Branco e sim já na entrada do Bairro Rocio Pequeno, no início da Rua Almirante Barroso, mas não quis dar muitas explicações e continuei meu propósito de estar ali:

- “Já te disse que não tenho interesse na minha nomeação, mas como tu dissestes que a tua intenção era que eu fosse nomeado já que estou lá embaixo fazendo às vezes de "Assistente Jurídico", daqui a pouco eu acabo sendo surpreendido com o ato no Diário Oficial. Na verdade, se isso vier ocorrer não vou poder me afastar para gozar minhas férias atrasadas e cuidar dos meus negócios. Não teria como. Já estou fechando os meus trinta anos de serviço e daqui a pouco posso requerer minha aposentadoria especial. Tu lembras que naquele nosso último encontro aqui no teu gabinete eu te disse que eu ficaria na "Assistência Jurídica" como responsável, aliás, como já estou desde 1999. Já tinha prometido que nunca mais iria aceitar cargo comissionado algum. Porém, naquela nossa conversa deu para sentir que isso poderia ocorrer sem que eu soubesse, o pessoal está aí reclamando que estão sendo convocados para comissões de processos disciplinares, sem qualquer consulta prévia. Então, claro que se viesse sair a minha nomeação eu teria que permanecer trabalhando. Eu vim aqui te pedir para que eu possa me afastar por um tempo e que você fique bem à vontade para propor a nomeação de alguém..., aliás, têm as policiais que estão lá elas podem ir tocando...”.

Dirceu ouviu atentamente o que eu tinha para dizer e perguntou como é que estavam as duas policiais da “Assistência Jurídica” . Interrompi para dizer que tinha dois assuntos para tratar com ele e que esse era o segundo. Retomei a conversa para concluir o primeiro:

- “Bom, então eu tenho um pedido para te fazer, isso se for possível, caso seja mesmo a tua intenção na minha nomeação, como penso que ocorreu com o Braga lá embaixo, gostaria que meu ato saísse com data retroativa ao mês de março porque tu sabes que eu já estou desde o início aí contigo, atuando na função de ‘Assistente Jurídico’”...

Dirceu interrompeu para dizer:

- “Isso eu não posso te prometer”.

Argumentei:

- “Bom, se fores por esse caminho, vê o que tu podes fazer...".

Dirceu ouviu atentamente e não se comprometeu com nada, estávamos em junho e eu finalizei esse primeiro assunto fazendo mais um pedido:

- “Bom, eu peço uma certa brevidade para você decidir isso”.

Estava me referindo ao possível afastamento ou o ato de nomeação. Na verdade, como estava construindo acreditei que o Chefe de Polícia iria liberar minhas férias por quatro, cinco ou até seis meses, enquanto isso Wilmar Domingues poderia ser designado... Na sequência entrei no segundo assunto que era sobre a Escrevente Suzana Half (esposa do Delegado Half) que havia começado a trabalhar na ‘Assistência Jurídica’ no dia anterior.  A Investigadora Krysthian que trabalha comigo já havia me advertido que no quarto andar havia um falatório da mulherada dizendo que “Suzana” por ser esposa de Delegado só trabalharia quatro horas e ganhava quarenta horas extras. Aquilo ficou no meu consciente porque Krysthian, querendo me proteger, havia perguntado: ‘doutor Felipe o senhor vai permitir uma coisa dessas? Vai ficar mal para o senhor, todo mundo vai falar mal do senhor...’. Aquelas palavras de Krysthian estavam na minha cabeça e eu tinha que fazer alguma coisa. Perguntei para Dirceu:

- “Tu tinhas conhecimento que ela estuda de manhã?”

Dirceu assumiu uma nova face. Ficou sério, assumiu ares de preocupação e um quê de autoritarismo e foi dizendo:

- “Felipe, cobra dela o horário. Eu não quero nem saber. Se ela não quiser, pode ter certeza que nós mandamos ela de volta”.

Percebi imediatamente que Dirceu já havia sido ‘envenenado’ por alguma policial do quarto andar que tem acesso e liberdade para conferenciar.  Diante daquelas circunstâncias, depois de ouvir atentamente suas palavras achei que já era hora de partir, mesmo porque o Delegado Peixoto já havia anunciado que o Delegado Lourival estava aguardando para conversar. Era incrível como Peixoto fazia o trabalho político, atendendo bem determinadas pessoas, com uma educação esmerada, digna de um embaixador. Comigo a coisa era diferente porque sempre procurei não dar espaços e me oferecer, mas tinha que reconhecer que Peixoto tinha um talento nato para servir principalmente pessoas que em determinadas circunstâncias estão em alta. Resolvi bater em retirada porque Lourival já estava aguardando há alguns minutos e na saída me desculpei dizendo:

- “Doutor Lourival me desculpa fazê-lo esperar”.

Lourival rebateu com certo nervosismo, mas em tom de brincadeira:

- “Não tem desculpa nenhuma!”.