Como há uma hierarquia descendente de grupos sociais e naturais da humanidade, assim também existe um conjunto ascendente de associações que tratam dos níveis espirituais, tendo sua origem no indivíduo e chegando até Adão Kadmon, que simboliza o ser humano arquetípico. Estes grupos internos são tão diversos quanto suas contrapartidas externas, pois são geradas por qualquer situação a ser encontrada na condição humana. Assim, pessoas do espírito são encontradas entre os mendigos do Cairo e entreee os ricos de São Francisco, nas altas rodas de Londres e dentre primitivas tribos africanas no deserto do Kalahari. Surgem grupos de indivíduos semelhantes no meio de uma cidade industrial ou na distante zona rural. Além do mais, não são sempre encontradas nos monastérios ou nas comunidades consagradas. É possível manifestarem-se como sociedade eruditas, organizações comerciais ou meramente como uma associação de pessoas vivendo em uma casa dirigida de acordo com certos princípios estéricos.

    Digo que uma pessoa em cada cem está interessada em desenvolvimento espiritual, mas que apenas uma em cada cem destas atém-se ao Caminho e continua até o fim de sua vida. O que significa que apenas uma em cada dez mil pessoas que andam pela Terra está envolvida na vida esotérica do planeta. Mesmo assim, atinge um número significativo. Começamos a perceber que deve existir alguma organização no processo de seleção ou será perdido o potencial deste “sal da terra”, como já foi chamado. Isso indica que um bando aparentemente disperso de pessoas como estas deve ser monitorado, examinado e organizado de alguma forma. É óbvio que uma operação tão ampla não pode ser executada por indivíduos, ou neste caso por uma organização terrena, embora os praticantes exteriores das grandes crenças mundiais tenham tentado por diversos métodos imitar o processo, convertendo e obrigando as pessoas a desempenhar papéis religiosos formais. A abordagem daqueles a cargo da Estrada é, na verdade, totalmente oposta, se bem que se criem condições tanto para testar como para resistir a qualquer um que procure a entrada do Caminho, de modo que só os confiáveis possam entrar.

    Como, então, isso é feito? Qual é o sistema operante de uma tradição esotérica ? Pois existe claramente algo mais nas diferentes escolas místicas que apenas se reunir para estudar e praticar espiritualidade. Na verdade existe. Existe todo um esquema de níveis nos quais a tradição se insere e desempenha sua missão específica na vida espiritual da humanidade. Há muitas maneiras de se olhar para este esquema. Uma delas é perceber a cadeia de comando, outra é ver como cada escola modifica sua apresentação de acordo com as necessidades e com o local. Tomando o nosso modelo das divisões naturais da raça humana, vamos expô-lo em termos de correspondência para percebermos sua organização esotérica.

    A primeira unidade é o indivíduo, que contém todos os níveis em miniatura dentro de si. Esta pessoa, vamos supor, não está mais preocupada só com a sobrevivência física ou apenas em firmas uma impressão egotista na sociedade, porém deseja explorar os mundos internos e superiores com a finalidade de encontrar uma realização mais completa. Essas pessoas procuram um significativo não só em suas próprias vidas, mas também no Universo em geral. Não estão apenas com suas próprias pequenas áreas de existência, mas desejam saber por que estão aqui na Terra, e com que finalidade. O primeiro contato entre um explorador e o Trabalho, como é às vezes chamado, é, em geral, através de sua cultura, diretamente da família ou a distância, pela observação dos costumes religiosos de sua sociedade. Muitas vezes a extensão desses encontros não é mais que participar de um casamento ou de um funeral. Os que comparecem aos serviços religiosos podem sentir que existe algo muito profundo contido no ritual e nas escrituras, mas essas experiências são, muitas vezes, enfraquecidas pela repetição mecânica e sem sentimento das orações e cerimônias. Em muitos casos, o único nível atingido é o tribal, embora a congregação aparente ser altamente civilizada. Existem, é claro, exceções, mas em geral isso é uma contingência da conexão interna do ministro, pois há rabinos, padres e imanes que são místicos. Nem todo ministro apenas casa e enterra as pessoas.

    O outro contato primário com o plano do espírito é através dos livros, os quais podem ser textos antigos ou transcrições modernas da filosofia eterna. Alguns autores serão da mais alta categoria e outros, uma mistura de realidade e fantasia. Certos textos serão uma janela aberta para aquele momento, e outros, uma porta fechada até a ocasião certa. Uma tradição está, em geral, na origem das obras que possuem verdadeira substância, mesmo que, às vezes, exista um indivíduo, como Jacob BOehme, o visionário alemão, que apesar de ignorante, apresentou uma versão muito profunda do Ensinamento. Contudo, até mesmo ele estaja sujeito à influência cultural de sua formação cristã e não estava carente de auxílio direto dos mundos superiores.

    Uma Tradição é o veículo pelo qual o Ensinamento é transmitido de determinada forma dentro de uma civilização específica. Assim, temos metafísicas budistas e cabalísticas, rituais Greco-ortodoxos e católicos, e uma liturgia hindu e muçulmana. Muitas vezes, tendo o explorador individual rejeitado suas próprias raízes culturais, encontra ressonância em uma tradição alienígena, que não tem a pesada carga da autoridade paterna. Para muitos, este é o ponto de entrada no segundo nível de uma família espiritual.

