RESUMO

Este trabalho pretende evidenciar o pensamento de Simone Weil naquilo que diz respeito à opressão e ao seu inverso que é o estado de liberdade. Buscaremos assim trazer à tona as causas que influenciam tanto para o modo do “bem viver” como também para o estado de alienação-opressão, que não exerce outra coisa a não ser o “mal viver” do indivíduo, que acaba tendo o sentimento de um ser escravo. Veremos assim que o indivíduo ao afastar-se das suas verdadeiras origens, ou seja, utilizando um termo da própria autora, quando ele se “desenraiza”, acaba por ser escravo de si mesmo. A escravidão, por assim dizer, gera um estado de opressão, que impede o “bem viver” do indivíduo. Desta maneira, buscaremos solucionar essa questão trazendo à tona a necessidade e a importância da liberdade como meio de levar o indivíduo ao retorno de suas raízes e ao encontro consigo mesmo. Devo também evidenciar que o principal remédio para esse veneno (da opressão) será o próprio trabalho, uma prática natural do indivíduo que, segundo Weil, se bem praticado, é a solução e a principal causa para o nosso bem viver.

Palavras-chave: Indivíduo; Liberdade; Trabalho; Opressão.

       RESUMEN

Este trabajo pretende poner de manifiesto el pensamiento de Simone Weil en lo que respecta a la opresión y al opuesto de este que es el estado de libertad. Buscaremos así sacar a la luz  las causas que influyen tanto para el modo del “buen vivir” como también para el estado de alienación/opresión, que no ejerce otra cosa a no ser el “mal vivir” del individuo, que termina teniendo el mismo sentimiento de un ser esclavizado. Veremos así que el individuo al alejarse de sus verdaderas orígenes, o sea, utilizando un término de la propia autora, cuando el se “desenraiza” termina por ser esclavo de si mismo. La esclavitud, por así decirlo, genera un estado de opresión, que impide el “buen vivir” del individuo. De esta manera, buscaremos solucionar esa cuestión tratando de la necesidad y de la importancia de la libertad como medio de reconducir el individuo  a sus mismas raíces y al encuentro consigo mismo. Debo también evidenciar que el principal remedio para el veneno (de la opresión) es el propio trabajo, una práctica natural del individuo que, según Weil, si bien practicado es la solución y la principal causa para  nuestro bien vivir.

 

Palabras clave: Individuo; Libertad; Trabajo; Opresión.


SUMÁRIO

 

1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 5

2 VIDA E PENSAMENTO....................................................................................................... 9

3 SOBRE A OPRESSÃO.. 11

4 CAUSAS DA LIBERDADE.. 22

5 O QUE É LIBERDADE.. 26

6 O TRABALHO.. 28

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS. 31

8 REFERÊNCIAS. 32

1 INTRODUÇÃO

 

 

Esse estudo se originou graças a um primeiro contato com as obras de Simone Weil. Com algum conhecimento em Marx, decidi, graças a minha formação sociológica, me aprofundar em uma autora que segue uma linha semelhante a de Marx.[1] Nota-se, porém, que a mesma difere de Marx,[2] pois acha que a realidade ultrapassa o campo material. Já para Marx, tudo pode ser explicado através das questões que envolvem a práxis (ciência, economia, sociedade), pois, para o mesmo não existe algo que ultrapassa esse plano. O chamado método materialista histórico dialético elaborado por Marx, “é o método de interpretação da realidade, visão de mundo e práxis. A reinterpretação da dialética de Hegel (colocada por Marx de cabeça para baixo), diz respeito, principalmente, à materialidade e à concreticidade. Para Marx, Hegel trata a dialética idealmente, no plano do espírito, das ideias, enquanto o mundo dos homens exige sua materialização”.[3] Sendo assim, Marx contribuiu para o pensamento de Weil dando “o caráter material (os homens se organizam na sociedade para a produção e a reprodução da vida) e o caráter histórico (como eles vêm se organizando através de sua história)”.[4] Weil, porém, o critica por que o mesmo retira as questões referentes ao espírito “Marx a substitué la matière à l'Esprit de Hegel, mais il a attribué à la matière ce qui est l'essence de l'esprit: une aspiration au mieux”. [5] Porém, aquilo que Marx observa como sendo uma aspiração ao melhor para Weil torna-se algo muito limitado e que poderia ser mais aprofundado. Marx limita tudo a matéria, ao social, e claramente podemos perceber que Weil vê no indivíduo algo mais do que um ser puramente social e composto de matéria, ou seja, existe no indivíduo o transcendental, o espírito.

Percebemos que Weil no início dos seus estudos também parte desse ponto materialista, pois é uma autora com muitos ideais e com uma vida bastante interessante caracterizada por várias causas abraçadas, atuando como professora, guerrilheira e em especial como trabalhadora operária, o que é muito bem exposto no seu escrito intitulado “Expérience de la vie d'usine”. [6] É a partir dessa vivência que Weil começa a mudar a sua compreensão acerca da realidade[7], pois não pensa mais como Marx. Mas ela percebe que o trabalho operário é fruto de uma apatia e aceitação[8] por parte do trabalhador que exausto pelo seu trabalho não consegue mais pensar e muito menos ter forças para gerar uma revolução. Tendo por base essas experiências vividas, podemos assim dizer que é uma filósofa bastante interessante de se estudar, pois embora não tenha sido uma doutora em filosofia, escreveu muito e hoje se torna importante assim como outros filósofos. Vemos que Weil busca prioritariamente através de seus estudos a verdadeira liberdade[9] do indivíduo.[10]

Vemos que inicialmente ela estuda a questão social, tendo como principal ponto de partida a relação de opressão e liberdade que podemos assim dizer que é algo muito natural do indivíduo e está presente em qualquer parte da nossa sociedade, desde o pai que manda no filho até o trabalhador que obedece às ordens do seu patrão. Pelo que vemos, é algo existente e que de certa forma é natural, mas que se não controlado pode se tornar um imenso monstro.[11] Vemos também Weil buscar uma liberdade verdadeira, aonde temos essa sua frase em que afirma que “o homem nunca deixou de sonhar com uma liberdade sem limites. Mas a liberdade perfeita não pode ser concebida como o desaparecimento da necessidade, posto que, enquanto o homem viver, a pressão da necessidade não se afrouxará nunca um só momento”.[12]

Sabemos que ao se estudar o ser humano deparamo-nos com algo muito complexo, composto e influenciado por inúmeras condições. Dessa forma, de acordo com Simone Weil, veremos dentro dessa problemática que o que mais aprisiona o ser não são as condições externas, mas sim a própria condição da sua interioridade que lhe impõem inúmeras barreiras que impedem o seu desenvolver.  Podemos pegar, por exemplo, uma pessoa que pode sentir-se totalmente livre exteriormente e completamente aprisionada interiormente.

A respeito disso penso ser muito importante estudar o seu modo de ver a realidade e, dessa forma, buscar aprofundar mais nos seus estudos para assim compreender o seu trabalho bem como o porquê do seu empenho para com a liberdade.

Com efeito, a liberdade é um tema sempre atual e que permanentemente é trabalhado por diversos autores. Viso assim analisar algumas das ideias propostas pelo livro Opressão e Liberdade e buscar compreender aquilo que a autora propõe. O relacionamento dos indivíduos entre si, do indivíduo com a máquina, do indivíduo (trabalhador) com o patrão, são questões que dizem respeito a um sistema no qual o próprio indivíduo está inserido, sendo por obrigatoriedade ou não. Trata-se de sistemas nos quais o mesmo relaciona-se, comunica-se e convive diante de constantes desafios que o levam a um desenvolver-se, a um adaptar-se, ou até mesmo a um aprender a sobreviver.

A liberdade pode ser trabalhada de diversas formas, seja no campo social ou então no campo do pensar. Pegando por base Weil vemos que a autora inicialmente trabalha com a questão da liberdade social. Ao longo dos seus escritos e até mesmo pelo fato de ocorrer um amadurecimento do seu pensar a mesma acaba se aprofundando em um determinado aspecto e assim criando um enraizamento[13] referente ao seu modo de pensar.  “A primeira necessidade da alma, a que está mais próxima de seu destino eterno, é a ordem, ou seja, um tecido de ralações sociais tal que ninguém seja coagido a violar obrigações rigorosas para se executar outras obrigações”.[14] Notamos assim o encontro da liberdade através de uma busca pessoal. Vemos que esse próprio enraizamento do ser[15] lhe dá bases no que diz respeito à cultura, étnica e social, pois é o próprio enraizamento que, assim como uma árvore de fortes raízes, é o que lhe dá o sustento para o bem viver. A autora procurará explicar que isso está relacionado ao sobrenatural sendo que somente corresponde à subjetividade e, sendo assim, só pode ser experienciado e vivenciado pela própria pessoa.

Buscaremos aqui fazer uma análise a respeito do tema da liberdade, porém, sem focarmos ainda o nosso estudo na questão da graça em Simone Weil. Como consequência dessa análise será explicitado um pouco do humano analisado por Weil e assim demonstrarmos suas perspectivas naturais e, em certa medida, até mesmo transcendentais diante desse humano. O trabalho consiste de três partes: a) de uma breve introdução à biografia da autora (Vida e Pensamento); b) Explicarei um pouco sobre o porque da necessidade da liberdade (Causas da liberdade); c) Definirei o conceito de liberdade com base no pensamento de Simone Weil (O que é liberdade); d) Explicitarei o meio no qual se gera a verdadeira liberdade (O trabalho); e) E por fim concluirei o trabalho evidenciando a importância do pensamento de Simone Weil para os dias de hoje e também a necessidade em que tenho de dar uma continuação à estudar as obras da autora, principalmente na questão que diz respeito à graça (Conclusão).

