PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data:  30.01.2003, Horário: 14:35 horas:

Braga apareceu na “Assistência Jurídica” e acabei passando um café. Reiterei se ele sabia que um Investigador estava sendo cotado para o seu lugar e comentou que era indicação da Delegada Lúcia Stefanovich. Relatou que o Delegado-Geral Dirceu Silveira e o Chefe de Gabinete José Antonio Peixoto tinham sido acionados,  teriam uma reunião com o Secretário de Segurança João Henrique Blasi para decidir. Porém, até aquele momento não saberia dizer o que havia sido tratado. Comentou, ainda, que queria ficar no mesmo lugar, na mesma condição e sem cargo comissionado. Na minha frente Braga telefonou para Mário Martins:

- “Alô Mário. É o Braga. Tudo bem? Alguma novidade? O pessoal está berrando. Os Delegados só estão falando nisso. Está todo mundo reclamando dessa reforma. Ontem nós nos reunimos, eu, o o Valquir, o Mauro, o Felipe, todo mundo e o pessoal está revoltado. Mário o que o Thomé ta querendo? Ele quer ser candidato a presidência da Adpesc? Ele já não aprontou tanto nessa reforma? Olha só o que ele está fazendo com a Polícia Civil?”

Não saberia dizer qual teria sido os comentários de Mário Martins do outro lado da linha e a ligação do celular havia caído. Braga não retornou a ligar e me perguntou:

- “Tu sabes quem é que eles querem fazer presidente da Adpesc?”

Respondi que era o Maurício. Braga perguntou novamente:

- “Tá, mas qual Maurício?”

Respondi que só poderia ser o Noronha. Braga disse:

- “Eu também pensava. Não é o Noronha. É o Eskudlark. Eles querem fazer o Maurício Eskudlark presidente da Adpesc. Eu estava conversando com o Mauro e ele disse que pelo menos o Maurício Eskudlark tem um projeto político e vai ter que mostrar serviço. Mas tem o Lauro André. Tem o Thomé... Eu conversei com o Mário e disse para ele onde é que já se viu ainda o Thomé querer ser presidente da Adpesc depois de tudo o que ele está fazendo com a Polícia Civil nessa reforma!”

Braga viu sob a minha mesa um processo do Delegado Célio Nogueira Pinheiro para manifestação acerca da sua licença-prêmio que foi indeferida por Lipinski. Célio estava com problemas de saúde, porém optou em pedir licença-prêmio. Braga conhecia o caso e argumentou:

- “Olha só que injustiça. Eles negaram a licença-prêmio do Célio, mas na hora do Lipinski, Rachadel pegarem as licenças-prêmio dele... eles simplesmente desaparecerem. Onde é que eles andam agora? Eu sei que naquela  hora que foram baixar a portaria limitando o gozo de férias e licenças-prêmio durante o verão o Moacir Bernardino sugeriu para o Lipinski que deixasse de fora da portaria as licenças-prêmios. Como mudou o governo eles trataram de pegar as licenças-prêmio deles e desapareceram, só que negaram a do ‘Celinho’, pode uma coisa dessas?” 

Perguntei para Braga como era que ficou a situação do Delegado Ilson Silva e Braga respondeu que ele iria assumir a Delegacia Regional de Polícia de Palhoça. O que mais eu poderia esperar? Todos ávidos por cargos, todos com mil justificativas, explicações e acabei me sentindo um verdadeiro otário e argumentei:

- “Como é que esse pessoal que vai assumir as Delegacias Regionais vai aceitar isso, será que estão com suas consciências tranquilas? Olha Braga se me convidarem para algum cargo comissionado em não terei condições de aceitar em razão dessas sacanagens que estão fazendo, tu não achas? Tu aceitarias Braga?”

 Ele concordou que eu estava certo e que não poderia também aceitar, porém, lançou uma indagação:

- “Pergunta para o Mauro se ele não aceitaria? Ele é meu amigo, mas só quer cargo  comissionado, ele só pensa nisso, só está atrás de carguinho, Felipe”.

“O Gerente de Orientação e Controle da Polícia Civil”:

No meio da conversa o Delegado Hilton Vieira telefonou para mim. Foi quase uma hora no telefone e Braga acabou indo embora. Hilton queria a minha opinião no caso do Perito Celito Cordiole. Soube que Hilton havia sido nomeado Gerente de Orientações e Controle da Delegacia-Geral e foi repassado o processo disciplinar de Celito para ele revisar a decisão (a criação dessa gerência foi mais um nocaute na instituição já que acabaram com a Corregedoria-Geral, símbolo de supremacia de qualquer instituição jurídica como o Judiciário, Ministério Público, Procuradoria-Geral do Estado...). Acabamos entrando no mérito. Eu comecei a defender a minha tese de que o Celito deveria ser absolvido porque não agiu com dolo e apenas procurou contribuir para a busca da verdade real defendendo uma tese, mesmo que contratado pela defesa. Lembrei que os médicos legistas eram os que auferiam melhores salários e possuíam várias outras fontes de rendas e que depois da lei complementar cinquenta e cinco somente os Delegados era que tinham obrigação de “dedicação exclusiva”. Hilton deixou transparecer que estava com uma missão: “fazer reabrir o caso Celito”. Contestei veementemente e lembrei que o fato sempre cheirou conotação política, especialmente, em razão do caso “Miguel Orofino”. Hilton começou a fazer algumas revelações: “...o processo está aqui comigo. O ex-Secretário deu um despacho dizendo-se impedido de decidir em razão da amizade que tinha com Celito. Mandou para o adjunto. O Dotta decidiu pelo arquivamento. Ele fez umas sete,  oito laudas e decidiu pelo arquivamento. Felipe tu não achas que isso tinha que ir para a Procuradoria-Geral? Será que o Secretário tinha como se declarar impedido?” Acabei conversando bastante tempo com Hilton sobre esse processo, sendo que ele com uma tese, ou seja, pela reabertura do caso e remessa para Procuradoria-Geral do Estado e eu defendendo a absolvição de Celito e o arquivamento, mas tudo em bom nível em razão de nossa amizade muito antiga. Lembrei de perguntar:

- “Dá uma olhadinha aí para ver se não tem uma informação minha nesses autos. Esse processo passou por mim”.

