PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 04.12.2002 - horário: 10:30 horas:

O Delegado Optemar Rodrigues girou de inopino a maçaneta da  porta da “Assistência Jurídica” e com aquele estilo engraçado permaneceu estático junto a porta de entrada com seu sorriso da gente típica da Ilha dos Açores, sem esconder sua face de garoto peralta. Optemar era um típico “manezinho” - que não era de Floripa, mas de Itajaí. Baixinho, magro, cabelos pretos, pele queimada do sol, fala engraçada, com frases soltas e cantadas,  meio que de improviso, risonho, usando gravata sem paletó, passos apressados, ansioso por saber das novidades e parecendo curioso. Fiquei em dúvida porque não sabia o que ele realmente queria. “Jô Guedes” – que estava de passagem, já que havia solicitado para “ficar comigo” durante às manhãs”, pois pretendia fazer alguns trabalhos de aula (cursava a Escola Superior da Magistratura) e, acreditei que também para matar um pouco da saudade. Optemar perguntou da porta:

- “Ô Felipe tu já começasses a escrever aquele teu livro sobre a passagem de governo, sobre o nosso momento?”

Fiquei intrigado com a pergunta e sem saber que rumo dar a conversa, ao mesmo tempo me perguntava como era que ele poderia saber que eu estava fazendo algum registro dos fatos.  Optemar insistiu:

- “Tu já começaste a anotar alguma coisa, acho que eu vi tu fazeres isso lá nas reuniões do Conselho?” 

Brinquei com as palavras:

- “Ah, sim! Já comecei a anotar alguma coisa, mas bem devagarzinho. Bom, ainda não anotei quase nada, mas uma hora vou começar...”.

Optemar não perdeu o seu riso, foi entrando e falando ao mesmo tempo:

- “Porque eu estou curioso. Tem muita coisa para registrar. Quando estiver pronto eu posso dar uma olhada”.

“Jô Guedes” percebendo que Optemar queria ficar mais à vontade deixou o computador do canto (sua antiga mesa de trabalho) e foi saindo da sala com discrição.   Resolvi perguntar:

- “Por quê? Tens alguma coisa importante para me contar? Eu estou precisando de informações prá ver se tenho ânimo prá começar a escrever”.

Optemar argumentou que não tinha nada, mas que estava curioso para saber o que andei anotando e começou a fazer algumas importantes revelações:

- “O Wanderley Redondo me contou que teve que fazer alguns churrascos na casa dele para apaziguar o Rachadel e o Lipinski. O Rachadel não aceita ordens do Lipinski porque ele é Especial e o Lipinski é Delegado de Quarta Entrância. Tu precisas ver, o Rachadel não aceita ordens do Lipinski. Bom, assim o Wanderley Redondo me contou. Eu viajei com ele algumas vezes pelo interior e ele me contava tudo”.

Fiquei intrigado e interrompi para perguntar:

- “O quê? Mas o Lipinski e o Rachadel não super amigos?”

Optemar continuou:

- “Não. Que super amigos o quê! Ali cada um quer o poder, ali não tem amigos. Tu registrasses o acordo entre os três? O acordo entre Lipinski, Rachadel e o Redondo? Se um caísse os três cairiam juntos? Ah, o Redondo me confessou esse acordo!”

Confirmei que tinha conhecimento desse acordo. Lamentei a situação futura da Polícia Civil, a luta dos grupos por cargos... Lembrei erros da gestão “Lipinskiana” à frente da Polícia Civil e citei um caso que estava estudando para dar parecer.  Sem citar nomes lembrei que Rachadel deu um despacho numa sindicância malhando um Delegado, chamando o mesmo de desleixado, displicente, incompetente..., só que durante a instrução o Promotor de Justiça foi ouvido e disse que aquele mesmo Delegado foi um dos melhores que já passou pela sua comarca e que ele estava fazendo um excelente trabalho, então   argumentei:

- “Tu vê Optemar,  como fica difícil para a instituição conviver com uma Corregedoria que age assim?”

Optemar fez seu comentário:

- “Sim. Um Delegado fica falando mal do outro, fica sentando o pau no colega, aí não dá, né!”