 
2 VIDA E PENSAMENTO

 

 

Simone Weil é uma autora francesa de origem alsaciana que viveu do ano 1909 ao ano 1943. Como filósofa não escreveu muitos livros, mas deixou várias anotações que demonstram claramente o seu modo de pensar. Além de filósofa, foi participante da Guerra Civil Espanhola lutando ao lado dos republicanos e também fez parte da resistência francesa durante a Segunda Guerra Mundial. Além disso, para vivenciar a realidade dos operários trabalhou como operária da Renault de 1934 até agosto de 1935 não podendo ficar mais por razões de saúde.

Suas ideias são fundadas por um pensamento filosófico inspirado principalmente por Platão, Descartes e Kant igualmente por Marx e pelo seu professor Alan. “Questo straordinario mix teorico tra il cartesianesimo puro del suo maestro e il materialismo rivoluzionario della tradizione marxista, individuava in un rapporto integrale tra il ‘pensiero e l’azione’ (...)”[16]. Seu modo de pensar influencia totalmente em sua vida. Pode-se dizer que sua vida é basicamente baseada em um desdobrar-se em atenção pelo outro, pois grande parte da sua vida fora dedicada para estudos e por vivências relacionadas às questões sociais.

Para Weil a filosofia deve ser acionada como uma virtude dentro do cotidiano, da vida prática. Seu desenvolver no dia-a-dia possibilita ao indivíduo novas condições de enfrentar a realidade, lhe traz meios que lhe favorecem para um bem viver, para um melhor enfrentamento da realidade.

Ao ler seu livro Opressão e liberdade percebemos claramente a sua vivência com a realidade operária. Simone Weil

(...) vai, livremente e por opção consciente, ao encontro da miséria mais atroz, acreditando que, através dessas experiências e da reflexão teórica sobre elas, poderia reconstituir dignidade do ser humano explorado e denunciar um sistema industrial opressivo que, no seu entender, deveria evoluir mediante a adopção de novas tecnologias menos penosas e relações industriais mais justas[17].

Vemos assim que não são meros escritos produzidos por uma imaginação fértil, mas sim uma rica e bela produção que visa trazer esperança e consequentemente uma solução para os problemas dos trabalhadores operários daquela época e também para a posteridade.

Tendo como uma das principais bases o grande intelectual Karl Marx, Weil pretende, dessa forma, construir um pensar que una a teoria e o método materialista com uma ideia relacionada ao platonismo e ao cristianismo para assim valorizar a concepção de espírito que está contida no sujeito[18]. Se Weil fosse trabalhar o sujeito somente pelo foco material provavelmente a mesma não se satisfaria. Deste modo, ela pega principalmente a obra Timeu de Platão, para confirmar a existência da alma.

O corpo material é formado por um substrato desordenado e pela alma, que é o princípio individual e inteligível que atua sobre o substrato desordenado como princípio ordenador. O corpo espiritual é a partícula divina presente no homem que lhe fornece vida. Como se pode observar, tal concepção é fortemente inspirada na doutrina platônica da criação retratada no Timeu (...)[19].

 É por isso que já nos anos 30 ela faz duras críticas ao marxismo, em especial ao próprio Marx de um ponto de vista inteiramente filosófico, como, por exemplo, a crítica que ela faz a Marx a partir de Platão dentro de uma busca pela vida prática do bem. Como Marx compreende tudo a partir da matéria e do ser social e não do ser subjetivo ele não consegue aprofundar os seus estudos e perceber que o indivíduo é algo que não é somente constituído de massa. Para Weil, Marx nunca conseguiria explicitar a verdadeira prática do bem, pois a verdadeira prática do bem é algo sagrado. “El bien es la única fuente de lo sagrado. Únicamente es sagrado el bien y lo que está relacionado com el bien”[20]. Não existe, portanto, uma fonte do bem que seja material, já que a prática do bem é recebida através de outra instância que está relacionada a questão do sobrenatural[21].

           


3 SOBRE A OPRESSÃO

 

 

Ao nos referirmos sobre a opressão, podemos assim dizer que a mesma se caracteriza no homem de uma forma nada agradável, pois o leva a um sentimento de dependência, pequenez e até mesmo de invalidez. O que se pode observar é que a opressão é algo comum a todos os indivíduos e que, portanto, é algo que faz parte do próprio cotidiano do ser humano. Segundo Weil, o que leva o indivíduo a esse estado de opressão é o afastamento das suas próprias origens, ou seja, é a complexificação da vida social que leva o indivíduo a afastar-se do seu modo primitivo de natureza e que o faz aprisionar-se, a alienar-se, e ainda por fim, a arruinar-se. O que assim podemos dizer que são diferentes modos de opressão. Neste aspecto, cabe primeiramente destacar que Simone Weil, nos seus estudos, se dedica a explicitar as causas da opressão social, para posteriormente falar sobre a pior opressão que é a opressão individual, ou seja, uma espécie de auto-opressão.

Referente à opressão social é certo afirmar que a mesma vai se formando até mesmo dentro dos pequenos grupos sociais. Já que a própria luta pela sobrevivência acaba naturalmente promovendo a concorrência[22]. Querendo ou não, surge a opressão. Desse modo, a autora coloca a questão: “É preciso ainda colocar mais uma vez o problema fundamental, ou seja, em que consiste o laço que parece até agora unir a opressão social e o progresso nas relações do homem com a natureza”[23]. A concorrência leva à separação (dos indivíduos) e por consequência à opressão. É cabível afirmar que os modos nos quais os agrupamentos sociais[24], sejam as tribos ou então castas sociais, se diferem levam a estabelecer distintas regras que causam naqueles indivíduos que estão inseridos nesses meios, esse sentimento de dependência e ao mesmo tempo de opressão.

Posteriormente, conquistada algumas necessidades básicas, o indivíduo cada vez mais buscará aquilo que é inverso à opressão, ou seja, a liberdade, a qual basicamente podemos assim dizer que é a procura de um livrar-se de um determinado estado que o oprime. O indivíduo, portanto, buscará o máximo de liberdade que ele puder adquirir.

Partindo de uma visão weiliana, baseada no materialismo de Marx, podemos considerar que o ser humano depois de conseguir dominar as principais ferramentas de trabalho, passa a querer dominar os animais. Após essa conquista, o homem chega ao extremo dos domínios que é a dominação do homem pelo homem. Claro que cabe destacar que o mesmo só consegue desenvolver-se e expandir os seus domínios graças aos seus aprimoramentos em relação a algumas condições que favorecem para que o mesmo possa expandir os seus domínios. Quanto mais meios, consequentemente mais opressão. Como exemplo, podemos citar “(...) a disposição do meio natural, a ferramenta, a arma, os procedimentos de trabalho e de combate (...)”[25], como meios que influenciam para que se possa exercer a opressão do (outro) indivíduo.

Importa aqui notar que Weil destaca principalmente a relação da opressão dentro das fábricas, onde a opressão se faz sentir pelo trabalho[26]. O trabalho, quando mal exercido[27], ao invés de tornar-se algo dignificante para a elevação do ser torna-se para o indivíduo um grande fardo, que o leva a um determinado modo de opressão. O trabalho se torna opressor na medida em que o homem se torna dependente dele e ao mesmo tempo escravo. “O trabalho faz sentir de maneira fatigante o fenômeno da finalidade disparada como uma bala: trabalhar para comer, comer para trabalhar...”[28]. É uma ação mecânica que leva o indivíduo à alienação, pois o mesmo se escraviza dentro de um ciclo vicioso. Simone Weil destaca também a função do trabalho[29] referente ao indivíduo em relação a seu próprio modo de agir, pensar e sentir, sendo que o mesmo pode exercer uma função de exploração-opressão, ou então, de salvação, dependendo do ponto de vista que é dado ao mesmo. O trabalho assume um papel importante e quase que decisivo na vida de qualquer pessoa, pois, a ação do trabalho decide até mesmo uma vida boa, ou então, uma vida ruim.

A questão que devemos solucionar é se o trabalho deve ser encarado como um meio ou como um fim, pois, segundo Weil, o mal essencial da humanidade está em substituir os meios pelos fins. “A lei de todas as atividades que dominam a existência social, inclusive o trabalho, é, (...) que cada um nela sacrifique a vida humana, em si e em outrem, por coisas que não constituem senão meios de viver melhor”[30]. A utilidade do outro[31] se torna uma questão de necessidade para a sobrevivência dos indivíduos. Oprimir o outro se torna um significado para a minha sobrevivência, e tudo isso “(...) se resume à questão do poder”.[32] O poder difere aqueles que mandam daqueles que obedecem, e deste modo separa indivíduos, e as divisões se constituem em classes.

O poder é a regulação do sistema de opressão, e chega ser algo necessário para qualquer sociedade. O poder constitui a relação de governos, de movimentos, e até mesmo sistemas aos quais indivíduos estão inseridos, que se fazem mandantes, ou então, seres obedientes. O poder regula um meio social, e conforme a necessidade o mesmo é substituído. “De tempos em tempos, os oprimidos chegam a expulsar uma equipe de opressores e a substituí-la por uma outra, e às vezes mesmo a mudar a forma de opressão”[33]. A própria massa de oprimidos é capaz de depor um sistema de opressão, conforme a necessidade que a mesma sente de que isso deva ser exercido. A questão errônea se refere ao fato de que sempre existe a dependência de um poder superior e que por fim também oprime. A regulação e a necessidade de um poder só se torna válida quando a mesma assume um papel de ordem, caso contrário é um sistema de opressão. O problema está na questão de que indivíduos confundem essa função do poder e o têm como algo necessário para interferir e regular diretamente as suas vidas. Nesse caso mudam-se os poderes, mas se continua a possuir a (errônea) mentalidade de que o poder é uma espécie de “pai mandão” o problema continua a ser o mesmo, pois a opressão ainda permanece inserida nos sistemas. E, portanto, permanece a existência de indivíduos escravos e a inexistência de indivíduos libertos.

