PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 25.05.2003:

E ninguém resistiria a um “Sistema Único de Segurança Pública”, a começar pela nova “cúpula”  que mais parece no mundo da lua. Lembrei do nosso “Grupo” de Delegados Especiais”, que tristeza, parece que foi criado com outras intenções, poderia até se dizer que era para se constituir uma inovação, um fato novo, fonte de “projetinhos”, uma forma de arrefecer quaisquer resistências por parte de Delegados Especiais?

“Segurança - Confirmado para segunda-feira, às 10 horas, no Palácio Santa Catarina, a assinatura dos convênios para a instalação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp) no Estado, com a presença do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Santa Catarina é o sexto Estado a aderir à iniciativa, ao lado do Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Minas Gerais, Alagoas e Rio de Janeiro”  (A Notícia, Moacir Pereira, 25.5.2003). 

“Atos - O senador Leonel Pavan marca presença hoje pela manhã, em Florianópolis, no 1º Encontro Parlamentar do Mercosul. Na seqüência, comparece à cerimônia de assinatura do protocolo de intenções para adesão de Santa Catarina ao Sistema Único de Segurança Pública. O tucano comparece para prestigiar o governador Eduardo Moreira e não propriamente o ministro Márcio Thomaz Bastos, do PT”  (A Notícia, Cláudio Prisco, 26.5.2003).  Deu para lembrar aquela passagem de Rui Barbosa: 

Lembrando Rui Barbosa: "De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantar-se o poder nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto." 

Data: 26.05.2003, horário: 09:30 horas

Resolvi descer para tomar o quase cafezinho tradicional das nove no bar do Ney no “Conjunto Comercial Ceisa Center”. Logo que me aproximei da Portaria da Chefia de Polícia avistei os Delegados Henrique Costa e Braga conversando na entrada do prédio. Observei que Henrique – que estava alegre - trajava terno preto que contrastava com sua camisa social laranja. Braga, diferentemente de outras vezes, também usava traje social, incluindo gravata, com o paletó nas mãos (pensei: “Braga certamente não gosta de usar paletó!).

Bem próximo, tentei desviar dos dois passando por trás, parecia impossível aquela manobra  sem que despertasse a atenção dos dois Delegados. E os dois imediatamente se posicionaram na minha frente, quase que obstruindo minha passagem e tive que me demorar para uma conversa fraternal,  o que não deixava de ser prazeroso.

Fiquei curioso de vê-los naqueles trajes e logo intui que alguma coisa importante estava para acontecer. O jeito era me demorar um pouco mais para saber das novidades. Tanto Henrique como Braga ostentavam ares de “estadistas”, aqueles trajes de “empacotamento” parece que afetava seus cérebros, mudava seus comportamentos.... Enquanto isso, eu acabava contrastando  com eles em razão da minha simplicidade. Enquanto Braga atendia uma chamada telefônica Henrique me perguntava:

- “Felipe, nós não temos uma forma de mudar o Estatuto da Polícia Civil?  Os policiais lá no oeste realizaram um trabalho muito bom, eu queria elogiar eles, como é que eu faço? Não tem uma forma de nós mudarmos isso? O pessoal fez um belo trabalho e nós tínhamos por obrigação elogiar eles”.

Interrompi Henrique:

- “Isso é possível. Está na lei complementar noventa e oito de noventa e três, dá uma olhadinha. Acho que é o artigo dezesseis que trata disso. É possível, só que tem que passar pelo Conselho Superior”.

Justamente nesse momento Braga encerra a ligação e passa a ouvir o que estávamos conversando, e reitera:

- “É, Henrique, isso tem que passar pelo Conselho Superior da Polícia Civil”. 

Lembrei que o Conselho nem havia ainda sido instalado. Aliás, no período “Lipinskiano” o Conselho praticamente foi ignorado. Depois, Dirceu Silveira assumiu e criou o “grupo especial”, dando a impressão que a meta era esvaziar o Conselho Superior... E,  querendo matar minha curiosidade ao vê-los naqueles trajes perguntei:

- “Sim, tem alguma solenidade hoje?”