Hilton estava com o processo nas mãos e começou a procurar a minha informação. Como não achava pediu alguns minutos para pesquisar e que depois daria um retorno. Concordei e já lancei uma indagação:

- “Só falta me dizer que Lipinski aprontou mais uma daquelas suas, como não interessava o meu parecer, não juntou nos autos e foi para sua pasta de arquivo “secreto? Olha Hilton se ele fez isso... Veja bem a minha informação é uma peça dos autos, não do Lipinski. Se ele não juntou essa peça ele cometeu uma falta grave, poderá até ser responsabilizado. Teve outro caso envolvendo o Ilson Silva, nosso Delegado. Foi naquele caso da ‘metralhadora’. O Lipinski pegou a minha informação e não juntou no processo. Descobri isso por acaso. Alguém esteve no gabinete dele, eu não posso dizer o nome, e pegou a pasta de arquivo particular dele e para surpresa lá estava a informação do caso do Ilson. Então o parece que essa era uma prática do Lipinski. Quando interessava ele juntava a informação, quando não interessava ele arquivava na pasta dele, pode uma coisa dessas?”

Hilton parecendo meio perdido e folheando o processo do outro lado pediu mais um tempo, sendo que em seguida me daria um retorno. Falamos sobre aposentadoria dos policiais e ele pediu que eu desse uma estudado no caso. Também lembrou que nós Delegados Especiais deveríamos nos reunir para conversar, tomar uma posição  e que havia um grupo de Delegados que se reunia para jogar dominó...  Perguntei para ele se o Valquir fazia parte desse grupo e Hilton confirmou que sim. Acabei lembrando daquele nosso “grupo”, de Garcez e Sena... que ficaram de criar um “jornal do grupo” e que nunca saiu do papel,, apesar de terem estufado seus peitos que dariam conta do recado... Pensei: “quanta coisa poderíamos ter feito, quanto resistência, quando formação de opinião...”. Acabei lembrando a expectativa de Garcez que acreditava piamente que um dia haveria uma reforma da segurança pública, das polícias... originada no seio da sociedade, de fora para dentro, enquanto isso o jeito é esperar pelo tal milagre em casa, talvez lendo sobre filosofia, o sobre receitas de biscoitos da vovó...

Permaneci em alerta, aguardando ansiosamente o retorno de Hilton e passados mais uns trinta minutos ele retornou a ligação, dizendo:

- “Olha Felipe surrupiaram mesmo o teu parecer no processo, bem provavelmente aí em cima...”. Não entendi bem e perguntei:

- “O que Hilton?”

Ele continuou:

- “Eu já olhei tudo e o teu parecer não foi juntado no processo do Celito”.

Fiquei indignado e desabafei:

- “É mais uma do Lipinski, é muita cara de pau!”.

Hilton argumentou:

- “É bem aquilo, quando interessava ele juntava, quando não interessava ele simplesmente tirava fora”.

Fiquei pasmo e disse:

- “É, mais ele não poderia fazer isso. Bom eu não vou fazer nada, a nossa classe já está tão fragmentada, tão desunida. Eu já disse para o Ilson Silva que se ele quisesse fazer alguma coisa tudo bem...”.

Hilton argumentou:

- “Eu não sei Felipe, mas esse negócio de companheiro, amigo... isso não existe!”

Repliquei dizendo que não era questão de amizade e sim de corporação. Acabamos nisso. Depois fiquei lembrando a conversa que Lipinski veio ter comigo na “Assistência Jurídica”, isso à época em que estava estudando o “Caso Celito” e fiquei pensando: “o que será que Lipinski queria me dizer ou me pedir? Para sua surpresa, quando me procurou, a Informação já estava pronta e Lipinski veio me pedir que eu meditasse muito bem sobre aquele caso e eu respondi que não precisava se preocupar porque já estava pronta e juntada no processo que estava encaminhando para ele... e por de Hilton Vieira fui descobrir bem mais tarde que Lipinski não juntou minha Informação nos autos, por quê, heim?” pensei. 

Depois de encerrada a nossa conversa fiquei pensando como era possível que Hilton Vieira tivesse aceito um “carguinho” no novo governo do PMDB, considerando que era um policial bastante experiente e antigo, sabia que por meio da “reforma” um dos retrocessos impostos foi o fim da Corregedoria-Geral da Polícia Civil e que isso teria sido uma forma de apequenar e desprestigiar a instituição, violentar a sua história... E, pensei: “Muito provavelmente quando se aposentar não vai olhar para trás, talvez, irá pegar sua lancha para pescar e à colocará sua cabeça no travesseiro e dormirá tranquilamente acreditando que cumpriu o seu dever? Sim, ele poderá até fazer isso, mas desde que a instituição esteja no rumo certo, porque do contrário...