Os ciclos econômicos e a crise atual.

Há muito venho falando que a causa da crise mundial atual é conseqüência da inflexão para baixo de mais um ciclo econômico gerado pela prosperidade iniciada na década de 90. Vamos esclarecer alguns pontos mais, de forma mais objetiva e mostrando que independente da causa, os sintomas são de um ciclo econômico.

O que vem a ser um ciclo?

A suposta existência de "ciclos econômicos" foi estudada inicialmente por Lord Overstone em 1857, depois veio Clément Juglar em 1862 e assim por diante. Poderíamos listar aqui centenas de economistas do século XIX e XX, mas vamos nos restringir citando aos mais famosos, Juglar (ciclos de 7 a 10 anos), J. Kitchin em 1923 (ciclos de 3 a 4 anos), Joseph Shumpeter em 1939 (Acoplamento dos ciclos de Kitchin e Juglar), Simon Kuznets em 1930 (ciclos de 15 a 20 anos) e finalmente Nicolai Kondrantieff na década de 20 (ciclos longos de 40 a 60 anos).

Por definição um ciclo é uma variação periódica para cima e para baixo nas variáveis econômicas (produção, emprego, consumo, investimento, etc.). O ciclo é inerente de mercados livres, capitalistas, mas alguns autores marxistas e mesmo os liberais enquadram a teoria dos ciclos nas economias planificadas. Certos autores abordam a questão de influências exógenas e endógenas no comportamento dos ciclos, como aspectos culturais, sociais e institucionais entre outros.

Um ciclo poderia ser simplesmente expansão, crescimento, contração, retração, recessão, ou depressão com diversas causas, mas é óbvio que a teoria dos ciclos econômicos poderá ser confirmada sempre com a máxima em que toda expansão será fatalmente seguida de uma retração e vice-versa. É uma lógica quase gravitacional, tudo que sobe, uma hora desce.

Na década de 30 foram aplicados modelos econometricos e estatísticos, mas ainda assim existem os céticos que bradam o empirismo, a falta de elementos e dados confiáveis para confirmação das teorias e seu movimento cíclico. Estudos nos EUA feitos pelo National Bureau of Economic Research (NBER) não são muito conclusivos quanto a confirmação científica dos ciclos.

Os ciclos longos de Kondrantieff são os mais aceitos academicamente e por isso mesmo ele é o mais citado e famoso entre os economistas que estudaram os ciclos econômicos.

A questão histórica está de certa forma e sucintamente aqui descrita, vamos agora inferir algumas considerações sobre a situação atual partindo-se da premissa que os ciclos são reais, até pela lógica da expansão seguida de contração e vice versa.

A atual situação mundial é um movimento de um ciclo econômico?

Um canadense chamado Ian Gordon em 2007 criou uma forma de interpretar Kondratieff introduzindo um conceito de estações do ano. A sua ilação foi que estamos vivendo o inverno. A Primavera teve início com o fim da segunda guerra nos anos 50 e um "boom" econômico.  O Verão veio na década de 60, com a euforia dos mercados a criação e expansão de formas de crédito e prosperidade total. A seguir chegou a vez dos mercados mundiais com interação e mecanismos novos e tecnológicos. Pela teoria de Kondrantieff existe uma recessão no meio de um ciclo, pela análise aqui esta é atribuída a inflação dos anos 70 e 80 e um ajuste na prosperidade dos anos anteriores. Continuando a interpretação de Kondrantieff conforme as estações do ano, o Outono volta na década de 90 com a explosão da internet, a confirmação da globalização, a apreciação dos ativos diversos e uma prosperidade nunca vista, principalmente nos países emergentes com a China e Índia adicionando lenha na fogueira econômica mundial. Assistimos uma explosão do comércio mundial e dos preços e demanda das commodities. O petróleo chegou a US$ 100 o barril prenunciando um choque energético que acabou não acontecendo, pelo menos até agora.