O indivíduo consciente do seu meio e com o sentimento de estado de liberdade buscará assim lutar dentro daquele sistema no qual ele está inserido e assim buscará afastar-se dos venenos da sociedade[34]. Deste modo, o indivíduo deverá buscar afastar-se dos venenos opressores e cultivar as virtudes necessárias para a sua verdadeira libertação[35]. Consequentemente, será mais feliz consigo mesmo, pois não mais mentirá para si próprio. Buscando, deste modo, viver a verdade. Podemos assim dizer que a busca da verdade está relacionada à questão referente à opressão individual, mais do que propriamente em relação à questão referente à opressão material[36]. Como veremos mais adiante, a pior opressão não é a social mas sim a individual.

Retornando à questão referente à opressão material[37] e tendo por base algumas ideias de Marx, podemos assim dizer que a opressão material é a instância ligada à opressão externa aonde um indivíduo se investe sobre outros desenvolvendo assim a exploração do homem sobre o homem. Basicamente, é a opressão do indivíduo pelo indivíduo que posteriormente se expande para o campo social.  Deste modo, dá-se aquilo que chamamos de opressão social. Certas circunstâncias do desenvolvimento humano produzem forças que se colocam entre o esforço e o fruto do esforço, o que produz o monopólio de alguns, que passam a dispor do destino daqueles de quem dependem, perecendo aí a igualdade[38]. É na relação entre indivíduos que se encontra uma brecha para que um possa se sobrepor ao outro. Através das desigualdades é que surgem os domínios e a opressão. O indivíduo mais enfraquecido cria uma dependência para com o outro necessitando de uma maneira ilusória daquele estranho poder do outro que não passa nada mais do que ser uma especialidade[39]. Em relação aos diferentes modos de opressão que ocorrem na sociedade, possuímos vários exemplos:

Os ritos religiosos são o espaço de inauguração do privilégio de alguns sacerdotes sobre o saber acerca dos poderes da natureza, o sacerdote hoje substituído pelo cientista e pelo técnico. O privilégio de controle sobre as armas possibilita o exercício da dominação dos guerreiros sobre os trabalhadores. A presença da moeda nas relações de troca entre os homens confere aos especialistas na organização das trocas o privilégio de prover-se, para viver, dos frutos do trabalho de outrem, e privar os produtores do indispensável.[40]

Ou seja, conforme cada especialidade surge também uma espécie de domínio. Uma nova espécie de poder que pode ser referente ao trabalho manual ou então ao trabalho intelectual[41]. A questão é que se exerce esse poder, e desta maneira a separação. Isso se dá através da luta pelo poder aonde se gera a opressão e ao mesmo tempo vai surgindo a dominação de uns que acaba se exercendo sobre outros, criando-se assim o poder que é gerado e praticado de várias formas dentro da sociedade.

O que podemos afirmar é que o poder é algo comensurável, criado pelo próprio ser humano, e desta maneira, não é uma questão referente a uma instância divina. Portanto, por ser de uma instância criada pelo ser humano é, deste modo, algo limitado e o mesmo tempo necessário. O próprio ser humano deixa-se oprimir pela ilusão do poder. Os poderosos fantasiam-se ou os próprios indivíduos é que fantasiam os poderosos, e assim fazem deles mais do que eles realmente são. Até mesmo mistificando-os e dando a eles a sensação de realmente serem detentores de uma espécie de poder extra, capaz de ultrapassar as barreiras do campo material e atingir o campo sobrenatural.  “Os poderosos – quer sejam padres, chefes militares, reis ou capitalistas[42] – acreditam sempre comandar em virtude de um direito divino; e os que a eles estão submetidos sentem-se esmagados por um poder que lhes parece divino ou diabólico, mas de qualquer forma sobrenatural”[43].

Como é da própria natureza do ser humano, é muito comum temer-se o desconhecido e mais comum ainda temer-se aquilo que é tido como místico, ou sobrenatural. Esta situação transforma-se numa grande cartada para criar-se um ponto de diferenciação, principalmente quando a questão diz respeito a poderes que exercem uma relação de opressão. É por isso que uns conseguem desenvolver essa diferenciação, seja pela criação de falsos mistérios ou então por algumas peripécias geradas de uma maneira aparentemente espetacular, para assim poderem garantir um bom terreno de controle e, assim, dominarem aqueles outros que, por algum motivo, não tiveram imaginação semelhante para também exercerem alguma forma de poder. Os que são tidos como especiais, que se mostram como divinamente diferentes ou então apresentam alguma especialidade[44] que os destaca dos outros, fazem-se detentores de algo que até para eles é tido como a mais pura verdade, sendo os mesmos convictos daquilo que praticam.

Os poderosos são capazes de acreditar na sua própria mentira e ainda fazer também com que os outros acreditem. Podemos assim dizer que são essas as diferenças que muitas vezes vistas como sobre-humanas fazem a distinção entre opressor e oprimido, dentro daquilo que corresponde às relações sociais. Aquele que consegue desenvolvê-las, ou melhor, especializar-se, se dará bem. Essas diferenças, na maioria das vezes, são caracterizadas por algo que só tem por objetivo dominar, mas que se demonstra de uma maneira camuflada como algo libertador. Porém que na sua verdadeira forma almeja não outra coisa a não ser adquirir um melhor espaço na sociedade, adquirindo assim, melhor status, estando categoricamente melhor que os outros. “Na realidade, em todas as sociedades opressivas, um homem qualquer, em qualquer categoria que se encontrar, depende não somente daqueles que estão colocados acima ou abaixo dele, mas antes de tudo do próprio jogo da vitória coletiva, jogo cego que determina sozinho as hierarquias sociais (...)”[45]. Deste modo, as diversas relações de opressão social se encontram diante de um jogo, que, porém, tem um custo muito alto.

Quaisquer que sejam os recursos de onde os exploradores tiram bens dos quais se apropriam, chega um momento em que tal procedimento de exploração, que era no início, à medida que se estendia, cada vez mais produtivo, torna-se em seguida cada vez mais custoso. Foi assim que o exército romano, que primeiro tinha enriquecido Roma, acabou por arruiná-la; foi assim que os cavaleiros da Idade Média, cujos combates no início tinham dado uma relativa segurança aos camponeses que se encontravam um pouco mais protegidos contra a pilhagem, acabaram, no decorrer de suas guerras contínuas, por devastar os campos que os nutriam[46]

A exploração acaba por gerar um fim em si mesma. Ela se torna um fim porque suga tudo o que pode, destruindo completamente até gerar o fim. Ou seja, ela não desenvolve, mas só regride na sua função, pois deteriora aquilo que deveria ser preservado para gerar-se uma continuidade, multiplicação, progresso, desenvolvimento, enfim... Ao se explorar, como o próprio termo já indica, se explora, se suga, se busca acabar com algo. Tirar sem repor é sinônimo de destruição e destruir é uma capacidade própria do ser humano, não há outro animal capaz de destruir tanto como o próprio ser humano e também de destruir a si próprio.  Essa destruição não vem de outra forma senão através da opressão dele sobre si e mais ainda sobre os outros e também sobre a própria natureza.

O ser humano ao conseguir a superação da natureza, ou seja, a libertação das forças naturais pelo progresso e organização social, acaba criando a opressão do homem pelo homem. Transformando-o em uma máquina, o leva a sugar e deteriorar o seu próprio meio, sem gerar-lhe uma transformação reflexiva e intelectual, pois faz dele um mero objeto que lida com os outros objetos que o cercam. Cabe então, segundo Weil, criar uma revolução para transformar essa relação e dessa forma promover uma inversão, a qual possa afastar cada vez mais o homem do hábito opressor, e fazê-lo retornar ao seu hábito natural que é o de relacionar-se intimamente com a natureza.

De certa maneira, essa relação de expandir as diversas formas de opressão parece tornar-se algo natural, aonde quanto mais se cresce mais consequentemente se deve oprimir. Ou seja, para eu me manter no poder e poder expandir esse poder, devo eu buscar dominar e oprimir mais e mais pessoas, para que assim eu possa me estabelecer enquanto sujeito dominante. Esse envolvimento demonstra até mesmo certa necessidade de relação na qual o homem não consegue mais separar-se e ir em busca de um novo caminho mais próximo da natureza. Quanto mais ele oprime, mais ele se afasta da sua natureza.

Se considerarmos o conjunto do desenvolvimento humano até hoje, se sobretudo compararmos as populações primitivas, organizadas quase sem desigualdade, a nossa civilização atual, parece que o homem não pode chegar a aliviar o jugo das necessidades naturais sem aumentar na mesma proporção o peso da opressão social, como que num jogo de equilíbrio misterioso[47]

Conforme o afastamento do indivíduo da sua relação de respeito e de igualdade sobre o outro, mais ele se vê afastado do seu primeiro modo de vida. Surge assim o aumento da opressão social e consequentemente o desequilíbrio social. Afastando cada vez mais os indivíduos e desenvolvendo a separação de classes e até mesmo a escravidão do homem pelo homem.

Podemos notar que primitivamente o homem não era escravo de nada, pois era livre para produzir o seu próprio alimento e viver simplesmente daquilo que ele plantou. Ao decorrer do tempo e do desenvolvimento das sociedades, os indivíduos passaram a se sobrepor uns sobre os outros de uma maneira que o domínio fosse a voz e a própria vez do controle. Alguns se intitulavam com mais poder que outros gerando assim os primeiros sistemas de opressão aonde os tidos como mais fracos trabalhavam para os mais fortes. Cada vez mais o sentido de coletividade foi se perdendo e a busca de dominação da natureza como da força humana foi-se desenvolvendo rumo ao objetivo da incessante busca pelo poder.

