PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 10.01.2003, horário: 16:30 horas:

A Escrevente Adriana me telefonou pedindo que subisse urgente porque o doutor Peixoto precisava conversar comigo. Terminei um serviço que estava fazendo e subi para saber do que se tratava. Logo que cheguei no quarto andar levei um susto. O local havia sido repaginado. Logo na saída do elevador pude notar as reformas que fizeram naquele local com obras de arte em várias paredes. Os tons na cor laranja chamavam atenção e na antessala do Delegado-Geral as paredes foram substituídas por vidros translúcidos por todos os lados, de maneira que se tinha uma visão de cento e oitenta graus. Adriana me recepcionou com muita simpatia e um sorriso de boas vindas, em seguida me convidou para sentar porque Peixoto estava trancado no gabinete de Dirceu Silveira.

Enquanto isso a Comissária Cleuza me cumprimentava de maneira discreta:

- “Tudo bem doutor?” 

Como estava surpreso com as mudanças no local a própria Adriana fez os esclarecimentos:

- “O senhor não tinha vindo aqui em cima ainda? O doutor Lipinski é que fez essas reformas aqui e criou esse espaço cultural, ficou bonito, né?” 

Concordei, estava mais humanizado, civilizado e bonito. Cleuza veio conversar comigo novamente e perguntei onde era que andava o doutor  Lipinski. Ela respondeu:

-  “Essa hora ele está longe. Ele e a mulher foram fazer um ‘tour’ até o Pará. Foram de caminhonete pelo litoral”.

Perguntei:

- “Então ele entrou de férias?”

Cleuza respondeu imediatamente:

- “Ele vai ficar uns vinte, trinta dias só viajando”.

Fiquei pensando por que naquele ano as férias dos policiais não foram suspensas durante o verão? Lipinski sempre foi muito rigoroso quanto ao gozo de férias dos policiais, e com a mudança de governo aproveitou para se afastar... Fiquei pensando se  caso o Governador Amin tivesse sido reeleito e se ele tivesse sido convidado para algum cargo, será que sairia de férias no mês de janeiro? Será que deixaria os policiais gozarem suas férias durante os meses de alta temporada?  Certamente que não, e era bem provável que ele tivesse boas justificativas para essa decisão: férias acumuladas, muito trabalho, muito ‘estresse’, muita luta em defesa da instituição, muitas conquistas para os policiais a começar pelos salários que foram reajustados no mínimo com base na inflação do período... e etc.? Em seguida Peixoto saiu do Gabinete de Dirceu e foi para sua sala ao lado totalmente visível, cujo espaço era totalmente visível... Adriana avisou que eu poderia entrar. Até então não sabia do que se tratava, mas estava tranquilo aguardando as novidades. Sentei na frente de Peixoto e ele começou a esclarecer do que se tratava:

- “Doutor nós precisamos de um parecer seu, precisamos nomear o pessoal da última Academia. Não podemos nomear o pessoal que conseguiu liminar, mas queremos nomear os que foram aprovados, o que o senhor acha? Amanhã o doutor Dirceu vai despachar com o Secretário e já quer levar os nomes do pessoal para ser nomeado”. 