Continuei:

- “Pois é, como vamos sobreviver assim? Tu não vê no Ministério Público um Promotor sentando o pau no outro colega abertamente,  tu não vê isso na magistratura, nem entre os Oficiais da Polícia Militar.  Agora tu imaginas, se um Promotor recebe um inquérito policial  e resolve não denunciar? Não acontece nada! Juízes dão suas sentenças do jeito que querem, deixam processos prescreverem e também não acontece nada, ninguém vai lá cobrar, a imprensa não se interessa, ninguém controla isso externamente. Nossos Delegados têm direito de se convencerem de que um determinado caso não é de flagrante, que não se trata de crime... Imagina um cidadão procurando o Delegado e reclamando que foi vítima de um furto impossível? Estou com o caso do Ivo Otto Kleine ali em cima da minha mesa e só porque o Promotor denunciou o Delegado na Corregedoria eles já ficaram loucos...  Não visses o jornal hoje? O STJ  excluiu o nome do Napoleão da listagem dos envolvidos no escândalo das letras, vê como eles se defendem... Resolvi fazer mais uma pergunta:

 

- “Sim Optemar, quem é que tu achas que vai ser o futuro Delegado-Geral?”

Optemar respondeu:

- “Olha, tem a Lúcia, tem o Thomé e tem o Neves. A Lúcia e o Thomé estão se comendo”.

Perguntei:

- “Como é que é? Mas a Lúcia e o Thomé não são superligados? Será que a Lúcia vai querer ser Delegada-Geral novamente? Quem já foi Papa não vai...”.

Optemar concluiu:

- “Sei. Não vai querer ser bispo. O Thomé é muito articulador. Ele articulou, fez um monte de esquema e agora tá aí”.

Argumentei que a força do Thomé estava com o Deputado Herneus de Nadal e que antes das eleições, segundo eu soube, houve um compromisso dele com o Deputado Herneus.  Perguntei sobre Maurício Eskudlark e Optemar fez outra importante revelação:

- “Quando o Rachadel era o DPL todas as movimentações de policiais civis eram centralizadas na DPL. Depois houve a mudança e o Rachadel foi para a Corregedoria-Geral. O Maurício assumiu a DPL e aí o Lipinski não aceitou que as remoções de policiais civis ficassem nas mãos do Maurício. O Lipinski fez de tudo para deixar o Maurício sem ação quando na época do Rachadel era ele que controlava tudo. Bom, o Maurício resolveu levar o assunto para a reunião do Conselho Superior de Segurança. Enquanto o Maurício discorria sobre o que estava acontecendo com ele o Lipinski se levantou e deu uma ‘porrada’ na mesa de reunião e disse: ‘Secretário e eu tenho que ouvir isso?’  Houve um silêncio e ninguém falou mais nada”.

Pelo relato de Optemar calculei que ele deveria ter participado dessa reunião e argumentei:

- “Isso é verdade? Olha, eu não sabia desses fatos”.

Optemar repetiu seu gesto anterior procurando imitar Lipinski e dando uma ‘porrada’ em cima de meus ‘Diários Oficiais’ que estavam em cima da minha mesa, repetindo literalmente toda a ação do Delegado-Geral Lipinski”:

- “E eu vou ter que ficar ouvindo isso, Secretário? Enquanto eu for Delegado-Geral eu não vou admitir que nenhum Diretor saía por aí usando do cargo para fazer política, eu não vou admitir Secretário!” 

Fiz meu comentário:

- “Olha, o Lipinski deu uma dentro. Agiu certo o Lipinski, imagina fazer politicagem, não achas?”

Optemar nada disse, nem comentou. Na sequência confessei para Optemar que alguns livros meus já estavam praticamente prontos e ele fez seu comentário final:

- “Eu tô curioso para ler, quando tu tiveres alguma coisa me avisa. Depois eu te conto mais algumas coisas, tem tantas, precisas ver, mas depois eu te conto!”

Fiz meu comentário final?

- “Só que este livro é para daqui a alguns anos, não é para agora!”

Depois que Optemar se foi  “Jô Guedes” retornou para a “Assistência Jurídica” e comentou:

- “Eu sabia. Tive que sair porque adviquei que o doutor Optemar lhe queria dizer algo em confidencial”.

Apesar daquela sua curiosidade nata não revelei o teor da conversa. “Jô Guedes” não eram mais da Polícia Civil, já era da Justiça Federal, muito embora permanecesse eternamente em nossos corações.  Argumentei:

- “É, e já registrei para o meu livro de ‘fofocas’, não é?” 

“Jô Guedes” deu uma risada escancarada, parece que era tudo o que queria ouvir e disse:

- “Sim. É isso mesmo: ‘livro de fofocas’. Tá vendo a sua fama como já vai longe?” 

Engoli em seco  e feliz que daqui mais uns dias estaria livre disso para nunca mais, com certeza! Estava aí uma coisa difícil de digerir: “não tem obsessão”, mas se for convidado para “ir para o sacrifício”, então certamente que irá...