Inicialmente o homem não podia ser escravo, pois simplesmente buscava aquilo que era necessário para a sua sobrevivência e nada mais do que isso. De uma maneira simples ele recolhia o necessário para o seu viver. Porém, se relacionarmos o homem primitivo com o homem atual, veremos que de certo ponto há uma grande diferença daquele para esse. Mas, se nos basearmos através de outro olhar, veremos que a necessidade da sobrevivência sempre foi algo pertinente e natural na relação entre indivíduos. Além disso, veremos também que desde muito tempo existiu um sistema que dita as regras do jogo social através da opressão. O trabalhador torna-se assim sempre dependente de um sistema que o coordena, que diga o que o mesmo tem que fazer.  

Podemos também afirmar que tanto no modo primitivo de vida como no modo de vida em que o trabalhador torna-se desnecessariamente “dependente” do seu patrão, os modos de opressão tornam-se inteiramente iguais, pois tanto em um como em outro o indivíduo torna-se preso a um determinado estado. Assim, perceberemos que as relações de opressão são presentes nos diversos sistemas pelos quais os indivíduos passaram dentro de suas sociedades. A diferença é que atualmente presenciamos a relação de opressão do trabalhador moderno e ao mesmo tempo o seu afastamento das suas raízes.

Os esforços do trabalhador moderno lhe são impostos por um constrangimento tão brutal, tão impiedoso e que o oprime de tão perto quanto a fome oprime o caçador primitivo até o operário de nossas grandes fábricas, passando pelos trabalhadores egípcios tratados a golpes de açoite, pelos escravos antigos, pelos servos da Idade Média que a espada dos senhores constantemente ameaçava, os homens nunca deixaram de ser impelidos ao trabalho por uma força exterior e sob pena de uma morte quase imediata[48].

Assim, o trabalhador vive sempre sob o medo e dessa forma continua a seguir as regras impostas para assim poder se manter no seu trabalho, mesmo que esse trabalho não o satisfaça. O indivíduo encontra-se assim inserido em um sistema servil e apto somente para produzir, no qual o mesmo tem que obedecer devido às regras instauradas. Dentro desse sistema o objetivo é somente gerar lucros, e deste modo acaba levando-o a um estilo de vida movido somente para a produção e para o enriquecimento. O errado nessa questão é que ao invés dele produzir para si ele é obrigado a produzir para os outros, pois o mesmo não possui as condições suficientes para conseguir produzir para si. Deste modo, é uma forma de vida na qual ele não consegue suprir as suas verdadeiras necessidades.

Por natureza, todos os indivíduos são seres de necessidades. As necessidades que me detenho a falar são aquelas que dizem respeito àquilo que é “essencial” para um bem viver do indivíduo que é encontrado no sistema de vida primitivo aonde o indivíduo se relaciona intimamente com a natureza.

A vida primitiva é algo facilmente compreensível; o homem é aguçado pela fome, ou pelo menos pelo próprio pensamento lancinante de que logo será tomado pela fome, e parte em busca de alimento; ele treme sob o império do frio, ou ao menos pelo raciocínio de que logo terá frio, e procura coisas boas para criar ou conservar o calor; e assim por diante[49].

De uma maneira simples, no modo de vida primitivo o homem seguia o seu instinto, buscava na simplicidade manter-se somente para a sobrevivência buscando alimento para si e para os seus e nada mais do que isso. O que transformou esse hábito[50] foi próprio daquilo que podemos chamar de desenvolvimento da cultura. A cultura se tornou a principal responsável por exercer essa relação de continuidade ou até mesmo de transformações sociais. É graças a ela que os antigos puderam passar seus conhecimentos, tradições e costumes para os mais novos. Assim, aos poucos foi-se gerando uma continuidade, podemos assim dizer, desenvolvimentista, a qual ao mesmo tempo foi tornando-se cada vez mais complexa. Através da cultura surgem as transformações que desenvolvem o chamado progresso, pois exerce uma transformação na realidade da sociedade e busca assim de certo modo trazer melhorias que visem aparentemente uma construção dignificante e enaltecedora do ser.

Quando culturas distintas se entrecruzam, ou melhor, entram em relação, em contato, acontece aquilo que chamamos de choque cultural[51], como por exemplo,

Um missionário que persuade um polinésio a abandonar suas tradições ancestrais, tão poéticas e tão belas, sobre a criação do mundo, pelas do Gênesis, impregnadas de uma poesia muito semelhante, esse missionário extrai sua força persuasiva da consciência que tem de sua superioridade de homem branco, consciência fundada sobre a ciência[52].

Nesse caso, por exemplo, o modo de opressão se dá através do conhecimento científico aonde o missionário pensa fazer-se mais sabedor que o nativo, pois o mesmo através do seu peculiar modo de vida acha que está conduzindo o polinésio para um desenvolvimento intelectual-científico. O que ele não percebe é que o polinésio tem a sua própria cultura e modo de conhecimento, que, embora sendo distinto do conhecimento do missionário, é tão válido quanto. Outro caso que Weil cita como exemplo referente à força persuasiva de consciência é a relação de um professor com um padre: “Um professor primário de vilarejo que zomba do padre, e cuja atitude dissuade as crianças de irem à missa, extrai sua força persuasiva da consciência que ele tem de sua superioridade de homem moderno sobre um dogma da Idade Média, consciência fundada sobre a ciência”[53]. Nesse caso, ele coloca a ciência como sendo algo superior a um dogma, deste modo, a relação de superioridade está relacionada mais à temporalidade do que à própria questão de valores, aonde a ciência, nesse caso, se torna superiora às questões ligadas à fé.

Deste modo, a opressão se dá através da força persuasiva da consciência que tenta impor o seu modo de pensar sobre outras instâncias. Nesses casos também podemos afirmar que trata-se de um modo de opressão. Assim, é correto afirmar que as culturas distintas promovem separações aonde os tidos como “superiores” buscam persuadir os tidos como “inferiores”. A ciência encobre, ilude, camufla, mascara aqueles que a buscam como solução de tudo e muitas vezes os fazem sentir-se superiores. O que não se percebe, e em vários casos, é que aquele povo mais simples tem muito mais a ensinar ao “homem civilizado” do que propriamente ser “doutrinado”, ou então, “civilizado”.

Afirmo, deste modo, que o progresso das relações do homem com a natureza parece estar inteiramente ligado às relações referentes à opressão social, ou seja, parece que quanto mais se gera progresso, consequentemente, mais se gera opressão social e ao mesmo tempo um afastamento das origens sociais e até mesmo pessoais, ou como a autora Simone Weil nomeia, um afastamento do indivíduo de suas verdadeiras raízes. O desenraizamento se dá quando o indivíduo afasta-se das suas origens, perde a sua identidade, quando o mesmo busca achar-se naquilo que o faz perder-se cada vez mais.

O indivíduo ao olhar para a sua realidade e aceitá-la como a mais plena verdade estará assim encontrando a sua verdadeira salvação, pois não mais buscará fugir ou então submeter-se a uma fantasia. A verdade encontra-se, portanto, no mais simples, e não no mais complexo, de modo que aceitar a sua realidade já é um grande caminho para se chegar a verdadeira plenitude. “Cualquier espíritu que há llegado a ser capaz de captar pensamientos inexpresables por la multitud de relaciones combinadas, aunque más rigurosos y más luminosos que los expresa el lenguaje más preciso, cualquier espíritu que há llegado a esse punto vive ya en la verdad”[54]. Desse modo, quanto mais o indivíduo afasta-se da opressão, das mentiras e das fantasias, mais ele se aproxima da verdade, da liberdade e da salvação.  Essas são antagonias que se presenciam no cotidiano e que ao mesmo tempo se fazem naturais dentro do nosso dia-a-dia, sendo que as primeiras envenenam o ser e as segundas o afastam do envenenamento.

 
4 CAUSAS DA LIBERDADE

 

 

Podemos afirmar que por razões da própria natureza humana, o indivíduo busca sair de um determinado estado que o oprime e que o impede de se desenvolver, buscando assim, a liberdade, de tal modo que o indivíduo pretende afastar-se, livrar-se da opressão e aproximar-se cada vez mais do estado de liberdade.

Ao lermos às obras de Simone Weil percebemos que, segundo a sua visão, há muito tempo o homem vem buscando emancipar-se, encontrar uma liberdade, buscar algo que o leve rumo a uma felicidade que o deixe em plena realização e que o faça entrar em um estado de plenitude. Essa questão ultrapassa povos, culturas e sociedades, pois é algo presente em todos os indivíduos. Ressalta-se com isso que a liberdade é um anseio mais subjetivo do que social. Embora ao longo da história percebamos a presença de muitas lutas sociais, podemos assim dizer que não passaram nada mais do que a substituição de um regime opressor pelo outro. A liberdade, portanto, mesmo sendo também uma questão social, não consegue ser alcançada somente através do campo social, pois até mesmo dentro de um meio social que existe liberdade externa garantida, há indivíduos que ainda sentem-se presos. Nesse caso, a liberdade diz respeito a uma necessidade subjetiva, que na maioria das vezes não está nada relacionada à questão social. É um estado individual que, portanto, é mais complexo que a liberdade social. A liberdade social se torna mais fácil de ser alcançada na medida em que se buscam soluções aparentes, ou seja, são vários indivíduos que compartilham de um mesmo ideal de liberdade. Quando tratamos de algo relativo ao social, lidamos deste modo com convenções, tornando-se até mais fácil de compreender aquilo que os indivíduos buscam e entendem por liberdade.