    Grupos correspondem à categoria da família. São compostos por um pequeno número de pessoas, oscilando de quatro a quarenta membros, do mesmo modo como uma família natural, onde todos conhecem todos e existe algum tipo de relacionamento pessoal, mesmo que isto se resuma a estar ciente de partilhar dos mesmos valores e objetivos. Um grupo, contudo, geralmente tem um dirigente, uma figura paterna ou materna, e diversas tias, tios e pessoas mais velhas. Um grupo também possui as características de uma família, em suas celebrações e rixas, momentos de unidade e tensão, desordem e reencontro. Pessoas são pessoas, mesmo no Trabalho espiritual; e a figura paterna dirigente inevitavelmente possuirá suas fraquezas ligadas às diversas projeções infantis negativas e positivas misturadas à interação do grupo.

    Grupos, como famílias, combinam-se com outros grupos formando uma comunidade, o que pode ser percebido como uma escola de grupos. Este nível de organização pode ser visto como um grupo de famílias espirituais que segue uma determinada forma de trabalho. A conexão externa pode ser apenas a origem e os métodos partilhados, como utilizar-se do mesmo texto, ou uma aliança íntima que se fundamenta em possuírem um instrutor comum que supervisiona um determinado número de grupos. Essas escolas serão inavações recentes para satisfazer o presente, ou antigos estabelecimentos de ortodoxia. Algumas escolas possuem edifícios especialmente construídas para seus fins, enquanto outras se reúnem em diversas casas espalhadas por determinada cidade, ou pelo campo. Contudo, o que constitui uma escola é o fato de ela existir e operar em escala além do alcance de um grupo isolado. Uma escola, por exemplo, pode afetar a vida de uma localidade, como as ordens monásticas na Idade Média. Começamos aqui a reconhecer a capacidade e a organização crescente da hierarquia espiritual que zela pelo mundo.

    Em termos espirituais, o nível de nação corresponde ao da Linha. O significado disso é existir uma certa ênfase em sua forma e em sua continuidade. Assim, diversas escolas transmitem uma visão particular do Ensinamento a diferentes partes do mundo. Aqui temos, por exemplo, o método hassídico da Cabala sendo vivido em Nova York e Jerusalém, ou os colégios dos jesuítas educando católicos em muitos países. A principal característica de uma Linha é que possui, assim como uma nação, uma natureza distinta que a separa de outras Linhas, de modo a permitir reconhecer certas ordens sufis por seus métodos. Na verdade, fomos informados de como um maçom pode dizer, através de um aperto de mão, se alguém faz parte da mesma Linha. Um exemplo mais óbvio de uma Linha é a Igreja anglicana, que é precisamente o que diz ser. Seu método de adoração demasiado inglês é reconhecido facilmente tanto nos Estados Unidos da América como na África e na Australásia. Nem todas as Linhas, contudo, serão observadas na superfície da vida. Pouco é dito ou de fato conhecido sobre os rosa-cruzes, uma Linha dentro do próximo nível, isto é, de uma Tradição, neste caso a oculta.

    As Tradições, em geral, se desenvolvem dentro de uma civilização. A cristandade, em sua maior parte, é um fenômeno europeu, enquanto o islamismo pertence ao Oriente Médio. A razão disso é que a interação entre a raça, a localidade e o espírito cria uma determinada civilização na qual o Ensinamento se externaliza em uma ortodoxia. Os temas esotéricos se transformam em práticas formais, e, assim, as realidades espirituais passam a ser doutrinas de fé, cultos de personalidades e costumes religiosos. Todas as religiões seguem esses padrões, embora cada civilização crie a sua própria versão. As Tradições estão, em geral, fundamentadas sobre a vida dos grandes santos, sábios e profetas, que transmitiram o Ensinamento tanto para uso das massas como para uso esotérico daquela determinada parte do mundo. Esses impulsos duraram milhares de anos, porque a dinâmica e a estrutura do Ensinamento são em geral usurpadas pelo clero secular, que mantém a casca externa, enquanto o poder interno é mantido pelos místicos da Tradição sob a forma de Linhas, escolas e grupos, embora isso seja raramente observado ou conhecido. Muitos sacerdotes e pessoas leigas se perturbam quando Moisés, Jesus, e Maomé são considerados místicos de mais elevada ordem.

    O esquema geral é retido pela humanidade. O paralelo espiritual é o Torah, ou Ensinamento, concedido para que Adão atingisse a plena realização. Temos aqui a completa cadeia de instrução para conceder o conhecimento sobre a natureza de Deus, do Universo e do homem, e seu mútuo relacionamento. Assim, a hierarquia espiritual se estende ao indivíduo, através do grupo, da escola, da Linha e da Tradição, aos colégios celestiais, que existem em outra espécie de tempo e espaço, e até a Academia do Alto, instruída pelo Santo. Se vistas como um todo, será possível perceber o esquema polarizado entre Adão Kadmon, o Homem Primordial, e o ser humano individual, com os vários estágios de desenvolvimento nos níveis intermediários.

    Delineado o plano maior, vamos agora examinar o que nos foi concedido sobre a história do Ensinamento desde os tempos mais antigos até a nossa própria época, para vermos como ele vem fluindo com as transformações das circunstâncias. Deste modo, preparemos o cenário para a nossa estória de como um grupo, para florescer a tempo, atravessa o processo de se transformar em uma escola, com uma tarefa e um significado precípuos.