OS PRINCÍPIOS BASILARES NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

 

Suziane Barreto de Castro¹

Evaneide Elias de França¹

Maria do Socorro Cruz Linhares²

 

 

Resumo

 

Este trabalho apresenta alguns princípios basilares que sustentam a aplicabilidade do Estatuto da Criança e do Adolescente, de forma a esclarecer a razão de cada artigo ali contido, sua funcionalidade, seus resultados caso sejam interpretados de maneira a garantir uma total amplitude de proteção à criança e ao adolescente.

Palavras-chave: Criança e adolescente. Princípios. Proteção

 

 

Introdução

 

O Estatuto da Criança e Adolescente é um instrumento de proteção a todos os menores, em especial aqueles que se encontram em situação de risco.

A Lei 8.069, traz objetivos nobres, onde princípios fundamentam cada direito, dever, protegendo destarte a efetiva aplicação, de maneira que garanta a criança e ao adolescente uma proteção integral.

O professor Miguel Reale (1991, p. 300) ensina “que princípios são certos enunciados lógicos admitidos como condição ou base de validade das demais asserções que compõem dado campo do saber”.

Desta forma o ECA, em consonância coma Constituição Federal de 1988, apresenta princípios fundamentais em relação à criança e ao adolescente servindo como base a Doutrina da Proteção Integral.

Segundo Guilherme Freire de Melo Barros (2010, p.15) a doutrina da proteção integral é fundamental, ou seja, a compreensão do caráter principiológico adotado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. A lei tem o objetivo de tutelar a criança e ao adolescente de forma ampla, não se limitando apenas tratar de medidas repressivas contra seus atos infracionais. Pelo contrário, o Estatuto dispõe sobre direitos dos jovens, formas de auxiliar sua família, tipificação crime praticados contra o jovem, infrações administrativas, tutela coletiva etc. Enfim, por proteção integral deve-se compreender um conjunto amplo de mecanismos jurídicos voltados à tutela da criança e do adolescente.

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Desenvolvimento

Vejamos inicialmente alguns desses Princípios, iniciando pelo Princípio da Prioridade Absoluta, fundamentado no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde diz que:

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais pública;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

O princípio da prioridade absoluta também tem previsão legal no artigo 227 da Constituição Federal de 88, quando determina que crianças e adolescentes sejam tratados pela sociedade; e em especial, pelo Poder Público, com total prioridade pelas políticas públicas e ações do governo.

Observe-se que os serviços públicos devem oferecer atendimento preferencial e prioritário destinado as crianças e aos adolescentes, evitando, assim, que seus interesses figurem como atendidos com a máxima urgência e efetividade. Sem deixar de mencionar que cabe ao poder público promover políticas sociais básicas, tais como saúde, educação, saneamento, políticas de assistência social, de proteção especial e por fim, às socioeducativas.

É primordial ressaltar que o orçamento público deve se adequar, dando prioridade, as necessidades específicas das crianças e dos adolescentes, sendo uma obrigação do administrador público destinar recursos necessários no sentido de garantir que os direitos da criança e do adolescente sejam plenamente efetivados.

Temos também em continuidade como princípio da Prioridade Absoluta o Princípio da Prevalência dos interesses, fundamentado no artigo 6º do ECA, onde diz que:

Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

O objetivo estabelecido no artigo 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente deverá ter sua interpretação de forma a assegurar a proteção e a integração do menor na comunidade.

O Princípio da Brevidade e Excepcionalidade, previsto no artigo 121 do ECA, menciona que a internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Necessário se faz transcrever o parágrafo 5º do mencionado artigo: “§ 5º - A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade”.

Com relação a internação vale ressaltar que é uma medida sócioeducativa, sendo, no entanto uma das mais gravosa, e isso para o adolescente, pois lhe cerceia amplamente a liberdade.

O princípio da brevidade impõe que o período de internação o qual o jovem será submetido seja o mais breve possível, onde deverá ser observado o prazo máximo de três anos. A brevidade no caso da medida sócioeducativa de internação deve ser por um período curto, ou seja, o estritamente necessário para que reflita sobre a gravidade de suas ações e comece a ressocializar-se. Quando for verificado o avanço em sua formação pessoal, melhoria de seu caráter, essa medida de internação deve ser substituída por outra menos gravosa.

O princípio da excepcionalidade, quando da aplicação da medida de internação deve ser interpretado com extrema cautela, isso em situações peculiares especificamente previstas em lei, ou seja, tal medida só será aplicada subsidiariamente, quando não houver cabimento para nenhuma outra medida socioeducativa. O caso concreto é que vai demonstrar a necessidade da aplicação da medida de internação.

A condição peculiar de pessoa em desenvolvimento guarda total relação com a doutrina de proteção integral, pois é necessário tutelar com a maior amplitude o adolescente, face a internação não ter caráter de punição, mas o objetivo da internação deve ser a ressocialização do adolescente, assim, o próprio Estatuto prevê no artigo 124, um rol de direitos garantido ao adolescente quando privado de sua liberdade, onde destaca-se o direito de receber escolarização e profissionalização, de realização de atividades culturais, esportivas e de lazer, de receber os documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade.

O Princípio da Sigilosidade, previsto no artigo 143 do ECA, aduz que é vedada a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional. E acrescente-se seu parágrafo único, quando descreve que qualquer notícia a respeito do fato não poderá identificar a criança ou adolescente, vedando-se fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco e residência.