No que diz respeito à liberdade social, sabemos, também, que os indivíduos são movidos pelos sistemas, grupos e poderes que os levam a unirem-se, a lutarem por uma causa semelhante, gerando-se assim a união de causas subjetivas que, devido à união das mesmas, se tornam semelhantes e, portanto, sociais. É correto afirmar que um grupo é mais fácil de ser compreendido do que somente um indivíduo, pois, o grupo partilha de semelhanças. Weil, para melhor explicitar essa questão, trabalha com o exemplo das civilizações egípcia e grega, aonde a mesma cita a Grécia como o principal modelo de sociedade. Para Weil o modelo de civilização grega fora o que mais conseguiu se aproximar de um estado ideal de liberdade social. Sua organização social alcançou vários objetivos (cultura, política, ...), embora para um número muito pequeno de indivíduos. Mas mesmo assim, podemos afirmar e louvar o seus métodos organizativos. Embora tenha sido uma sociedade aonde somente em torno de 10% da população participava das ações políticas, a mesma conseguiu exercer, de certa maneira, uma relação de igualdade entre indivíduos.

Cabe destacar que Weil possuía um apreço especial pelo modelo de civilização grega, mas que, segundo ela, também não deixou de apresentar algumas falhas. Uma das principais questões que Weil critica é que a civilização grega ficou somente na desenvoltura do trabalho intelectual e o esquecimento do trabalho manual. Além disso, Weil faz uma comparação, citando um outro extremo que é o caso da civilização egípcia que ficou somente na desenvoltura do trabalho manual.

Deste modo, temos Egito e Grécia[55], com distintos sistemas de liberdade e distintos modos de compreender a relação do trabalho: “O Egito é o sistema de castas representativo da sociedade; a Grécia, o momento de liberdade interior pura em que cada um é um fim para si mesmo e para os outros, em que se vivem a independência e o lazer.”[56]

            A principal diferença é que a Grécia consegue atingir o auge da liberdade interior, sendo isso para Weil algo muito importante, naquilo que diz respeito ao bem estar do indivíduo. Pois, nessa sociedade havia tempo e oportunidade para a desenvoltura do ser. Fazendo com que os mesmos pudessem tranquilamente desenvolver a sua liberdade interior. A questão é que o trabalho manual não era visto com bons olhos e isso influenciava para que os indivíduos não conseguissem encontrar a sua verdadeira plenitude. “A Grécia, de fato considerava o trabalho algo servil[57]. As ocupações dignas do homem eram a política, a eloquência, os jogos, as artes, a geometria e a filosofia.”[58] Com essa separação se valorizava somente aqueles que conseguiam desenvolver as áreas intelectuais já que as mesmas eram de suma importância para o bom andamento da sociedade. O que, segundo Weil, os gregos não perceberam é que a verdadeira liberdade não poderia ser encontrada no exercício do trabalho intelectual. Deste modo, podemos ver uma distinção referente às relações sociais aonde, de um lado, uma sociedade vivencia um sistema de liberdade inteiramente social (Egito), por assim dizer, mais massificado, e que também observa o trabalho como algo escravo; e, de outro lado, outra extremidade que é o caso da Grécia, aonde o desenvolvimento da liberdade individual é privilegio de uns poucos, e, ao mesmo tempo, o trabalho como sendo uma simples atividade. “O trabalho que os gregos valorizavam era a atividade na medida em que ela não tinha relação alguma com a necessidade, finalmente, na medida em que ela não era um trabalho mas seu exato oposto, o lazer[59]”.

Cabe destacar que ter-se a visão do trabalho restrito à ação (no sentido grego de trabalho intelectual) lazer é algo muito importante para a elevação do estado de liberdade do indivíduo, pois, o trabalho, desta maneira, acaba assumindo uma função boa. A questão grega está no trabalho como sendo algo que é tido somente como um lazer e não o trabalho como sendo ao mesmo tempo um lazer e uma necessidade. O trabalho[60], portanto, para os gregos é entendido mais como uma atividade (ação) do que propriamente uma necessidade e, deste modo, escraviza ainda mais aqueles que não dominam o trabalho intelectual.

Simone Weil ao trazer a questão do trabalho manual e do trabalho intelectual pretende evidenciar um sistema divisor e assim criticar essa separação que acontece na Grécia aonde os indivíduos separam o trabalho intelectual[61] (lazer-necessidade) do trabalho manual (lazer-necessidade). No caso da civilização egípcia se valorizava mais a influencia do trabalho manual, o oposto da civilização grega que se evidenciava pelo trabalho intelectual. Essa separação do trabalho em intelectual e manual, e a valorização do trabalho intelectual, característico da cultura clássica grega, de acordo com Weil impede o crescimento individual porque fragmenta o homem. O homem que exerce somente um dos trabalhos, seja o trabalho intelectual ou então o trabalho manual, torna-se um ser dividido. Essa separação deixa o indivíduo preso, coibindo que o mesmo permaneça livre para um bem viver, pois impede que o mesmo possa exercer e dominar as duas formas essenciais de trabalho (intelectual e manual) que o levaria a melhores condições de vida. 

Essa separação acaba impedindo que se possa exercer a verdadeira liberdade individual, que é aonde Weil diz que o trabalho deixa de ser trabalho, pois assume outra função. “El punto de unión del trabajo intelectual y del trabajo manual es la contemplación, que no es un trabajo”[62]. O trabalho deixa de ser trabalho porque torna-se um objeto da contemplação aonde o mesmo liberta o indivíduo de suas amarras. Ao contemplarmos o trabalho como algo necessário para a nossa edificação não mais o veremos como algo ruim, mas como algo necessário para a nossa vida e que responde àquilo que procuramos referente à liberdade.

Um exemplo da relação de união de trabalho intelectual com o trabalho manual são as formas primitivas de vida.

Nas formas completamente primitivas da produção, caça, pesca e coleta, por exemplo, o esforço humano parece uma simples reação à pressão inexorável constantemente exercida pela natureza sobre o homem, e isso de duas maneiras: primeiro ele se realiza, quase inteiramente, sob o constrangimento imediato, sob o aguilhão continuamente sentido das necessidades naturais; e por uma consequência indireta, a ação parece receber sua forma da própria natureza, por causa do papel importante que nela assumem uma intuição semelhante à do instinto animal e uma paciente observação dos fenômenos naturais mais frequentes, por causa também da repetição indefinida dos procedimentos que frequentemente deram certo sem que se saiba por que, e que são, sem dúvida, vistos como sendo acolhidos pela natureza com uma benevolência particular.[63]

Neste exemplo vemos que o indivíduo não se esforça para produzir em larga escala, pois, constrói uma íntima relação com a natureza que o leva a agir somente pelas suas necessidades quase que instintivamente, não se preocupando com um grande número de produção e por suntuosos resultados. Ele é somente dedicado para uma necessidade que o leva a nada mais do que a sua simples sobrevivência. Deste modo, o indivíduo contempla as suas ações referente à natureza e busca assim contentar-se com aquilo que pratica estando livre para o seu bem viver e feliz pelas coisas úteis que ele produz.

 
5 O QUE É LIBERDADE

 

 

A Liberdade é um conceito que pode ser compreendido por diversos olhares, tanto pelo olhar social, político, etc. A questão de Weil refere-se a uma liberdade que ultrapassa o campo social e que se transfere para a questão individual. A mesma define a liberdade deste modo:

Pode-se entender por liberdade outra coisa além da possibilidade de obter sem esforço aquilo que agrada. Existe uma concepção bem diferente de liberdade, uma concepção heroica que é aquela do senso comum. A verdadeira liberdade não se define por uma relação entre o desejo e a satisfação, mas por uma relação entre o pensamento e a ação[64]; seria completamente livre o homem cujas ações procedessem todas de um julgamento prévio concernindo ao fim que ele se propõe e ao encadeamento dos meios próprios para levar a esse fim.[65]

Cabe ao indivíduo relacionar corpo e mente para assim poder promover a sua verdadeira ação em relação à liberdade. De certa forma, é um estar bem, um sentir-se livre que é capaz de promover uma verdadeira sensação de liberdade, tanto do corpo como também do pensar.

O pensar é algo único do indivíduo e que ao mesmo tempo é aquilo que de mais livre nós possuímos, pois, ninguém, além de nós, consegue ter acesso. É o pensamento que nos leva à ação e que, portanto, se transfere de um campo inteiramente livre e subjetivo para um campo de inteira prática que só se exerce graças e primeiramente ao iniciante modo de pensar. O pensamento é o que temos de mais livre e que, portanto, se bem exercido, nos proporciona a liberdade do corpo. Essa interelação de corpo e pensar é que livra o indivíduo da opressão, pois, o mesmo acaba exercendo assim distintas faculdades que devem trabalhar juntas para, assim, gerar-se a harmonia do indivíduo. Portanto, o pensamento não é algo que deve ser praticado separadamente do corpo, caso isso ocorra o indivíduo escraviza-se. “O pensamento é por essência livre e soberano, quando se exerce realmente[66].” E é esse o pensamento que leva a verdadeira libertação.

Assim, o homem não deve ser somente um ser livre e pensante, mas também, deve conciliar pensamento e ação, assim como também deve conciliar o trabalho manual com o trabalho intelectual. Isso é, portanto, uma superação do modelo da civilização grega. É outra espécie de liberdade um tanto mais elevada. O indivíduo que se faz livre para o seu modo de pensar não se torna escravo e, ao mesmo tempo, não busca meios para escapar do pensamento. Ele exerce sobre si uma capacidade própria, inteira, e que é só dele. E desse modo consegue caminhar rumo ao estado de liberdade. Só é capaz de gerar a liberdade aqueles indivíduos que conseguem desenvolver a capacidade da reflexão para a dominação daqueles que por uma coisa ou outra não conseguiram desenvolvê-la. Àqueles que não conseguiram dominar o seu pensamento não lhes resta outra coisa a não ser obedecer.

