Dialogo com Nicomedes Costa de Vasconcelos da cidade de Itapagipe.

Após muitos anos, certo dia Nicomedes perguntou ao Edjar.

Você Edjar finalmente terminou seus estudos para ordenar a padre.

 Exatamente senhor Nicomedes terminei, foram muitos anos, só de curso superior nove anos, tive que cursar duas faculdades.

 Duas faculdades para ser padre senhor Edjar, exatamente senhor Nicomedes, Filosofia e Teologia, tenho licenciatura em Filosofia e bacharel em Teologia, além de dois anos de noviciado no convento do Caraça.

Isso significa que você estudou muito, sempre estudei muito, li em toda minha vida praticamente quatro mil livros e tenho uma biblioteca de seis mil e quinhentos livros de todos os assuntos.

Isso significa que você perdeu a fé senhor Edjar, não teve jeito senhor Nicomedes, ao término dos meus estudos não acreditava em Deus. É muito interessante estudar para ser padre e ficar ateu, não tinha imaginado essa possibilidade disse Nicomedes.

Vários padres perdem a fé, sobretudo os que estudam muito, eu estudei bastante senhor Nicomedes e tive a felicidade de tirar dez no exame univera, um exame que poucos podem fazer, para o senhor entender o valor do exame univera, passar no mesmo com nota máxima é mais importante eclesiasticamente que fazer um doutorado em qualquer disciplina. O cidadão é tratado o senhor univera, tive esse mérito senhor Nicomedes.

Eu não sabia dessa importância disse Nicomedes, não é qualquer aluno que pode fazer o referido exame, têm que ter notas altas no currículo, além de saber alguns idiomas, dessa forma determina o direito canônico, as leis que regulam a Igreja.

Percebo que você de fato é uma pessoa preparada, portanto, tenho algumas dúvidas do ponto de vista espiritual, gostaria que você pudesse respondê-las. Com muito prazer senhor Nicomedes.

 A primeira delas existe ou não uma alma, quando o homem morre  vai para o céu ou para inferno. Senhor Nicomedes é muito triste o que vou lhe dizer se não existe nem mesmo Deus, como poderia existir a alma? Céu, inferno, tudo isso é ideologia inventada pela Igreja, para dar um pouco de conforto a pessoa perante a morte e ao sofrimento da vida.  

Posso lhe garantir que não existe alma, o conceito de alma, foi um equivoco, pelo fato do homem ser o único animal que desenvolveu a fala, imaginou-se esse fenômeno pelo fato do homem ter uma alma, responsável pela linguagem e pela inteligência.

Naturalmente que o conceito é um erro senhor Nicomedes, o senhor pode acreditar em mim, porque não tenho interesse em mentir a vossa pessoa, tudo que desejei que o homem tivesse uma alm.

 E que a vida humana, não terminasse na lógica de mudança de Estado como mecanismo de reformulação da natureza.  Ser apenas pó químico, isso é muito triste senhor Nicomedes, mas se é uma realidade física, o que podemos fazer.

O homem após a morte é igual a um cabrito ou até mesmo um inseto, sua ultima utilidade é reciclar a natureza, nada além  disso, aliás, tudo que existe nela, tem exatamente essa finalidade. A sustentação da natureza, pelo seu mecanismo de reformulação permanente.  

 O homem foi entendido como um animal distinto, por ter desenvolvido a fala, e desenvolveu por um erro na evolução, aconteceram coisas na trajetória da evolução da vida que não estava previsto senhor Nicomedes.

O homem era para ser exatamente igual a qualquer bicho, mas no processo de evolução aconteceu algo exuberante, num determinado momento em que todo sapiens era ainda um chimpanzé, um grupo deles, resolveu não adentrar a floresta.

Aqueles que ficaram na savana, tiveram que erguer aos poucos a cabeça, para enxergar a distancia outros animais carnívoros, essa prática de esforço constante de levantar a cabeça provou uma revolução na coluna, levando ao homem ficar bipedal.

O que levou ao desenvolvimento das cordas vocais, esse fenômeno foi único a esse grupo de macacos que transformou em humanos, possibilitou ao desenvolvimento da linguagem.

Então os homens imaginaram ter uma alma porque falavam senhor Nicomedes. Inventaram Deus, céu e inferno, posteriormente criaram o Estado, colocando parte significativa da sociedade sobre o domínio daqueles que tem o poder institucionalizado.