Henrique respondeu:

- “O Ministro da Justiça vai estar aí hoje de manhã para assinar o sistema único de segurança!”

Parece que acabei entendendo a preocupação do Chefe de Polícia de colocar o “grupo especial”, na condição de “tropa de choque” para prestar “assessoramento” especial, no presente caso, para tratar desse assunto. A bem da verdade a impressão era que Dirceu Silveira queria mesmo queria era dividir responsabilidades, prevenir quaisquer imprevistos futuros que pudessem gerar desgastes. Lamentei o fato de estar sendo usado e entendi o interesse do Chefe de Polícia querer a minha nomeação para o cargo de “Assistente Jurídico” e fiquei em paz de ter rejeitado essa sua proposta, diferentemente de Braga, e agora estava ele ali tendo que prestigiar esse acontecimento. Lembrei, também, a discussão que tive com Dirceu Silveira na semana passada no “Grupo Especial”... e percebi pelo seu comportamento que ele não apreciou a minha sinceridade, o fato de ter sido contrariado sobre algo que já deveria estar decidido e acabado.

Soube que os Delegados Henrique (Diretor de Polícia do Interior) e Lauro Cézar Radka Braga, como membros do “stablishment” da Chefia de Polícia estavam indo para o Palácio do Governo para prestigiar um protocolo de intenções que ninguém discutiu previamente no “Grupo Especial”, ninguém teve participação... e nós parecíamos uns “fantoches” nas mãos do Chefe de Polícia? Acabei lembrando do Delegado Mauro Dutra que segundo Braga era doente por um cargo comissionado, não importando a que preço, será que iria se juntar ao trio esperança? 

Nesse momento o Delegado Tim apareceu do nada, estava também de terno e gravata, apertou minha mão com solicitude e firmeza.  Respondi da mesma forma, Tim Omar sempre foi uma  figura simples, aberta e carismática, também possuía história na instituição, posicionando-se em momentos importantes da vida institucional do outro lado da trincheira, tendo uma visão crítica das coisas, muito embora não tivesse vocação para se expor abertamente num estilo “jacobino”.

A seguir, deixei o local me desculpando e fazendo uma provocação:

- “Eu já estava subindo para a nossa reunião do ‘grupo’!”

Tim respondeu:

- “Não. O Wilmar conversou comigo e disse que era importante que eu fosse a assinatura do ‘Sistema Único de Segurança’ lá no Palácio. Eu vou. Então falei que a reunião hoje está cancelada”. 

Eu não pude conter meu lado à “Voltaire” que nos últimos anos parecia estar mais arrefecido:

- “Ainda bem que vocês vão estar lá. Assim pelo menos vão se posicionar contra esse ‘sistema único de saúde’. Ainda bem!”.

Tim me olhou quase que ignorando minhas palavras e eu completei:

- “Bom, desculpem, mas isso mais parece ‘Sistema Único de Saúde’. Temos que defender a integração, mas ‘sistema único’ mais parece isso mesmo”.

Nem cheguei a completar porque Henrique que conversava paralelamente com Braga olhou na  minha direção, dando a impressão de que estava por fora da nossa conversa, e fez a seguinte afirmação:

- “Mas como o Felipe tá bem, olha só. Como é que pode. O doutor Tim também, olha como ele também está bem!”

Como pude observar nos últimos poucos contatos com Henrique, depois do falecimento de sua esposa ele passou a nutrir certa preocupação com a fisionomia. Disfarcei, procurando fazer de conta que não tinha ouvido nada, mas Tim ouviu e pareceu que ficou  atingido. Braga do outro lado arrematou:

- “O doutor Tim está com sessenta e...”.

Tim deu um corte:

- “Cinquenta e três. O doutor Felipe está com quarenta...”.

Antes de me despedir, completei:

- “Quarenta e dois...”.

(...)”.