Portanto, é o indivíduo que deve aprender a exercer essa liberdade do pensar, pois, “(...) o pensamento só se forma num espírito que se encontra só diante de si mesmo; as coletividades não pensam.”[67] A própria liberdade do pensar é capaz de gerar uma elevação do indivíduo, ou seja, uma sensação que nunca pode ser experenciada de uma maneira coletiva. Pois, a força social exercida sobre as massas não consegue se equilibrar diretamente com a verdade, já que as coletividades não suportam manterem-se por muito tempo em uma situação de pensar que possa manter-se em sintonia. “A força social não se sustenta sem mentira. Tudo o que existe de mais elevado na vida humana, todo esforço de pensamento, todo esforço de amor também é corrosivo para a ordem. O pensamento pode, a justo título, tanto ser descreditado como revolucionário, de um lado, como contra-revolucionário, de outro”[68].

É dessa forma que as massas não conseguem fazer outra coisa a não ser obedecer, pois, “los hombres en colectividad no tienen acceso a lo impersonal, ni siquiera em sus formas inferiores”[69] e é por isso que cabe a cada um desenvolver a arte do pensar-refletir. É essa arte que o liberta e o leva a um novo modo de viver livre, pois, “(...) o homem nada tem de essencialmente individual, nada tem que lhe seja absolutamente próprio, se não essa faculdade de pensar”[70]. É correto assim afirmar que é o próprio pensar que é tido como algo de mais valioso que um indivíduo possui. O pensamento livre e bem praticado o leva a distintos modos de analisar a realidade como também de realmente exercer o verdadeiro trabalho-livre.


6 O TRABALHO

 

 

Para fugir da opressão, cabe ao homem desenvolver uma busca rumo a sua própria naturalidade. Fugir daqueles meios que o oprimem e lutar pela sua verdadeira liberdade. Deste modo, “Simone Weil adota o ponto de vista freudiano, segundo o qual o trabalho absorveria um potencial considerável de energia, a qual, na falta de ser assim direcionada – para o trabalho – tomaria a forma de agressão do homem contra o homem[71].” Para ele fugir deste modo de agressão, deve antes de tudo encontrar-se com suas próprias raízes. Estar cada vez mais próximo dos seus meios naturais e assim interligado com a natureza. O mesmo deve sempre buscar interligar a sua liberdade com as suas necessidades, buscando, dessa forma, suprir duas questões necessárias para o bem viver e fazer do trabalho, o principal meio para o seu bem viver, pois, “(...) o próprio trabalho pode ser uma exigência da própria natureza e (por que não) a prioritária”[72]. O próprio trabalho faz do indivíduo um novo ser construtor, faz dele um ser de mudanças capaz de estabelecer diferenças tanto coletivas como também individuais, pois a pessoa elevada e estando em sentimento de liberdade estará assim acima de tudo aquilo que é referente à questão humano-social. A pessoa estando em um estado de paz e tranquilidade proporcionará uma interelação na qual desenvolverá um encontro em direção à transformação sua e também à transformação do outro. Para Weil, há que se buscar aquilo que o homem perdeu durante o seu desenraizamento. “Nós queremos devolver ao homem, isto é, ao indivíduo, a dominação que ele tem por função própria exercer sobre a natureza, sobre os instrumentos, sobre a própria sociedade”[73]; Fazê-lo retornar as suas origens, relacioná-lo com o trabalho enquanto “trabalho-livre”,

“(...) restabelecer a subordinação das condições materiais do trabalho em relação aos trabalhadores; e, em vez de suprimir a propriedade individual, ‘fazer da propriedade individual uma verdade, transformando os meios de produção... que servem hoje sobretudo para subjugar e explorar o trabalho, em simples instrumentos do trabalho livre e associado”[74].

É a própria busca por um trabalho mais digno e libertador que leva o indivíduo a um estado de liberdade através da contemplação[75] do seu próprio trabalho. O trabalho desta forma é visto enquanto função de crescimento individual, pois se o mesmo é exercido com aquilo que Weil chama de atenção será desenvolvido no indivíduo tanto a atenção do corpo como também a atenção do espírito, pois são esses exercícios que levarão o indivíduo a uma verdadeira compreensão da utilidade do trabalho. “Os movimentos do corpo e a atenção do espírito são função das exigências do utensílio, que é ele próprio adaptado à matéria do trabalho”[76]. O trabalho dessa forma exerce a função de levar o indivíduo a àquilo que é chamado por Weil de estado de graça.

Notamos claramente que é da própria natureza do homem trabalhar, de desenvolver o trabalho de uma forma construtiva e não de uma maneira destrutiva e exploradora. Deste modo, é correto afirmar que o ser humano é um ser gerado para a libertação e não para a opressão, sendo que esse deve por si só encontrar essa forma de libertação, que para Weil, de uma maneira prática, pode ser encontrada através do trabalho. Cabe ao indivíduo exercer a função do trabalhador, podendo livremente lidar com suas próprias vontades e achar-se por si só um homem em sentimento de liberdade, mas que esteja ao mesmo tempo comprometido com o seu trabalho. Como a própria autora diz, que ele possa envolver-se em um “trabalho livre” e dessa forma contribuir para a construção de uma sociedade ideal. “A independência, a liberdade e a igualdade (individuais) seriam alguns dos pontos fundamentais para se construir uma sociedade capaz de servir de moldes para a fundamentação de uma sociedade ideal”.[77] Estas são algumas necessidades básicas para se manter uma ordem e um certo equilíbrio. “A independência, por exemplo, serviria para livrar o indivíduo da compra. Por exemplo, um operário que possui um jardim grande o suficiente para provê-lo de legumes é mais independente do que seus companheiros que devem obter todo o alimento dos comerciantes”;[78] Assim, a independência do alimento já é um ponto chave que determina a liberdade do indivíduo em relação à dependência da compra e também dos instrumentos de produção.

Outro exemplo a destacar é o do artesão, “(...) um artesão que possua seus instrumentos é mais independente que um operário de fábrica cujas mãos se tornam inúteis quando o patrão resolve lhe retirar o uso de sua máquina”[79]. Vemos assim, que para se obter um trabalho livre é necessário que o indivíduo, referente à questão social e até mesmo em relação ao seu patrão, construa uma liberdade e ao mesmo tempo uma independência diante daquilo de que ele necessita dos outros para a sua sobrevivência. Portanto, Weil busca definir como ideal um “trabalho livre” como sendo aquele trabalho no qual o indivíduo possa ser independente em relação ao seu modo de produção, que o mesmo consiga apropriar-se da sua função, tornando-a intimamente sua, parte de sua vida. Além disso, cabe a ele contemplar a sua obra, principalmente por duas coisas: pela sua própria maneira de ser trabalhador e produtor e também pela produção de algo que será de grande utilidade para os outros.

Como a própria autora demonstra em seus escritos, ela tem por objetivo propor o retorno do indivíduo em relação ao seu processo de reenraizamento[80], ou seja, à questão do mesmo de retornar às suas próprias origens. Se formos pegar à questão do trabalho referente à sua origem, o mesmo tinha nas civilizações mais antigas um caráter místico, os povos tinham por objetivo “(...) fazer dele a expressão direta da fé”[81]. E deste modo o trabalho era tido como algo divino e estava inteiramente ligado a Deus.

Cabe assim destacar que durante o seu tempo de vida, Weil acaba percebendo que o ponto central, praticamente a razão do existir do indivíduo está relacionada ao trabalho, pois, é o mesmo que estabelece o bem viver e o sentir-se pleno. É só através do trabalho que se encontrará a graça, a verdade e a mais plena liberdade.  É necessário, portanto, que o indivíduo busque se enraizar e, deste modo, voltar as suas origens, para assim encontrar-se consigo mesmo e, através do trabalho, tornar-se um indivíduo pleno e feliz.

 
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

 

Ao concluirmos o referido trabalho, nota-se que buscamos evidenciar no pensamento de Simone Weil a necessidade e a importância de um encontro consigo mesmo. A autora em sua vivencia demonstra que o indivíduo ultrapassa o campo social e que só encontrará a verdadeira liberdade ao encontrar-se consigo (e com Deus). De modo que a liberdade social é uma mera utopia quando pensamos que a mesma solucionará todos os problemas do indivíduo. Ela é meramente um acesso, um caminho que facilita para que o indivíduo possa libertar-se interiormente. Mas não há como negar que a liberdade social é somente uma solução que diz respeito somente à questão externa, e não propriamente à questão subjetiva.

Cabe também ressaltar a importância da união entre pensamento e ação, pois é essa prática que auxiliará para que o indivíduo possa realmente viver a sua realidade e não inserir-se dentro de um sistema de alienação que não lhe gera outra coisa a não ser opressão. Portanto, um indivíduo livre é aquele que consegue exercer essa prática que une a teoria e a prática, gerando assim uma práxis. A práxis, portanto, estabelecerá a liberdade subjetiva.

Weil, ao percorrer um caminho da história da humanidade, demonstra a própria relação que o indivíduo possuía com a natureza. Na sua própria simplicidade, o mesmo buscava simplesmente suprir as suas necessidades básicas, e desta forma, o mesmo permanecia enraizado dentro do seu meio, se fortalecia, conjuntamente com o seu grupo e dessa forma conseguia sentir-se livre. O indivíduo livre é aquele que preserva, que se enraíza, que contempla e que faz do seu trabalho um próprio mistério. Pois é o trabalho a razão do viver, é o trabalho que gera o caminho rumo à liberdade. Aquele indivíduo que trabalha livremente, que não vê o trabalho como obrigação, mas sim como um lazer, certamente encontrar-se-á em seu verdadeiro estado de liberdade. Pois como diria Weil, aonde está o trabalho bem exercido está também Deus.