O que posso lhe garantir que não existe alma, ela é uma fraude cultural, cujo intuito é dominar pessoas simples pela impulsão do medo, da punição, Deus sempre foi utilizado visando exatamente ao desenvolvimento da civilização.

Entendo perfeitamente o que você está dizendo, confesso que é assustador, mas tudo isso no meu entendimento crítico, está cheio de lógica. Que bom que senhor acredita, quando explico as coisas, tem sentido.

Garanto a vossa pessoa, que pode ficar em paz, e que quando morrer não existe nenhuma razão para o desespero, porque nada disso existe, sendo da forma que exponho não existe também o pecado.

 A  espécie a nossa razão de estar aqui nesse magnífico planeta é apenas uma, servir para  renovação da natureza através do mecanismo de reciclagem da mesma, nada tem grande significado a não ser  ela tão somente.  

Mas você não admite a possibilidade de estar errado senhor Edjar? Não existe essa possibilidade senhor Nicomedes, mas suponhamos que exista a alma, céu e inferno, qual é o conceito da alma exegeticamente.

Existem dois conceitos, um elaborado por santo Agostinho, outro por Tomas de Aquino. Alma formulada por Agostinho é entendida separada do corpo, quanto a Tomas, após a morte, o velho corpo ressuscita de forma nova.

Os dois conceitos são delíricos, vejamos, a alma separada do corpo é como um fluindo é inatingível, de acordo com sua acepção, ela pode ficar em qualquer lugar e não sentirá as dores do meio ambiente, frio ou quente.

  Deus não teria, portanto, poder sobre alma, refiro-me  ao aspecto da punição.  Com efeito, nesse sentido a alma seria uma grande ideologia.  Uma representação do imaginário, estamos nesse mundo, temos uma única oportunidade, posterior a esse momento, somos de fato, pó de reciclagem químico.  

  Nada atinge a alma, é como se Deus desejasse punir o vento, isso significa que para alma, tanto poderia ir apara o céu ou  inferno,  ela não tem materialidade, não existe meio ou forma de punição.

 A alma   como fluido é inatingível, não se tem matéria,  portanto não tem como ser atingida.   Refiro-me a alma como formulação de Santo Agostinho.  O fundamento da alma defendida por Agostinho fundamenta se na filosofia de Platão, invertidos em alguns aspectos, porque ele sempre foi reencarnacionista.

Quanto ao outro conceito de alma, defendido por Santo Tomás de Aquino, a alma não se separa do corpo, seu fundamento vem da filosofia de Aristóteles, quando a pessoa morre, fica esperando pelo momento certo da ressurreição, quando um novo corpo será reconstituído.  

Mas se é um novo corpo, não é aquele que o pó químico transformou em natureza, pelo mecanismo de reciclagem, cientificamente não tem como reconstituir o velho corpo, até porque biologicamente o velho corpo é sempre a continuidade do velho processo de replicação, somos eternamente a renovação do primeiro átomo mater.

Substancialmente somos sempre os mesmos, entende se essa leitura pelos fatores de DNA, não existe duas pessoas, o que existe são formas diferentes da mesma substancia isso cientificamente.

 Se Deus fosse usar o mecanismo de recuperação do mesmo corpo, poderia apenas salvar o primeiro corpo, porque os demais cientificamente são os mesmíssimos. Sendo dessa forma não tem como justificar exegeticamente a ressurreição pelo mecanismo da recuperação da matéria, do mesmo modo, a reencarnação.

Imagino que tudo tenha sido explicado senhor Nicomedes, é muito triste, mas não existe outro caminho para nós humano, da ótica da essência de cada coisa, a natureza não deu privilegio a nada.

 A  lógica que aplica ao homem, ao cavalo, ao inseto, até mesmo a arvore e a pedra, é semelhante para o único mecanismo da natureza, que é a sua permanência alimentando de tudo que ela mesma produziu.

 Com a única finalidade, permanecer para sempre natureza. Entendo perfeitamente, respondeu Nicomedes, nunca tinha pensado em tudo isso dessa forma, compreendo o lado trágico da vida.

  Não existe nenhum propósito a tudo que existe sobre a natureza, nem ela mesma tem finalidade no seu mecanismo de mudança de estado. Exatamente isso senhor Nicomedes.

Edjar Dias de Vasconcelos.