Peixoto me mostrou uma listagem com os nomes dos candidatos aprovados e em condições de nomeação.  A Comissária Cleuza veio ajudar e sentou no computador tentando acessar alguns documentos. Durante esses instantes olhei para Peixoto e fiquei me fazendo várias perguntas: “O que faz um homem perseguir tanto o poder? Como é que conseguiu deixar a Chefia de Gabinete do ex-Secretário Chinato e agora estava ali comandando o Gabinete do Delegado-Geral? Que ligações, favores, compromissos, amizades... deve ter feito para assegurar essa sobrevida, garantindo passagem blindada por diversos governos?”  Continuei olhando para Peixoto e me veio a lembrança um outro “Peixoto”  que estava há alguns anos na Delegacia Regional de Itajaí, ele era bem mais novo, conservado. Esse “Peixoto” que se apresentava aparentava estar visivelmente inchado, envelhecido e meditei que realmente o poder não valia a pena (acabei lembrando da minha conversa com a Psicóloga Kátia...).  Deixei esses pensamentos de lado para externar minha opinião de que a nomeação dos candidatos fora da ordem de classificação asseguraria aos melhores classificados o direito de pleitear na Justiça a nomeação. Peixoto concordou e insistiu que eles teriam que levar para a reunião do dia seguinte um “parecer”, enfim, alguma coisa para pleitear a nomeação do pessoal para suprir um mínimo de carência de policiais.  Propus, então, que fosse apresentada uma exposição de motivos sem que se entrasse na questão jurídica porque fatalmente os prejudicados procurariam  assegurar via judicial suas nomeações. Conclui dizendo que aquele concurso já havia causado muitos desgastes à instituição e que era preciso pensar bem no que estava se fazendo. Peixoto estava convicto de que o caminho era nomear o pessoal e se os demais tiverem assegurado o direito de nomeação via judicial que se cumprisse.  Eu lembrei que futuramente esses mesmos policiais poderiam perder a ação no mérito e iriam acabar tendo que ser exonerados.  Peixoto com inteligência fez um questionamento:

- “Mas se nós formos aguardar a decisão de mérito nem poderemos mais nomear ninguém, nem fazer concurso, não é?”

Concordei.

Horário: 18:00 horas:

A Comissária Cleuza esteve na “Assistência Jurídica” a fim de apanhar documentos do concurso para levar para cima. Entreguei para ela uma informação que havia providenciado acerca do direitos dos candidatos prejudicados e que teriam assegurado o direito de nomeação caso não fosse cumprida a ordem de classificação.  Pedi que fosse feito uma recomendação oral para Peixoto. Nisso a policial Cleuza lembrou o caso envolvendo dois Delegados que haviam sido reprovados num concurso de psicotécnico e que tiveram assegurado o direito de nomeação (liminar), no entanto, passado alguns anos, perderam no mérito e que estariam na eminência de perderem seus cargos após anos na Justiça.

Data: 13.01.2003, horário: 12:00 horas:

A exposição de motivos que Peixoto havia me solicitado já estava pronta e a expectativa era grande.  A Inspetora Myriam que estava excepcionalmente comigo naquele dia foi levá-la no quarto andar. 

Enquanto Lipinski se preocupou com o “espaço cultural” (nada contra...) da Delegacia-Geral,  em deixar a “mulherada” do prédio de boca aberta com as gravuras e reformas, a PM estava com três helicópteros marcando outro tipo destaque:

HELICÓPTEROS - Esquema de segurança da PM será ampliado na região de Criciúma, que terá agora cobertura do helicóptero Águia 3. O Águia 1 continuará na Capital e o 2 em Joinville”  (A Notícia, Moacir Pereira, 13.1.2003).  Depois fiquei sabendo que o “espaço cultural”  foi objeto de notícia na imprensa...  Certamente que o “espaço cultural”  não envolveu resistências, lutas, embates..., bem diferente de outras peleias... 

E o legado do “triunvirato”  continua rendendo:

Delegado - Deverá ser definido hoje o nome do novo delegado Regional de Polícia de Joinville, caso que se desdobra há duas semanas numa guerra de bastidores da segurança pública da maior cidade do Estado em número de habitantes. Zulmar Valverde, Marco Aurélio Marcucci e agora o delegado Fabrício, que acaba de entrar na parada, engrossam a disputa para suceder Marilisa Boehm”  (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 13.1.2003). 

Enquanto Lipinski foi para o nordeste com a família o Delegado Mário Martins, Presidente da Adpesc (que brindava a vinda do novo governo e dava boas vindas à nova cúpula...) deveria estar achando tudo muito normal, resultando da prática de um processo democrático.  O triunvirato (que já nem existe mais) era bem provável que dissesse que não tinha nada haver com isto e que sempre foi assim:

“Novos nomes - Agora, mais dois nomes apareceram na disputa pela Delegacia Regional de Polícia de Joinville: Fabrício Dias e Wilson Masson”  (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 14.1.2003).