Devo destacar que pretendo me expandir nos estudos da autora, pois, não consegui nesse trabalho tratar a questão do estado da graça que para Weil é de suma importância para a espiritualidade do indivíduo. Cabe assim dizer, que a graça é o estado final, ou seja, o resultado da união entre oração e contemplação do trabalho. Portanto, deixo assim, a abertura para a continuidade de um trabalho posterior.

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[1] Son extraordinaire intelligence et as culture philosophique lui permirent une connaissance et approfondie des grands théoriciens socialistes, en particulier de Marx p.8. WEIL, Simone. La condition ouvriére. Paris: Les Éditions Gallimard, 1951, 375 pp. Collection idées, no 52.

[2] Podemos assim dizer segundo os estudos que Weil abraça algumas concepções de Marx, principalmente do que diz respeito ao livro III do Capital. CHENAVIER, Robert. Civilização de trabalho ou civilização do lazer?

[3] PIRES, Marília Freitas de Campos. O materialismo histórico-dialético e a educação. Arquivo acessado dia 06/06/2012, às 12:11. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v1n1/06.pdf

[4] Arquivo acessado dia 06/06/2012, às 12:23. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v1n1/06.pdf

[5]Arquivo acessado dia 14/06/2012, às 17:29. Disponível em: http://moderne.canalblog.com/archives/2010/02/17/16884846.html

[6] WEIL, Simone. La condition ouvriére. Paris: Les Éditions Gallimard, 1951, 375 pp. Collection idées, no 52.

[7] D’abord, elle Mena son expérience à fond, et avec la plus grande honnêteté, s’isolonat de sa famille, vivant das lês mêmes conditions matérielles que sés compagnes d’atelier(p.10). Idem

[8] “La vita in fabbrica: non è um destino, per lei, ma Il risultado di uma decisione volontaria.” GIACOPINI, di Vittorino. Simone Weil: l’oppressione e il gioco del potere di cui tutti sono vittime

[9] “La verdadera libertad no se define por una relación entre el deseo y la satisfacción sino por una relación entre el pensamiento y la acción. Seria totalmente libre el hombre cuyas acciones procedieran todas de un juicio prévio sobre el fin propuesto y el encadenamiento  de los medios proprios para llevar a este fin.(p.29)” WEIL, Simone. Reflexiones sobre lãs causas de la libertad y de la opressión social.

[10] “Y sin embargo nada em ele mundo puede impedir al hombre sentirse nacido para la libertad. Jamás, sea como fuere, puede aceptar la servidumbre, pues piensa. Jamás há dejado de soñar uma libertad sin limites, ya com una felicidad futura a la que tendría derecho por uma espécie de pacto com una providencia misteriosa.”(p.28) Idem

[11] Podemos assim exemplificar com o mito do elefante e do rato em que o elefante teria medo de que o rato entrasse em sua tromba matando-o asfixiado. Ao nosso ver um rato parece algo insignificante em relação ao seu tamanho o mas para o elefante aquele animalzinho seria o motivo de um grande espanto tornando-se assim por causa do medo “um grande monstro”.

[12] LEITE, José Vieira. Texto base para a palestra opressão do trabalho. Rio de Janeiro: 2011. (Manuscrito).

[13] O que constitui o enraizamento: 1) Liberdade e Obediência; 2) Igualdade e Hierarquia; 3) Honra e Punição; 4) Segurança e Risco; 5) Propriedade privada e propriedade coletiva.Esse enraizamento implica em um triplo enraizamento: no mundo sensível; na aspiração a um bem transcendente; numa comunidade cujo papel é o de articular as duas primeiras dimensões, a saber, as necessidades da alma e as necessidades do corpo. Arquivo acessado dia 22 de maio de 2012, às 21:00. Disponível em: http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2904&secao=313

[14] WEIL, Simone.  O Enraizamento. São Paulo: EDUSC, 2001. p.13-14

[15] Vemos claramente que é uma questão ontológica que está inteiramente ligado àquilo que Weil denomina de “necessidades da alma”. Caso a alma não seja suprida o homem por conseqüência adoece. Por isso que o dezenraizamento é tudo aquilo que afasta o homem das suas verdadeiras necessidades, como por exemplo, o trabalho excessivo, o pouco convívio com a sua família, etc.

[16]  GIACOPINI, di Vittorino. Simone Weil: l’oppressione e il gioco del potere di cui tutti sono vittime

[17] CAMUS, Albert. Simone Weil – Actualidade de uma estranha mística para o nossos estranhos tempos. p.1

[18] Segundo estudos do autor francês Robert Chenavier a autora Simone Weil busca aquilo que ela chama de “metaxu, ou seja, uma realidade temporal e social que permite à alma abrir-se ao sobrenatural, ou este nela enraizar-se.” CHENAVIER, Robert. Civilização de trabalho ou civilização do lazer?

[19]Arquivo acessado dia 24/08/2012, às 12:02. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/escolar/frances/index.php?lingua=frances-portugues&palavra=malheur MAIA, Thais Lemos de Oliveira. Simone Weil: Pensamento Moderno e razão supranatural. p.25

[20] WEIL, Simone. La persona y lo sagrado. Escritos de Londres. (1942) p.2

[21] Não existe bem que seja material quando tratamos de um bem subjetivo. A virtude do bem diz respeito ao campo do sobrenatural pelo fato de que o mesmo, não pode ser experenciado, e desta maneira, é algo místico, que realmente não consegue ser confirmado a sua existência através da matéria. Já a prática do bem coletivo já diz respeito a outra instância, aonde o mesmo, pode ser visto através da própria prática.

[22] A concorrência humana leva por consequência a separação dos indivíduos e isso também influencia para que os “mais aptos a concorrerem se sobreponham aos outros”, gerando assim a opressão. É certo afirmar, que a concorrência não é uma atitude anormal, mas sim, uma atividade natural do ser que busca pela sua própria necessidade, lutar, sobreviver e crescer dentro do seu meio. Assim, é certo também justificar a necessidade em que o indivíduo tem de ser “ambicioso”, já que isso já está contido por natureza dentro do mesmo.

[23] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.101

[24] Indivíduos que se agrupam por características peculiares, seja por questão de cultura, modo de vida, etc.

[25] LEITE, José Vieira. Contemplativo na ação: notas sobre a questão do sentido no trabalho contemporâneo. Revista Opus Magis, Centro Loyola de Fé e Cultura. PUC – Rio. Número 2, Janeiro – 2004. p.80

[26] Mais adiante no capítulo 6 explicitaremos mais sobre o tema do trabalho.

[27] Veremos mais adiante no capítulo 6 as conseqüências que um trabalho mal exercido pode trazer.

[28] Arquivo acessado dia 16/08/2012, às 10:45. Disponível em: http://almanaque.folha.uol.com.br/filosofiasimoneweil.htm

[29] Na capítulo veremos mais aprofundadamente a relação do trabalho referente ao homem que pode ser tido como algo bom ou algo ruim, dependendo da maneira na qual ele é praticado.

[30] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.90

[31] Nesse caso o outro é o trabalhador oprimido que se torna uma engrenagem importante para que assim os outros possam crescer através dele.

[32] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.91

[33] Idem. p.91

[34] Os chamados venenos da sociedade são práticas erradas que o indivíduo exerce, pois ao invés de libertá-lo, acaba oprimindo-o cada vez mais.

[35] Ou seja, aquele estado de sentimento de plenitude, que o dignifica, que o torna mais feliz e participativo dentro do seu meio. Esse é o verdadeiro estado de liberdade.

[36] Só o indivíduo pode alcançar a verdadeira liberdade não às massas sociais que nesse caso são pura matéria, pois as massas não conseguem alcançar o campo do sobrenatural.

[37]A opressão material está relacionada somente à matéria, ou seja, as relações em que o indivíduo passa no seu meio social, porém, são condições referentes somente ao mundo e não tendo assim nada relacionado às questões ligadas ao campo do sobrenatural.

[38] LEITE, José Vieira. Contemplativo na ação: notas sobre a questão do sentido no trabalho contemporâneo. Revista Opus Magis, Centro Loyola de Fé e Cultura. PUC – Rio. Número 2, Janeiro – 2004. p.80

[39] A especialidade refere-se ao diferenciar-se do outro por algo em que eu me destaco, o que muitas vezes por ser algo tão envolto de mistérios pode até ser denominado como sendo algo “místico”.

[40] LEITE, José Vieira. Contemplativo na ação: notas sobre a questão do sentido no trabalho contemporâneo. Revista Opus Magis, Centro Loyola de Fé e Cultura. PUC – Rio. Número 2, Janeiro – 2004. p.80

[41] Mais informações no capítulo 6.

[42] Pegando por base o livro O Capital[42] de Marx, podemos dizer que os capitalistas são aqueles indivíduos detentores do capital, ou seja, do dinheiro e, por conseguinte detentores do poder e de todos os meios de produção. E proletariado, como a própria palavra já expressa, vem de prole, visando demonstrar significativamente que é uma classe que tem como uma das principais características, a reprodução. De certa forma, podemos dizer que a reprodução é a própria identidade desse grupo. É a famosa classe popular que quando não está produzindo no seu trabalho está nas horas de lazer reproduzindo na sua casa.

[43] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.95

[44] Não são nada mais do que especialistas no trabalho intelectual o qual conseguem dominar as massas. Ver mais no capítulo 6.