O princípio da sigilosidade tem como objetivo garantir a privacidade dos registros referentes aos jovens infratores, somente pessoas autorizadas deverão ter acesso a tais documentos, evitando com isso, que o menor infrator venha sofrer preconceito e seja de alguma forma segregado da sociedade. Pode-se dizer que havendo algum conflito com o princípio da liberdade de imprensa com o da proteção integral, que inclui também o direito de imagem, o Estatuto faz a opção pela prevalência do direito do jovem, pois conforme prevê o artigo 144, até cópias e certidões de processos relativos a atos infracionais somente serão expedidos após deferimento da autoridade judiciária e desde que demonstrado o interesse.

O Princípio da Gratuidade, no art. 141, §§ 1º e 2º do ECA, diz que:

É garantido o acesso de toda criança ou adolescente à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, por qualquer de seus órgãos.

§ 1º. A assistência judiciária gratuita será prestada aos que dela necessitarem, através de defensor público ou advogado nomeado.

§ 2º As ações judiciais da competência da Justiça da Infância e da Juventude são isentas de custas e emolumentos, ressalvada a hipótese de litigância de má-fé.

É relevante acrescentar que o Supremo Tribunal de Justiça reconheceu que a isenção de custas referida no § 2º do art. 141 do ECA, não se estenderá aos demais sujeitos processuais envolvidos, haja vista o já mencionado princípio visa beneficiar apenas crianças e adolescentes.

Necessário ressaltar que o Princípio da Convivência Familiar é bastante negligenciado pela própria família, pois sua redação diz o seguinte:

Art. 19 - Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.

O princípio da Convivência Familiar é respaldado no art. 227 da C.F/88, o qual demonstra o valor das relações afetivas da família, haja vista ser na família o principal lugar onde a criança encontrará refúgio, apoio e proteção, pois é no seio familiar que deve acontecer a estruturação da personalidade da criança. Leve-se, em consideração que o papel dos pais e responsáveis não se limita a providenciar alimentação, saúde, educação, lazer, mas acima de tudo, a criança e o adolescente devem encontrar no seio familiar um ambiente que lhe garanta um elo de amizade, amor, de compreensão, pois conforme o que dispõe o texto constitucional acima relatado a convivência familiar significa: “respeitar seu direito de personalidade e garantir-lhe a dignidade [...]”.

             

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Considerações Finais

 Sem dúvida todos os princípios citados são primordiais, mas a convivência familiar gera na criança e no adolescente um crescimento saudável, que contribuirá para um futuro melhor para o País, ou seja, adultos equilibrados moralmente, psicologicamente, espiritualmente e etc. Atualmente, vislumbra-se essa enorme deficiência nas famílias, onde não há mais essa convivência familiar, muitas famílias só tem a figura da mãe, outras famílias a avó desempenha o papel de pai e mãe. Nas famílias onde temos a figura do pai e da mãe, por diversas vezes não há tempo para essa convivência por conta de trabalho, então o que se nota é que vai gerando crianças e adolescentes despreparados para o mundo que lhes apresentam caminhos tortuosos, e mais uma vez repetimos, com isso se tornaram presas fáceis, pois não tiveram aquele apoio familiar, enveredam-se por caminhos muitas vezes sem volta.

Destaque-se que o Estatuto permite que a criança seja inserida em família substituta, através dos institutos da guarda, tutela ou a adoção, mesmo que temporariamente, ficando essas famílias responsáveis pela sua proteção.

A família é a base fundamental para formação de indivíduos, conforme dispõe o artigo 226 da Constituição Federal: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Assim é preciso compreendermos a estrutura da família, pois de acordo com Szymanski (SZYMANSKI, apud, BRITO, 2002, online):

[...] Para compreendê-las e desenvolver projetos de atenção à família, o ponto de partida é o olhar para esse agrupamento humano como um núcleo em torno do qual as pessoas se unem, primordialmente, por razões afetivas, dentro de um projeto de vida em comum, em que compartilham um quotidiano, e, no decorrer das trocas intersubjetivas, transmitem tradições, planejam seu futuro, acolhem-se, atendem os idosos, formam crianças e adolescentes.

É evidente que sendo a legislação clara no que diz respeito à necessidade e importância da convivência familiar para a população infanto-juvenil, infelizmente o que ocorre é a insuficiência por parte de políticas públicas quando se trata de proteger o núcleo familiar. Discorre nesse sentido Coelho (COELHO, apud, FONSECA, 2002, online):

[...] as políticas oficiais, voltadas para a família, quando existem, têm se mostrado inadequadas, pelo pouco investimento nas necessidades e demandas deste grupo, não oferecendo suporte básico para que possa cumprir de forma adequada suas funções.

Desta forma, para a família desenvolver seu papel eficazmente, é primordial que o Estado exerça de maneira responsável sua função de garantidor de políticas públicas, e com bastante zelo no que se refira à educação, trabalho, saúde, lazer, alimentação, segurança, previdência e assistência social

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¹ Aluna em Graduação de Direito da Faculdade Luciano Feijão

² Aluna em Graduação de Direito da Universidade Estadual Vale do Acaraú

Referências

 

 BARROS, Guilherme Freire de Melo. Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº. 8.069/1990. 4. ed. São Paulo. JusPODIVM, 2010.

 

BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e Adolescente. Brasília, 1990. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 31 de jul. de 2015.

 

FONSECA, Júlia Brito. Princípios Norteados do ECA. Jus Brasil, [S.I.], Janeiro, 2015. Disponível em: http://juliabr.jusbrasil.com.br/artigos/155146186/principios-norteadores-do-eca. Acesso em 31 de jul. de 2015.

 

SZYMANSKI, Heloisa. Viver em família como experiência de cuidado mútuo: desafios de um mundo em mudança. In: Revista Serviço Social & Sociedade, nº. 71. São Paulo: Cortez, 2002. p. 09-25.