O Inverno, que seria a segunda recessão e segundo Kondrantieff uma depressão, foi iniciado por volta de 2000 com o excesso de liquidez e a riqueza gerada, alavancada pelos juros baixos e desregulamentação do mercado financeiro. Como conseqüências tivemos o estouro da bolha das ponto com e quebra de empresas famosas como Eron, WorldCom, etc.

A história seria interessante se não tivéssemos vividos crises sérias como a queda da bolsa em 1987, a deflação japonesa a partir de 1990, a crise escandinava de 1992, a insolvência mexicana de 1994, a crise asiática de 1997 e a crise russa de 1998. Isso tudo sem contar o famigerado ataque terrorista de 2001 que como fator exógeno derrubaria qualquer teoria de ciclo econômico pelo caos vivido na economia global, muito bem administrado pelo FED americano. A interpretação é válida, mas cabem muitas contestações.

Pode até ser e muitos economistas devem estar ressuscitando Kondrantieff ou seguindo a onda midiática que cerca esta crise. Uma coisa é certa, estamos vivendo uma onda de um ciclo econômico, se a teoria de Kontrantieff ou outro economista pode confirmar, deixemos para os estudiosos. No futuro teremos muita matéria acadêmica para estudos e pesquisas pelo momento atual, na economia global.

J. Shumpeter, um dos grandes economistas da escola austríaca, atual em muitas teorias, como a destruição criativa, criou uma nomenclatura para um ciclo chamando as fases de boom, recessão, depressão e recuperação. Se analisarmos os fatos recentes é possível enxergar todas as variáveis descritas por Shumpeter, menos ainda a temida depressão, felizmente.

A questão permanece: Teremos a depressão esperada por diversos analistas econômicos ou uma recessão grave, eufemismo de outros?

Reafirmo minha tese que as experiências passadas, a tecnologia, a interatividade e os países emergentes mudaram a concepção da depressão em um ciclo econômico.

Peter Drucker e mais recentemente Alan Greenspan preconizaram que o mundo não seria o mesmo com a era do conhecimento e a sociedade da informação. A perda da importância dos Estados Unidos na economia global é outro fator que ajudará a arrefecer uma possível depressão. A China caminha a passos largos para assumir a ponta na economia mundial, bilhões de pessoas ainda precisam do movimento virtuoso do consumo por lá, do mesmo modo na Índia e no próprio Brasil.

Há muita gordura para ser queimada na expansão da produção e do consumo. Uma recessão na Europa e nos EUA vão afetar de certa forma a economia global, mas não podemos afirmar que chegaremos à depressão.

Se para a teoria dos ciclos econômicos a única coisa óbvia e certa é a contração após a expansão, para determinação do estágio e da cronologia são necessários muitos estudos mais, inclusive agora com novas premissas como a velocidade, intangibilidade e conectividade que tanto tenho alardeado.

O empirismo do ciclo não pode ser confirmado, mas o das previsões e da futurologia econômica sim. São muito comuns os erros das previsões econômicas pelos técnicos e pela imprensa especializada. A onda midiática funciona como fator positivo ou negativo dentro do contexto da sociedade da informação. As expectativas sempre podem ser confirmadas dependendo da atuação da imprensa e um eventual efeito manada que este comportamento pode provocar.

A articulação do G-20, a experiência com crises passadas, o presidente eleito Obama, a resiliência da economia americana, a pujança da China com seu crescimento de 9% ao ano e outros fatores positivos vão nos salvar da terrível e temida depressão.

Uma coisa deve ficar clara, não podemos comparar as crises do passado com as atuais. Analogamente sim, mas uma repetição é impossível. O mundo é outro, as pessoas evoluíram muito, os mecanismos de gestão e a tecnologia estão ai, com um detalhe, as mudanças são cada vez mais rápidas.

Vivemos uma inflexão de um ciclo econômico sem dúvida, não podemos afirmar é que estágio seria este, nem quanto tempo vai durar, independente da teoria que vamos adotar.

A lógica econômica funciona algumas vezes, as previsões também, mas existe até uma brincadeira entre os economistas: Às vezes conseguimos errar até com o passado!