[45] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.122

[46] Idem. p.99

[47] Ibidem. p.101-2

[48] Ibidem. p.102-3

[49] Ibidem. p.104

[50] A palavra hábito vem do latim HABITUS, “condição, aparência, vestimenta, comportamento”, particípio passado de HABERE, “ter, assegurar, possuir”. A partir do século XIV adquiriu o sentido de “prática costumeira” O hábito dependendo do olhar no qual ele é posto pode ser tido como algo muito estranho ou então tão normal, semelhante tal como a forma de vida de qualquer sociedade. Um exemplo é o hábito que alguns orientais tem de comer carne de cachorro, já para os ocidentais isso soa um tanto “estranho”. Isso depende muito do lugar e da região. Existem regiões nas quais os hábitos são muito semelhantes isso se dá devido as culturas que se desenvolveram muito proximamente, tendo assim inúmeras semelhanças e poucas distinções. É através da cultura que ele é desenvolvido e diferenciado, hábito e cultura são inteiramente necessários para qualquer sociedade, porque são essas duas coisas que caracterizam, que identificam, uma determinada tribo ou sociedade. O hábito gerado tende a desenvolver uma normalidade na qual, na maioria, das vezes é tida como correta e inteiramente verdadeira, claro, algo tido como um consenso em determinado grupo social. Muitas vezes algo normal para mim, pode não ser tido como normal para outro, assim, como numa determinada sociedade pode serem exercitadas determinadas práticas nas quais, podem serem tidas como abomináveis para outra sociedade. Por exemplo, em uma tribo que se pratica o canibalismo isso para eles é tido como normal devido ao hábito cultivado, pois é uma verdade para aquele povo e é algo cultural, porém, para uma sociedade industrializada isso é mais que errado e é tido como algo completamente errado e anormal, tudo devido a uma forma de viver diferente. Outro exemplo é pegarmos uma tribo o indígena que sobrevive somente da caça e da pesca e a vida deles se resume basicamente a isso, para eles isso pode ser um máximo, um completo bem-estar, mas para uma sociedade industrializada isso pode ser visto como algo muito primitivo. Já os indígenas poderiam também lançar um olhar achando tudo aquilo muito esquisito e complexo, chegando-se até mesmo a um ponto de total maluquice, analisando como o homem foi perder-se em tamanha complexidade desnecessária. Torna-se desnecessário pelo próprio excessivo esforço que é gerado para uma produção que faz do homem não um ser que vive, mas um ser quase que 100% inteiramente produtor. E isso o transforma e quase que de certa forma, o destrói do seu modo primitivo de vida Todas as ações geradas pelo hábito, dão ao homem condições para que ele possa desenvolver-se enquanto ser e gerar dessa forma, uma bela cultura, rica e grandiosa que promova o seu próprio hábito que faça da sociedade algo mais dignificante e que cada vez mais o coletivo possa viver de uma maneira melhor. Busca-se assim a promoção humana e não a deterioração e desvalorização da mesma. Arquivo acessado dia 6 de março de 2012, às 15:29. Disponível em: http://origemdapalavra.com.br/palavras/habito/

[51] O choque cultural se dá principalmente quando distintos modos de viver se encontram e os mesmos se relacionam. Nessa relação gera-se assim uma medida na qual o certo para mim pode ser o errado para o outro e assim vice-versa. A questão cultural sempre foi algo muito pertinente nas nossas sociedades, pois, é graças a essas distinções que surgem as guerras e também os enriquecimentos quando claro, uma cultura visa aproveitar aquilo que a outra tem como algo valorativo. E não simplesmente buscar oprimi-la e tentar impor a minha cultura sobre outra. Quando isso ocorre, é correto afirmar que acontece uma certa manifestação de ignorância, pois, eu busco defender a minha posição cultural enquanto verdade e deste modo, ofusco a cultura do outro. Fazendo da mesma, algo insignificante. É necessário, portanto, que durante esses distintos contatos culturais, haja um respeito e valorização da cultura do outro, para que assim, ambas saiam ganhando.

[52] WEIL, Simone.  O Enraizamento. São Paulo: EDUSC, 2001. p.215

[53] Idem. p.215

[54] WEIL, Simone. La persona y lo sagrado. Escritos de Londres. (1942) p.14

[55] A própria autora chegou a conclusões de que a civilização grega possuía vários aspectos positivos, porém, ainda era um sistema que não conseguiu alcançar o ideal de uma sociedade igualitária, pois, também praticava, em certos moldes, a opressão. Arquivo acessado dia 15/04/2012, às 18:50. Disponível em: http://wwwcristianismolibertas.blogspot.com.br/2011/01/simone-weil-filosofa-da-graca.html

[56] CHENAVIER, Robert. Civilização de trabalho ou civilização do lazer? p.190

[57] Já se dizia antigamente que quanto mais filhos o casal tivesse mais mão de obra se teria para o trabalho. Inclusive em certas regiões chamavam-se de pás, o trabalhador da roça que ia procurar emprego, era indagado sobre quantas pás ele trazia consigo, pois o termo pás referia-se à quantidade de filhos os quais ele trazia consigo e quais eram os capazes de trabalhar. Segundo a tradição o patrão alegrava-se quando o indivíduo tinha muitas pás, pois assim, mais trabalhadores o patrão teria, e maior seria a produção. Etimologicamente, essa palavra é originária de Roma. ‘Em Roma, estes eram os cidadãos de mais baixa classe. O único que eles produziam para o Estado eram crianças (o que já não era pouco, pois era necessária gente para o exército), ou proles, “filhos descendentes. Arquivo acessado dia 21 de fevereiro de 2012, às 17:49. Disponível em: http://origemdapalavra.com.br/palavras/proletarios/

[58] CHENAVIER, Robert. Civilização de trabalho ou civilização do lazer? p.190

[59] Idem. p.190

[60] Para compreendermos um pouco mais a respeito do trabalho, peguemos por base o livro A condição humana de Hannah Arendt, no qual nos explica detalhadamente a diferença entre labor, trabalho e atividade. O labor é a atividade que corresponde ao processo biológico do corpo humano, cujo crescimento espontâneo, metabolismo e eventual declínio têm a ver com as necessidades vitais produzidas e introduzidas pelo labor no processo da vida. A condição humana do labor é a própria vida.

                O trabalho é a atividade correspondente ao artificialismo da existência humana (...). O trabalho produz um mundo <<artificial>> de coisas, nitidamente diferente de qualquer ambiente natural. (...) A condição humana do trabalho é a mundanidade.

                A ação, única atividade que se exerce diretamente entre os homens sem a mediação das coisas ou da matéria, corresponde à condição humana da pluralidade (...). O labor assegura não apenas a sobrevivência do indivíduo, mas a vida da espécie. O trabalho e seu produto, o artefato humano, emprestam certa permanência e durabilidade À futilidade da vida mortal e o caráter efêmero do tempo humano. A ação, na medida em que se empenha em fundar e preservar corpos políticos, cria a condição para a lembrança, ou seja, para a história. ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução de Roberto Raposo; posfácio de Celso Lafer. – 7.ed. – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. p.15-6

[61] Aqui ambos os trabalhos podem serem analisados, ou então praticados, de formas distintas. Tanto o trabalho manual quanto o trabalho intelectual, podem serem exercidos para a sobrevivência do próprio indivíduo, ou seja, por uma necessidade vital. Ou então, pode ser exercido somente pela prática do lazer que nesse caso é algo mais livre e desinteressado, praticado pela pura vontade do indivíduo. O trabalho livre, deste modo, não exerce nos indivíduos os sentimentos de obrigação e até mesmo de opressão já que é exercido de uma forma despreocupada. 

[62] WEIL, Simone. “Condición primera de um trabajo no servil.” Tradución de Eva Aladro (Texto escrito en Marsella en 1941, publicado parcialmente en el número 4 de “Cheval de Troie” en 1947, e íntegramente en “La Condition Ouviriére”, Gallimard, 1951).

[63] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.83

[64] Essa ideia de pensamento e ação é basicamente influenciada por Kant.

[65] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.109

[66] WEIL, Simone.  O Enraizamento. São Paulo: EDUSC, 2001. p.67-8

[67] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.123

[68] WEIL, Simone. Meditação sobre a obediência e a liberdade (1937). (Projeto de artigo) In: Oppression et liberté, Paris, Ed. Gallimard, 1955, p. 186-193[1]. Reimpresso em Oeuvres complètes, Écrits historiques et politiques, v. II, t. 2, Paris, Gallimard, 1991, p. 128-133. Tradução e notas de Emilia Maria M. de Morais.

[69] WEIL, Simone. La persona y lo sagrado. Escritos de Londres. (1942) p.5

[70] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.123

[71] CHENAVIER, Robert. Civilização de trabalho ou civilização do lazer? p.195

[72] Idem. p.203

[73] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.32

[74] Idem. p.32

[75] Segundo estudos, para Weil a contemplação está inteiramente relacionada à oração.

[76] WEIL, Simone.  O Enraizamento. São Paulo: EDUSC, 2001. p.271

[77] WEIL, Simone.  Opressão e Liberdade. São Paulo: EDUSC, 2001. p.129

[78] Idem. p.129

[79] Ibidem. p.129

[80] Vemos que Simone Weil, percebe que o próprio meio social influencia para que os indivíduos afastem-se de sua realidade. Esse afastamento lhe gera um espécie de alienação, pois, quanto mais o indivíduo se afasta de suas origens mais ele tende a tornar-se alienado. Como a própria autora fala, ocorre um desenraizamento, no qual o mesmo, desencontra-se, acaba por afastar-se de si mesmo. A solução para essa questão seria o retorno do indivíduo às suas raízes, ou seja, um reenraizamento, que possa lhe proporcionar um estado de liberdade, bem viver e de encontro consigo mesmo.

[81] WEIL, Simone.  O Enraizamento. São Paulo: EDUSC, 2001. p.267