PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 13.05.2003, horário: 09:10 horas:

Resolvi ir até o “auditório” da “Delegacia-Geral” onde o nosso “grupo” especial estava reunido para entregar a última redação do “projeto” de criação da “Procuradoria-Geral de Polícia”. Logo que entrei pude reparar que o “grupo” estava completo com a presença, inclusive, do Delegado Mauro Dutra, além dos demais membros. Logo que me juntei ao pessoal fui até o ouvido de Tim Omar e disse:

- “Estou te repassando o ‘projeto’ com as alterações que acertamos ontem. Eu não vou participar da reunião. Vou trabalhar na exposição de motivos, mas qualquer coisa estou ali do lado” (Assistência Jurídica).  Tim imediatamente concordou e sob os olhos atentos principalmente de Valdir Batista fui saindo à francesa. Pude ouvir Valdir ainda comentar:

- “Qualquer entrevero nós chamamos o homem ali do lado”.

Quando já estava fechando a porta Braga quase que gritou em tom de brincadeira:

- “O Felipe não vai participar da reunião?”

Sem me deter retornei para a “Assistência Jurídica”.

Horário: 11:00 horas:

O Delegado Tim Omar foi atrás de mim e disse:

- “Poderias ir até ali com o pessoal (auditório). O Mauro não está entendendo uma coisa e nem o pessoal está sabendo explicar”.

Imediatamente me levantei e acompanhei Tim Omar até o “auditório”. Mauro Dutra estava querendo entender algumas coisas, como por exemplo: a) O cargo de Procurador-Geral seria escolhido por meio de lista tríplice votada pelo Conselho Superior da Polícia Civil. Como o Procurador-Geral preside o colégio e pode ser reconduzido uma vez ao cargo então ele é que presidiria a própria reeleição. Mauro propôs que todos os Delegados votassem na escolha do Procurador-Geral como ocorria no Ministério Público. Braga, Valquir e Wilmar estavam concordando com esse raciocínio. Expliquei primeiramente que o colégio escolheria lista tríplice e que competiria ao Chefe do Poder Executivo escolher dentre três o nome do novo Procurador-Geral, podendo haver opção pela reeleição... Além do mais, argumentei que no Ministério Público já existia uma consciência de classe formada, sendo o pessoal mais politizado. Os Delegados teriam que passar por um primeiro estágio e quando naturalmente houvesse um reclamo geral aí sim poderíamos cogitar de abrir as eleições como ocorreu no Ministério Público, cuja eleição num primeiro momento foi  restrita aos Procuradores de Justiça. Ilustrei, afirmando que no Ministério Público os promotores ao formar a lista tríplice sempre levavam em conta o perfil ideológico dos três mais votados, objetivando propiciar ao Chefe do Executivo maior afinidade com o escolhido e com a instituição... b) Mauro também não concordava que um Delegado para ser promovido tivesse que ficar três anos numa mesma graduação. Foi explicado que o objetivo era fazer com que os Delegados estivessem lotados em comarcas compatíveis com sua graduação, evitando-se distorções...; c) Mauro também não estava entendendo porque iria se transpor dez cargos de Delegado Especial para a Entrância Especial... Argumentei que o projeto não poderia aumentar despesas e seria estratégico que nós apresentássemos uma proposta de diminuição dos cargos de Procurador a fim de evitar inicialmente quaisquer possibilidades de resistências à proposta, em especial, por parte não só do governo, mas de outras categorias “isonomizadas”...  Além disso, argumentei que mais a seguir a instituição teria que ter efetivo e quadro lotacional...  e poderia se cogitar de aumentar o número de Procuradores para trinta novamente. Valdir Batista ainda tentou passar aquela emenda dele que previa transpor trinta cargos de Delegado de Quarta entrância, sem mitigação do atual número de cargos de Delegados Especiais. Wilmar Domingues do outro lado da mesa propôs se incluir no projeto o fim das promoções por merecimento... Argumentei que não concordava e que a promoção por merecimento era muito salutar para a instituição, que em nenhum outro órgão se convivia somente com promoções pelo critério de antiguidade, mas que poderíamos fazer uma consulta aos policiais... Wilmar disse que o ideal era só ter promoção por antiguidade para se por fim as politicagens nas promoções, em especial, em razão de elogios concedidos para amigos da direção e etc. Argumentei que isso era difícil se extirpar porque fazia parte do jogo democrático institucional, ou seja, mudam os governos e mudam as administrações, mas que uma consulta aos policiais poderia por fim às nossas dúvidas, ainda mais com a experiência decorrente da aplicação da lei especial de promoções (LC 98 de 1993)... Procurei não aprofundar e argumentei que o jeito é se criar freios, contrapesos... Valquir do meu lado pegou carona com o termo e reverberou dizendo:

- “É isso aí, tem que se criar freios...”.

Alguém apoiou Valquir que disse:

- “A ideia não foi minha. Foi o Felipe que disse...”.

Nesse momento relembrei do Chefe de Polícia e fiquei feliz com o que o “grupo” estava fazendo... Pela primeira vez na história da instituição estava vendo um pessoal discutindo, planejando... Mais importante era se respirar liberdade e Dirceu Silveira estava propiciando essa nova atmosfera na instituição, apesar de que o Delegado Braga estivesse revoltado, cheio de amargores...  Fiquei feliz, também, muito embora pudesse prever que nosso “projeto” não iria dar em nada. O encontro do pessoal operava como um milagre. Pela primeira vez poderia sentir que havia esperança para todos nós...?

Data: 15.05.2003, horário: 10:00 horas:

O legado da gestão do “triunvirato” continua a repercutir todos os dias nos jornais, não só pelas notas de um único “concurso”:

“Cidades pacatas convivem com crime - Ladrões migram para centros menores e levam insegurança e medo aos moradores - Jaraguá do Sul - O aumento da criminalidade, aliado à falta de policiais e a quase nenhuma infraestrutura nas pequenas delegacias tem transformado o dia-a-dia de municípios que até a década de 90 acompanhavam a violência apenas pelos noticiários da tevê ou nos jornais. O cotidiano de pacatas localidades colonizadas por alemães e italianos das regiões Norte e Vale do Itajaí de Santa Catarina, que dispõem de algum poder econômico, deu lugar a crimes típicos dos grandes centros urbanos, como assaltos a mão armada, sequestros relâmpago, assassinatos e estupros. É a chamada migração criminosa. Quadrilhas inteiras se deslocam das maiores cidades, em decorrência do forte cerco policial empregado nestas regiões, em busca de dinheiro, joias ou simplesmente para espalhar terror nas pequenas comunidades, que muitas vezes contam somente com um policial civil, responsável por todo o trabalho da delegacia (...)”  (A Notícia, 15.5.2003).